Crônica do Encontro pela Palestina em Madri da iniciativa Um Estado Democrático (ODS)
Construindo uma Palestina democrática: a luta pela descolonização e pela emancipação da classe trabalhadora.
De 7 a 8 de novembro de 2025, a Iniciativa Um Estado Democrático organizou uma conferência política intitulada «Palestina do amanhã: um Estado Democrático para todos os seus cidadãos», com o objetivo de “progredir em direção à transformação desta visão descolonial em um movimento político para coordenar os esforços dos palestinos e judeus, da Palestina e da diáspora, e aliados mundialmente”.
Segundo seus organizadores: “Esta não foi apenas uma conferência acadêmica ou educativa. Foi uma conferência política com mais de 25 palestrantes, onde a maioria dos falantes eram palestinos da Palestina e da diáspora”.
Duas companheiras da Corriente Roja participamos do encontro e interviemos no debate do primeiro dia. E nele esteve presente também como orador, nosso companheiro Joao Conceicao, do PSTUB-seção da LIT no Brasil- que falou aos presentes como membro de Estudantes em Solidariedade com o Povo Palestino e da organização da juventude Rebeldia. Em sua intervenção explicou como se organizou nesses mais de dois anos o ativismo estudantil em todo o mundo na luta contra o genocídio e como a indignação moral que inicialmente impulsionou os estudantes começou a se transformar em compreensão política.
No Brasil, este processo alcançou um ponto de inflexão com a decisão da Universidade de São Paulo de suspender a cooperação com a Universidade de Haifa. Isso não foi resultado de uma iniciativa administrativa nem de pressão diplomática; foi alcançado por meio da mobilização.
Acreditamos que o encontro expressou que há uma necessidade e uma tentativa de organizar os diferentes grupos palestinos, o ativismo e as diversas organizações palestinas para buscar uma saída depois que esses dois anos de genocídio deixaram mais claro, ainda que se possa, que a solução dos dois estados defendida pelos governos e uma parte da esquerda é uma utopia reacionária.
Tanto as palestras quanto o debate entre os participantes mostraram o acordo com uma única Palestina livre do rio ao mar, em sintonia com a histórica consigna depois abandonada pela OLP: Por uma Palestina laica, democrática e não racista.
Houve um acordo sobre a necessidade de desmantelar o Estado de Israel, porquanto se trata de um projeto colonial cujo objetivo é apagar do mapa o povo palestino e estender seu domínio desde o rio Nilo até o Éufrates.
Também sobre o legítimo direito que assiste aos palestinos na diáspora para retornar a um único estado palestino que deveria ser democrático e secular. Um estado que proteja o direito de culto das distintas confissões religiosas e onde possam permanecer apenas aqueles judeus que decidam renunciar ao sionismo e aos privilégios que lhes assistem hoje por ter cidadania israelense.
Como diz a própria declaração final do encontro: “Não se trata de democratizar Israel, ou de realizar um estado binacional. Trabalhamos para desmantelar o estado de colonos que discrimina com base na identidade, e estabelecer sua antítese: um estado palestino que vê sua sociedade como cidadãos.”
Também houve acordo sobre a necessidade de diálogo entre as forças seculares e as forças islamistas, hoje majoritárias na região.
Essas posições foram levantadas com uma perspectiva de luta regional, o que significa o compromisso de lutar não apenas pela libertação da Palestina, mas também do Líbano, Jordânia ou Síria. Nesse caminho, a resistência palestina em todas as suas formas, incluindo a resistência armada, foi reconhecida como legítima e como uma necessidade enquanto existir o Estado de Israel.
Por todos esses elementos, consideramos que a conferência foi um ato muito progressista, embora tenha tido algumas limitações e contradições que queremos continuar debatendo com seus impulsionadores.
Uma delas é que esteve quase ausente a perspectiva de classe. Apesar do discurso crítico com o capitalismo, com os governos imperialistas e com os próprios governos árabes da região, não vimos uma preocupação de como organizar a classe trabalhadora, a juventude e o povo pobre, na luta pela libertação da Palestina; algo que desde a LIT-ci consideramos imprescindível.
Apenas a classe trabalhadora —junto com seus aliados e os movimentos sociais— tem a capacidade de deter o sistema que sustenta a ocupação. Quando os estivadores se negam a carregar armas, como na Itália, o impacto é imediato. Por isso, o próximo passo do movimento deve ser estabelecer vínculos com sindicatos, federações de trabalhadores e lutas sociais.
Em segundo lugar e apesar das críticas tanto à ONU quanto a outras instituições por seu papel de cúmplices do genocídio, alguns palestrantes defenderam a necessidade de continuar trabalhando de dentro dessas instituições para avançar em direção a um único estado palestino a partir de alcançar pequenas conquistas do território por meio de reformas legislativas ou de outro tipo.
Nos parece que esta é uma visão errada, pois embora se possa e deva pressionar as instituições, suas decisões se enquadram em um contexto político e econômico mais amplo que permanece intacto.
A luta por uma Palestina democrática está vinculada à luta pela transformação social em escala global.
Por último, pensamos que faltou explicar o importante papel que sempre teve e continua tendo a mulher palestina. As mulheres palestinas têm sido uma força fundamental na resistência, com uma história que abrange desde a luta armada até a resistência pacífica e a preservação cultural.
Desde a mais ampla unidade de ação com todas aquelas pessoas e organizações que defendem uma Palestina livre do rio ao mar, acreditamos que se faz necessário formular um programa político que vincule a luta imediata contra o genocídio com a luta mais ampla contra a ordem capitalista que o produz.




