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quinta-feira, março 28, 2024

Todo apoio à greve geral

Uma greve geral foi convocada em 27 de setembro pelo sindicato dos agricultores “Samyukt Kisan Morcha” (Frente Unida dos Agricultores) para protestar contra as três leis agrícolas que foram aprovadas arbitrariamente no ano passado. Foi exatamente neste dia, em 2020, que o presidente deu seu consentimento às três novas leis agrícolas e aos novos códigos de trabalho, aprovando assim os projetos de lei. Estas três leis visam incentivar o crescimento do monopólio corporativo sobre o comércio e a produção agrícola, em detrimento dos agricultores individuais; isto não só empobrecerá os camponeses já marginalizados na Índia, mas também empurrará ainda mais os trabalhadores agrícolas empregados nestas fazendas para a pobreza.

Por: Adhiraj Bose – Mazdoor Inqilab – 27 de setembro de 2021

O apelo à greve geral foi apoiado por todos os partidos burgueses da oposição, bem como por vários sindicatos, que aproveitaram esta oportunidade para manifestar sua oposição à igualmente desastrosa nova lei trabalhista, que tornará muito mais difícil a organização e a agitação no local de trabalho, ao mesmo tempo em que facilitará a contratação e a demissão de trabalhadores por parte dos patrões. Vale lembrar que, no ano passado, os sindicatos realizaram uma greve geral contra a nova lei que coincidiu com o início da agitação mais longa dos agricultores da história recente da Índia.

As leis agrícolas

As três leis agrícolas que foram aprovadas pelo governo do BJP no ano passado são:

1) Lei de Promoção e Facilitação do Comércio de Produtos Agrícolas de 2020

A lei também é pejorativamente chamado de “lei de desvio dos APMC”. Os APMC ou Comitês de Venda de Produtos Agrícolas atuam como intermediários entre o agricultor e o comprador. A lei anulará e eventualmente substituirá a existência dos APMCs, dando livre arbítrio às forças de mercado. Tal lei já existe no estado de Bihar, onde os efeitos da lei são uma maior marginalização dos agricultores de Bihar e a migração dos agricultores para outros estados como trabalhadores assalariados. A justificativa ostensiva por trás desta lei é que ele dará maiores oportunidades de comércio ao agricultor em todo o país, mas o fato é que a maioria dos agricultores na Índia não tem meios de vender seus produtos fora de seu estado ou região, pois não possui transporte e infraestrutura digital que a lei presume. A lei ajudará as corporações que têm uma infraestrutura nacional e dinheiro para competir efetivamente no mercado mais amplo.

2) Lei de Garantia de Preços e Serviços Agrícolas para Empoderamento e Proteção dos Agricultores de 2020

A lei procura fornecer aos agricultores uma estrutura para o contrato agrícola. Isto, em teoria, lhes permitiria interagir diretamente com os compradores a preços pré-determinados, eliminando assim o intermediário. Entretanto, esta lei também fornecerá um meio pelo qual as empresas agrícolas de varejo controlarão a subsistência do agricultor. Não haverá uma troca igual entre o agricultor marginal proprietário de um hectare ou meio hectare de terra e as empresas varejistas com cadeias logísticas maciças em todo o país, com centenas de lojas em toda a Índia em cidades e vilas.

3) Lei de Mercadorias Essenciais (Emenda) de 2020.

A Lei de Mercadorias Essenciais permitia ao governo impor limites ao comércio de produtos agrícolas e limitar os preços das mercadorias. A nova lei emendada retira cereais, leguminosas, sementes oleaginosas, óleos comestíveis, cebolas e batatas da lista de mercadorias essenciais. Em conjunto com as outras duas leis, e no contexto do aumento da inflação no país, este pode ser um movimento potencialmente desastroso, uma vez que permitirá o açambarcamento e aumento indiscriminado de preços de algumas das culturas alimentares mais essenciais da Índia! Esta medida mais uma vez ajudará as corporações agrícolas em vez de pequenos agricultores, ao mesmo tempo em que prejudicará diretamente o consumidor.

Por  seus próprios títulos, as leis mostram que são um exercício de duplo sentido. Longe de proteger e promover a causa do agricultor, estas leis ameaçam marginalizar e espremer o pequeno agricultor em favor das corporações agrárias e varejistas que finalmente monopolizarão o mercado. Para o agricultor, estas leis prometem marginalização e miséria e para o trabalhador, fome e inflação.

