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Estado Espanhol

Por que a II República foi derrotada?

(Eingeschränkte Rechte für bestimmte redaktionelle Kunden in Deutschland. Limited rights for specific editorial clients in Germany.) Spain Madrid : Celebrating supporters of the Popular Front marching through the streets of the city after the proclamation of the republic following the municipal elections – 1931 – Vintage property of ullstein bild (Photo by ullstein bild/ullstein bild via Getty Images)

Juan R.

junho 30, 2025

Este artigo faz parte da série “O franquismo não morreu com Franco”, que estamos publicando ao longo de 2025 para marcar o 50º aniversário da morte do ditador.

A Segunda República foi uma experiência breve, mas que deixou uma marca inextinguível em nossa história. Sua bandeira ainda é comumente hasteada em mobilizações sociais, associada ao progresso, à democracia e à esquerda. A Corriente Roja é uma organização orgulhosamente republicana, e justo por isso interpretamos criticamente a experiência da década de 1930. Aqueles que não estudam história com rigor estão fadados a repetir os mesmos erros. Para que a Terceira República seja definitiva, há lições a aprender.

Por: Juan R.

A chegada da Segunda República

O final do século XIX e o início do século XX na Espanha foi marcado pelos conflitos sociais dos operários, lutas camponesas e do trabalhador agrícola, pela ebulição das diferentes nacionalidades dentro do Estado e a luta contra o clero e a Monarquia. A Revolução Russa de 1917 encontrou forte eco em nosso país, alguns exemplos foram o “Triênio Bolchevique”[1] na Andaluzia e a greve da Canadiense[2] na Catalunha. Durante esse período, a burguesia recorreu decisivamente à repressão mais violenta e implacável, utilizando armas de fogo e assassinando centenas de ativistas operários, como Salvador Seguí.

Finalmente, com a intenção de controlar completamente a situação, o exército, em aliança com o rei Afonso XIII, deu um golpe de Estado em 1923, estabelecendo uma ditadura liderada por Miguel Primo de Rivera. No entanto, ao longo de seus anos de existência, a ditadura não conseguiu esmagar a oposição, e o novo regime ruiu assolado pela instabilidade. A crise econômica de 1929 atiçou ainda mais o descontentamento e a agitação constante, e finalmente, em 1930, o ditador renunciou, inaugurando um breve período conhecido como “ditadura branda”.

O Rei, que havia vinculado seu futuro à ditadura, estava severamente desacreditado. À medida que o movimento operário e as lutas sociais cresciam, o republicanismo se espalhava com força crescente, levando até mesmo a uma tentativa de golpe, o levante de Jaca. Esse republicanismo, politicamente constituído como um “comitê revolucionário”, apesar de baseado na agitação operária, era liderado por tendências políticas da pequena burguesia progressista, que arrastava o PSOE e a UGT. É importante ressaltar que essas organizações têm pouco a ver com o que são hoje, que se tornaram social-liberais. Naquela época, embora reformistas, eram organizações operárias que ainda falavam de socialismo e revolução, ainda que de forma inconsistente.

Finalmente, as eleições de 12 de abril de 1931, que haviam sido concebidas como um plebiscito sobre a Monarquia, produziram um resultado favorável aos candidatos republicanos-socialistas nas capitais de quase todas as províncias. Enquanto o Rei estava no exílio, a Segunda República foi proclamada pelas Câmaras Municipais.

Seis anos da República

Após décadas de agitação operária e social, após a Monarquia e a ditadura, a República foi recebida com alegria e esperança generalizada. Grandes expectativas surgiram em relação às condições de trabalho e à reforma agrária, à democracia e à laicidade, ao reconhecimento das nacionalidades dentro do Estado e à descolonização na África, à educação e aos direitos das mulheres.

No entanto, o novo regime logo revelaria seus limites sobre estas demandas, e o entusiasmo inicial gradualmente se transformou em desencanto. A Segunda República caracterizou-se por falhas em tudo. Entre revolução e reação, tentou-se um meio-termo que atenuasse o conflito entre classes… para finalmente, em momentos cruciais, aliar-se à reação, por ação ou omissão.

