dom set 08, 2024
domingo, setembro 8, 2024

O abraço de Milei e do Papa Francisco

Após sua visita a Israel[1], o presidente argentino Javier Milei viajou a Roma e manteve uma audiência pessoal com o papa Francisco, no Vaticano, durante a canonização da missionária argentina Mama Antula. Qual foi o significado político desta reunião?

Por: Alejandro Iturbe

Poucos dias depois, várias organizações sociais que garantem o funcionamento das cozinhas populares ou comunitárias (nas quais muitos argentinos garantem minimamente suas necessidades de alimentação) realizaram centenas de bloqueios de ruas exigindo do governo de Milei que volte a entregar os alimentos para seu funcionamento já que este abastecimento foi cortado desde que assumiu[2]. Neste artigo, analisaremos a relação entre ambos os fatos.

A inflação derrota o salário

Desde que assumiu, o governo de Milei aplica um duríssimo ataque ao nível de vida das massas. Este ataque tem “dois braços”: o primeiro é um profundo ajuste (corte) dos gastos do Estado para obter um “equilíbrio fiscal”, congelando o salário dos funcionários públicos e dos docentes, fechando ou reduzindo repartições públicas e eliminando remessas com destino fixo.

Também eliminou diversos subsídios que eram concedidos a determinados serviços para baratear seu preço final ao consumidor. Isto significou grandes aumentos do preço do transporte público e de abastecimentos essenciais como o gás e a eletricidade domiciliar. Estes aumentos foram replicados pelas grandes empresas “modeladoras de preços” em ramos como alimentação e medicamentos. Ao mesmo tempo, estas empresas calculam seus preços em dólares e depois os “pesificam”. O peso argentino vive um processo de “liquidação” frente ao dólar e se desvaloriza cada vez mais. Assim foi deflagrado um novo salto na inflação.

A Argentina é um país com alta inflação estrutural. Durante o último governo peronista, cresceu ainda mais, mas desde que Milei assumiu disparou terrivelmente. Em dezembro passado, foi de 25,5% em relação a novembro com um acumulado interanual em relação a 2022 de 211,4%. Em janeiro, foi de 20,6% com um acumulado interanual de 254,2%[3]. Embora sejam impressionantes, esses números escondem o verdadeiro impacto do aumento de preços sobre o poder de compra das famílias operárias e populares já que bens indispensáveis como alimento, transporte e serviços essenciais aumentaram ainda mais.

O segundo braço do ataque do governo é que os salários são atualizados nominalmente muito abaixo da inflação. Um estudo privado calcula que o aumento salarial médio para os trabalhadores argentinos, no bimestre dezembro 2023/janeiro de 2024 foi de 38,4% contra uma inflação acumulada de 51,9%[4]. Outro estudo anterior já estimava que “o poder de compra dos argentinos caiu cerca de 13% só em dezembro [de 2023]”[5]. Atualmente, o salário mínimo legal na Argentina é de 152 dólares, o segundo pior da região, só superior ao da Venezuela. Inclusive o salário de bolsillo (salário líquido, ndt.) de muitos trabalhadores industriais, em setores como alimentação ou metalúrgicos, é de 400 dólares, frente a uma cesta básica para uma família de quatro pessoas (limite abaixo do qual se considera “pobreza”) que, em janeiro, estimava-se em cerca de 570 dólares (pela cotação atual) [6]. Em outras palavras, grandes setores da classe operária argentina que recebem um salário mensal estão na pobreza e inclusive na indigência.

Face à forte queda do salário real, alguns sindicatos começaram a realizar paralisações, como o sindicato dos condutores ferroviários (ao que se somaria a seção Haedo do Sindicato Ferroviário, dirigida pela esquerda), o sindicato da Saúde (trabalhadores de hospitais privados e laboratórios de medicamentos)[7]. A isso, se soma o dos trabalhadores aeronáuticos[8], o dos trabalhadores portuários[9] e o de diversos sindicatos docentes[10]. No contexto atual, as lutas por sindicato (e inclusive por empresa) podem alastrar-se ainda mais e generalizar-se.

Por sua vez, a CGT (o aparato que reúne os setores centrais da burocracia sindical peronista) se viu obrigada a chamar a paralisação, que foi seguida por uma grande mobilização em 24 de janeiro passado, sem integrá-la em um plano de luta. Agora, frente a um pequeno aumento do salário mínimo que o governo decretou, “ameaça” com a “possibilidade” de chamar uma nova paralisação[11].

