dom maio 19, 2024
domingo, maio 19, 2024

Assassinato de professor detona paralisação nacional

No dia 4 de abril, o professor de Química Carlos Fuentealba foi covardemente morto na província de Neuquén, na Argentina. Ele foi atingido na cabeça por uma bomba de gás lacrimogêneo lançada por um policial a menos de dois metros de distância. Fuentealba ainda agonizou antes de morrer. Levado ao hospital, foi mantido em vida artificial e faleceu no dia seguinte.

No momento em que foi atingido, Fuentealba participava, com mais mil pessoas, de uma tentativa de trancamento de uma estrada. Os docentes argentinos estão em estado de mobilização permanente por aumento de salários, incompatíveis com a inflação do país que, nos últimos dois anos, chegou a quase 25%. Acordos feitos entre o governo e a Central de Trabalhadores da Argentina (CTA) levaram a categoria a uma situação de arrocho insustentável.

O movimento já havia sido reprimido de forma selvagem, recentemente, pelo menos duas vezes, com bombas de gás e balas de borracha. Além disso, o governo enviou a Gendarmería – uma espécie de polícia fronteiriça militarizada – para militarizar as escolas na província de Santa Cruz, que junto com Neuquén e Salta constituem os principais pontos das mobilizações.

Os ativistas argentinos responsabilizam, também, o presidente Néstor Kirchner pela situação. “O presidente é tão responsável quanto o governador, com escolas que estão militarizadas”, disse Marcelo Guagliardo, da Associação de Trabalhadores da Educação de Neuquén (Aten). O movimento exige o fim da repressão em todos os níveis e o fim das prisões políticas que já chegam a 5.000 em dois anos.

Morte de professor catalisou a luta nacional

A morte do professor Carlos Fuentealba teve repercussão nos principais jornais do mundo. O mais importante, porém, foi que desencadeou um conjunto de mobilizações pelo país. Os professores convocaram uma greve nacional docente para a segunda-feira, 9 de abril. Em Neuquén, 30 mil pessoas foram às ruas pedir a punição dos responsáveis pelo crime e exigir a renúncia do governador Jorge Sobisch, pré-candidato à presidência nas eleições de outubro próximo.

Foi o maior protesto desde o início do governo Kirchner. As escolas ficaram vazias, e alunos e pais aderiram à manifestação, inclusive em escolas particulares. Segundo o jornal La Nación, a adesão chegou aos 70% nas escolas. Nas ruas, comerciantes fecharam as portas e colaram cartazes de apoio às marchas.

“O giz não mancha de sangue”, repetiam os manifestantes, demonstrando que não estão dispostos a se entregar. Aos professores, juntaram-se trabalhadores fabris e do setor de transportes. Os protestos se espalharam por quase todas as províncias. Em Buenos Aires, foram mais de 20 mil ativistas. Em Salta, os manifestantes ocuparam o palácio do governo. O jornal La República afirmou que a Argentina esteve “semi-paralisada” em função da greve.

Momentos após a mobilização contra a morte de Fuentealba, Kirchner informou, através do ministro do Interior Aníbal Fernádez, que enviará mais gendarmes à Neuquén se Sobisch solicitar. Demagogicamente, Kirchner e Fernández se pronunciaram contra a repressão, mas mantiveram-se calados até presenciarem os protestos.

A Frente Obrera Socialista (FOS), seção Argentina da Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (LIT-QI), está participando ativamente das mobilizações agentinas. A FOS distribuiu um panfleto que, além de repudiar e exigir a punição dos responsáveis pela morte de Fuentealba, chama à construção de um encontro nacional que defina um plano de lutas e assembléias em todos os locais de trabalho. “Se este crime fica impune e se limitam a sancionar um policial somente, a mensagem será que trabalhador que luta por salário estará ameaçado de morte”, diz o manifesto.

A FOS também responsabiliza os próprios dirigentes sindicais da categoria que, apesar de convocarem a greve nacional do dia 9, “abandonaram as províncias em luta”. Segundo o texto, o Hugo Yasky, secretário da CTA, fez um acordo com o governo nacional para colocar limites nas reivindicações salariais dos educadores, o que o levou a trair seus representados.

 

Reproduzimos a seguir o panfleto da FOS e a declaração emitida pela Conlutas em solidariedade com os trabalhadores argentinos.

