sex mar 29, 2024
sexta-feira, março 29, 2024

Pela reconstrução da IV Internacional

Ao longo de 2018, nossa página publicou varios artigos dedicados aos 80 anos da fundação da IV Internacional que abordaram o contexto e os objetivos de sua fundação, as causas da crise de 1953 e suas consequências na dispersão das forças trotskistas e os debates que a LIT –QI mantém com as outras organizações que se reivindicam trotskistas. Neste material queremos fazer uma revisão desses artigos e suas conclusões.

Por: Alejandro Iturbe

A fundação da IV Internacional foi o resultado de longos anos de atividade e luta de León Trotsky e das forças que, já em 1938, se denominavam “trotskistas”. Começa desde o final de 1923 através da Oposição de Esquerda, com sua batalha dentro da URSS, o partido bolchevique e a III Internacional, contra a burocratização estalinista e suas consequências teóricas e políticas. Continua após a expulsão de Trotsky do partido bolchevique, da III Internacional e da própria URSS, entre 1927 e 1929, quando estas forças passam a denominar-se Oposição de Esquerda Internacional dentro da Terceira. E se reforça, a partir de 1933, depois que a política criminosa do estalinismo, na Alemanha, contribuiu para o triunfo do nazismo e Trotsky conclui que a Terceira havia morrido como organização revolucionária.

Desde então, são cinco anos de reagrupamento de forças, de busca de acordos com outras organizações, e de intensa elaboração teórico-política, como o livro “A Revolução Traída” e o “Programa de Transição” escrito como o documento central para ser votado na Conferência de Fundação.

Uma tarefa imprescindível em um contexto muito difícil

A IV Internacional nasce em um contexto muito desfavorável da luta de classes: o triunfo e a consolidação do estalinismo na URSS e o avanço do nazi-fascismo na Europa. Nasce perseguida pelo imperialismo e, essencialmente, pelo estalinismo: milhares de trotskistas morriam nos campos de concentração na Sibéria, alguns dos colaboradores mais próximos de Trotsky eram assassinados no exterior: seu filho León Sedov e seu secretario Rudolf Klement, no próprio processo de preparação da Conferencia de Fundação.

Este contexto determinou que a IV nascesse organizativamente débil. Eram menos de seis mil militantes, distribuídos da seguinte forma: Estados Unidos, 2.500; Bélgica, 800; França, 600; Polônia, 350; Alemanha, 200 (dos quais 120 estavam presos); Inglaterra, 170; Checoslovaquia, entre 150 e 200; Grécia, 100; Brasil, 50; Chile, 100, Cuba, 100; África do Sul, 100; Canadá, 75; Holanda, 50; Austrália, 50; Espanha, entre 10 e 30; México, 150; mais um número não definido de “adeptos clandestinos” na URSS.

Tratava-se, entretanto, de uma tarefa imprescindível: tinha que se defender no terreno teórico e programático a herança do marxismo e a experiencia da Revolução Russa, que havia sido deformada até sua quase destruição pelo estalinismo. Ao mesmo tempo, se tratava de lutar contra um novo fenômeno contrarrevolucionário no interior do movimento operário: a burocracia estalinista e as terríveis consequências de sua ação para os trabalhadores e as massas. A IV tem, desde sua fundação, o mesmo objetivo estratégico da III: dirigir a classe operária no processo da Revolução Socialista Mundial. Nesse caminho, agregava uma nova tarefa: a revolução política para derrotar o regime estalinista na URSS e recuperar esse Estado operário como alavanca da revolução mundial. Era uma tarefa defensiva (manter um fio de continuidade) e, ao mesmo tempo, preparatoria de um embrião de direção para os processos revolucionários que inevitavelmente viriam no futuro [1].

Não é casual que Trotsky, que havia sido um dos grandes dirigentes da Revolução Russa e tinha comandado milhões de combatentes no Exército Vermelho, considerasse que reagrupar esses poucos milhares de militantes “é o trabalho mais importante de minha vida; mais que o de 1917, o da guerra civil, ou qualquer outro”. E que seu papel nesse “trabalho” era “indispensável”, porque em 1917 Lenin estava orientando a revolução e agora somente ele podia levá-la adiante [2].

O pablismo

Em agosto de 1940, Ramón Mercader, um agente do estalinismo, assassinou Trotsky em sua casa de Coyoacán (México). Com este crime, o estalinismo buscava cortar o “fio condutor” com a herança marxista e a experiência de Outubro que Trotsky representava. Ao mesmo tempo, deixava a jovem IV sem seu principal dirigente, o de nível teórico-político e experiencia revolucionária qualitativos. A Segunda Guerra, ademais, diminuiu suas forças militantes, com muitas de suas seções européias na mais dura clandestinidade, nos países ocupados pelos nazis, e com o SWP (já debilitado pela ruptura de uma ala pequeno burguesa, em 1940) perseguido por sua oposição à guerra.

