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Quem foi Trotsky?


No dia 20 de agosto, completam-se 71 anos do assassinato de Leon Trotsky. Mas quem foi esse homem? O que ele fez?


Por que a palavra “trotskismo” é, até hoje, em muitos lugares, pronunciada com ares de maldição? Qual ativista, radicalizado por uma luta e disposto a tudo, não foi acusado do crime de “trotskismo”? O Opinião Socialista dedica estas páginas ao mais perseguido e um dos mais brilhantes revolucionários de todos os tempos.

A vida

Liev Davidovich Bronstein nasceu no dia 26 de outubro de 1879 no vilarejo ucraniano de Yanovka, Império Russo. Judeu, filho de camponeses médios, aderiu ao marxismo aos 19 anos e passou a reunir os operários da região em uma organização político-sindical denominada “União Operária do Sul da Rússia”.

Trotsky (pseudônimo emprestado de seu carcereiro em 1902) passou por três longos exílios fora da Rússia (1902-1905, 1907-1917 e 1927-1940), mas também participou de três revoluções (1905, Fevereiro de 1917 e Outubro de 1917). Foi por duas vezes presidente do Soviete de Petrogrado (1905 e 1917). Trabalhou como jornalista em duas guerras: nos Balcãs em 1910 e durante a Primeira Guerra Mundial, em 1914. Membro do Comitê Militar Revolucionário durante a insurreição de outubro de 1917, dirigiu os operativos que levaram os bolcheviques ao poder. Depois da vitória da insurreição, assumiu o Comissariado do Povo para Assuntos Estrangeiros e esteve à frente das negociações sobre a paz com a Alemanha em 1918.

Formou e dirigiu o Exército Vermelho, cujo contingente chegou a cinco milhões de homens e mulheres em 1920. Venceu 14 exércitos estrangeiros durante a Guerra Civil. Depois de 1921, dedicou-se às questões econômicas do jovem Estado Operário. Inspirou, junto com Lenin, a formação da III Internacional, redigindo seus principais documentos e declarações. Após a morte de Lenin, travou uma batalha política contra a burocratização do Estado Soviético e a degeneração do Partido Bolchevique. Expulso da URSS em 1927 por denunciar o curso antiproletário da fração de Stalin, Trotsky percorreu o mundo durante 10 anos em busca de asilo, até seu pedido ser aceito pelo governo mexicano em 1937. Morreu assassinado por um agente stalinista em 1940.

O homem

Trotsky era de estatura média, tinha cabelos negros e encaracolados, grandes olhos azuis, voz metálica e fala rápida. Ao discursar, gesticulava rica e elegantemente. Trabalhou com Lenin em Londres na equipe de redação do Iskra, primeiro jornal bolchevique. Depois da ruptura entre bolcheviques e mencheviques em 1903, afastou-se de Lenin por vários anos. Nunca foi, no entanto, menchevique.

Teve quatro filhos de dois casamentos. Todos morreram antes dele, dois dos quais assassinados pelo stalinismo. Conheceu a mais absoluta glória e o mais terrível fracasso. No entanto, nunca encarou nem um nem outro desde um ponto de vista pessoal. Para Trotsky, sua sorte era a sorte do proletariado em luta, suas glórias e fracassos eram as glórias e fracassos da classe operária mundial e, portanto, de caráter essencialmente político.

Nos tempestuosos dias de outubro de 1917, às vésperas da tomada do poder, abordado por um jornalista para que desse uma declaração em nome dos bolcheviques, Trotsky respondeu: “A única declaração possível neste momento é a que fazemos pela boca de nossos canhões”, e seguiu com passos apressados para a sede do Comitê Militar Revolucionário. Assim falava Trotsky. E, do mesmo modo que falava, agia.
 
A obra

Trotsky era um homem de ação, mas não de ação sem verdade. Para ele, a atividade prática revolucionária era inseparável do estudo e do trabalho intelectual. Aos 26 anos, em base à experiência da revolução de 1905, formulou a Teoria da Revolução Permanente, na qual previa que, numa Rússia atrasada e semifeudal, com uma burguesia fraca e vacilante, a revolução democrática contra o czarismo conduziria imediata e inevitavelmente à ditadura do proletariado. Doze anos depois, seus prognósticos se cumpririam de maneira categórica.

Mas seu trabalho teórico mais importante é, sem dúvida, A Revolução Traída, de 1936. Neste livro, Trotsky analisa o processo de burocratização da URSS e do Partido Bolchevique e sentencia: ou a classe operária soviética, sob a direção de um partido revolucionário, fará uma revolução política, que limpe dos sovietes e do Estado Operário a burocracia stalinista parasitária, ou o capitalismo será restaurado na Rússia. Cinquenta anos depois, a restauração do capitalismo em todos os países de economia planificada confirmou de modo dramático a sua previsão.

Trotsky possui uma vasta obra sobre uma infinidades de assuntos. Escreveu sobre literatura, psicologia, opressão da mulher, moral e muitos outros temas. Analisou e nos deixou valorosas lições sobre cada um dos processo revolucionários que presenciou: a revolução alemã de 1923, a revolução chinesa de 1927, a revolução espanhola de 1931-1937 e o início da Segunda Guerra Mundial. Deixou-nos, ainda, duas obras belíssimas de inestimável valor histórico e literário: História da Revolução Russa e Minha Vida, sua autobiografia.

