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terça-feira, março 19, 2024

Ucrânia| A resistência à agressão russa torna-se o epicentro mundial da luta de classes e acelera a crise da ordem mundial

Após a invasão da Ucrânia por Putin, a guerra de resistência aberta pelo povo ucraniano já dura 6 meses e coloca a Eurásia no epicentro da luta de classes mundial. A crescente intervenção do imperialismo estadunidense e, em menor grau, europeu, e a política de sanções e ajuda militar não alteram por si só o caráter da guerra: uma guerra de libertação nacional contra a agressão de uma potência militar.

Por: LIT-QI

A resistência armada ucraniana – de composição social operária e popular – apesar dos limites impostos por sua direção burguesa (Zelensky) perdurou ao longo do tempo e superou as previsões do regime de Putin e dos imperialismos. Esta extensão da guerra tem consequências claras para a luta de classes dentro da Ucrânia.

A resistência armada do povo ucraniano acelera múltiplas contradições:

1.- Choca com os objetivos dos Estados imperialistas envolvidos no conflito e suas alianças: por um lado, fomenta rivalidades internas dentro do bloco da OTAN (entre os EUA e a Alemanha), por outro os unifica para uma “rápida” resolução do conflito, isto é, impor à Ucrânia a perda de sua integridade territorial. Essa luta entre os interesses da OTAN e da Rússia na Ucrânia acelera o processo de semicolonização e tem fortes repercussões na disputa mundial entre os EUA e a China.

2.- A cada dia que passa, a resistência operária e popular na Ucrânia colide com o regime de Zelensky e o governo semicolonial, que conspira contra a possibilidade de uma vitória militar do povo ucraniano contra as tropas invasoras de Putin. As duas reformas trabalhistas antioperárias impostas por este governo de Zelensky visam fortalecer os mecanismos legais de coerção que garantem a exploração dos trabalhadores ucranianos durante a guerra e libertar os capitalistas de sua obrigação legal de pagar salários aos trabalhadores que foram para a linha de frente para defender o país. A luta da resistência operária e popular pela libertação nacional tem hoje um centro fundamental na luta contra as medidas do governo Zelensky.

3.- A guerra contra a invasão e ocupação desenvolveu o processo de armamento das massas e a crescente organização de um movimento partisano nas zonas ocupadas, que não são totalmente controladas pela cúpula militar burguesa. Isso produz temores crescentes nas classes dominantes e nas potências imperialistas, já que a guerra está treinando a classe operária no manuseio de armas pesadas e modernas.

4.- A guerra na Ucrânia abriu, em um primeiro momento, uma crise energética, já que o confronto militar iniciou uma guerra econômica (com as políticas de sanções e novas alianças) centrada na disputa pelos mercados de energia (especialmente o GNL) e das áreas de influência das distintas potências. Como consequência dessa competição travada pelos monopólios capitalistas e seus Estados, os preços dos combustíveis fósseis dispararam, gerando um pico inflacionário mundial e uma queda brutal do poder de compra dos salários do proletariado em todos os países.

5.- Em um segundo momento, a guerra desencadeou uma grave crise alimentar em escala global. Já foi dito que a Ucrânia é “o celeiro do mundo”, pois é um grande fornecedor de cereais para a Europa e África, e também de fertilizantes. O prolongado bloqueio dos portos, que impediu a exportação de grãos, provocou uma primeira onda de inflação na cesta básica. Mas o mais preocupante é o fato de este ano não ter havido plantação, e assim o prolongamento e agravamento da crise alimentar continua colocada em consequência da guerra.

6.- Outra dimensão das contradições desta guerra tem a ver com a interação entre a crise energética e a crescente crise climática. A solução que as burguesias imperialistas europeias e americanas propõem para a crise energética é o rápido aumento da produção de combustíveis fósseis, responsáveis ​​pelo colapso climático: o reinício do fracking para produzir GNL, a realização de novos projetos de perfuração de petróleo e a reabertura das centrais termoelétricas a carvão. Ao mesmo tempo, o transporte fluvial deste carvão é dificultado pelos efeitos da seca, o que também afeta a produção hidrelétrica em vários países europeus. Em suma, a solução capitalista para a crise energética acentua a crise ambiental e vice-versa. Neste contexto, vale destacar o risco representado pelo domínio dos russos da Usina Nuclear de Energodar, em Zaporizhie, de onde disparam mísseis ao restante do território ucraniano, provocando a resposta das forças armadas e da resistência.

