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terça-feira, março 19, 2024

Ante as próximas eleições europeias

A União Europeia (UE) é uma máquina de guerra contra a classe operária e os povos da Europa

Temos que romper com a UE e o euro para conseguir uma mudança social e construir uma Europa dos trabalhadores!

Este manifesto vê a luz em plena batalha dos coletes amarelos franceses, o movimento popular que enfrenta o regime de Macron e questiona as desigualdades sociais. Esse questionamento ocorre no momento em que os capitalistas franceses, presos a uma crise mais global do modo de produção capitalista, atacam por todos os meios à classe operária e os setores populares, a fim de restaurar sua taxa de lucro.

A União Europeia, construída pelos e para os capitalistas, é um instrumento essencial para esse fim.

A luta dos coletes amarelos opõe-se objetivamente à UE e às suas políticas. E, além disso, se desenvolve na França, um dos países que mais pesa no funcionamento da EU, e na aplicação de brutais planos de austeridade em outros países europeus.

A situação na Grécia, o exemplo mais brutal

Alguns meses atrás a mídia anunciou com grande alarde que em 20 de agosto de 2018 a Grécia, finalmente, “saía do resgate”. Mas eles estavam mentindo, porque a Grécia foi transformada em um país semicolonial, onde todas as decisões importantes precisam da aprovação de Bruxelas e Berlim. Porque toda a sua economia está ao serviço do pagamento de uma dívida impagável que equivale a 188% do seu PIB.

A Grécia é o exemplo mais nítido e brutal de até onde a UE está disposta a ir para salvar os grandes bancos europeus e dar uma lição a um povo rebelde. Depois de oito anos e três “resgates”, o país foi saqueado e devastado. Os direitos trabalhistas foram cortados de maneira selvagem. O PIB caiu em 30%, os salários em 30% e as aposentadorias e pensões em 50%, após 14 cortes. O financiamento dos hospitais públicos diminuiu mais da metade e o desemprego supera os 20%. Em uma população de 11 milhões, mais de 500 mil jovens tiveram que deixar o país em busca de trabalho. Enquanto isso, Tsipras e Syriza, no governo, continuam implementando os planos de miséria da UE.

Mas se a Grécia tem sido o caso mais violento de políticas de ajuste, são os países da UE como um todo e especialmente aqueles da “periferia” que foram profundamente afetados.

A UE, uma máquina de guerra contra os trabalhadores e os povos

A UE mostrou-se como uma máquina de guerra social, sob a batuta do capitalismo imperialista alemão em aliança com o francês. Eles têm armas poderosas, o euro e o Banco Central Europeu – BCE, instrumentos com os quais selam sua hierarquia em relação a outros capitalismos europeus. Na ausência de moeda nacional, os países menos competitivos devem ajustar seus salários para evitar desequilíbrios externos.

A UE e o euro não são organismos ou moedas “neutros”, que podem ser apropriadas pelos povos. São, ao contrário, instrumentos do capital com os quais a classe operária deve acabar para deter a ofensiva capitalista e conseguir mudanças reais em suas condições de vida e trabalho.

Quando a crise financeira eclodiu, há 10 anos, as grandes potências europeias resgataram os seus bancos e evitaram o colapso recorrendo a enorme dívida pública, saqueando a periferia e atacando os serviços públicos, os salários e os direitos trabalhistas em seus países. As consequências são óbvias: cortes generalizados, privatizações e demissões no setor público (educação, saúde, etc), contrarreformas trabalhistas e da previdência, generalização do trabalho precário, cortes salariais e aumento insultante da desigualdade social.

Enquanto a UE foi a grande protagonista dos piores planos de ajuste e contrarreformas trabalhistas desde a Segunda Guerra Mundial, seus defensores a apresentam como um baluarte “democrático” diante da ultradireita. No entanto, a política da UE em relação aos refugiados e migrantes é tão xenófoba e racista como a que agora aplicam Salvini e Kurz à escala da Itália e da Áustria. Uma política baseada em centros de detenção, expulsões e subcontratação de trabalho sujo para ditaduras corruptas como a Turquia ou máfias como na Líbia.

