dom set 08, 2024
domingo, setembro 8, 2024

França: uma sequência eleitoral tensa e agitada

Em um artigo anterior foi feito um balanço dos desafios da dissolução do parlamento e das grandes tendências esperadas para as eleições legislativas imediatas que Macron chamou na tarde de 9 de junho. Mais recentemente demos uma imagem mais precisa e fiel possível da campanha legislativa do Reagrupamento Nacional (RN) e da dinâmica que desencadeou. Trata-se agora de compreender a evolução do panorama político francês produzido nas últimas quatro semanas para melhor entender as tendências do período que se abre após o segundo turno destas eleições.

Por: Grupo simpatizante da LIT na França

Relembremos brevemente as principais consequências da derrota de Macron nas eleições europeias e da dissolução da Assembleia Nacional decidida por Macron: profundo enfraquecimento do seu campo político; aumento sem precedentes do RN; fratura e grande crise da direita clássica, parte dela optando pela aliança com o RN; unificação da esquerda com a constituição da Nova Frente Popular (NFP).

O primeiro turno e suas principais lições

Partidos e coalizõesVoz% registrado% expresadoCadeiras
RN + LR “Ciotti”10 62850721,54%33,15%38
NFP8.974.56618,19%27,99%32
Juntos (coalizão Macron)6.425.21713,02%20,04%2
LR (“no-Ciotti”)2.104.9184,27%6,57%1
Varios dereitos1.172.5482,38%3,66%2
Varios esquerda491.0691,00%1,53%0
Centro varios391 4080,79%1,22%0
Mais à esquerda367 1580,74%1,15%0
Reconquista240.0060,49%0,75%0
Outros[1]1.202.8782,44%3,75%1

Os resultados do primeiro turno confirmaram essencialmente as pesquisas: forte progresso do RN, dura derrota de Macronie e dinâmica insuficiente da NFP que o impedisse de reverter o predomínio do RN e seus aliados. Um fato que não era realmente esperado da eleição é que a elevada participação, próxima de uma eleição presidencial (66,71%), não prejudicou o RN, que parece ter, em parte, se beneficiado. Obtemos os resultados nacionais acima.

Grande vantagem para o RN

Parecia que o parlamento seria dominado por três grandes blocos políticos: o que rodeia o RN (com o LR pró-Ciotti e possivelmente outros); aquele agrupado na NFP, que apresentamos em artigo anterior; e o “Juntos!” da antiga maioria presidencial, que reúne os partidos Renascimento, em francês Renaissance – RE (Macron), Movimento Democrático, em francês: Mouvement démocrate, MoDem, e o partido Horizontes, em francês Horizons, (do ex-primeiro ministro francês Edouard Philippe, ndt).

No primeiro turno houve uma vitória nítida para o RN que, pela primeira vez em sua história, conquistou o primeiro lugar em uma eleição legislativa nacional. A Révolution Permanente observa assim a evolução histórica do partido lepénista: “Sob Sarkozy e Hollande, o partido de extrema-direita ganhou quase dez pontos. Com Macron, ganhou vinte, dos quais mais de quinze nos últimos dois anos. No primeiro turno, a questão central era se o bloco de extrema-direita obteria a maioria absoluta. Foi o bloco RN que conseguiu eleger o maior número de deputados no primeiro turno (39 no total). O RN e seus aliados lideraram em mais da metade dos 577 distritos eleitorais (exatos 297 do RN contra 110 em 2022, e contra 155 da NFP, que ficou em segundo lugar). Outras medidas desse aumento: com seus mais de 10,6 milhões de votos, o conjunto RN-Ciotti registrou 2,5 vezes mais votos que o RN nas eleições legislativas de 2022. Em comparação com as eleições presidenciais de 2022, o RN sozinho obtém melhores resultados do que Marine Le Pen há dois anos (9.377.397 votos contra 8.133.828), e a diferença é cerca de 2,5 milhões (+30%) se forem incluídos os votos “ciottistas”.

A votação do RN ampliou para regiões onde antes era muito mais fraca. Este é especialmente o caso na Bretanha, terra geralmente socialista e depois macronista, onde o RN obtém 27,76%, ficando pouco atrás da NFP e do campo presidencial. Numa região onde nunca conseguiu participar num segundo turno das eleições legislativas o RN triunfou em quase todos os distritos eleitorais. Lá, como em outros lugares, o seu crescimento é nítido nas áreas rurais. No sudoeste também é nítido o ganho eleitoral do RN, em terras tradicionalmente socialistas. Em vários destes departamentos, o RN classificou-se para o segundo turno, por vezes em condições favoráveis.