Nesse marco, em 1948 realizou-se o II Congresso, que reagrupou as forças trotskistas. O SWP dos Estados Unidos era o partido trotskista mais forte e o que contava com os quadros mais experimentados (varios deles educados pelo próprio Trotsky), mas padecia de um desvio que o levaria a não assumir como sua tarefa central ser o eixo de construção da Internacional. Seus dirigentes viam a IV como uma federação de partidos e não como uma direção internacional centralizada. Desta forma, a centralização foi assumida pelo grego Michel Raptis (Pablo) e o belga Ernest Mandel, acompanhados por um grupo de dirigentes muito jovens e de pouca experiencia, como o argentino Nahuel Moreno e o francês Pierre Lambert.

Esta direção débil e inexperiente viu-se submetida a duras pressões e provas sem a presença de Trotsky. Por um lado, a guerra produziu, de acordo com os prognósticos prévios de Trotsky, um grande ascenso revolucionário na Europa e outras regiões do mundo, e o surgimento de novos Estados operários que se somavam à URSS. Mas, por outro, contra esses prognósticos, a IV não ganhou peso de massas e incidência nesses processos e continuou sendo um pequeno núcleo. Pelo contrario, foi o estalinismo, que havia dirigido a derrota do nazi-fascismo e construido novos Estados operários, quem se converteu na direção indiscutível do movimento operário e de massas mundial.

Neste contexto, a nova direção da IV (Pablo e Mandel) não passou a prova e (a partir do III Congresso, em 1951) adotou um curso cada vez mais oportunista, baseado nas caracterizações impressionistas e totalmente equivocadas (a “inevitabilidade da Terceira Guerra Mundial” entre o imperialismo e a URSS, processo em que a burocracia estalinista desempenharia um papel “objetivamente revolucionário”), adotou a linha de que os trotskistas deviam fazer um “entrismo de longo prazo” dentro dos partidos comunistas estalinizados[3].

Entre as consequências políticas desta linha, chegaram ao cúmulo de recusar-se a defender a retirada do Exército Vermelho quando explodiram as revoluções políticas em Berlim Oriental (1953) e na Hungria (1956).

Esta caracterização e esta política de capitulação se estenderam aos movimentos nacionalistas burgueses e a outras correntes de origem não estalinista, como o castrismo. O SWP, Moreno e Lambert opuseram-se a estas caracterizações e políticas.

A tragédia da Bolívia em 1952

 “A consequência mais trágica dessa política foi a traição à revolução boliviana. Em 1952, na Bolívia se dá uma típica revolução operária. Os trabalhadores organizam milícias, derrotam militarmente a polícia e o exército, e surge a COB (Central Operária Boliviana) como organismo de poder dual. As minas são nacionalizadas e estoura a revolução camponesa, que invade os latifúndios e ocupa as terras. Até 1954, a principal força armada da Bolívia eram as milicias operárias dirigidas pela COB.

Desde a década de 1940 a organização trotskista boliviana (POR) vinha ganhando enorme influencia no movimento operário. Tinha em suas fileiras importantes dirigentes mineiros, fabris e camponeses. Seu principal dirigente, Guillermo Lora, foi o redator das Teses de Pulacayo, uma adaptação do Programa de Transição à realidade boliviana, votadas pela Federação de Mineiros.[…]Na revolução de ’52, o POR codirigiu as milicias e foi cofundador da COB. Tinha peso de massas na Bolívia.

Lamentavelmente, o POR, seguindo a orientação do Secretariado Internacional [SI] da IV, encabeçado por Pablo, não levantou a política de que a COB tomasse o poder. Ao contrario, deu seu apoio crítico ao governo burguês do MNR (movimento nacionalista burguês). Sem a orientação revolucionária, o movimento de massas foi sendo desarmado e desmobilizado, e a revolução foi desmontada em poucos anos” [4]. Nahuel Moreno e sua organização na Argentina combateram duramente esta linha do SI propondo que se impulsionasse a linha de “Todo poder à COB”.

A crise de 1953

Além destes gravíssimos erros políticos, a direção internacional dirigida por Pablo utilizou um método nefasto: interveio na seção francesa, destituiu a maioria de sua direção (que não tinha acordo com sua política), e tentou formar uma fração secreta no SWP norteamericano. A maioria dos trotskistas franceses (dirigidos por Pierre Lambert), ingleses (dirigidos por Gerry Healy), o SWP dos EEUU, e parte dos trotskistas sulamericanos, encabeçados por Nahuel Moreno, romperam com o Secretariado Internacional (SI) dirigido por Pablo e criaram em 1953 o Comitê Internacional (CI).

