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Paraguai| 2021, mais negociatas e entreguismo do governo Abdo

Horacio Cartes e Mario Abdo Benítez
fevereiro 4, 2021

O ano de 2021 abriu com novas crises no Executivo. Estas colocam um manto de dúvidas sobre a continuidade do projeto do “acordo colorado” para as eleições municipais e, ao mesmo tempo, dão lugar às ameaças do fantasma do julgamento político. As declarações de representantes do cartismo[1] não passam até agora de bravatas, pois o acordo colorado não é mais do que um acordo de conveniência mútua que garante impunidade e facilidade para os negócios do cartismo e, ao mesmo tempo, abona a continuidade do governo em um desgaste permanente.

Por: PT-Paraguai

O ano apenas se inicia e já aparecem as primeiras negociatas

Os fatos que abrem este novo momento de crise estão cruzados por escândalos de corrupção: o conflito que envolve o chefe do Gabinete da Presidência, Juan E. Villamayor, na negociata da dívida da Petropar com a PDVSA (Petróleos da Venezuela), que incluiria o pagamento de comissões milionárias; o escândalo da milionária passarela de ouro[2] de 2 milhões de dólares, que foi denunciado pelo Diretor de Obras Públicas José Kronawetter, apontando a conexão da empresa que constrói a passarela de ouro  com Jorge López Moreira (irmão de Silvana), cunhado do presidente Abdo Benítez.

Kronawetter foi afastado do cargo pelo Ministro de Obras Públicas, Arnaldo Wiens, após confirmar que López Moreira tinha feito lobby a favor do super fornecedor Engineering SA, cujo diretor é Juan Andrés Campos Cervera, empresário ligado à equipe de Abdo. Esta empresa conta com 66 contratos com o Estado e se encarregou da polêmica passarela com desenho de “ ñandutí” (aranha em guarani, ndt.) entre o parque Ñu Guasu e o Comitê Olímpico Paraguaio.

Estes dois fatos precipitaram os questionamentos e pedidos de destituição de Villamayor e Wiens, não só da oposição por fora do partido colorado, como do aliado do acordo colorado, o setor de Horacio Cartes, enquanto Abdo respalda publicamente a ambos.

Avança a traição e o entreguismo da soberania energética

A tudo isto se somou a renuncia do hoje ex – Diretor de Itaipu, Ernst Bergen, que, empurrado pelas pressões internas e externas para a adjudicação de licitações e outras negociatas por parte dos que formam o primeiro anel que parasita a entidade, decidiu se afastar. Em seu lugar, Mario Abdo designou um dos traidores e entreguistas da soberania energética do país, Federico González, partícipe direto do escândalo da frustrada assinatura da ata secreta de Itaipu (2019) que até então ocupava o cargo de Chanceler.

Federico González atuou como ajudante do presidente Mario Abdo e esteve à cabeça junto ao vice-presidente Hugo Velásquez para tentar fechar a negociata sobre a energia excedente da represa a favor da empresa Leros, vinculada a Bolsonaro.

A designação de Federico González obedece à necessidade de Mario Abdo de ter a qualquer preço alguém absolutamente leal aos grandes interesses que surgem da negociação do Anexo “C” de Itaipu, discussão que já está em desenvolvimento e cujo desenlace deve ser em 2023. A enorme indignação despertada é a tempestade que o governo, de maneira consciente, resolveu enfrentar para não alterar seus planos em torno às negociatas que vai produzir o acordo que chegar com o governo brasileiro.

A designação de González gerou movimentos no gabinete: o oportunista e ardiloso Euclides Acevedo – que ocupava o cargo de Ministro do Interior- foi designado novo Chanceler e Arnaldo Giuzzio, até então Ministro da SENAD (Secretaria Nacional Antidrogas), foi designado como o novo Ministro do Interior em substituição a Acevedo.

Tiroteios de todos os lados, de acordo com seus interesses de classe

Esta quantidade de escândalos em cima aprofunda a crise do governo, que não consegue se recompor de um golpe para continuar recebendo outros que o deixam cambaleando e onde as encruzilhadas com o cartismo elevam o tom diante da tentativa de colocar em andamento o operativo “acordo colorado” para as eleições municipais.

O conjunto da oposição voltou a trazer à tona o fantasma do julgamento político, ainda que da parte do cartismo isto não passe de meros latidos, porque a essência do acordo entre ambas as facções coloradas é o pacto de impunidade e a manutenção do governo até o final do mandato.

A nomeação de González à frente de Itaipu não tem acordo no senado até hoje, o que deixa o governo novamente condicionado a chegar a acordos com o cartismo para avançar em suas pretensões de negociações em Itaipu.