 

 

TODOS À PARALIZAÇÃO E À MOBILIZAÇÃO SEGUNDA-FEIRA, 9 DE ABRIL

 

Punição aos responsáveis à repressão contra professores

 

Assembléias e plenárias para exigir paralisação geral e plano de lutas da CGT-CTA

 

O professor Carlos Fuentealba agoniza, em estado de morte cerebral irreversível. Os professores de Neuquén, da mesma forma que em outras províncias, estavam lutando por melhores salários. Estavam mobilizados e foram reprimidos de maneira selvagem pela polícia enviada pelo governador Sobisch. Um cartucho de gás lacrimogênio dirigido diretamente contra sua cabeça a menos de 2 metros foi o projétil assassino.

Não foi um fato isolado, nem a brutalidade de um louco. Em Santa Cruz, e por ordem do próprio Kirchner, as escolas foram militarizadas. E houve atentados com bombas molotov contra os docentes que se encontravam realizando uma “Feiria Popular de Pratos” para conseguir fundos para sua luta, já que lhes haviam descontado mais da metade do pagamento. Também em Salta os professores em luta foram duramente reprimidos.

A CTERA e a Central de Trabalhadores Argentinos declararam uma paralisação nacional docente e estatal para segunda-feira, em repúdio ao fato e pela punição aos assassinos.

Trata-se de um atentado contra todos os trabalhadores e o povo, que não contam com outra arma exceto a greve por aumento de salário, para se defender da inflação que não cessa.

Esse ataque é uma ameaça a todo trabalhador que queira lutar por seus direitos. Por isso, é um dever de toda a classe operária responder a esse crime. A CGT tem a obrigação de se incorporar à paralisação. De que lado estão Moyano e os dirigentes, do lado do professor agredido ou do lado do policial assassino? Deixemos que eles próprios respondam.

 

 Os responsáveis pelo crime

 

O policial que efetuou o disparo está detido. Mas isso não basta. Há outros responsáveis, cuja culpa deve ficar clara para toda a população. O governador Sobisch tem que renunciar, como chefe direto da operação repressiva. O governo nacional deve arcar com a responsabilidade de suas ações. Quando enviou a polícia para militarizar a província de Santa Cruz contra os docentes, acionou o mecanismo que terminou disparando contra Carlos Fuentealba. O governo demonstrou dessa forma como atua diante das reivindicações dos trabalhadores.

Não é casualidade que os seqüestradores de Julio López estejam livres. Os seqüestradores são policiais do tipo necessário para disparar à queima-roupa e trair os trabalhadores docentes.

É por essa razão, porque necessitam desses policiais para reprimir as reivindicações dos trabalhadores e do povo, que tanto os governos provinciais como o nacional não vão a fundo na depuração das forças armadas e de segurança.

Mas a lista de responsáveis tem muitos outros nomes. Os próprios dirigentes da CTERA que hoje convocam a paralisação deixaram as províncias abandonadas na luta. O acordo de Yasky com o governo nacional para pôr fim à reivindicação salarial docente levou-o a trair a sua base.

As greves das províncias foram uma tentativa para reivindicar diante do isolamento a que foram submetidas por seus dirigentes.

Mas já faz 15 dias que a repressão contra os docentes de Santa Cruz teve início. E Yasky não fez nada.

Uma paralisação nacional na semana passada contra a repressão em Santa Cruz teria impedido a operação repressiva em Neuquén. Por isso, Yasky e os dirigentes docentes têm sua parcela de responsabilidade frente aos fatos de Neuquén.

 

Que os crimes não permaneçam impunes – uma necessidade de toda a classe trabalhadora

 

Vários sindicatos estão lutando por salário. Trabalhadores metalúrgicos, do setor pneumático, telefônicos, do metrô e ferroviários rechaçam as ofertas patronais e preparam medidas. Se este crime ficar impune, e se a sanção se limitar a um só policial, então a mensagem será clara: trabalhador que lutar por seu salário estará ameaçado de morte.

O governo não pode resolver o problema da inflação, nem os problemas ambientais, nem o da saúde e da educação. As províncias estão quebradas. E as empresas multinacionais continuam saqueando o país. Mas frente às reivindicações operárias e populares, a resposta é a repressão.

