qua jul 24, 2024
quarta-feira, julho 24, 2024

Caos climático e irracionalidade do capitalismo neoliberal

Na última semana, quase todo o Brasil sofreu com a onda de calor. Por dias consecutivos, os termômetros chegaram a marcar temperaturas entre 35 e 44°. No Rio de Janeiro, a sensação térmica chegou a 60°. Devido ao calor, uma jovem de 23 anos morreu e outras mil pessoas passaram mal durante um show da cantora Taylor Swift. Essa situação absurda foi criada porque a produção do show proíbe as pessoas entrarem com água, para as obrigarem a comprar copos d’água a R$ 8 no próprio evento.

Por: Jeferson Choma

Em São Paulo, a temperatura superou os 40°C e, por conta de alta exposição ao calor, o estado teve uma disparada de 102,5% nos atendimentos em hospitais e internações, em relação a 2022.

Mas, o calor foi mais intenso nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. No Pantanal, castigado pela seca, um incêndio incontrolável já consumiu mais de 1 milhão de hectares, o que equivale a um milhão de campos oficiais de futebol.

As mudas de soja, recém-plantadas, secaram devido ao calor e à falta de água. Uma prova da total irracionalidade do agronegócio, que avança destruindo a Amazônia, resultando em menos chuvas e que, no final das contas, acaba se voltando contra o próprio agronegócio e seus monocultivos.

Dias piores virão…

País afora, onda de calor também vai resultar na quebra de safras de muitos outros cultivos.

Na Amazônia, a seca continua intensa, deixando os rios secos e as florestas vulneráveis às queimadas. No dia 8, uma tempestade de poeira engoliu Manaus, a capital do Amazonas. Manaus também está sob fumaça de queimadas que são as piores já registradas. A seca também produz a salinização da foz do rio Amazonas, deixando milhares sem água potável, no Amapá.

No Sul do país, novas enchentes inundam cidades e castigam a população, sobretudo a mais pobre.

Todos esses fenômenos climáticos extremos estão relacionados ao El Niño, fenômeno climático que aquece as águas do Oceano Pacífico.

No entanto, o El Niño ainda nem chegou no seu auge, que deverá ser em dezembro-janeiro, para quando os meteorologistas preveem mais ondas de calor no país, mais chuvas intensas e enchentes no Sul do país, deslizamentos em áreas de encostas e mais secas no Norte e, também, no Nordeste.

Aquecimento global

2023 deve terminar como o mais quente em 125 mil anos

O aquecimento global, provocado pela queima de combustíveis fósseis (petróleo, carvão mineral e gás natural), intensifica e torna mais frequentes os fenômenos climáticos como o El Niño. De acordo com cientistas do Observatório Copernicus, da União Europeia, o ano de 2023 deve terminar como o mais quente em 125 mil anos. Os dados do observatório mostram, ainda, que o último mês de outubro foi o mais quente do mundo nesse período.

Entretanto, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mesmo antes do El Niño, entre 2011 e 2021, o Brasil já havia registrado 52 dias por ano com ondas de calor intenso. O índice representa quase oito vezes o total verificado nos trinta anos entre 1961 e 1990, quando não ultrapassava de sete dias por ano.

O planeta rodando num círculo desastroso

Queiram ou não os negacionistas, o aquecimento global é uma realidade e até os relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, na sigla em inglês) já apostam que, em breve, vamos cruzar o perigoso limite de 1.5°C a mais do que as temperaturas registradas desde 1850.

Daí pra frente, o clima poderá se tornar incontrolável e, com um aquecimento superior a 2°C, muitos pontos de ruptura da Terra poderão ser acionados, tal como o degelo do “permafrost” (camada do subsolo da crosta terrestre que está permanentemente congelada); o derretimento das geleiras da Antártida e do Ártico; a acidificação dos oceanos; a transformação da Amazônia em uma savana degradada, entre outros fenômenos que podem retroalimentar o aquecimento do planeta.

O caos climático terá consequências devastadoras para todo o país. Vai resultar em quebras de safras; redução de chuvas, especialmente no Nordeste e no Brasil Central; degradação da Amazônia; possibilidade de novas pandemias; escassez de água nos grandes centros urbanos; e ameaças às cidades costeiras, devido a elevação dos oceanos.

Clima e capitalismo

Caos climático e privatizações preparam o capitalismo do desastre

As mudanças do clima produzidas pelo capitalismo, com o uso voraz de combustíveis fósseis, são o elemento deflagrador de tragédias. Mas elas estão sintonizadas com outra: a tragédia social que produz a imensa desigualdade no país, ampliada nas últimas três décadas pelo neoliberalismo.