O fator qualitativo que condiciona e agrava tudo isso é a heroica resistência operária e popular ucraniana, que apesar da desigualdade de armamento impede a consolidação das zonas ocupadas. Putin dificilmente conseguirá consolidar seus objetivos como uma tropa de ocupação contra a população hostil que resiste ao inimigo. É preciso analisar todas as derivações e consequências que isso trará para a Rússia e sua periferia. Não devemos subestimar a lenta, mas profunda inquietação das massas russas diante das crescentes evidências da estagnação da “operação militar especial”, que dentro da Rússia é proibido chamar “guerra” e que é punível por lei.

Ao mesmo tempo, aos povos da Belarus e do Cazaquistão está colocada a necessidade de continuar sua luta para derrubar seus governos fantoches de Putin. Devemos nos preparar para a possibilidade de explosões ou mobilizações sociais na região da antiga União Soviética, como resultado das contradições da guerra, e também para uma aceleração do processo de bonapartização de seus governos. Inclusive existem focos de tensão militar, como o enclave russo na região de Transniester, na fronteira entre a Moldávia e a Ucrânia, no rio Dniester.

Hoje, apesar da simpatia pelo povo ucraniano, a ação independente das massas em favor da resistência ucraniana – seja na Europa ou em escala mundial – está bloqueada, por um lado, pela ação dos aparatos burocráticos, especialmente os neo-stalinistas e castrochavistas transformados em putinistas, com seu “campismo” supostamente anti-imperialista. Por outro lado, por causa das políticas dos governos, de apelar constantemente à “unidade nacional” e tentar convencer seus proletariados de que podem confiar em seus governos e em suas intenções, com declarações de “intenção de ajudar” o povo ucraniano. Cabe aos revolucionários denunciar a política hipócrita dos diferentes imperialismos e afirmar que o proletariado de cada país deve procurar expressar sua solidariedade internacionalista com a resistência ucraniana, com independência de classe de seus governos.

As contradições do imperialismo

A crise da aliança energética russo-alemã, as interrupções no fornecimento de gás e petróleo, seus efeitos econômicos e sociais sobre as massas europeias no próximo inverno, o aumento dos custos de produção da máquina de exportação alemã, alimentam a rivalidade entre os imperialismos.

Durante este primeiro período da guerra, o imperialismo estadunidense conseguiu se impor – apesar de suas divisões – como direção política e militar do conflito. Essa hegemonia foi expressa na resolução da cúpula da OTAN realizada em junho em Madri. No entanto, as contradições subjacentes dentro do bloco da OTAN, agora em expansão, não desapareceram, mas se acentuaram e continuarão atuando na realidade.

O rearmamento dos Estados imperialistas e da China, e o plano agora explícito da OTAN para conter o avanço da China, também sugere que a guerra pode evoluir na direção de uma recomposição mais ampla das alianças (e rupturas de alianças) entre potências globais e regionais em escala global.

A classe trabalhadora deve tomar em suas próprias mãos a liderança da resistência aos invasores

A resistência operária e popular ucraniana choca cada vez mais com o regime e o governo semicolonial que representa os interesses capitalistas que são centralmente os das corporações imperialistas e dos vários grupos oligárquicos. Como assinalamos, a direção política do enfrentamento militar, encarnada no governo Zelensky, conspira contra a vitória do povo ucraniano: a classe operária deve tomar em suas mãos a direção da resistência aos invasores, levantando um programa revolucionário . Estamos diante da necessária combinação da guerra de libertação nacional com a luta pela independência política da classe operária para sua libertação social.

Os eixos do nosso programa, que levantamos e devemos continuar a desenvolver dentro da Ucrânia, são a expropriação de todos os ativos dos oligarcas e empresas russas associadas ao regime de Putin, a nacionalização e centralização da economia nas mãos do Estado, ao serviço da defesa nacional, sob o controle dos trabalhadores, e a centralização das defesas territoriais como organização da resistência em milícias operárias que favoreçam a tendência à independência do governo. Devemos chamar a defender a soberania nacional à custa dos lucros capitalistas e derrotar as demissões, suspensões forçadas e garantir o pleno emprego, como parte de um plano de defesa nacional, com uma política de exigência e denuncia para a política concreta de Zelensky hoje. Ao mesmo tempo, devemos avançar no processo de organização independente da classe, nos níveis político e militar, porque somente a classe operária ucraniana, aliada ao resto do proletariado mundial, pode garantir essas tarefas de defesa nacional, tomando-as em suas próprias mãos.

Para esta tarefa gigantesca e urgente, é necessária uma direção operária revolucionária que se nutra do movimento revolucionário internacional e de suas melhores tradições. A CSP-Conlutas do Brasil juntamente com outras organizações sindicais europeias, demonstrou ser uma alavanca fundamental no impulsionamento da campanha de solidariedade e para ampliar a divulgação e o apoio à resistência. Um primeiro Comboio Operário em apoio à resistência ucraniana já foi realizado e um segundo está sendo organizado. Colocamos todas as nossas forças ao serviço desta tarefa.

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