O maior legado

Para Trotsky, porém, seu maior feito não foi a vitória da Revolução de Outubro, nem a formação do Exército Vermelho ou a construção da III Internacional, mas sim o fato de ter dado a batalha pela continuidade da tradição marxista através da fundação da IV Internacional em 1938. Trotsky costumava dizer que, se ele não estivesse presente em Petrogrado em outubro de 1917, Lenin ainda assim teria garantido a vitória da insurreição. O mesmo teria acontecido com a Guerra Civil e a III Internacional. Mas a construção da IV Internacional era uma tarefa que somente ele poderia cumprir, uma vez que Lenin já havia morrido. Sem a construção de uma nova Internacional, a tradição marxista e proletária se perderia para sempre, fruto da degeneração da III Internacional já controlada pelo stalinismo.

As duras condições em que a IV Internacional se construiu tornavam a sua fundação ainda mais necessária. O stalinismo havia triunfado na URSS e o nazismo tinha chegado ao poder na Alemanha. Era preciso formar uma Internacional capaz de continuar, assim que as condições o permitissem, a luta de Marx, Engels, Lenin, Rosa e do próprio Trotsky.

O assassinato

Depois de ser atingido na cabeça com um golpe de picareta por Ramon Mercader, um agente da GPU, a polícia política stalinista, Trotsky ainda lutou contra a morte por 22 horas e veio a óbito em 21 de agosto de 1940. Milhares compareceram ao seu velório.

No hospital, antes de perder definitivamente a consciência, Trotsky pediu a seu secretário que registrasse sua última mensagem: “Estou próximo da morte pelo golpe de um assassino político. Ele me atingiu em minha sala, lutei com ele… nós entramos… ele me atingiu… por favor, diga a nossos amigos… estou confiante… na vitória… da IV Internacional… adiante!

Aos 71 anos de seu assassinato, as ideias de Trotsky permanecem vivas na luta e na organização da classe operária mundial. Trotsky morreu. Viva Trotsky!

O testamento de Trotsky

Pelo perigo que representava para a burocracia stalinista, Trotsky sabia que seria assassinado a qualquer momento. Antes de morrer, escreveu um breve testamento que permanece como um dos mais belos escritos revolucionários da história. Nele, dizia:
 
Durante quarenta e três anos de minha vida consciente, fui um revolucionário. Destes, quarenta e dois combati sob a bandeira do marxismo. Se tivesse que recomeçar, procuraria evidentemente evitar este ou aquele erro, mas o curso principal de minha vida permaneceria o mesmo. Morro um revolucionário proletário, marxista, partidário do materialismo dialético e, por consequência, ateu irredutível. Minha fé no futuro comunista da humanidade não é menos ardente; em verdade, ela é hoje mais firme do que o foi nos dias de minha juventude.
 
Natasha acabou de chegar pelo pátio até a janela e abriu-a completamente para que o ar possa entrar mais livremente em meu quarto. Vejo uma a larga faixa verde de grama sob o muro, sobre ele o claro céu azul e a luz do sol por todos os lados. A vida é bela, que as gerações futuras a limpem de todo o mal, de toda opressão, de toda violência e a gozem plenamente.
 
O que é ser trotskista hoje

A relação que os socialistas têm com os grandes dirigentes revolucionários como Trotsky não pode ser a de uma admiração cega, ou de uma veneração mística. Ser trotskista é, antes de tudo, defender e divulgar o legado de Trotsky, suas contribuições, suas elaborações.

Ser trotskista é ser internacionalista: é compreender que não há saída para a humanidade a não ser na unidade da classe trabalhadora em escala mundial. Essa compreensão deve necessariamente se expressar no esforço por construir uma organização mundial revolucionária que seja capaz de travar a luta pelo socialismo em todo o mundo.

Ser trotskista é defender a democracia operária: os trotskistas são os maiores lutadores contra a burocratização dos sindicatos e organizações operárias. Os trotskistas lutam para que as decisões da base sejam respeitadas, para que não haja privilégios para os dirigentes sindicais, para que as eleições sindicais sejam limpas e sem violência, para que os trabalhadores controlem suas organizações e seus dirigentes, e não o contrário.

Ser trotskista é defender a independência de classe: os trotskistas acreditam que trabalhadores e burgueses têm interesses absolutamente opostos. Por isso, são contra qualquer governo em que participem empresários e patrões. A burguesia é a classe mais rica, mais consciente e mais organizada da sociedade. Assim, sempre que empresários e trabalhadores se unem, o resultado é que os trabalhadores são primeiro enganados e depois derrotados. Os trabalhadores só devem confiar em suas próprias forças.

Ser trotskista é construir um partido que seja uma organização de combate político, não um clube de amigos do socialismo, uma legenda eleitoral ou uma corrente sindical. Para ser uma arma nas mãos dos trabalhadores, esse partido deve ser coeso, disciplinado, e ao mesmo tempo democrático. A história demonstrou que só assim é possível vencer. A luta por esse tipo de partido foi iniciada por Lenin e continuada por Trotsky. E está agora em nossas mãos.

Fonte: Opinião Socialista nº 430, PSTU – Brasil

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