Cresce a pobreza

Esta queda do poder de compra do salário se reflete em um importante aumento da pobreza no país. Seus números já eram muito altos durante o último governo peronista, mas deram um novo salto desde que Milei assumiu e começou a aplicar seu plano.

Um relatório recente do Observatório Social da UCA- Universidade Católica Argentina (cujos estudos são considerados muito sérios) coloca que, em janeiro de 2024, cerca de 57,4% da população argentina estava abaixo da “linha da pobreza”. Isto significa que 27 milhões de pessoas não conseguiram garantir uma cesta básica completa. É o percentual mais alto da série iniciada em 2004, quando o índice de pobreza foi de 54%[12].

Em uma comparação de curto prazo, o relatório informa que, no terceiro trimestre de 2023 (período final do governo anterior), o índice era 44,7% e em dezembro de 2023, quando Milei assumiu, chegou a 49,5%. Novamente, é muito possível que as novas medidas do governo agravem ainda mais o percentual mais recente. Um setor cada vez maior da classe trabalhadora argentina cai na pobreza porque, como vimos, seu salário não é suficiente para cobrir completamente suas necessidades.

A indigência e a fome também

No marco desse crescimento da pobreza, cresce também a indigência, cujo valor de referência é o acesso a uma cesta básica que não inclua nenhum outro tipo de gasto essencial (transporte, gás, eletricidade, vestimenta, etc.). Em janeiro passado, calculava-se em 265 dólares mensais.

O relatório da UCA “projeta que a população em situação de indigência passou de 9,6% no terceiro trimestre de 2023 a 14,2% em dezembro de 2023 e a 15% em janeiro de 2024”. Ou seja, sete milhões de argentinos estão nesta situação. No caso de considerar outros critérios, como a necessidade de receber assistências sociais do Estado, em janeiro de 2024, a indigência teria sido de 23,8%.

No marco da indigência, cresce a fome. A organização social latino-americana La Poderosa, estimava em novembro passado que “cerca de dez milhões de argentinos e argentinas necessitam de algum tipo de assistência alimentar”[13]. Um número que aumentou nos últimos meses.

As cozinhas comunitárias

Este déficit alimentar era coberto parcialmente pela atividade de 38.000 cozinhas comunitárias nas quais trabalham cerca de 70.000 pessoas (especialmente cozinheiras) que não recebem nenhum salário legal. Algumas destas cozinhas chegam a atender 100 pessoas por dia, especialmente crianças, às quais se proporciona merenda, almoço e/ou jantar, como Tacitas Poderosas que funciona dentro da gigantesca Villa31 em pleno centro da cidade de Buenos Aires[14].

Estas cozinhas funcionavam graças a um equilíbrio muito precário: recebiam remessas de comida do Estado ou doações. Para os gastos fixos, como o aluguel do local (se fosse o caso), o custo dos botijões de gás para cozinhar e a eletricidade, realizam coletas e rifas, ou vendem alguns produtos alimentícios artesanais que são fabricados nelas com um esforço adicional daqueles que trabalham.

Algumas surgiram de uma organização do próprio bairro, outras são garantidas por ONGs como a já citada La Poderosa e, finalmente, muitas são coordenadas pelas chamadas “organizações sociais” provenientes do movimento piqueteiro, como Barrios de Pie, Libres del Sur ou a UTEP (União dos Trabalhadores da Economia Popular), promovidas pelas organizações políticas que se localizam na área de influência do peronismo, e também muitas organizadas pelos chamados “piqueteiros de esquerda”.

A política e as medidas do governo de Milei agravaram o quadro da fome e aumentou a demanda destas cozinhas: “Os movimentos sociais que gerenciam muitos destes centros garantem que, entre dezembro e fevereiro, a quantidade de pessoas que chegam aumentou pelo menos 50%”[15].

Ao mesmo tempo que aumentam as necessidades destes setores, o governo de Milei deu um golpe ainda mais duro contra as cozinhas comunitárias: suspendeu todos os envios de comida, de qualquer auxílio financeiro, e gerou uma situação na qual muitas já não podem funcionar: “Hoje não sei se funcionamos”, disse Carina López da cozinha Las hormiguitas viajeras de Loma Hermosa, um bairro da Gran Buenos Aires[16].

Neste marco, várias organizações realizaram uma atividade em frente ao Ministério do Capital Humano: formou-se uma fila de mais de dois quilômetros pedindo entrevistas com a ministra Sandra Pettovello para que seja retomada a ajuda alimentar às cozinhas comunitárias. Pettovello não recebeu ninguém e, até agora, os envios não foram retomados.