Face ao caos climático, a resposta dos governos tem sido mais privatizações, mais cortes em investimentos nas áreas sociais, e sequer existe uma política para construir a infraestrutura necessária para se preparar para as mudanças climáticas.

Privatização e a apagão

O apagão do dia 3 de novembro, em São Paulo, que deixou mais de 2 milhões de pessoas sem luz por cinco dias, nos oferece uma pálida ideia do que está por vir. O apagão foi o resultado trágico da privatização da antiga Eletropaulo, que levou a demissões em massa, terceirizações, cortes de investimentos, aumento nas tarifas e, claro, apagões. Privatização é isso. Um negócio excelente para os capitalistas – os lucros da Enel saltaram de R$ 777 milhões para R$ 1,4 bilhão, de 2019 a 2022 –, enquanto o povo pobre fica no escuro.

Mercantilização da água

Se a privatização do setor elétrico resulta em apagão de cinco dias para o povo pobre, é fácil imaginar o que acontecerá com a privatização do abastecimento de água e do saneamento, em um cenário de caos climático, e a diminuição da disponibilidade de água nos próximos anos.

Essa situação vai ser particularmente nefasta para aqueles e aquelas que enfrentam maior vulnerabilidade social. Até hoje, quase a metade do país não tem saneamento básico. Segundo o Instituto Trata Brasil, em todo o país, cerca de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e apenas 50% do esgoto é tratado.

Foram as empresas estatais que realizaram as obras de saneamento existentes hoje. Mas, elas estão na mira dos governos estaduais, como a Sabesp, em São Paulo, cuja privatização está sendo levada a cabo pelo governador bolsonarista Tarcísio (Republicanos) e em Minas Gerais, onde o governador Romeu Zema (Novo) investe na privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).

As experiências internacionais negativas comprovam que privatização do saneamento significa caos para a população e lucros enormes para as empresas privadas. De acordo com o Instituto Transnacional (TNI), entre 2000 a 2019, 312 cidades em 36 países foram obrigadas reestatizar seus serviços de tratamento de água e esgoto. Entre elas, Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina) e La Paz (Bolívia).

Tragédias impulsiona lucros

Privatização do saneamento é transformar a água em uma mercadoria. Garante lucros aos capitalistas e desastre para os trabalhadores pobres, que terão negado um direito essencial à vida.

Além de impedir a universalização do saneamento básico em todo o país, a privatização da água vai agravar os efeitos da crise climática. Milhões não terão acesso a um bem essencial para que um punhado de capitalista ganhe dinheiro.

Essa combinação mortal de neoliberalismo e mudanças do clima foi chamada de “Capitalismo do Desastre” pela jornalista estadunidense Naomi Klein. De acordo com a escritora, o capitalismo produz desastres e se aproveita deles para fazer a rapina e ganhar mais dinheiro.

Deter a catástrofe

O capitalismo destrói! Construamos o socialismo!

No Brasil, a burguesia responde à catástrofe climática com aprofundamento do neoliberalismo, privatizações e as famigeradas Parcerias Públicas Privadas (PPPs). Em suma, à beira do abismo, o Estado capitalista e seus governos estão abrindo novas fronteiras de acumulação de capital para que a burguesia possa lucrar com a tragédia e a morte.

É por isso que a luta pelo meio ambiente precisa ser abraçada pela classe trabalhadora, que deve levar essa pauta para os sindicatos, movimentos sociais e organizar as suas bases para enfrentar o caos climático.

A lista de exigências é imensa. Começa por lutar por melhores condições de trabalho face às ondas de calor; maior investimento público em obras de mitigação (alívio) dos efeitos do aquecimento; obras de saneamento, moradia digna e segura e sistemas de alertas eficientes.

Mas, também, é preciso lutar contra as privatizações e por serviços públicos de qualidade; exigir a reestatização do que já foi privatizado; defender a recuperação de ecossistemas e de bacias hidrográficas e, finalmente, exigir a transição energética (com a substituição dos combustíveis fósseis), a partir da nacionalização dos recursos energéticos do país.

A pauta ambiental deve ser combinada com a luta por soberania nacional, com as lutas econômica e por melhores condições de trabalho para a classe trabalhadora, contra o racismo ambiental e toda forma de opressão. Ao mesmo tempo, é preciso superar o capitalismo que leva os seres humanos ao desastre. É preciso construir uma sociedade socialista, fundada na propriedade social dos meios naturais de produção, para que uma nova racionalidade ecológica floresça e harmonize as forças produtivas com a natureza.

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