O exemplo mais claro disso foi sua política em relação às forças policiais e ao exército. Em nenhum caso, tomou medidas decisivas contra os conspiradores. Não desarticulou a Guarda Civil reacionária, mas criou uma força policial paralela, mais em sintonia com o novo regime, a Guarda de Assalto.

Em todos os aspectos, a situação era semelhante: a reforma agrária foi tão tímida que, na Extremadura, cansados ​​de esperar, os camponeses ocuparam as terras. A autonomia foi aprovada para a Galiza, o País Basco e a Catalunha (a da Andaluzia foi interrompida pelo golpe de Estado), mas não houve autodeterminação nem descolonização do Marrocos e do Saara. A Educação laica avançou, mas a Igreja manteve uma posição predominante. As reivindicações dos trabalhadores permaneceram sem resposta, levando a inúmeras greves.

Mesmo com os generais de extrema direita que acabaram por derrubá-la, a República foi condescendente. Em 1932, houve uma primeira tentativa de golpe fracassada, liderada por Sanjurjo, que foi perdoado e pôde participar da conspiração subsequente. Os outros generais que desempenharam um papel fundamental no golpe de 1936 nem sequer foram expulsos do exército; foram simplesmente transferidos para postos distantes. Mola foi para Navarra, Franco para as Ilhas Canárias.

Em contraste, desferiu toda a sua fúria contra a classe operária mobilizada, e não apenas durante os sombrios dois anos de governo de direita. Houve momentos-chave que enterraram as esperanças no novo regime. Em 1933, reprimiu brutalmente a revolta dos diaristas em Casas Viejas (Cádiz). Em 1934, em um contexto marcado pela ascensão dos nazistas ao poder na Alemanha, a Revolução Asturiana, desencadeada contra a ameaça fascista representada pela ascensão ao poder do extremista de direita Gil Robles, da CEDA – Confederação Espanhola de Direitas Autônomas, foi afogada em sangue.

Assim, se a Segunda República não contava com a simpatia dos grandes proprietários de terras, industriais e banqueiros gradualmente perdeu o apoio da classe trabalhadora. À medida que a experiência republicana avançava o hino de Riego [Hino da Segunda República Espanhola] para entoar “A Internacional” ou “Às Barricadas” era cada vez mais vaiado, e bandeiras republicanas arrancadas para serem substituídas por bandeiras vermelhas ou vermelho-pretas.

A guerra civil

O projeto reformista republicano não agradou a quase ninguém, e a Guerra Civil marcou a crise final de todas as tensões acumuladas, um ato final tão heroico quanto trágico. Após a vitória da Frente Popular nas eleições de fevereiro de 1936, as grandes massas operárias entraram em ação, libertando imediatamente os milhares de presos políticos que definhavam na prisão. A situação era insuportável para a burguesia, assustada com a possibilidade de uma nova Revolução. Imediatamente, os generais facciosos começaram a preparar o golpe. Apesar da conspiração ser um segredo aberto, a República não tomou medidas para impedi-la. Uma vez iniciada, não conseguiu combatê-la de forma consequente.

Após o golpe de Estado de 1936, a República retirou armas da classe operária e continuou a minar suas conquistas mais sentidas, como as coletivizações da revolução social que havia sido desencadeada. Sevilha é um bom exemplo disso.

Diante da iminência do golpe, o governo republicano concentrou suas armas em quartéis localizados em áreas nobres da cidade para evitar que caíssem em suas mãos durante o previsível ataque da multidão aos quartéis e delegacias de polícia em seus bairros. Com o exército sublevado, a mesma delegação do governo republicano evacuou a massa de pessoas que cercava o quartel, permitindo que as tropas golpistas se mobilizassem facilmente. O prefeito havia declarado que “preferia uma ditadura de botas militares a uma de alpargatas” e, diante do avanço fascista, abriu as portas da Prefeitura. O governador militar estava ciente do plano de revolta e nada fez para impedi-lo, transferindo sua autoridade para Queipo sem resistência.