A UE apoiou também a escandalosa repressão do Estado Espanhol contra o povo da Catalunha que deseja exercer o seu legítimo direito à autodeterminação. Esta repressão foi exercida graças à Constituição herdada do franquismo do Estado Espanhol.

De modo mais geral, a UE tem sido o instrumento das grandes potências imperialistas europeias para desenvolver a sua política externa, com os acordos econômicos para suas multinacionais, vendas de armas para regimes sanguinários e corruptos como a Arábia Saudita ou o Egito ou intervenções militares colonialistas como as francesas na África ou aquelas realizadas no âmbito da OTAN em solidariedade com os EUA.

A UE está passando por uma crise profunda

Apesar dos ataques aos direitos e conquistas sociais, os capitalismos europeus não conseguiram sair da crise. A Europa está imersa, há 10 anos, em uma longa depressão econômica. Sua “recuperação econômica”, anêmica e desigual, não tem sido sustentada por um ciclo de investimentos produtivos financiados pelos benefícios, mas pelo aumento da dívida. Agora, sem ainda ter se recuperado, uma nova recessão surge no horizonte e explodirá quando os lucros caírem, em um cenário de bolhas especulativas e aumento das taxas de juros.

Sobre este fundo econômico e social repousa a maior crise da UE desde a sua fundação. Os planos para fortalecer os poderes da UE sobre os estados foram deixados no congelador. A Alemanha é incapaz de disciplinar os sócios, enquanto a sua própria estabilidade política está em perigo. A França está agitada com a mobilização dos coletes amarelos, o que aumenta a instabilidade do regime Macron. A Grã-Bretanha, profundamente desestabilizada, prepara-se para deixar a UE sem saber o que acontecerá no futuro próximo. O Estado Espanhol é incapaz de resolver o problema catalão.

A onda generalizada de protestos na Hungria é a mais importante desde que Orban chegou ao governo em 2008. É, em primeiro lugar, uma luta contra a “lei da escravidão”, que autoriza os empresários exigir de seus trabalhadores até 400 horas extras ( 1 dia a mais por semana), para pagar em três anos. Mas também é uma luta contra um regime ultradireitista que sufoca as liberdades políticas e sindicais. É, finalmente, a ponta de lança de um crescente descontentamento que cresce e desestabiliza toda a Europa do Leste, um território semicolonizado por multinacionais alemãs.

O crescimento da ultradireita institucional

A crise econômica e social atingiu em cheio a classe trabalhadora, mas também a amplas camadas da pequena burguesia, e até enfrentou setores médios da burguesia com o capital financeiro. Nesta situação de crise social, a cumplicidade da burocracia sindical com os patrões e governos, bem como o desempenho da esquerda oficial, provocaram derrotas à classe trabalhadora, promovendo assim o direcionamento de parte dessas camadas em favor de “ultradireita institucional”.

Seu eixo central é a xenofobia, a islamofobia e o racismo contra a imigração, juntamente com um chauvinismo nacionalista que afronta a UE. Esta ultradireita é porta voz das reivindicações de setores da burguesia média do país, se apoia na radicalização da pequena burguesia e aproveita o agravamento das condições de vida entre os setores mais pobres e mais atingidos da população para instigar seu enfrentamento com os trabalhadores imigrantes, que dizem que são responsáveis ​​pela degradação social, exonerando seus verdadeiros culpados, os bancos e os grandes capitalistas.

São forças reacionárias que ocupam a ultradireita dos regimes existentes e são inimigos irreconciliáveis ​​da classe trabalhadora. Nós não podemos, no entanto, identificá-los com as forças nazifascistas no estilo da Aurora Dourada na Grécia, embora estes aproveitem a oportunidade para aparecer.

É importante notar o caráter principalmente retórico de seu confronto com a UE. Marine Le Pen, no segundo turno das eleições presidenciais de maio de 2017, anunciou que a França não deveria deixar a UE, mas renegociar os acordos com a Alemanha e que seu programa econômico tinha deixado de ser “incompatível” com o euro. O italiano Salvini (e Di Maio, do Movimento de Grillo) também não estão dispostos a colocar em risco a permanência da Itália na UE e no euro. E o mesmo pode ser dito de toda a ultradireita dos outros países.

