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sexta-feira, março 29, 2024

De «utopia» a urgência, o programa trotskista continua vivo

Em 17 de novembro passado, depois do (e devido ao) bom resultado eleitoral da Frente de Esquerda dos Trabalhadores-Unidade (FIT-U),  Infobae publicou um artigo da jornalista peronista Claudia Peiró onde ela declara o trotskismo como uma “utopia virginal” e recorre a uma série de desqualificações baseadas em falsidades sobre a corrente à qual pertencemos, e contra seu fundador, León Trotsky. Por sua vez, Infobae abriu o debate para que figuras da esquerda respondessem. Algumas o fizeram defendendo as posições históricas do trotskismo e polemizando com argumentos parcialmente corretos contra as tergiversações de Peiró.

Por: PSTU-Argentina

Não é o objetivo desta nota responder a todas as falsificações de Peiró mas focar em desenvolver alguns aspectos centrais do programa e a estratégia do trotskismo e em particular da visão de nossa corrente, o morenismo e de nosso partido internacional: a Liga Internacional dos Trabalhadores.

Nossos objetivos

A atual pandemia e a continuidade da crise econômica internacional revelaram a incapacidade do capitalismo para resolver as necessidades mais urgentes da humanidade. Diante da morte de milhões de pessoas pela COVID-19, o crescimento brutal da miséria, da fome, das opressões e da destruição do planeta, milhares de trabalhadores/as se perguntam qual é a saída. E a realidade é que não há segredos e repetimos cada vez que podemos: nossa perspectiva histórica é convencer os setores mais avançados da classe operária para o programa da Revolução Socialista Internacional, única forma de acabar com a exploração e as opressões, produtos do capitalismo. Para isso, é imprescindível uma ferramenta, uma organização internacional centralizada que golpeie como um só punho todos os países, províncias e cidades onde se encontre.

Tudo o que vier a acontecer depois depende de nossa capacidade para cumprir, mas o objetivo é esse. Talvez essa parte tenha sido esquecida por Peiró, que fala das lutas pessoais entre Trotsky e Stalin para terminar igualando leninismo e trotskismo com o estalinismo em sua desqualificação.

Mas, ao contrário, o estalinismo foi a expressão da contrarrevolução no interior do Estado operário revolucionário. Por isso precisou assassinar mais de 800 mil revolucionários e quase todo o CC (Comitê Central) bolchevique para se impor. Stalin foi o líder da casta burocrática que se desenvolveu na URSS a partir do isolamento da Revolução e do atraso do país. A serviço da defesa de seus privilégios desenvolveu a nefasta teoria do “socialismo em um só país” e da “coexistência pacífica com o imperialismo”.

Trotsky e seus seguidores expressaram a batalha contra a burocratização, em defesa da democracia operária e pela revolução mundial tal como propunha a Terceira Internacional. Trotsky foi junto com Lenin, um dos principais dirigentes da Revolução Russa e o organizador do Exército Vermelho de operários e camponeses que derrotou militarmente a contrarrevolução burguesa e imperialista. Também enunciou a Teoria da Revolução Permanente, que explica a mecânica da revolução mundial e a combinação das revoluções democráticas e políticas nacionais com as socialistas. Mas Trotsky argumentava que sua maior conquista foi a fundação da Quarta Internacional em 1938. Nas palavras de Martín Hernández: “para Trotsky, se a IV Internacional não fosse construída, o estalinismo e o fascismo acabariam com todo tipo de vestígio de programa e organização revolucionária. Quando, em 1938, Trotsky construiu a IV não o fazia com a esperança de ganhar, naquele momento, as massas para esse programa, mas com o objetivo de poder intervir no próximo, e inevitável, ascenso revolucionário com um programa e uma organização revolucionária internacional.”(1)

De onde viemos

Trotsky foi assassinado em 1940 por ordem de Stalin, os aliados ganharam a Segunda Guerra e o pós-guerra não cumpriu as expectativas trotskistas.  Os partidos comunistas estalinistas se fortaleceram por uma vitória popular que não correspondia a eles: a derrota do nazismo em Stalingrado ocorreu pelo apoio popular ao Exército Vermelho, não graças a Stalin, mas apesar dele. Os partidos trotskistas continuaram na marginalidade, perseguidos e caluniados pelo imperialismo e pelos PC (Partidos Comunistas).

 “O Movimento Trotskista foi heroico por ter lutado durante muito tempo para manter vivo o programa da revolução proletária contra aparatos tão poderosos como o fascismo e o estalinismo. Mas, tal como assinalou Marx, ‘a existência determina a consciência’ e, no caso do trotskismo, uma existência marginal levou, na maioria dos casos, a todo tipo de processos degenerativos e ao abandono, na prática, do programa revolucionário.” (2)

A IV Internacional pós Trotsky sob a direção de Ernest Mandel e Michel Pablo degenerou no revisionismo e terminou capitulando ao estalinismo e às direções nacionalistas burguesas e pequeno burguesas que encabeçaram os processos revolucionários do pós-guerra. No início dos anos 40, um jovem argentino chamado Nahuel Moreno, estava convencido que tinha que levar o trotskismo para a classe operária, para ganhar seus melhores lutadores e construir com eles uma direção revolucionária. Assim fundou a corrente que com o tempo daria lugar à atual Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT-QI). Seu objetivo não foi outro senão dar continuidade ao programa da revolução internacional e do governo dos trabalhadores, combatendo todas as organizações oportunistas. Foram construídos partidos de vanguarda em toda a América Latina e em vários países da Europa, para dar aos trabalhadores uma ferramenta para lutar pela revolução. As diferentes burocracias (e o peronismo na Argentina) foram combatidos nos sindicatos, lutando pela democracia de base, para colocar os sindicatos a serviço dos trabalhadores e da Revolução Socialista e não de sindicalistas empresários. A fraude da Dívida Externa e a recolonização de nossos países por parte do imperialismo ianque foram denunciadas. Tudo isto foi possível porque nosso guia foi o programa da Quarta Internacional de León Trotsky e a luta pela sua reconstrução.

Para onde vamos

Hoje em dia, diversas organizações reivindicam a tradição do trotskismo em seu caráter de força política classista e anti-imperialista (como os partidos da FIT-U, o Nuevo MAS e Política Obrera), mas se adaptaram ao regime democrático burguês e à sua legalidade, priorizando a atividade eleitoral e a conquista de cargos parlamentares. Isso os levou a deixar de lado a principal estratégia: a luta pelo poder para a classe operária mediante uma revolução socialista e a construção do partido revolucionário internacional para isso. Por essa razão, embora possamos estar juntos em algumas lutas e organizar frentes nos sindicatos para tirar a burocracia, não é possível construir um programa e uma organização comum hoje, ainda que todos nos reivindiquemos “trotskistas”.

Os discursos sobre o fracasso do socialismo se chocaram com um século XXI cada vez mais instável, com revoluções, guerras e golpes de Estado em todo o mundo. É impossível dar uma saída à pobreza crescente da população mundial se não for através da planificação socialista centralizada da economia contra o caos capitalista. A LIT e o PSTU estão a serviço de uma revolução para consegui-lo.

Notas:

(1) Hernández, M. Algunas reflexiones sobre el morenismo, 2007, en: https://litci.org/es/algunas-reflexiones-sobre-el-morenismo/

(2) Idem.

Tradução: Lilian Enck

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