As novas leis trabalhistas

Os novos códigos de trabalho foram concebidos para substituir o quadro legal existente das relações de trabalho na Índia, onde existem 44 leis trabalhistas diferentes que tratam de vários aspectos trabalhistas, sendo as mais notáveis entre elas a Lei de Conflitos Industriais de 1947, a Lei de Salários e a Lei de Fábricas. Os quatro novos códigos irão anular todas essas leis em favor de quatro novas leis que pretendem “racionalizar” as leis trabalhistas na Índia, favorecendo a “flexibilidade” em detrimento da segurança. Tais mudanças são uma exigência de longa data da burguesia indiana, que deseja reverter as conquistas das lutas trabalhistas dos últimos 100 anos.

Na mesma linha das leis agrícolas, os quatro novos códigos trabalhistas foram aprovados pelo parlamento sem nenhuma discussão ou consulta aos sindicatos. O voto oral arbitrário e a decisão do presidente do congresso de aprovar o projeto, apesar da clara oposição e incerteza da maioria, desnudaram a forma antidemocrática com a qual estas e as leis agrícolas foram aprovadas.

Assim que as leis foram aprovadas, todos os sindicatos em todo o país, bem como os partidos da oposição, uniram forças para denunciá-la. Mesmo o Bharatiya Mazdoor Sangh, ligado à BJP, manifestou-se contra o projeto de lei. Seu secretário geral declarou que as novas leis “afetariam negativamente a paz industrial”, uma posição em nada surpreendente de um sindicato de direita. Como ele próprio admitiu, nenhuma das recomendações pró-trabalhadores feitas pelo sindicato ou pela comissão parlamentar permanente foi aceita pelo governo, que desejava impulsionar uma lei inteiramente pró-empresarial.

Entre as mudanças radicais trazidas pelas novas leis, a isenção de ordens permanentes passou de empresas com até 100 para até 300 trabalhadores. Isto permitira às empresas com até 300 trabalhadores flexibilidade para contratar e demitir. Isto tornaria milhões de trabalhadores empregados no setor de pequenas e médias empresas (a base do emprego) vulneráveis a demissões e reduções em massa. Nas palavras do secretário geral do CITU, Tapan Sen:

“Estes códigos, agora aprovados, jogarão mais de 74% dos trabalhadores industriais e 70% dos estabelecimentos industriais em ‘regime de contratação e demissão’ à vontade dos empregadores; mesmo a formação de um sindicato será extremamente difícil; imporão uma proibição virtual ao direito dos trabalhadores à greve e até mesmo à agitação coletiva por suas demandas e exigências.”

Segundo o novo código salarial, o salário indireto está limitado a 50%. Isto significa que o salário básico não pode ultrapassar a metade do salário bruto, e a contribuição à previdência social é calculada como uma porcentagem do salário básico. Os empregadores têm dividido os salários em numerosos subsídios para manter os salários básicos baixos e reduzir a despesa em previdência e imposto de renda. O novo código salarial prevê a contribuição à previdência como uma proporção prescrita de 50%. O efeito disto seria reduzir o valor do salário que o trabalhador pode receber, isto é, seu dinheiro “vivo”.

Agitações contra as leis trabalhistas

Enquanto os protestos dos agricultores estão no foco, e merecidamente, a classe trabalhadora também está se mobilizando contra as leis. Logo após a aprovação das novas leis trabalhistas, os sindicatos começaram sua agitação. Em abril deste ano, quando as leis deveriam ser implementadas em todo o país, os sindicatos saíram às ruas em protesto no “Dia do Código Antilaboral”. O fato é que as novas leis trabalhistas são profundamente impopulares entre a maioria dos trabalhadores na Índia, e há ainda mais razões para fazê-lo agora, uma vez que a economia ainda está cambaleando pelos efeitos devastadores da pandemia, que custou 20 milhões de empregos. Por esta razão, o governo ainda precisa definir as regras para as leis para colocá-las em vigor. Este ano, a crescente dissidência contra o BJP encontrou expressão em sua derrota eleitoral em vários estados importantes da Índia, e outra eleição está para acontecer em breve no maior estado da Índia, Uttar Pradesh. Não é sem razão que as leis trabalhistas continuam paralisadas.