Vieram anos de dispersão, pois, apesar de que as forças que ficaram com Pablo e Mandel eram minoritárias, a maioria nunca se organizou de forma centralizada como a “verdadeira IV” para reverter a dispersão, especialmente por responsabilidade do SWP. Novamente coube a Nahuel Moreno combater este desvio “federalista” do SWP.

Apesar de uma tentativa de reagrupamento parcial, em 1963 (ao redor da caracterização de Cuba como um novo Estado operário), a crise não foi superada e a dispersão das forças que se reivindicavam trotskistas acentuaram-se. Por isso, hoje a IV Internacional não existe como organização unificada ainda que suas propostas programáticas tenham passado pela história.

A estratégia da LIT é reconstruir a IV

A corrente morenista integrou-se em 1964 ao SU (Secretariado Unificado) que tinha se formado um ano antes [5]. Demorou em fazê-lo porque considerava que essa reunificação devia fazer-se sobre a base de um balanço muito crítico do pablismo, que não se realizou. Durante sua permanencia no SU, sempre combateu os sucessivos desvios e capitulações que a maioria da direção impulsionava, agora encabeçada somente por Ernst Mandel (o “mandelismo”) [6], como o guerrilherismo, o vanguardismo e a adaptação à democracia burguesa [7].

Em 1979, a corrente morenista estava organizada como Fração Bolchevique (FB) dentro do SU. Nesse momento se desenvolvia o debate político sobre o caráter da Frente Sandinista de Liberação Nacional (FSLN) nicaraguense e seu governo (e a política a ter ante ele). A FSLN prende e expulsa os integrantes da Brigada Simón Bolívar (BSB), que havia sido impulsionada pela FB, e os entrega à polícia panamenha, que os tortura. O SU mandou uma delegação à Nicarágua, apoiou a decisão do governo, e não defendeu os integrantes da BSB (entre eles, militantes e dirigentes de sua organização internacional). A isto se soma, a resolução do SU de proibir a construção de partidos trotskistas em Cuba e Nicarágua. A FB rompeu com o SU. Após uma fracassada tentativa de fusão internacional com a corrente de Pierre Lambert, em 1982 fundou-se a LIT-QI com as forças da FB e setores latinoamericanos provenientes do lambertismo [8].

Desde sua própria fundação e seus estatutos, a LIT-QI (apesar de ser nesses anos a corrente trotskista mais forte e dinâmica) nunca se autoproclamou “a IV”, e sempre colocou sua própria construção a serviço da tarefa estratégica de reconstrução da IV Internacional:

 “A Liga Internacional dos Trabalhadores (Quarta Internacional) – LIT(QI), tem como propósito fundamental superar a crise de direção do movimento operário mundial e construir a Quarta Internacional com influência de massas. Somente assim, resolvendo a crise de direção do proletariado, a permanente mobilização dos trabalhadores e explorados do mundo contra o imperialismo e a burguesia, poderá culminar com a vitória da revolução socialista internacional e com a implantação da ditadura revolucionária do proletariado” [9]. Para a LIT-QI, essa é a “mãe de todas as tarefas”, a tarefa prioritária que apresentamos aos revolucionários do mundo. Não a propomos somente aos que se reivindicam trotskistas, mas também às novas gerações de lutadores.

Como fazer esta reconstrução?

Desde sua fundação, a LIT-QI tentou diversas aproximações com outras organizações internacionais e nacionais para explorar a possibilidade de unificação. Algumas deram resultado, mas várias outras fracassaram. Quais são os criterios com que fizemos estas aproximações no passado e continuaremos fazendo no futuro?

 “Temos defendido sempre que os processos de unificação devem ser sólidos, preparados e discutidos com profundidade e, se necessário, lentos. Neste sentido, propomos criterios claros. O primeiro é que a reconstrução da IV deve estar baseada ao redor de um programa, o que implica uma compreensão comum da realidade mundial e uma estratégia comum frente a ela [10].

É necessário também ter acordo nas posições sobre os principais fatos da luta de classes, especialmente nos processos revolucionários, para poder desenvolver uma ação militante comum sobre eles. Caso contrário, a coincidencia programática fica só nas palavras.

Um terceiro critério imprescindível é que as relações entre as organizações devem ser honestas e sem manobras desleais, para delimitar diferenças e inclusive até para chegar à conclusão de que não é possível uma unificação imediata mas que talvez possa dar-se no futuro. Este último deixa de fora desse processo as pequenas organizações sectárias ou as “seitas trotskistas” maiores (nacionais ou internacionais) para as quais “vale tudo” em função de parasitar as outras correntes e ganhar-lhes alguns militantes.