A revolta húngara contra Orbán e seu regime demonstra os limites para a extrema direita em seu ascenso, e é o melhor exemplo de rejeição em massa que provoca uma vez que chega ao governo e aplica suas políticas reacionárias a serviço do capital

O novo reformismo

Ao longo destes anos, a acelerada decadência dos partidos social liberais europeus deu lugar ao surgimento de um novo reformismo, que se declara a favor da “refundação da UE”. Seu modelo foi, durante todo um período, Syriza. Nas eleições europeias anteriores, Tsipras era o herói e a referência de Podemos, Mélenchon, o Bloco de Esquerda português, Rifondazione Comunista ou o alemão Die Linke. O problema é que Tsipras, dois anos depois, para permanecer no euro e na UE, se tornou o novo sicário da Troika na Grécia.

No entanto, embora Tsipras tenha traído de forma covarde seu povo em um referendo de julho de 2015, Pablo Iglesias (Podemos) não hesitou em declarar que ele teria feito o mesmo: “É tristemente a única coisa que podia fazer” (16.07.15). Agora, os velhos amigos de Tsipras não se fotografam com ele porque ele não é mais uma chama eleitoral. No entanto, eles continuam mantendo a mesma estratégia de 2013.

Em 12 de abril de 2018, Iglesias (Podemos), Catarina Martins (Bloco) e Mélenchon (La France Insoumise) anunciaram em Lisboa uma campanha comum nas próximas eleições europeias e assinaram um manifesto conjunto, “Agora o Povo”. Este manifesto, que poderia ser assinado por qualquer socialdemocrata, não menciona nem uma vez as palavras classe operária, burguesia, imperialismo ou socialismo. Para seus signatários não há classes sociais, apenas “elites e povo”. Seu objetivo é limitado à recuperação do estado de bem-estar e para a promoção de políticas keynesianas, que não só é incompatível com o quadro de austeridade da UE e do euro, mas também representa uma via morta para resolver a crise do capitalismo. Os novos reformistas querem refundar a UE e excluem a saída do euro. Eles falam em modificar os tratados da UE e até mesmo uma possível desobediência os mais “radicais” entre eles (Francia Insumisa, que abandonou seu plano B de saída da UE). Mas não há desobediência possível dentro da UE. Por exemplo, ou submetem-se ao BCE ou recuperam a soberania monetária e emitem a sua própria moeda. No caso de Podemos e do Bloco Português, esta política se encaixa perfeitamente com o seu principal objetivo: integrar um governo burguês de coalizão com Sánchez (PSOE) e Costa (PS), no âmbito da UE e do euro.

Agindo desta forma, estes partidos neorreformistas entregam a bandeira da luta contra a UE para a ultradireita, ajudando-os a capitalizar o legítimo repúdio popular à Europa do capital.

Por isso não estamos de acordo com as forças de extrema esquerda que se opõem a ruptura com a UE e o euro dizendo que esta seria uma saída “nacionalista” que “faz o jogo da ultradireita”. Este argumento falso funde a justa rejeição popular à UE com o chauvinismo e xenofobia da ultradireita, grosseiramente deturpando a realidade e dando cobertura de esquerda aos neorreformistas defensores da UE e do euro.

Um programa para uma mudança social real

Um programa de mudança real deve conter as seguintes medidas:

– A recuperação e melhoria substancial dos serviços públicos para que sejam gratuitos, públicos e de qualidade, anulando as privatizações por meio de sua expropriação sem indenização; a anulação de contrarreformas trabalhistas e previdenciárias e o fim da do emprego precário; garantir um emprego decente e um salário decente para cada um, o que exige a expropriação do capital e o controle dos meios de produção pelos trabalhadores associados.

– Assegurar o direito ao aborto gratuito, a igualdade das mulheres e os direitos da juventude trabalhadora; acabar com o racismo e a xenofobia institucional; garantir a liberdade de circulação e instalação para os trabalhadores migrantes.

– Acabar com a deriva autoritária e repressiva dos Estados e assegurar o pleno exercício dos direitos e liberdades democráticas. Dissolver as forças especiais de repressão e promover a autodefesa popular e operária diante do Estado e as agressões fascistas e racistas. Garantir o exercício do direito à autodeterminação nacional da Catalunha e das nações sem Estado.