A agitação contínua é essencial para garantir que a lei não entre em vigor, e nosso objetivo deve ser a sua revogação, para que seja morta e enterrada. Enquanto esta luta continua, a luta dos trabalhadores do esquema[1] (incluindo trabalhadores da ASHA e Anganwadi) continua. Deve-se lembrar que os trabalhadores da ASHA formam a linha de frente contra a pandemia, mas o governo tratou-os com desprezo e ignorou suas demandas mais urgentes. Em 24 de setembro, eles fizeram outra greve nacional, por falta de pagamento de salários, por aumento salarial durante a pandemia e pelo direito básico à alimentação e nutrição. No ano passado, mais de meio milhão de trabalhadores da ASHA entraram em greve, enquanto a pandemia e o bloqueio ainda estavam em vigor, para exigir salário básico, segurança e kits que eles precisam para conduzir seu trabalho. O governo foi forçado a ceder.

A situação na Índia é terrível, e os trabalhadores estão se mobilizando por todo o país. Junto à agitação dos agricultores, a agitação da classe trabalhadora na Índia apresenta uma oportunidade de ouro para uma aliança de forças entre camponeses e trabalhadores. Tal força contra o governo capitalista seria imparável, caso fosse mobilizada na luta.

Nossa posição sobre a greve

O apelo à greve uniu vários partidos burgueses e de esquerda de vários matizes em todo o país; também encontrou apoio entre a maioria das centrais sindicais, representando dezenas de milhões de trabalhadores em vários setores da economia. A maioria da oposição burguesa, e até mesmo alguns da oposição de esquerda, estão se comprometendo a apoiar a greve, mais por razões míopes ou por interesse próprio. O Congresso, por exemplo, tem sido o pioneiro do neoliberalismo na Índia e do desmantelamento das proteções trabalhistas. Seria nada menos que hipócrita que eles se comprometessem a apoiar os agricultores, ou que se opusessem aos novos códigos trabalhistas que realizaram as reformas apresentadas pela primeira vez sob seu governo.

Entretanto, este fato por si só não significa, e não pode significar que não apoiaremos esta agitação. Devemos apoiar as ações de greve dos agricultores e trabalhadores, por mais imperfeitas que sejam suas lideranças. Ir contra isso seria nos distanciarmos das massas trabalhadoras do país e deixar o campo aberto para que todos os tipos de liderança oportunista assumam o controle. Nós, marxistas revolucionários, estamos conscientes das deficiências da agitação liderada pelos camponeses, ou das deficiências do que eles exigem. A agitação camponesa trouxe tanto os agricultores pobres quanto os grandes proprietários de terras para uma luta comum contra os monopólios corporativos, e nisto eles também são apoiados em grande parte pelos trabalhadores rurais. Não é surpresa, então, que não foram levantadas questões prementes de reforma agrária e de expropriação de terras, nem as desigualdades na propriedade da terra, nem as condições do trabalho rural. A agitação atual está focalizada apenas no aspecto do comércio de mercadorias agrícolas.

Estas são deficiências que conhecemos, mas também estamos cientes do fato de que as condições de trabalho irão piorar infinitamente se o impacto da proletarização cair sobre a maioria dos agricultores do país. A vida de um agricultor pobre agarrado à sua terra ainda é melhor do que a vida de um trabalhador pobre forçado a entrar no exército de reserva dos desempregados, forçado a ganhar a vida em uma das muitas grandes favelas da Índia. Podemos ver que as leis trabalhistas, por um lado, e as leis agrícolas, por outro, são como um martelo e uma bigorna da máquina de proletarização do capitalismo indiano, ambas destinadas a espremer a vida e o trabalho das massas trabalhadoras, para o enriquecimento da burguesia. Por isso, estamos contra ambas!

REVOGAR AS LEIS AGRÍCOLAS!

REVOGAR OS CÓDIGOS TRABALHISTAS!

NÃO MAIS PRIVATIZAÇÕES!

APOIO TOTAL À GREVE GERAL!

[1]     Trata-se de serviços de assistência social na região rural, baseados em trabalho voluntário. ASHA são trabalhadores da Saúde e Anganwadi são creches rurais.

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