Finalmente, como um aspecto muito importante: “Defendemos a moral operária e revolucionária” que “para nós, constituem um ponto do programa. A profunda degeneração das organizações trotskistas, produto da longa crise, das pressões do estalinismo no passado, e da “enxurrada oportunista” nas duas últimas décadas, produziu também uma degeneração metodológica e moral” [11]. Nas últimas décadas, assistimos a um aumento alarmante de lutas pelo aparato, roubo de sedes partidárias e sindicais, mandatos parlamentares e dinheiro, acusações sem provas e calúnias e, inclusive, agressões físicas entre organizações que se reivindicam revolucionárias. Posicionamos-nos categoricamente contra estes métodos que caracterizam uma profunda degradação moral. A partir destes critérios, analisemos algumas das correntes que se reivindicam da IV Internacional.

O SU

Tal como temos assinalado, a Revolução Cubana e o reconhecimento de Cuba como um novo Estado operário impulsionaram em 1963 o reagrupamento de parte importante das forças trotskistas no mundo, no Secretariado Unificado. Afastado Michel Pablo de suas fileiras, a figura que encabeçou o SU foi Ernst Mandel.

Mandel não tinha os métodos autoritários de Pablo, mas manteve um elemento central do pablismo: suas análises e caracterizações totalmente impressionistas e a elaboração de orientações que se adaptavam à “moda” imperante, em cada momento, na vanguarda de esquerda e, a partir daí capitulavam a diversas direções burocráticas e pequeno burguesas.

Na década de 1960, isso levou o mandelismo a capitular à direção castrista cubana e às organizações guerrilheiras, a impulsionar uma linha guerrilheirista e a colocar as seções latinoamericanas em aventuras que tiveram um altíssimo custo em vidas e militantes (como o PRT-ERP da Argentina e o POR-C da Bolívia). [12]. Nos anos ’70 girou para uma posição “vanguardista” em geral: a tarefa não era agitar as consignas surgidas das necessidades profundas dos trabalhadores e das massas e sim das campanhas que impactassem na “nova vanguarda de massas” [13]. Ambas as linhas foram combatidas pelo morenismo e pelo SWP.

Na segunda metade da década de 1970, este seguidismo tomou outro rumo: o “democratismo” como expressão do impacto que tinha na esquerda européia o chamado “eurocomunismo”. Ante essa pressão, Mandel assumiu posições democratistas.

Em seu texto “Democracia socialista e ditadura do proletariado” (1979), mais tarde aprovado pelo congresso do SU, apresentava um modelo de ditadura do proletariado que era uma capitulação ao eurocomunismo e à socialdemocracia. Contra este material, Nahuel Moreno escreveu o livro Ditadura Revolucionária do Proletariado. Nele, além de analisar e defender a essência deste regime político, fez um prognóstico: se Mandel e o mandelismo aprofundassem neste caminho, abandonariam o campo dos revolucionários e passariam ao do reformismo. Lamentavelmente, este prognóstico se cumpriria anos mais tarde.

De modo quase simultâneo, o mandelismo voltou a expressar sua política de capitulação às direções pequeno burguesas e burocráticas que encabeçavam um processo revolucionário, ao apoiar o governo burguês nicaraguense da FSLN.(14)

Um salto de qualidade

O prognóstico de Moreno cumpriu-se cabalmente a partir do XIV Congresso do SU (1995). Quem deu o marco teórico-político foi Daniel Bensaïd, que havia passado a ser seu principal dirigente. Em seu informe, Bensaïd analisou que a restauração do capitalismo na URSS e nos outros ex Estados operários representava uma “grande transformação mundial”, uma verdadeira “mudança de época”. Para o SU havia finalizado a época definida por Lenin como de “guerras, crises e revoluções”, aberta com a Primeira Guerra Mundial e o Outubro russo (a época imperialista e revolucionária) [15]. Bensaïd considerava que entrávamos em uma época muito mais defensiva, com uma “crise no projeto socialista”, que requeria “construir um novo programa”.

Ao considerar que havia um “eclipse da razão estratégica”, o SU eliminou o eixo do Programa de Transição escrito por Trotsky: a ditadura do proletariado. Nesse marco, entre outras consignas para impulsionar a mobilização, se propunham algumas como radicalizar a democracia [burguesa], democratizar a ONU, criar novas instituições financeiras internacionais “democráticas”, etc. O SU havia deixado de ser uma organização revisionista do trotskismo para passar a ser diretamente uma organização reformista cujo acionar se integrava como a “perna esquerda” do sistema capitalista e das instituições da democracia burguesa.

A partir daí, a não participação em governos burgueses deixava de ser um problema de princípios para passar a ser um problema “tático”. Assim o expressou o próprio Bensaïd em seu debate com a organização DS (Democracia Socialista, então seção do SU) sobre se esta devia entrar ou não no governo burguês de Lula, em 2003 [16]. Posteriormente, em 2014/2015, a direção do SU impulsionaria o apoio de seus militantes gregos ao governo burguês do Syriza.