O RN avança em todas as categorias da população. O partido lepenista consolida as suas raízes em círculos socioprofissionais onde já era forte, ao mesmo tempo que avança em setores onde ainda era fraco. Segundo pesquisa da OpinionWay para Les Echos, o RN avança entre os desempregados (40%), entre as pessoas que não possuem ensino médio completo (48%) e entre os trabalhadores (53%). Mas também está crescendo entre os aposentados (em grande medida, até agora, muito atrás de Macron), bem como entre executivos e pessoas com ensino superior. O estudo observa que o RN “agora atrai tanto homens (34% dos eleitores) quanto mulheres (32%), aos jovens dos 18 aos 24 anos (33%) e idosos (39% das pessoas dos 50 aos 64 anos), os ativos (35%) e os desempregados (40%).

Por fim, o RN esmaga seus concorrentes mais diretos, a começar pelo Reconquête, partido de Eric Zemmour que elegeu nenhum deputado em 2022, e nos 330 distritos eleitorais em que esteve presente desta vez obteve apenas 0,7%. Este partido sobreviverá? Isto surge depois do fracasso das negociações entre o RN e esta formação que arrancou as cadeiras do Parlamento Europeu em 9 de junho. A sobrinha de Marine Le Pen (Marion Maréchal) parece ter jogado a carta da alianço RN-Reconquista, contra Zemmour, que queria mostrar a sua diferença. Interrogámo-nos também sobre o futuro político do antigo aliado de Marine Le Pen nas eleições presidenciais de 2017, o soberanista Nicolas Dupont-Aignan, deputado por Essonne desde 1997 e cuja reeleição foi muito incerta no final do primeiro turno.

Dinâmica insuficiente da NFP

A união da esquerda dentro da NFP permitiu avançar um pouco em relação a 2022, mas a dinâmica não foi suficiente para frear o avanço do RN. Com quase 28% e 9 milhões de votos, a NFP ficou atrás do bloco RN, e elege 32 deputados em primeiro turno, entre eles figuras nacionais como Olivier Faure (primeiro secretário do PS), Sandrine Rousseau (deputada ecologista em Paris ), Eric Coquerel e Clémentine Autain (LFI em Seine Saint Denis).

A NFP consegiu um grande avanço em Paris, onde ficou em primeiro lugar em 13 dos 18 distritos eleitorais, e elegeu nove deputados no primeiro turno, permitindo à capital resistir à onda do RN. Globalmente, a NFP teve um bom desempenho em Ile-de-France, com uma posição forte em Val d’Oise (com dois representantes eleitos); avança em Essonne e parece no caminho certo para vencer as batalhas da segunda fase em Seine-Saint-Denis.

A nível nacional, a dinâmica foi muito mais limitada. Parece que parte do eleitorado à esquerda e direita não quis votar na NFP, essencialmente por rejeitar a LFI ­ (França Insubmissa – em francês: La France Insoumise fundada por Jean-Luc Mélenchon, ndt.). O eleitorado da LFI também parece ter sido menos mobilizado do que em 2022. A divergência de projetos entre os componentes da NFP refletiu-se apesar do acordo aprovado, limitando o voto a seu favor. A isto acrescenta-se uma forte diferença de votos para a NFP de acordo com a região: é forte em Paris e na região parisiense, e mais amplamente nas zonas altamente urbanizadas e nos subúrbios, mas raramente nas zonas rurais (exceto em Limousin e outras exceções). Nas zonas rurais ou periurbanas, a NFP enfrenta dificuldades. No geral, a NFP está se fortalecendo na maioria dos seus redutos, mas não está conquistando novas frações do eleitorado.

No âmbito da NFP, o reequilíbrio de forças parece confirmar-se após as eleições europeias. O voto do PS voltou a ganhar peso, em grande parte em detrimento da LFI. A eliminação no primeiro turno do secretário-geral do PCF, Fabien Roussel, por um candidato do Norte do RN é um duro golpe para ele. Mas o PC conseguiu duas reeleições no primeiro turno, em particular a de Elsa Faucillon em Hauts-de-Seine com 65% dos votos.

A grande derrota de Macronie

A aposta de Macron na dissolução foi um fracasso retumbante: em vez de dar nova vida e eleger representantes no seu campo, o presidente infligiu um teste em que conseguiu apenas o terceiro lugar, com 20,04% dos votos e apenas duas reeleições no primeiro turno.

