sáb jun 15, 2024
sábado, junho 15, 2024

Honduras: rebelião ou ditadura, só existem dois caminhos

Dia 27 de janeiro marca um ano da impopular reeleição de Juan Orlando Hernández (JOH), um revés que certamente se marcou por dois caminhos decisivos, ou triunfava a insurreição em curso contra a fraude, ou triunfava o projeto ditatorial do Partido Nacional (PN).

Um ano atrás, uma nova etapa foi aberta no país. O regime, com a proteção da embaixada dos EUA e do Departamento de Estado ianque, mobilizou todo o seu aparato militar e repressivo para neutralizar a insurreição contra um segundo mandato de JOH. Mas não foi apenas a repressão que enfraqueceu a sublevação social, ela também perdeu força ao depositar sua confiança nos líderes da oposição burguesa. Todos os partidos em disputa e em oposição ao Partido Nacional (PN) concordavam que JOH havia ganhado devido a uma fraude eleitoral escandalosa, mas todos se colocaram no campo da democracia burguesa, terreno em que JOH tinha tudo a ganhar. Um forte golpe contra a revolta popular que, inicialmente, conseguiu colocar JOH contra a parede.

A explosão popular demonstrou o dilema: Rebelião ou ditadura. Por enquanto, JOH está na dianteira diante da situação, considerando que, apesar da instabilidade e da crise, está sobrevivendo ao primeiro ano de sua reeleição. Por outro lado a insurreição, que foi uma das lutas mais fortes nos últimos anos não conseguiu avançar para uma política organizacional e de reivindicações que permitisse se distanciar dos grupos de oposição burguesa e radicalizar o processo para uma deposição inegociável do ditador. O espaço que foi dado a Mel Zelaya e Salvador Nasralla foi determinante para deter a insurreição através da via “pacífica” da institucionalidade.

Uma ditadura para reprimir e explorar mais

JOH não foi eleito pela administração de Trump por capricho, sua imposição responde a todo o pacote de medidas prejudiciais que seu governo deve garantir em virtude da sustentação dos organismos financeiros internacionais, que há décadas têm um papel decisivo no curso do país De acordo com o Fórum Social para a Dívida Externa de Honduras (FOSDEH) na última década o país dobrou a dívida, fechando 2018 com uma dívida que chega a 50% do PIB, estamos falando de cerca de 15 bilhões de dólares (366 bilhões de lempiras), o que obriga o Estado a destinar uma boa parte do orçamento deste ano para pagar a dívida, cerca de 45 bilhões em um orçamento que aumentou minguados 6%.

Por outro lado, a taxa de desvalorização anual da lempira em relação ao dólar se mantém em 5%, o que contribui para o empobrecimento do país, onde cerca de 4 milhões de hondurenhos já vivem em extrema pobreza. Não é por acaso que milhares de pessoas fogem do país em caravana, a mensagem é clara, viver bem em Honduras é praticamente impossível. Apenas em 2018 foram deportados dos EUA e do México 75 mil e 105 hondurenhos. O sistema público de saúde está praticamente em colapso e a educação é cada vez mais consolidada como um privilégio, enquanto as privatizações de empresas estatais continuam e aceleram seu curso.

A ditadura também está podre de corrupção, tanto que o próprio PN não pôde esconder que até seus deputados estão afundados na lama, reflexo, além disso, de sua fragilidade política. A administração de Hernández é tão escandalosa que seu próprio irmão foi submetido a julgamento por tráfico de drogas, o que o deixa em uma posição desconfortável, especialmente quando Trump se mostrou muito irritado com as caravanas migratórias que desnudou a crise humanitária no país e no resto da região da América Central.

Agora, uma vez que terminou o  “diálogo nacional”, colete salva-vidas para JOH, os partidos da oposição recarregam as baterias para estabelecer “novas regras” para o jogo eleitoral. Os próximos quatro vão terminar cozinhando no Congresso Nacional, enquanto mais de uma dúzia de lutadores se encontram como presos políticos da ditadura.

Os setores da oposição

A burguesia, que se expressa no Partido Liberal, Salvador Nasrallah e a cúpula do Partido Liberdade e refundação (Libre), junto com alguns setores concordam que JOH não deve ostentar a cadeira presidencial, no entanto, no fundo todos têm acordo que sua saída deve ser controlada e “pacífica” no quadro da institucionalidade burguesa e sob a permissão do imperialismo,. Se não fosse assim, Nasrallah e Luis Zelaya não teriam aceitado o diálogo, e Manuel Zelaya não teria esperado o reconhecimento dos EUA ao candidato da Alianza como o vencedor, para depois passar a fazer parte do governo da ditadura e pretender pressioná-lo a partir de suas cadeiras no parlamento. Uma saída que também não questiona  a fundo o Estado burguês e seu modelo neoliberal.