Um novo tipo de partido

Junto com esta mudança qualitativa e regressiva no terreno teórico-político, o SU abandonou a tarefa de construir partidos revolucionários segundo o modelo leninista. Sua principal organização, a Liga Comunista Revolucionária (LCR) francesa, se autodissolveu em 2009, para fundar nesse mesmo ano o Novo Partido Anticapitalista (NPA). Sua proposta geral passou a ser a construção de “partidos amplos” em comum entre “os revolucionários e os reformistas honestos”, o que implicava, com certeza, na aceitação do programa reformista.

Em Portugal, são parte do Bloco de Esquerda que apóia o governo burguês de Antonio Costa, no Estado Espanhol integram o Podemos, que se associou  ao governo burguês de Pedro Sánchez Pérez-Castejón, na Itália, integraram Rifundazione Comunista,  que apoiou o governo burguês de Romano Prodi, e, na Grécia, como vimos, do Syriza. No Brasil, isto se expressou na construção do PSOL. Em alguns casos, como na Grécia, isto provocou crise e debates com setores de militantes deles (a OKDE-Spartacus) e produziu-se também o desaparecimento da  Rifundazione, na Itália. Mas nunca fizeram um balanço sério desta política desastrosa e, de fato, continuam aplicando-a, como no Estado Espanhol, Portugal e Brasil. Esses partidos amplos passaram de “anticapitalistas” para ser “antiausteridade”, em uma dinâmica programática cada vez mais rebaixada e à direita.

O SU (hoje denominado Comitê Internacional da IV Internacional) já não é uma organização trotskista revolucionária. Portanto, não pode ser considerada como um possível participante de um processo de reconstrução de uma IV Internacional revolucionária, ainda que insista em apresentar-se como “a continuidade” da IV e em usurpar seu nome.

Por outro lado, atua como um polo de reagrupamento de outras organizações internacionais e nacionais (algumas das quais ainda se reivindicam trotskistas), que se aproximam assim de suas posições e propostas reformistas. Acreditamos que aqueles que, dentro do SU ou de sua “esfera de influencia”, acreditam honestamente que assim se ajuda a “reconstruir a IV” estão profundamente equivocados: uma verdadeira reconstrução da IV somente pode vir de um duríssimo combate contra as posições teóricas, programáticas e políticas do SU.

Os herdeiros da tendência The Militant”

The Militant foi uma tendencia interna do Partido trabalhista (Labour Party – LP) inglês, fundada pelo trotskista Edward “Ted” Grant (1913-2006), a partir de 1964 [17].

Após oscilar em suas posições, acabou fundando a Revolutionary Socialist League (RSL) que, em 1956, tornou-se a seção da IV Internacional pablista na Grã Bretanha. A RSL aderiu à concepção e à política do “entrismo sui generis” para aplicá-la no LP: em 1960 inicia primeiro um entrismo na juventude do trabalhismo e após a construção do The Militant, como uma política a longo prazo à espera da “radicalização” do LP e de capitalizar suas “rupturas de massas”.

Ted Grant não entrou no SU quando se deu o reagrupamento de 1963, e começou a desenvolver sua própria organização internacional: o Comitê por uma Internacional de Trabalhadores (CWI na sigla em inglês). Uma de suas características é, como vimos, transformar a tática de entrismo em organizações de massas com direções burocráticas em uma estratégia permanente, ao estilo pablista [18]. Em 1992, o CWI definiu encerrar o entrismo no LP, mas Ted Grant opôs-se a isto e ficou então fora dessa organização. Com uma minoria de militantes começou a construção da Tendência Marxista Internacional (IMT na sigla em inglês).

A concepção pablista desta corrente levou Alan Woods, sucessor de Ted Grant como principal dirigente da IMT, a seguir o mesmo caminho que Pablo teve com a Frente de Liberação Nacional (FLN) argelina. Woods abandonou a luta pelo poder dos trabalhadores e se transformou em assessor do governo burguês de Hugo Chávez na Venezuela. De fato, era o “trostkista oficial” do castro- chavismo: por exemplo, é o único autor “trotskista” que pode vender seus escritos na Feira do Livro de La Habana[19]. Hoje tomou certa distância do governo de Nicolás Maduro, mas apoiou sua repressão e continua reivindicando o “processo bolivariano”, apesar do desastre a que este conduziu.

O setor que continuou como CWI, encabeçado pelo inglês Peter Taaffe, apesar de ter saído do LP na Inglaterra e de construir o Partido Socialista (SP na sigla em inglês), mantém como uma de suas políticas essenciais o entrismo a longo prazo em organizações reformistas e eleitoralistas com conduções pequeno burguesas e burocráticas, como o PSOL brasileiro. Chegaram ao limite de apoiar a candidatura de Bernie Sanders contra Hillary Clinton nas últimas primárias do imperialista Partido Democrata estadunidense.