O porta-voz do governo justificou esta atitude dizendo “Não queremos mais intermediários, não queremos mais negócios com os pobres. Queremos que a ajuda chegue a quem precisa”. Esta imagem de milhares de pessoas com fome esperando na rua e da funcionária do governo que devia atender esse pedido (vestida com roupas caras de marca) negando-se a recebê-los percorreu o país e o mundo como uma imagem muito expressiva da realidade argentina.

Como vimos no início, voltaram a se mobilizar, agora de forma mais radicalizada: com bloqueios de ruas e vários desses movimentos anunciaram uma nova jornada de lutas em que irão aos grandes supermercados exigir a entrega de comida[17].

Comprar sobras e descartes

Até aqui, a política do governo de Milei parecia ter como objetivo reduzir “gastos” do Estado e, ao mesmo tempo, retirar a base de apoio e influência política das organizações sociais que se localizam na oposição para assumir diretamente a tarefa e obter para si um benefício político “clientelista”.

Rapidamente, ficou evidente outro objetivo: transformar a fome em lucro para as grandes empresas produtoras e distribuidoras de alimentos. Com a desculpa de que o governo anterior “comprava caro” e “sem transparência” (o que contém uma parte da verdade) decidiu mudar o mecanismo de licitação para as compras, que já não serão feitas globalmente e com um certo critério de equilíbrio alimentício global, mas “os ofertantes[poderão] competir parcialmente por cada uma das linhas do que se pretende comprar”. Para exemplificar este mecanismo e mostrar seus benefícios, Pettovello declarou que “Se uma empresa ou distribuidora tem um excedente de 50.000 latas de tomates, pode ofertar, e […] assim se compra dos que fazem a oferta mais barata”.

Mas, o verdadeiro pano de fundo é muito diferente, como explicou um analista econômico: “Desta forma, as empresas poderão negociar suas sobras e descartes, também chamados de ‘excedentes de produção’, a um preço baixo, da mesma forma que aqueles que se vendem, de porta em porta, nos transportes públicos e na via pública, chocolates e guloseimas próximas do vencimento. Produtos que não poderiam ser vendidos, agora têm um destinatário”[18].

Ou seja, graças a esta medida do governo de Milei, as empresas evitarão perdas e obterão lucros adicionais.

As coisas se complicam para Milei

No marco de continuar desenvolvendo seu ataque profundo ao nível de vida das massas, as coisas estão se complicando muito para o governo. A aprovação de seu pacote de medidas legislativas (a Lei Ônibus) está travada no Parlamento e não houve “período de carência” por parte de setores importantes do movimento de massas. Menos de dois meses depois sua posse, já houve muitos panelaços nos bairros e mobilizações (algumas muito grandes, como a de 24 de janeiro passado) [19].

O segundo fator é que há uma profunda crise política na burguesia e em suas organizações com representação parlamentar e institucional (governadores e prefeitos), com uma tendência a rupturas e fragmentação em todas elas e, ao mesmo tempo, novos reagrupamentos. O conjunto da burguesia argentina é a favor da essência da política de Milei: a necessidade de um profundo ajuste às massas e ao Estado, e a subordinação ao FMI e ao imperialismo. Mas está dividida tanto sobre como enfrentar o choque com as massas como sobre quem receberá os benefícios deste ajuste e sobre quais custos cada setor burguês irá pagar.

Se o processo de luta contra o governo de Milei não é mais agudo e acelerado é porque as diferentes frações do peronismo (inclusive o kirchnerismo) têm a política de chamar sua base a não enfrentar o governo nas ruas e deixar que governe e “se queime”, para capitalizar seu desgaste em futuras eleições[20]. É o mesmo que fez em 2017 durante o governo de Macri.

Neste contexto, o governo de Milei “dobra a aposta” de seu ajuste e seu ataque: já anunciou novos aumentos do transporte público e dos serviços, e cortou o envio de fundos federais às províncias, cujos governadores, em muitos casos, não poderão pagar os salários dos trabalhadores estatais e docentes. Depois da brutal queda do nível de vida da população, anunciou que março e abril serão ainda “mais duros”[21].

Então, cresce o setor da população que votou nele e compreendeu o verdadeiro significado da proposta de Milei, de “total liberdade para os mercados”, e já não acredita na promessa de Milei de que depois do “sacrifício” virão “tempos melhores”. Como resultado, o apoio político ao governo decresceu rapidamente.