O declínio macronista é muito massivo, ainda que o campo presidencial resista em alguns departamentos, contra o RN e a NFP. É o caso dos territórios favorecidos a oeste de Paris: Hauts-de-Seine, onde um macronista é eleito no primeiro turno, ou Yvelines, onde outros, entre os mais conhecidos de Macronie, estão bem colocados para o segundo turno. Fora da região de Paris, Macronie está bem face à pressão do RN em alguns departamentos como Ille-et-Vilaine, Mayenne ou Aveyron.

O período entre os dois turnos e a questão da retirada de candidaturas

O sistema eleitoral francês, por distrito, uninominal em dois turnos, leva a que a Assembleia Nacional seja necessariamente uma representação distorcida do eleitorado. Vemos isso ainda hoje, com um bloco do RN que obteve as maiores pontuações no primeiro turno, mas só obteve a terceira representação parlamentar após o segundo turno.

A questão do triangular e quadrangular.

Principalmente para nossos leitores no exterior, precisamos explicar as regras de passagem do primeiro turno para o segundo turno. Um candidato está qualificado para o segundo turno das eleições legislativas se obtiver os votos de pelo menos 12,5% dos inscritos. Com 50% de abstenção, isto corresponde a 25% dos votos expressos. Mas quando a participação é maior, da ordem de dois terços como em 30 de junho, entendemos os que o número de candidatos qualificados para o segundo turno aumente mecanicamente, pois basta que um candidato tenha reunido (em média) 18,75% dos votos dos votos expressos no primeiro turno no seu círculo eleitoral para poderem participar no segundo. Na verdade, na noite do primeiro turno, Le Figaro contabilizou 306 eleições potencialmente triangulares e uma eleição quadrangular (em comparação com 190 duelos), enquanto em 2022, um ano de abstenção muito maior, apenas foram realizadas 7 eleições triangulares. Contudo, uma votação de três ou quatro é ainda mais incerta do que um duelo entre dois candidatos. A pergunta feita na tarde do dia 30 de junho foi: quem desistiria de concorrer? Geralmente são os terceiros colocados que desistem, com instruções de voto mais ou menos precisas para garantir a derrota do candidato. Chegou primeiro ou segundo. Portanto, potencialmente os três blocos (RN, Macronie e NFP) ainda poderiam se enfrentar no segundo turno na maioria dos distritos eleitorais, sendo os demais casos muito mais raros. Portanto, é importante observar o que aconteceu entre os dois turnos sobre esta questão, ao mesmo tempo em que observamos que existem três níveis de implementação de uma política de retirada; retirada de candidaturas, ou recurso ou voto: o de instruções ao pessoal; a dos candidatos do seu distrito, que podem resistir a estas instruções ou mesmo rejeitá-las; a do eleitorado, que sempre segue apenas parcialmente – mas em proporções variáveis ​​dependendo da eleição – as instruções dos líderes políticos.

Retiradas, instruções de voto e tentativas de divisão

É notável a participação inusitada, numa eleição deste tipo, dos sindicatos e dos seus dirigentes, na maioria das vezes no primeiro turno, e a favor da NFP, mas de forma mais geral contra o RN. Após o primeiro turno, as posições sindicais, tanto comuns como individuais, multiplicaram-se. Desde 1 de julho, uma declaração intersindical que reúne a CFDT, a CGT, a UNSA, a FSU e os Solidaires afirmava: “Nada está decidido”, apelando a “um avanço democrático, social e republicano nas urnas”. Sophie Binet (CGT) chamou a lutar contra o “nem-nem” (nem a esquerda nem o RN), que enfrentam “um perigo mortal para a nossa República”. Para Marylise Léon (CFDT), ante o RN, “nenhum cálculo político se sustenta. Os candidatos com classificação mais baixa, sejam eles quem forem, devem retirar-se para derrotar os candidatos de extrema-direita no segundo turno.” Solidaires apelaram à “unidade das forças sindicais e associativas para impedir um governo da extrema direita”. Laurent Escure (UNSA), ante o “perigo de uma maioria do RN”, também exigiu “retirada republicana”. E a Confédération Paysanne disse estar “muito preocupada” em ver o RN tão perto do poder.