Outra diferença muito importante é que, diante da luta do povo palestino, o CWI chama a formar uma aliança com o “proletariado israelense”, quando este proletariado é na realidade a base social do enclave sionista imperialista e sua ampla maioria é pela defesa intransigente deste Estado genocida.

A FT-PTS

Tal como assinalamos em um dos artigos que lhe dedicamos dentro desta série sobre os 80 anos da IV Internacional, “As diferenças com a Fração Trotskista (FT) surgiram desde a própria origem do Partido dos Trabalhadores Socialistas (PTS), uma ruptura do MAS argentino e da LIT-QI, em 1988, que começou a construção da FT com seções na América Latina e alguns grupos na Europa” [20].

As principais diferenças do PTS/FT se expressavam em uma dura crítica às elaborações de Nahuel Moreno que, baseado no estudo dos processos revolucionários da Segunda Pós Guerra, elaborou aportes críticos a aspectos da formulação das Teses da Revolução Permanente, escritas pro Trotsky em 1930. Especialmente, sua revalorização das “revoluções democráticas” que derrubavam regimes ditatoriais ou liberavam colônias do imperialismo.

Para o PTS/FT estas elaborações eram uma concepção etapista ou semietapista que abandonava a teoria da revolução permanente de Trotsky e levava à construção de organizações centristas. Por isso, tinha que romper com o morenismo e retomar a construção de um “verdadeiro trotskismo de Trotsky”. No artigo já citado, respondemos extensamente a este debate com a FT.

Eles consideram que não havia nenhuma divergência entre a realidade e a teoria. Tudo havia sido previsto nos escritos de Trotsky e não havia nada que preocupar-se, sobre que refletir, ou o que corrigir. O nascimento do PTS está intimamente associado a este método que transforma o marxismo em “dogma bíblico” e não uma ciência viva que deve verificar de modo permanente suas construções teóricas na realidade e, a partir daí, melhorá-las e/ou modificá-las total ou parcialmente. Um método que os levaria, anos mais tarde, a negar que o capitalismo já havia sido restaurado na China e que ainda nega que a restauração se produziu totalmente em Cuba.

Esta discussão teórico-política se tornou muito aguda em torno ao processo revolucionário no mundo árabe, iniciado nos fins de 2010 com a derrota do ditator tunisiano Ben Ali, que depois se estendeu ao Egito, Líbia e Síria. A FT negou-se a qualificar esses processos como “revoluções” e a ter uma política revolucionária concreta ante eles e às guerras civis que se abriram na Líbia e Síria, ao propor não atuar dentro do campo militar que lutava contra as ditaduras de Kadafi e Assad.

Um giro de 180 graus

Até este ponto do debate entre a LIT e a FT, esta organização nos criticava desde a “esquerda” e a “ultraortodoxia trotskista”. Entretanto, nos debates mais recentes, a FT continua criticando-nos tão duramente como antes, mas agora vemos que se localizou à nossa “direita” e utiliza argumentos antes impensáveis nela. O ponto de partida é que adotou a “caracterização” (comum à maioria da esquerda internacional) de que no mundo existe uma “onda reacionária”. Dado que a correlação de forças com o inimigo é muito desfavorável, se impõem essencialmente táticas unitárias.

Muito ligado a isto, as seções mais importantes da FT giraram sua atividade para o eixo eleitoral-parlamentar como centro de sua atividade. Quem expressa isso, com muita nitidez, é o MRT brasileiro, que pediu seu ingresso ao PSOL e apresenta candidatos por este partido [21]. Consequente com esta localização de “satélite” do PSOL, um dos principais eixos de agitação do MRT e da FT é a campanha por “Lula Livre” e “Lula candidato presidencial”.

A política do MRT expressa a política da FT em seu conjunto e, em especial, a de seu principal partido, o PTS da Argentina. Os “sintomas” não são tão evidentes como no MRT pelo maior peso da organização argentina (inclusive em estruturas operárias) e porque obteve êxitos eleitorais através da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), que tenta manter um “perfil trotskista”. Entretanto, nitidamente já estão ali: baseados nesses êxitos eleitorais, há varios anos que o PTS vem atuando como uma organização eleitoralista e parlamentarista [22].

As diferenças teórico-políticas que temos com a FT são profundas. Mas, inclusive se elas diminuíssem, esta organização tem um método de relacionamento desleal (como a realização da tática de “entrismo secreto” em outras organizações trotskistas). Ainda que seja maior, a FT tem o método das seitas parasitárias. Isso torna hoje impossível qualquer aproximação em bases sérias e honestas. Mais ainda, determina que, nestas condições, a FT somente pode desempenhar um papel negativo e destrutivo num processo de avanço na reconstrução da IV Internacional.