O que o governo republicano fez foi desmantelar as conquistas revolucionárias impulsionadas pela classe operária. Diante do golpe e da permissividade republicana, quem freou o fascismo foi a classe operária organizada. Nessa explosão, uma verdadeira revolução social eclodiu em todos os níveis. Milícias foram formadas por todos os partidos ou sindicatos, indústrias e terras foram expropriadas e colocadas em produção sob controle operário, e grandes hotéis de luxo foram transformados em cozinhas comunitárias e hospitais. Até governos protorrevolucionários foram formados, como o Conselho de Defesa de Aragão e o Comitê Central de Milícias Antifascistas.

Antes de Franco nos exterminar, a República já havia dissolvido tudo isso. O antigo exército foi restaurado com seu código militar reacionário, dissolvendo as milícias; a indústria e o comércio foram tirados das mãos dos operários; as mulheres não podiam mais ser milicianas e foram novamente confinadas à função de donas de casa; o exército republicano, sob influência stalinista, invadiu Aragão, dissolvendo os coletivos e acabando com o Conselho de Defesa.

Em toda essa política contrarrevolucionária da República, os líderes do PSOE, da UGT e, especialmente, do PCE, sob o comando de Stalin, foram protagonistas proeminentes. Infelizmente, sob a pressão de manter a “unidade antifascista”, até mesmo a maioria da liderança da CNT e do POUM foram seguidistas. Durruti, a única figura importante que se revoltou energicamente contra o governo da Frente Popular, morreu cedo demais. Os bolcheviques-leninistas (trotskistas) eram pequenos demais para desempenhar um papel decisivo. 

Centralizar e coordenar o esforço de guerra era certamente uma necessidade imperativa. Mas essa centralização ocorreu por meio da restauração da ordem burguesa e não pelo desenvolvimento da revolução social em curso. O entusiasmo que tinha tomado conta da classe operária, que lutou até a morte, detendo com sucesso o fascismo nas principais cidades e avançando suas colunas de milícias na ofensiva em territórios controlados pelos golpistas nos estágios iniciais da guerra, foi sufocado pelo governo republicano. À medida que a classe operária era atacada, seu espírito de luta enfraquecia e a frente se desintegrava. As razões para dar a vida, lutar até o fim, foram cada vez mais perdidas, e os melhores quadros da classe operária morreram ou foram presos.

A gota d’água foram os eventos de maio de 1937. O governo republicano tentou retomar o controle da Companhia Telefônica de Barcelona, ​​que ainda estava sob o controle dos/as trabalhadores/as. A classe operária respondeu à provocação e a cidade foi coberta por barricadas. A atmosfera revolucionária do verão anterior retornou e a vitória foi novamente possível. Mas os principais líderes operários (da CNT, com a colaboração do POUM) pediram calma e fizeram todo o possível para salvaguardar o governo republicano. A classe operária, mais uma vez desorientada, acabou recuando, esgotando suas energias. Aproveitando a oportunidade, o governo republicano reprimiu os setores revolucionários. Quando as tropas de Franco tomaram Barcelona, ​​a prisão Modelo continha mais antifascistas (anarquistas, membros do POUM e trotskistas) do que fascistas. Pouco mais precisa ser acrescentado.

A grande lição para a atualidade é que não há meio-termo entre revolução e reação. A tensão de classes, quando se aguça, destrói qualquer tentativa de equidistância. Como se gritava nas manifestações: “Não há outro caminho, ou com os patrões, ou com a classe operária”. A Terceira República será operária e socialista, ou certamente será efêmera e instável, como foram as duas anteriores.


[1] Triênio Bolchevique (1918-1920) – conflitos sociais na zona rural da Andaluzia no pós-guerra, sob efeito da Revolução Russa, de 1917, ndt;

[2] Referência a greve na Canadiense (empresa de eletricidade) iniciada em 19 de fevereiro de 1919 pela CNT, na Catalunha, que após 44 dias, mesmo com a prisão de seu dirigentes e quase 3 mil grevistas obteve o Decreto de jornada de 8 horas de trabalho, colocando o país entre os primeiros a tender esta demanda internacional, ndt;

Tradução: Rosangela Botelho

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