Dentro da NFP, todos o pessoal rapidamente deu instruções para a retirada dos candidatos que ficaram em terceiro lugar, pelo menos caso fosse possível a eleição de um deputado do RN, a partir da tarde do dia 30 de junho. Isto levou inclusive, em particular, à retirada das candidaturas da NFP em circuncrições eleitorais onde Macronie estava representado por figuras tristemente emblemáticas: Gérald Darmanin, Ministro do Interior do Norte; Elisabeth Borne, ex-primeira-ministra encarregada de impor a reforma previdenciária! Para a fração LR que se opõe a Eric Ciotti, também houve nitidez: nem retirada nem chamado ao voto à esquerda.

Por outro lado, foi a cacofonia que predominou entre os presidenciáveis. Houve alguns casos de recuos rápidos a favor da esquerda – até mesmo da LFI – para derrotar o RN. Mas entre os tenores de Macronie, toda uma série de nuances governava as instruções para o segundo turno, e a “retirada republicana” não foi nada sistemática. Alguns macronistas se mantiveram em posições triangulares, contra as instruções centrais; outros acabaram cedendo às pressões do Estado-Maior. Em nenhum caso os líderes macronistas pediram nitidamente o voto na NFP para derrotar o RN. Nada de surpreendente, depois de ter demonizado a esquerda unida tanto ou mais que o RN. Na maioria dos casos, foi feita uma distinção entre a LFI – muitas vezes apresentado como “não republicano” e “antissemita” durante meses – e os outros componentes da NFP. Para muitos, como o ex-primeiro-ministro Edouard Philippe, esta não é uma instrução de “nem-nem” contra “lezextreme”: nem LFI, nem RN. O Ministro da Economia, Bruno Le Maire, também rejeitou ambos, afirmando que seriam “dois Frexits disfarçados”. Muitos macronistas reivindicam uma lógica caso a caso, como Yaël Braun-Pivet, ex-presidente da Assembleia, que pede para não dar votos ao RN mas quer distinguir entre os candidatos da LFI, considerando que “nem todos são iguais”. ” Ao final foram 14 candidatos macronistas que, diante do apelo ao bloqueio do RN, optaram por manter-se na terceira posição.

Na verdade, todas estas nuances dentro do campo presidencial não refletem apenas divergências entre indivíduos, mas também obscurecem o que emergiu mais nitidamente nos últimos dias antes do segundo: uma tentativa, particularmente orquestrada por Attal, de dividir a NFP para conseguir governar com os seus setores mais direitistas. Para fazer isso, é melhor não ofender o conjunto da esquerda. Daí a sua retórica mais moderada do que antes do primeiro turno. Este empreendimento, que provavelmente destruiria a NFP, produziu efeitos sedutores ainda antes do segundo turno. Marine Tondelier, líder dos ecologistas, considerou publicamente várias vezes um governo comum com Macronie, declarando em particular: “não haverá uma boa solução. Encontraremos o menos mau e o melhor para a França. Mas sim, devemos mostrar-nos preparados para governar.” Hollande também deixou a porta aberta a esse governo de coalizão, que, segundo ele, deveria basear-se em “promessas mínimas, pelo menos durante um ano, para que o país seja governado”.

O surpreendente veredicto do segundo turno

Os resultados anunciados na tarde do dia 7 de julho não eram esperados. Certamente, as últimas pesquisas entre os dois turnos previram falta de maioria absoluta e revelaram diminuição de cadeiras para o RN em relação às projeções iniciais, mas indicaram um primeiro lugar em cadeiras para o RN e essa diminuição foi percebida como consequência das desistências. Mas o que finalmente aconteceu nas urnas não estava previsto: um primeiro lugar atribuído a NFP, um campo macronista que ficou em segundo lugar com um número inesperado de representantes eleitos, e o bloco RN que foi relegado para o terceiro lugar no parlamento.

A transformação de votos em cadeiras

Se o primeiro turno representou uma vitória clara para o RN, o segundo foi um revés, que não conseguiu converter a tentativa. Aqui se tem a imagem da nova Assembleia.

Fonte: Ministério do Interior. Infográfico Le Figaro.

Por parte da NFP, os 184 eleitos estão divididos em 78 LFI, 69 PS, 28 ecologistas e 9 PC. Pelo menos parte da “esquerda misturada” e dos “regionalistas” (entre os “vários”) poderiam juntar-se a eles. Os 166 eleitos do campo macronista estão divididos em 99 Renaissance, 33 Modem, 26 Horizon e 9 “outros grandes”. presidencial”. A direita (LR e várias direitas) consegue salvar o mobiliário com 65 eleitos, enquanto o RN se limita a 143 deputados, incluindo os 17 de LR-Ciotti.