O  nacional-trotskismo

A partir da crise de 1953, começou a surgir um profundo desvio em algumas organizações, que denominamos nacional-trotskismo: correntes cujos esforços se concentram quase que exclusivamente no desenvolvimento da organização nacional de origem e não na construção de uma Internacional e sua equipe de direção. Este processo se acentuou com aquelas organizações que não ingressaram no reagrupamento de 1963, como o Workers Revolutionary Party (WRP) da Grã Bretanha, encabeçado por Gerry Heally, e o PCI francês (depois OCI) de Pierre Lambert. Embora ambos desenvolvessem grupos em outros países, não eram verdadeiras internacionais e sim colaterais que giravam ao redor do “partido mãe” e eram centralizadas ferreamente por sua direção.

Estas organizações nacional-trotskistas apresentam algumas características comuns: se constroem ao redor de um “dirigente infalível” e tem um método de funcionamento interno sumamente burocrático. Por isso, qualquer diferença política com esse dirigente e sua equipe acaba geralmente em expulsões, com o argumento da “defesa da organização”. A combinação deste funcionamento interno com a falta de controle de uma Internacional é explosiva.

O WRP havia se transformado, na primeira metade da década de 1970, na principal organização tortskista do mundo (mais de 5.000 militantes), com peso em importantes estruturas operárias. Em 1985, Healy recebeu uma gravíssima acusação moral: assediar e obrigar várias militantes do partido a ter relações sexuais com ele. A maioria da direção saiu em sua defesa e o partido acabou explodindo em numerosas e pequenas frações [23].

No caso da OCI lambertista, primeiro se adaptou profundamente aos aparatos sindicais burocráticos franceses (especialmente a Força Operária) e depois capitulou completamente ao governo burguês de frente popular de François Mitterrand (desde 1981) [24]. A OCI conseguiu certo desenvolvimento mas após sucessivas expulsões e rupturas ficou muito reduzida. Nesse processo, adotou o nome de PT, com um programa muito rebaixado. Sua corrente internacional quase desapareceu.

Atualmente, uma organização claramente nacional-trotskista é o Partido Operário (PO) da Argentina, organização de origem lambertista que nunca deu importancia nem dedicou seus esforços à construção de uma Internacional. Às características que assinalamos aqui (dirigente “infalível” e burocratismo interno), devemos agregar-lhe seu burocratismo no próprio movimento de massas e suas organizações. A respeito de sua política cotidiana, o PO (ainda que tente manter um perfil trotskista e militancia nas estruturas) também se transformou em uma organização cujo eixo é a atividade eleitoral-parlamentar.

Algumas conclusões

Até a década de 1970, Nahuel Moreno caracterizava que existia um “movimento trotskista”. Definiu que, para além de suas diferenças, era “uma corrente independente dos aparatos burocráticos ainda que não tivesse unidade organizativa”. Esse movimento já não existe como tal: como parte da “enxurrada oportunista” que arrasou a esquerda desde a década de 1990, setores importantes desse movimento “cruzaram a linha” e abandonaram o campo revolucionário, transformando-se em correias de transmissão (e vivendo às expensas) da democracia burguesa e parlamentar, dos fundos do Estado, ou de aparatos sindicais burocráticos.

Alguns o fizeram de modo explícito, como o SU. Outros, de modo mais vergonhoso: continuam ainda reivindicando-se trotskistas, mas avançam (mais lento ou mais rápido) nessa direção. Além das diferenças teóricas que temos com elas, também apresentam diferenças incompatíveis nas políticas frente aos processos concretos. Muitas dessas organizações capitularam ao chavismo venezuelano, ao Syriza na Grécia, ao PT e a Lula no Brasil (e continuam). Basta ver, por exemplo, que no Brasil, a grande maioria das correntes que se reivindicam trotskistas estão dentro do PSOL, fazem campanha por “Lula Livre” , e criticam o PSTU por “sectário” quando se opõe a esta linha. Com várias delas, além disso, nos separa seu método de relacionamento desleal e adoção da moral do “vale-tudo”.

Somos totalmente conscientes que a LIT-QI também sofreu as consequencias da “enxurrada oportunista” e, depois da morte de Nahuel Moreno, passou por uma profunda crise que quase levou a seu desaparecimento. Mas analisando autocriticamente seus erros e buscando corrigi-los, vai superando essa crise, e suas seções e militantes buscam intervir e construir-se ativamente nos processos reais da luta de classes. Com uma política trotskista revolucionária, suas seções e militantes desempenham um papel de primeira linha nos processos de reorganização do movimento operário e de massas, como a CSP-Conlutas, no Brasil, CoBas no Estado Espanhol, No Austerity na Itália, o Sitrasep na Costa Rica, entre outros. Além disso, como consideramos que o marxismo não é um dogma e sim uma ciência viva que se enriquece com o estudo dos novos fatos da realidade, estamos em um processo de atualização do Programa de Transição.