Com sua promessa de “mudar as regras do jogo”, Milei obteve cerca de 56% de apoio eleitoral, e no dia que assumiu (10 de dezembro passado) uma pesquisa indicava que 60% da população tinha uma “imagem positiva” do novo presidente. Recentemente, uma pesquisa realizada pela empresa Zuban Córdoba em todo o país, em 13 e 14 de fevereiro, mostrou que 44,6% “aprovam a gestão do presidente” e 55% a desaprovam. O mesmo acontece quando a pergunta é “se o governo vai na direção correta ou equivocada”[22].

Nessa mesma pesquisa, só 34,3% se manifestou a favor da Lei Ônibus ser aprovada “sem objeções”, 46,7% quer que seja rejeitada, e 17,5% respondeu que, mais além de votar a favor ou contra os legisladores “deveriam colocar limites para Milei”. Em dois meses, Milei perdeu entre 10% e 15% de apoio, uma perda que certamente aumentou depois que anunciou novos aumentos de tarifas e que “viriam meses mais duros”.

Milei e o Papa se “reconciliam” 

Muitos analistas têm apontado que este aumento da fome e da crise do sistema de cozinhas comunitárias representam uma “bomba relógio”, pela possibilidade de que, se não houver algum tipo de resposta, a situação gere uma explosão social e/ou saques como já aconteceu outras vezes no país, no passado. A própria Igreja católica advertiu o governo de Milei sobre este perigo [23]. Ainda mais se esta dinâmica se combinar com uma expansão das lutas por salário e o enfrentamento das províncias com o governo nacional[24].

Até agora, o governo de Milei, além de agravar as condições objetivas com suas medidas, parecia “fechado em si mesmo” frente à esta situação e a este perigo, ao que só respondeu com seu “protocolo antipiquetes”, uma política que implica um “choque direto” com as massas e um alto risco de fracassar [25].

Agora, o governo parece ter começado a perceber que existe uma panela de pressão no país e que pode precisar de ajuda para conter sua explosão, já que não tem uma “rede de contenção” própria (com a qual o peronismo contou e conta). Por isso, pediu a ajuda de Francisco e da Igreja nesta tarefa de contenção. Já em uma carta pessoal que Milei enviou ao Vaticano, convidava Francisco a viajar ao país para que sua visita desse “frutos de paz, irmandade e unidade”[26].

Por ora, o Papa não viajará à Argentina, mas a audiência pessoal que teve com Milei foi uma reunião de “reconciliação”. Durante sua campanha eleitoral, Milei acusou Francisco de ser um “imbecil” e um “esquerdista asqueroso”, enquanto o Papa e a Igreja argentina “jogavam” a favor da candidatura do peronista Sergio Massa[27]. Na audiência, Milei lhe “pediu perdão” e Francisco o concedeu. Já no ano passado, quando houve a vitória eleitoral de Milei, tinha telefonado para parabenizá-lo,“enviou-lhe um rosário abençoado e lhe pediu que tivesse ‘coragem e sabedoria’ durante sua gestão’”[28].

A Igreja entra no jogo

Do lado de Milei, este “pedido de perdão” significou na realidade um “pedido de ajuda”. Do lado de Francisco, mostra que a Igreja está disposta a desempenhar esse papel e a colocar todo seu aparato e sua influência no país a serviço da “pacificação” (ou seja, de conter os processos de lutas). Uma influência que, na Argentina, inclui também sua relação com movimentos sociais como a UTEP-União dos Trabalhadores da Economia Popular, cujo principal dirigente, Juan Grabois, mantém uma estreita relação com Francisco há anos[29]. Lembremos também que durante sua carreira eclesiástica na Argentina, o atual Papa tinha uma forte relação com a direita peronista.

No marco do capitalismo imperialista, a Igreja Católica é um dos grandes poderes da economia mundial. Isso se vê complementado com sua grande influência política internacional, e em muitos países. Desde que Francisco tomou posse, assumiu um perfil de denunciar as piores consequências do capitalismo imperialista e chamar a “corrigi-las”. Ao mesmo tempo, age para evitar que as respostas das massas a essa situação transborde, se radicalize e avance para um questionamento global do capitalismo imperialista com seus permanentes chamados (e sua ação) pela “paz” e pela “irmandade” [30]. Hoje, Francisco está disposto a desempenhar esse papel na Argentina, a serviço de “ajudar” o governo de Milei.