Como explicar esta mudança – tão rápida – entre as dois turnos? Primeiro, muitas eleições locais foram muito apertadas e dezenas de deputados foram eleitos ou reeleitos com algumas centenas de votos a mais, ou até menos. Parece também que os recalls anti-RN funcionaram bem. Sem dúvida, a maioria dos eleitores de esquerda votou em Macronie ou LR, um número significativo de eleitores de direita ou de centro também votou na esquerda. Mas parece nítido que as retiradas favoreceram mais Macronie do que a esquerda, particularmente porque as instruções da esquerda foram mais nítidas e porque o eleitorado de esquerda votou mais no LR ou na direita macronista do que os eleitores com estas sensibilidades não votaram na esquerda. Podemos assumir que este último ponto é mais verdadeiro para aplicações LFI. Gaël Sliman, do Instituto Odoxa, explica o seguinte: “64% dos eleitores do CCN que têm de escolher entre um candidato do Grupo e um candidato do RN declaram-se encorajados a votar no candidato do Grupo, contra apenas 5 % para o candidato do RN A tendência é menos forte, mas igualmente importante para os eleitores do bloco central, “que têm entre 4 e 5 vezes mais probabilidade (49% contra 11%) de dizer que votariam a favor do RN em vez de contra”. Para os eleitores da LR, o quadro é mais variado, já que apenas 35% afirmam estar mais inclinados a votar contra o RN, enquanto 28% consideram que isso reforça a sua vontade de votar na coligação de extrema-direita”1. As futuras sondagens de opinião sobre este tema terão de ser acompanhadas de perto.

No final a NFP e o “Juntos!” Graças às retiradas, conseguiram vencer a maior parte dos duelos contra o RN. Se é um erro falar de uma derrota deste partido, que aumentou consideravelmente a sua força eleitoral e passou de 89 deputados para 143 (com os seus aliados), as eleições de 7 de julho não confirmam a dinâmica anterior. Enquanto em 30 de junho o bloco RN havia conquistado 39 circunscrições, liderado em 258 e classificado para o segundo turno em outros 186, só obteve, com seus aliados, 104 vitórias em 7 de julho. O RN alcança seu melhor desempenho reelegendo deputados de seus redutos no Norte, Nordeste e Sudeste, e ampliando sua influência institucional nesses territórios, mas há pouca confirmação de seu crescimento em termos de eleitos , em zonas onde está menos implantada, na Bretanha, por exemplo. Verifica-se também – este é um ponto levantado por alguns analistas e pelo próprio Bardella – que os cerca de 80 candidatos do RN denunciados pelos seus comentários racistas, homofóbicos, antissemitas, etc. pesou muito no final. Segundo um analista, “isso influenciou a guinada à esquerda, porque os eleitores (re)descobriram uma imagem do RN que não conheciam”.

O que as eleições mostram?

Para compreender o que aconteceu é necessário ter em conta a situação de profunda crise política e social que abala toda a Europa e também a França e que está na base da enorme polarização social e política que assistimos no país.

Se por um lado há uma tendência para o fortalecimento das lutas e o surgimento de ativistas independentes, não ligados às forças políticas e que confrontam a burocracia sindical, por outro há um nítido aumento das tendências nacionalistas, justamente numa altura em que a UE, imprensada no meio do confronto entre os dois principais imperialismos mundiais, os EUA e a China, desempenha um papel cada vez mais subordinado na economia e na política mundial.

Na ausência de partidos revolucionários capazes de representar as lutas e promovê-las no sentido de questionar o sistema capitalista, os partidos da esquerda reformista crescem eleitoralmente. Mas também o populismo de direita e de extrema-direita, como o RN em França, que tenta virar a seu favor o descontentamento e a raiva popular contra as políticas de Macron, apoiando-se em particular na empobrecida classe média baixa. Para fazer isso, utiliza propaganda racista e xenófoba que tenta atribuir todos os males aos setores mais oprimidos, como os trabalhadores/as migrantes, promovendo assim divisões dentro do proletariado.

Incertezas imediatas

 Macronie conseguiu impedir sua derrota. Macron parece querer ganhar tempo… a ponto de deixar passar os Jogos Olímpicos? Attal apresentou sua renúncia em 8 de julho, mas ele recusou, pedindo-lhe que permanecesse no cargo até o dia 18, o que Attal aceitou. Provavelmente teremos que esperar um pouco para descobrir o que exatamente está acontecendo.