Objetivamente, por seu funcionamento centralista-democrático, por seu programa e pela manutenção da estratégia da ditadura do proletariado, por sua política concreta diante dos processos e por sua defesa da moral revolucionária, a LIT-QI é hoje, com todas suas debilidades, a única organização revolucionária trotskista internacional que merece tal nome. É uma constatação, em grande medida dolorosa, da realidade das “forças trotskistas”.

No contexto que analisamos, propor um possível reagrupamento estratégico de modo imediato com outras forças que se reivindicam trotskistas seria equivocado e, ao mesmo tempo, irresponsável. Talvez no futuro, a luta de classes permita essa aproximação com algumas das organizações que analisamos, ou com outras. Quando essa possibilidade aconteça na realidade, atuaremos como já temos feito no passado: com seriedade, honestidade e lealdade, para tentar concretizá-la. E faremos com os critérios que já assinalamos neste mesmo artigo. Por isso, consideramos que uma verdadeira reconstrução da IV Internacional passa atualmente pela construção da LIT-QI.

 

[1] Sobre o tema da fundação da IV Internacional como continuidade da III Internacional, ver o artigo de Alicia Sagra, em: https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/reconstruir-la-iv-continuidad-la-iii-internacional/

[2]  Citado por Eduardo Almeida, em: https://litci.org/es/menu/teoria/historia/defensa-la-cuarta-internacional/

[3] Sobre este processo, ver https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/la-lucha-la-reconstruccion-la-iv-internacional-papel-del-parte-i/

[4] Idem.

[5] Ver https://litci.org/es/menu/teoria/historia/defensa-la-cuarta-internacional/

[6] Pablo opôs-se à reunificação de 1963, passou a atuar como assessor do governo burguês da FLN argelino, e começou a construir uma pequena organização internacional. Foi formalmente expulso do SU em 1964.

[7] Sobre alguns desses debates, recomendamos ler os livros de Nahuel O partido e a revolução, de 1973 (conhecido como “Morenazo”) e Ditadura revolucionária do proletariado, de 1980, ambos reeditados pela Editora Lorca, 2010.

[8] Ver https://litci.org/es/menu/teoria/historia/nahuel-moreno-nuestra-experiencia-con-el-lambertismo/

[9] http://phl.bibliotecaleontrotsky.org/arquivo/estatutosLIT.pdf

[10] Sobre estes critérios e as bases deste programa, ver: https://litci.org/es/menu/teoria/el-proyecto-estrategico-de-la-lit-ci-es-reconstruir-la-iv-internacional/

[11] Idem.

[12] O PRT-ERP foi reconhecido como seção oficial argentina do SU em 1969, em detrimento da organização morenista (PRT-La Verdad).Rompeu com o SU e o trotskismo em 1973.

[13] Em debate com estas posições e com um balanço da experiencia guerrilheira, Nahuel Moreno escreveu e apresentou ao X Congresso o documento já citado, conhecido como “Morenazo” e logo reeditado como O partido e a revolução.

[14] Declaração da Fração Bolchevique (1979).

[15] Para uma análise mais profunda deste tema, ver: https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/la-lucha-la-reconstruccion-la-iv-internacional-papel-del-parte-ii/

Para consultar diretamente os textos de Daniel Bensaïd, ver: http://www.internationalviewpoint.org/spip.php?rubrique4  y http://danielbensaid.org/Uma-nova-epoca-historica?lang=fr

[16] Sobre este tema, ver: http://danielbensaid.org/Carta-a-Democracia-Socialista?lang=fr

[17] Sobre a trajetória de Ted Grant, The Militant e sua corrente, ver: https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/tendencia-marxista-internacional-tmi-del-entrismo-permanente-al-abandono-la-dictadura-del-proletariado/

[18] Idem.

[19] Ver o artigo “Alan Woods: o ‘trotskista oficial’” em Correio Internacional No 14 (dezembro de 2015).

[20] https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/fraccion-trotskista-pts-del-sectarismo-propagandistico-al-oportunismo-electoralista-parte-i/

[21] Sobre esta parte do debate com a FT/PTS, ver: https://litci.org/es/menu/especial/80-anos-de-la-cuarta/fraccion-trotskista-pts-del-sectarismo-propagandistico-al-oportunismo-electoralista-parte-ii/

[22] Idem.

[23] Uma delas, encabeçada por Bill Hunter, ingressou na LIT-CI e formou a Internacional Social League (ISL).

[24] Ver o artigo sobre o lambertismo citado na nota 8.

Tradução: Lilian Enck

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