Aqui entra a questão da crise do fornecimento de comida às cozinhas comunitárias por parte do Estado, e seu funcionamento. A Igreja Católica argentina possui a estrutura necessária para garantir seu funcionamento e evitar uma dinâmica de explosão social. Em troca, certamente, pediu para ser quem centralize e controle todo o processo.

Por um lado, para impedir que esse papel (ou parte dele) seja desempenhado pelas igrejas evangélicas (com as quais mantém uma dura disputa pela influência popular), às quais o governo de Milei havia se aproximado[31]. Quer o “monopólio” para si. Por outro, quer “morder” no “negócio” da entrega de comida.

A Igreja argentina já tem grandes privilégios econômicos legais, como as isenções de impostos pelas rendas que obtém pelas suas atividades e também por suas propriedades. A questão da comida para os “famintos” também é um negócio. De fato, a Igreja tem uma instituição (Cáritas) para as atividades de “caridade”. Cáritas Argentina já começou a receber fundos do governo para intervir na questão da comida[32]

Como resolver o problema da fome na Argentina?

Esta pergunta deve ser respondida em dois planos. O primeiro é o imediato: como garantir o funcionamento de um sistema de cozinhas populares que garanta que milhões de argentinos possam ter ao menos uma alimentação básica diária e evitar que adoeçam ou morram de fome? O ponto de partida é que o Estado garanta o fornecimento de comida e os fundos necessários para seu funcionamento.

Resolver este primeiro plano seria muito fácil. Segundo o estudo já citado de La Poderosa: “O investimento social requerido representaria um orçamento global equivalente a menos de 0,07% do produto interno bruto nacional, 10% do destinado a serviços de inteligência ou a 0,14% dos serviços de dívida previstos no orçamento de 2023”[33].

Ou seja, bastaria deixar de pagar a fraudulenta dívida externa e destinar uma pequeníssima fração do que é roubado do país com esse pagamento para que as cozinhas comunitárias possam funcionar sem abalos. Mas ninguém dos governos burgueses, nem Macri nem o peronismo (e, menos ainda, Milei) estiveram dispostos a deixar de pagar a dívida externa, romper com o FMI e deixar de cumprir suas exigências.

Ao mesmo tempo, para resolver a situação que dá base à necessidade destas cozinhas (a pobreza e a indigência dos trabalhadores) é necessário lutar por um imediato aumento que eleve o salário mínimo ao valor de uma cesta básica completa, ou seja, a 570 dólares.

O segundo plano é muito mais estrutural e requer medidas muito mais profundas. A Argentina é um país de 48 milhões de habitantes, que produz alimentos que podem satisfazer as necessidades de 400 milhões de pessoas[34]. Entretanto, como consequência de sua submissão ao imperialismo, que a saqueia, só um punhado de latifundiários (que dominam a produção agropecuária), um punhado de empresas exportadoras de grãos (a maioria de propriedade estrangeira) e de grandes empresas industriais de alimentos se beneficiam dessa gigantesca produção, em um modelo de acumulação cujo centro é a exportação da qual obtêm grandes lucros[35].

O resultado é que os alimentos estão cada vez mais caros no país e 10 milhões de argentinos passam fome. É a consequência do capitalismo imperialista e de como este funciona no país, com todos os governos burgueses. A política de Milei só exacerbou esta base de fundo.

Por isso, para resolver com profundidade o problema da fome na Argentina, na questão dos alimentos, também é necessário “expropriar todas as empresas multinacionais, as grandes empresas capitalistas nacionais [e as dos latifundiários], deixar de pagar a dívida fraudulenta, e colocar todos os recursos a serviço de um plano econômico operário e popular”. Um plano que deve ser centralizado a partir do Estado e cujo objetivo não seja os lucros dos latifundiários e dos monopólios e o pagamento ao FMI, mas que tenha como prioridade a satisfação das necessidades dos trabalhadores e do povo. Neste caso, o acesso a uma alimentação segura e completa[36].


[1] ¿A qué fue Milei a Israel? – Liga Internacional de los Trabajadores (litci.org)

[2] https://www.pagina12.com.ar/714883-organizaciones-sociales-realizaran-este-viernes-500-cortes-e

[3] https://elpais.com/argentina/2024-02-14/argentina-comienza-2024-con-una-inflacion-del-206-solo-para-enero.html

[4] La licuadora y la recesión: se agudiza la crisis de los salarios y prevén mayor deterioro (ambito.com)

[5] Ver nota 5.