Os líderes da Frente Popular estão em negociações para propor o nome de um primeiro-ministro que também deve ser ratificado por Macron. O primeiro secretário do Partido Socialista, Olivier Faure, já rejeitou Mélenchon, apesar de a França insoumise ser o partido da coligação com mais representantes eleitos. Neste momento, a gestão da LFI exige a implementação do “programa, todo o programa, mas nada mais que o programa” da NFP. Entre os políticos mais representativos da esquerda burguesa (Glucksmann, Hollande e muitos outros) existe uma vontade real de “salvar o soldado Macron” através da formação de um governo de unidade nacional anti-RN. Yaël Braun-Pivet foi rápido em abrir uma brecha entre a esquerda, apelando à formação de um “grande bloco central”, sem LFI ou RN. O próprio Mélenchon nunca foi um baluarte da independência de classe e pode aceitar a colaboração com os partidos burgueses. O regime semipresidencialista francês inclui inúmeras combinações de acordos explícitos e implícitos com os partidos burgueses e até com Macron.

Seja como for, o RN não está morta. “Vejo todas as sementes da vitória de amanhã”: assim declarou Marine Le Pen para afastar a amargura das suas bases, acrescentando: “A maré está subindo, desta vez não subiu o suficiente, mas continua a subir. a vitória só atrasará”. É muito provável que o RN se fortaleça ainda mais na próxima sequência política, especialmente se a NFP revelar a sua incoerência programática – se tentar implementá-la – ou, pelo contrário, se se desintegrar, com uma proporção suficientemente grande da seus representantes eleitos que decidam engolir a sopa macronista. Uma sopa burguesa que é necessariamente intragável para as classes trabalhadoras e que durante anos as mergulhou na infelicidade, na pobreza e no desespero, um terreno fértil para o lepenismo.

Nossas tarefas

Ao contrário dos desvios e das renuncias que se podem esperar, a luta que se aproxima deve ser ao mesmo tempo uma luta de classes intransigente.

Em todos os casos, a mobilização e as lutas da nossa classe serão decisivas. Devemos insistir na necessidade de independência de classe, sistematicamente desprezada, em um momento ou outro, pelos líderes reformistas e sindicais.

Mas quem diz lutar pela independência de classe também diz que trabalha duro para defender os valores do internacionalismo. Isto significa, antes de mais, levantar a bandeira da luta contra o imperialismo e o colonialismo francês e os seus inúmeros delitos, de Françafrique a Kanaky. Isto também significa apoiar a resistência ucraniana contra o imperialismo russo e apoiar o povo palestiniano contra o genocídio levado a cabo pelo Estado de Israel. Isso também inclui, evidentemente, uma solidariedade inabalável para com os nossos irmãos e irmãs imigrantes ou de origem imigrante.

Por último, mas não menos importante, a ideia de uma greve geral mal está na cabeça das pessoas hoje, mas com o perigo da extrema direita, as manobras macronistas e as traições da “esquerda” iminentes, é essencial preparar-se pacientemente, trabalhar para amadurecê-la, buscando sistematicamente o reagrupamento para a luta dos setores militantes mais determinados. Chamamos a sair às ruas para defender medidas do programa da NFP como a revogação da reforma da previdência ou o aumento do SMI nas quais não podemos confiar ou esperar que sejam alcançadas, apenas através de meios parlamentares.

As próximas semanas, ainda antes do início do ano letivo em setembro, dirão com mais precisão o quadro político em que teremos de nos mobilizar.


[1]Fonte: Quadro proporcionado pelo Ministério do Interior. https://www.resultats-elections.interieur.gouv.fr/legislatives2024/ensemble_gegraphique/index.html Agrupamos os resultados disponibilizados pelo ministério para reunir à fração RN e LR que seguiu a Eric Ciotti em sua aliança com o RN. O ministério também contabilizou a um candidato de extrema direita sem a etiqueta do RN e não LR. Trata-se de Eddy Casterman, próximo a Marion Maréchal e eleito em Aisne, que se sentará com o RN. Nesta seção encontramos categorias muito diversas: regionalistas, candidatos não aliados de Horizontes (dereita), o PS, a esquerda Radical, o PCF, a LFI não investido pela direção, soberanistas, ecologistas diversos e outras aplicações bastante inclassificáveis.

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