No contexto desta pugna de facções ocorrem golpes e ameaças que debilitam relativamente o governo de Abdo, sobretudo o desgasta e o desprestigia diante da opinião pública e de certos setores burgueses que vão perdendo confiança em sua gestão. Cartes sabe que ainda não tem campo livre e que pesa sobre sua cabeça o processo de Messer que o envolve e ameaça seus negócios e projetos, por isso apela para estes tiroteios. Apesar destas idas e vindas, o governo segue firme em outros aspectos que fazem a agenda comum entre ambos os grupos contra a classe trabalhadora.

O cartismo golpeia, tira vantagens e continua avançando

Por sua vez, o cartismo não só continua na linha de desgastar o governo para se transformar na única força preponderante no interior do partido colorado, mas ao mesmo tempo já apresenta a dupla tentativa de seu movimento para disputar em 2023 (Santi Peña & Pedro Alliana) e também coloca a discussão de preparar a constituinte para reformar a constituição e assim incorporar a figura da reeleição e outras modificações de acentuado corte autoritário. O deputado por Itapúa Walter Haarms (cartista) propôs o debate da constituinte como uma ideia própria, procurando assim desembaraçar Cartes e o cartismo do projeto.

O cartismo tem um programa que busca não só retornar ao poder, como busca afastar todos os obstáculos legais que travaram o projeto de reeleição de Cartes, assim como a necessidade de aceitação da renúncia presidencial por parte do congresso para jurar como senador ativo, pretensão de Cartes em 2018, entre outras reformas reacionárias.

A facção de Cartes se joga neste projeto no contexto da discussão da reforma estatal e uma das hipóteses que trabalha, é que sua estratégia de desgaste contínuo do governo e a ameaça de julgamento político possa condicioná-lo para viabilizar sua agenda política.

A oposição em crise e à espera de fechar acordos eleitorais

Por parte da oposição parlamentar não existem muitas novidades. A crise do Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) segue seu curso; Efraín Alegre segue sua campanha antimáfia tentando aglutinar todos sob seu teto. Blas Llano, colado ao cartismo, com aparente menor força, faz campanha para reforçar seu espaço, enquanto que o resto do PLRA corre em caminhos separados na busca de se acomodar onde for mais conveniente.

Olhando de fora e à espera de resolução da crise do PLRA está a Frente Guasu (FG), que no marco de seu oportunismo eleitoralista pretende se aliar ao setor do PLRA que melhor se posicione nesta ou naquela zona do país. Esta disposição da FG já ocorre a nível interno, onde o Partido Tekojoja decidiu se afastar da FG em alguns distritos, para se aliar de maneira independente com o PLRA e garantir a localização de seus indicados em alguns municípios.

Hugo Richer (Convergencia Socialista) destacou que o que foi decidido pelo Tekojoja é um fator de debilitamento da FG, explicando que na coalizão existe a figura da “exceção” que é a decisão autônoma de cada espaço para poder escolher sair da aliança em certos lugares, e se juntar com outros setores ou ir de maneira independente disputar eleições em melhores condições. Carlos Filizzola (Partido País Solidario) disse que esta situação só debilita a FG neste momento e até deu a entender que isso é uma atitude mesquinha de Sixto Pereira (Tekojoja), que em vez de aproveitar a força que tem em determinados distritos para que isso reflita no resto da FG, o utilizam só em benefício próprio ao garantir as candidaturas em aliança com o PLRA.

A oposição reformista, ao ter as eleições como prioridade, não tem em como objetivo organizar a classe trabalhadora para se agrupar em torno a um plano de ação para a  mobilização e pressionar o oficialismo a retroceder em seus planos entreguistas, de reforma estatal e maiores ajustes contra o povo.

A tarefa das organizações combativas da classe trabalhadora

O governo caminha com uma grande debilidade por sua submissão constante ao cartismo, mas estão unificados nos planos estratégicos que significam multimilionárias negociatas e aprofundamento da miséria para o povo trabalhador.

As organizações classistas e combativas devem aprofundar as discussões políticas para reagrupar as organizações em torno a um plano de luta contra a política do governo, propondo a mobilização de todos os setores atingidos pela crise.

A tarefa deve ser voltar a nos articular, discutir um plano de lutas como no ano passado e voltar a nos mobilizar demonstrando a força das organizações nas ruas e que não vamos tolerar nem mais um só passo nas negociatas e traições do governo e dos donos do grande capital.

[1] Movimento ligado a Horacio Cartes, ex presidente do Paraguai (ndt.)

[2] Caso da milionária ponte de pedestres construída na rodovia Ñu Guasu (ndt.)

Tradução: Lilian Enck

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