– Deter a destruição do meio ambiente e enfrentar as mudanças climáticas por meio de uma transição ecológica cuja primeira condição de sucesso é a socialização das empresas energéticas e o controle popular e operário dessa transição.

– Sair da OTAN, desmantelar as bases norte-americanas na Europa e as bases europeias no exterior. Acabar com as intervenções colonialistas e retirar as tropas europeias do estrangeiro. Deixar sem efeito os tratados colonialistas, como o sistema do franco CFA na África, criado para o benefício do capitalismo francês. Deter a venda de armas. Permitir o direito à autodeterminação de todos os povos oprimidos.

Um programa incompatível com a UE e o euro

Um programa com essas características é impossível de aplicar sem anular a dívida pública, expropriar os bancos e grandes empresas, socializar o investimento e estabelecer o controle dos trabalhadores sobre a produção. Estas medidas só podem ser realizadas com base numa mobilização geral e sustentada das massas e são totalmente incompatíveis com a adesão à UE e ao euro. A sua implementação exigirá que o poder passe para as mãos de Governos dos Trabalhadores, oriundos de novas instituições, apoiados em uma rede de assembleias e comités populares organizados nos locais de trabalho e de moradia do povo, com base em delegados revogáveis ​​em todos os momentos.

O desempenho selvagem da UE na Grécia mostra que a ruptura revolucionária de um país com a UE vai enfrentar com toda a certeza, desde o início, a sabotagem mais brutal. Portanto, será necessário adotar medidas básicas de autodefesa, como o fechamento dos mercados financeiros, a conversão dos ativos e passivos financeiros em uma nova moeda não conversível ou o monopólio estatal do comércio exterior. Só assim a economia poderá se reorganizar contra a sabotagem externa, enquanto a solidariedade internacional se articula e novas vitórias incorporam novos países à construção de uma Europa dos trabalhadores e dos povos, dos Estados Unidos Socialistas da Europa. Não há solução na escala de um país. Ou o processo revolucionário se estende a outros países ou estará fadado à derrota.

Alguns vão criticar que este programa não é “realista”. Em certo sentido, estão certos, porque não pode ser aplicado por procedimentos “parlamentares” nem pelo “diálogo social” dos burocratas sindicais. É um programa para realmente mudar a vida da classe trabalhadora, o que significa que exigirá grandes mobilizações e duros enfrentamentos de classe.

Organizar a luta comum

Lutar por esse programa é lutar para agrupar o sindicalismo combativo contra a burocracia e reconstruir o movimento sindical em novas bases; impulsionar a mobilização baseada na democracia operária e na unificação das lutas; organizar a solidariedade internacionalista com as lutas e dar respostas conjuntas em nível europeu; fortalecer a Rede Sindical Internacional.

Lutar por esse programa é, na França, lutar pela unificação entre os coletes amarelos, os operários das fábricas e outros setores sindicalizados e a juventude estudantil para organizar uma greve geral que derrube Macron e abra caminho para as reivindicações. E fora da França, reforçar a solidariedade com os coletes amarelos.

Lutar por esse programa é lutar para construir e organizar uma força revolucionária que o defenda internacionalmente e em cada país.

Maio de 2019

Assinam :

Sophie (Birô do Secretariado Jovem do NPA Jovem) França

Thomas (Birô do Secretariado Jovem do NPA Jovem) França

Philippe (Comitê Executivo e Conselho de Política Nacional do NPA, Tendência Claire) França

Gaston (Conselho de Política Nacional do NPA, Tendência Claire) França

Marie (Conselho de Política Nacional do NPA, Tendência Claire) França

Serge (Conselho de Política Nacional do NPA, Tendência Claire) França

Georg H. (ISO) Alemanha

Laura Requena (Corriente Roja-LITqi) Estado Espanhol

David Pérez (Corriente Roja-LITqi)  Estado Espanhol

Francesco Ricci (PdAC-LITqi) Itália

Fabiana Stafanoni (PdAC-LITqi) Itália

Carlos Ordaz (Em Luta-LITqi) Portugal

Tradução: Lena Souza

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