[6]  Canasta básica: cuánto necesitó una familia para no ser pobre en enero | TN

[7] Paro de trenes: a qué líneas afecta y hasta qué hora no habrá servicios este miércoles 21 de febrero | TN

[8] Quiénes adhieren al paro de trabajadores aeronáuticos y cómo afectará a los vuelos este miércoles | TN

[9] Estibadores anunciaron un paro nacional para el día lunes en los puertos del país – El retrato de Hoy

[10] Paro nacional en escuelas y universidades contra el ajuste de Milei – Diario El Ciudadano y la Región (elciudadanoweb.com)

[11] Otra vez, Pablo Moyano amenaza con un nuevo paro general – Estación Claridad (estacionclaridad.com.ar)

[12] https://www.resumenlatinoamericano.org/2024/02/17/argentina-un-estudio-de-la-uca-confirma-que-en-los-dos-primeros-meses-de-milei-la-pobreza-ha-llegado-al-574-por-ciento/

[13] Mujeres, pilares de la economía popular | Diario El Norte

[14] https://elpais.com/america-futura/2023-04-19/las-cocineras-que-alimentan-a-millones-de-argentinos-quieren-ser-reconocidas-por-la-ley.html

[15] https://www.swissinfo.ch/spa/comedores-populares-de-argentina-en-crisis%3a-sin-comida-y-con-m%c3%a1s-gente-para-atender/72577734#:~:text=Los%20movimientos%20sociales%20que%20manejan,Sur%2C%20que%20coordina%20este%20comedor.

[16] https://www.cadena3.com/noticia/nuevo-gobierno/pettovello-no-recibio-a-manifestantes-que-fueron-a-capital-humano-no-los-cite_379999

[17] Movimientos sociales protestarán en supermercados por la entrega de alimentos | Perfil

[18] https://infobaires24.com.ar/sobras-descartes-estrategia-pettovello-comida-pobres/

[19] https://litci.org/pt/2024/02/03/argentina-o-que-significou-a-greve-do-dia-24/ [20] El peronismo se reorganiza para salvar a Milei – PSTU

[21] Javier Milei advirtió que el momento más duro va a ser en marzo y abril | Infocielo

[22] https://www.iprofesional.com/politica/398079-encuesta-reveladora-se-desploma-la-imagen-de-javier-milei-por-ley-omnibus

[23] La Iglesia reitera su reclamo por alimentos para comedores populares (iprofesional.com)

[24] La rebelión patagónica se extiende a todo el país – Infobae

[25] Los trabajadores dijimos NO al “protocolo antipiquetes” – PSTU

[26] Milei le prende velas al Papa: lo invitó a la Argentina y dijo que su presencia contribuirá a la unidad | La carta que le envió | Página|12 (pagina12.com.ar)

[27] https://www.lanacion.com.ar/politica/elecciones-2023-las-criticas-de-milei-al-papa-francisco-segun-the-new-york-times-palabras-osadas-nid16102023/

[28] https://www.pagina12.com.ar/694802-que-dijo-el-papa-francisco-de-javier-milei-y-sobre-su-visita

[29] Con el Papa. El Vaticano oficializó a Grabois como miembro de un ministerio – LA NACION

[30] https://litci.org/es/la-iglesia-catolica-no-tiene-el-derecho-de-ser-la-voz-de-los-pobres/

[31] https://www.lapoliticaonline.com/politica/milei-se-bolsonariza-y-terceriza-con-evangelistas-la-ayuda-alimentaria/

[32] https://www.infobae.com/politica/2024/02/07/tras-el-reclamo-de-la-iglesia-el-gobierno-renovo-con-caritas-un-acuerdo-por-310-millones-para-alimentos-para-comedores/

[33] https://elpais.com/america-futura/2023-04-19/las-cocineras-que-alimentan-a-millones-de-argentinos-quieren-ser-reconocidas-por-la-ley.html

[34] ¿La Argentina produce alimentos para 400 millones de personas? | Biodiversidad en América Latina (biodiversidadla.org)

[35] Ver, por exemplo: ¿Quiénes son los verdaderos dueños de la comida en la Argentina? | El Destape (eldestapeweb.com) y

Quiénes son los 20 mayores terratenientes de la Argentina – Punto de Partida (puntodepartidatv.com)

[36] Hay una alternativa al plan de Milei – Liga Internacional de los Trabajadores (litci.org)

Tradução: Lílian Enck

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