Aqueles que afundaram o país, aqueles que saqueiam a nação, os empresários e especuladores, os responsáveis pela inflação, não são reprimidos. Só há repressão para aqueles que se queixam por tudo isso.

 

A resposta ao ataque a Fuentealba é um ato de autodefesa operária e popular

 

A paralisação da CTA é uma primeira resposta. Mas insuficiente. Os responsáveis devem ser todos presos, Sobisch tem que renunciar, e Kirchner deve assumir a responsabilidade por suas ações.

O dia 9 tem que ser o primeiro passo de um plano de luta progressivo para terminar com a repressão e conseguir um aumento nacional aos docentes que iguale o piso salarial ao preço da cesta básica. Mas não podemos esperar que os dirigentes da CTA e da CGT impulsionem essa luta. Devemos realizar assembléias em todos os locais de trabalho, impor plenárias de delegados com mandato, para debater, resolver e concretizar os próximos passos do plano de luta.

O professor de Neuquén está morrendo por lutar por seu salário. A resposta do povo deve avançar até ficar claro que suas reivindicações não poderão ser detidas pela repressão.

Seria muito importante que as províncias em luta convocassem um Encontro Nacional por Salário e contra a Repressão, que ajudasse a coordenar as lutas e impor à CGT e à CTA um verdadeiro plano de luta por essas reivindicações.

 

TODOS À PARALISAÇÃO SEGUNDA-FEIRA, 9 DE ABRIL

 

PARALIZAÇÃO NACIONAL CGT-CTA, COM MOBILIZAÇÃO E PLANO DE LUTA

 

ASSEMBLÉIAS EM TODOS OS LOCAIS DE TRABALHO E PLENÁRIAS DE DELEGADOS COM MANDATO PARA VOTAR E ORGANIZAR A LUTA

 

VIVA A LUTA DOCENTE

 

PUNIÇÃO A TODOS OS RESPONSÁVEIS PELO ATAQUE AO DOCENTE DE NEUQUÉN

 

AUMENTO NACIONAL DE SALÁRIOS PARA TODOS, POR UM PISO SALARIAL IGUAL AO VALOR DA CESTA BÁSICA FAMILIAR

 

 

FOS – LIT-QI 

5/4/07

 

 

TODO APOIO E SOLIDARIEDADE À LUTA DOS TRABALHADORES ARGENTINOS

 

A Coordenação Nacional de Lutas – CONLUTAS – vem manifestar sua mais irrestrita solidariedade aos trabalhadores Argentinos, professores à frente, que lutam neste momento em seu país, em defesa da melhoria de seus salários e contra a repressão assassina que acaba de tirar a vida de um trabalhador – Carlos Fontealba – na província de Neuquen.

 

A reivindicação dos professores argentinos, por um salário digno, é a mesma reivindicação de todos os trabalhadores, do Brasil e da América Latina, que lutam por uma vida digna. Que enfrentam a política de rapina que as multinacionais praticam contra nossos países com a conivência de nossos governantes.

 

A agressão assassina que ceifou a vida do companheiro em Neuquen é parte da mesma política de criminalização e repressão implacável a todos os trabalhadores e movimentos sociais que lutam na América Latina em defesa de seus direitos e interesses. É a única resposta que podem dar governantes como Sobisch e Kirchner, cujo compromisso é apenas o de atender os interesses do imperialismo e das grandes empresas transnacionais.

 

Por todas estas razões afirmamos que a luta dos professores e dos trabalhadores argentinos é a mesma luta dos trabalhadores brasileiros e de todos os países da nossa região. Nos irmanamos em sua luta, pois é a nossa luta também. Reafirmamos, por outro lado, a opinião de nossa organização pela urgência de construirmos formas de coordenação de nossas lutas em nossa região. Se o inimigo nos ataca de forma coordenada em todos os nossos países, com a conivência de todos os nossos governos, os trabalhadores precisam também coordenar sua luta para enfrentá-los e derrotá-los.

 

Nossa solidariedade aos familiares e amigos do professor assassinado.

Nos somamos, por todas as formas que estiverem ao nosso alcance à luta de nossos irmãos argentinos.

 

Força, companheiros! Carlos Fuentealba está presente em nossa luta. E na luta venceremos!

 

São Paulo, 09 de abril de 2007

 

Coordenação Nacional da CONLUTAS

 

 

 

Confira nossos outros conteúdos

Artigos mais populares