Em janeiro, também surgiu um novo espaço: A Acción Cidadana contra a ditadura no qual afluíram, a partir da suposta lógica de um “grande pacto político”, empresários, setores sociais e líderes populares do Partido Liberal, Salvador Nasrallah, sociedade civil e representantes de Convergência contra o Continuísmo. Libre, enquanto isso, faz burburinho dos famosos “Comandos insurrecionais (CI)” sob o método da não violência ativa, definindo, além disso, aos CI como o braço de luta de Libre, tal como foi colocado antes com a Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP). A questão é: por que agora e não quando a insurreição eclodiu? A resposta é simples, Manuel Zelaya não está realmente interessado em qualquer insurreição, se estivesse não teria desmobilizado a luta contra a fraude, chamando a respeitar as férias e feriados de final do ano. Todos seus esforços reais estão focados em negociar as reformas eleitorais no Congresso Nacional (CN) que lhe permitam ter um representante no Supremo Tribunal Eleitoral (TSE) para que nas próximas eleições possam sair vitoriosos nas urnas.

Por outro lado, temos os setores populares e sociais que nos últimos anos mantiveram uma resistência contra as políticas de entreguistas e de privatização do ditador. 2018 foi um ano que, apesar da repressão e refluxo da luta contra a ditadura, teve mobilizações muito importantes, como as lutas estudantis, a resistência em Guapinol, resistência em Choluteca contra JOH e a mineração, as lutas contra projetos hidrelétricos, paralisações de transportes, greves no setor de saúde, mobilizações para a libertação de presos políticos e pequenas expressões em setores operários como as maquiladoras.

Estes diferentemente dos primeiros atuam no campo das demandas diretas ao governo, e também sabem que cada dia que passa é um dia em que a ditadura ganha terreno para se manter e continuar explorando e oprimindo a classe trabalhadora.

Unidade, sim, mas com quem e para que?

Durante a insurreição contra a fraude eleitoral no final de 2017 e no início de 2018, colocávamos que duas tarefas eram necessárias para derrotar JOH. A primeira era aprofundar as greves insurrecionais, organizar a autodefesa e neutralizar as forças armadas. A segunda tarefa era política e, em nossa opinião, o fracasso em cumprir essa tarefa foi decisivo para que JOH permanecesse no poder. Essa grande tarefa política passava por ultrapassar a oposição burguesa, que privilegiava o terreno das negociações ao invés do terreno insurrecional, e construir uma direção revolucionária do processo e à esquerda da oposição burguesa.

Defendemos o princípio da unidade da classe trabalhadora, com os setores que sofrem diretamente a política repressiva do JOH e sua miséria, que levanta um programa próprio. Isso porque, além de exigir a saída do JOH, devemos lutar por demandas que só podem ser defendidas pelas grandes maiorias exploradas e oprimidas. Lutar contra JOH é lutar pela libertação dos presos políticos, melhores salários e contra os aumentos miseráveis ​​acordados pelas burocracias, por direitos sexuais e reprodutivos plenos para as mulheres e um basta ao feminicídio, nacionalização dos bancos, renacionalização das empresas privatizadas, ruptura dos acordos com o imperialismo, não ao pagamento da dívida, pela expulsão das bases militares gringas, contra o desemprego e a pobreza que expulsam milhares de pessoas do país.

É por isso que alertamos que nenhum agrupamento burguês que integra a Acción Ciudadana Contra la Dictadura vai concordar com uma saída que coloque o questionamento do Estado burguês no país e as relações coloniais de Honduras com o imperialismo. Qualquer unidade com setores provenientes da burguesia como o PL, Nasralla e outros deve ser estritamente tática, com o objetivo de unir esforços para lutar pela queda do governo ditatorial. Para conseguir isso, devemos exigir que essas organizações, acima mencionadas, abandonem imediatamente o apoio que vem dando a este regime absolutista, ao qual apoiaram sendo parte do Diálogo Nacional e votando juntos no Congresso Nacional, leis que flagelam os interesses e direitos dos trabalhadores. Da mesma forma, devemos exigir energicamente que eles se juntem e chamem suas bases para as ruas, para, através da mobilização, derrubar JOH.

Chamamos a uma grande rebelião em todo o país, uma segunda insurreição construída a partir dos bairros populares, locais de estudo e trabalho, que construa assembleias locais e nacionais, para organizar e relançar a luta contra a ditadura de forma democrática e não caudilhesca. É urgente avançar na formação de um espaço unitário, com independência e democracia de classe, que ative as mobilizações contra o governo, a partir de um programa e plano de luta. Unidade sim, mas para se rebelar, unidade sim, mas para organizar seriamente a luta contra o ditador.

Comitê Executivo do Partido Socialista dos Trabalhadores

Tegucigalpa, janeiro de 2019

Tradução: Lena Souza

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