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COP30

COP 30: A farsa da transição energética sob o comando do capital

Lena Souza

novembro 6, 2025

A COP 29, realizada no Azerbaijão em dezembro de 2024, ficou marcada como mais uma vitória dos combustíveis fósseis[1]. Enquanto as catástrofes climáticas se multiplicavam pelo planeta, a conferência foi dominada por lobistas da indústria petrolífera, que superaram numericamente as delegações de muitos países pobres. Em vez de uma eliminação acelerada dos fósseis, foram assinados compromissos genéricos, que nem de longe poderia traçar o caminho da redução de emissão de gases de efeito estufa (GEE).

Como era de se esperar a exploração de petróleo se intensificou em 2025, já que o interesse no lucro, dos ricos, está muito acima da necessidade dos bilhões de trabalhadores/as, juventude, mulheres, negros/as, indígenas, ou seja, a maioria da população do planeta, pobre e oprimida, que recebe todos os impactos da crise ambiental provocada pelo aquecimento global.

Escalada na produção de petróleo

Apesar do comprometimento em palavras de vários países na redução das emissões de gases de efeito estufa, a produção de petróleo aumenta a cada ano. O resultado estão nos números divulgados AIE (Agência Internacional de Energia): “A produção de petróleo deverá atingir uma média de 105,8 milhões de barris de petróleo bruto por dia em 2025, 2,7 milhões de barris a mais do que em 2024. Em 2026, a produção global deverá atingir 107,9 milhões de barris de petróleo por dia, um aumento de 2,1 milhões”.[2]

Plano de aumentar em 120% até 2030

Acompanhando a produção, a exploração de combustíveis fósseis no mundo atingiu níveis recordes e segue em franca expansão, revelando o abismo entre o discurso climático e as práticas reais. Segundo o relatório Production Gap 2025, citado pelo portal Click Petróleo & Gás[3], os países planejam produzir até 120% mais petróleo, gás e carvão, até 2030, do que seria compatível com o limite de aquecimento global de 1,5 °C, e 77% acima do cenário de 2 °C. Dos 20 maiores produtores, 17 pretendem ampliar a extração e 11 já revisaram suas metas para cima desde 2023.

Petróleo na Amazônia Não!

Essa expansão do extrativismo fóssil ganha contornos ainda maiores e graves na Amazônia, que se tornou uma das novas fronteiras globais do petróleo. Segundo levantamento da InfoAmazonia[4], quase 20% das reservas identificadas entre 2022 e 2024 estão localizadas na região amazônica, e centenas de blocos exploratórios  invadem territórios indígenas, unidades de conservação e zonas de grande biodiversidade. Essa realidade, por um lado, acelera a destruição de florestas, contamina rios e compromete o equilíbrio climático e, por outro, brutaliza ainda mais a dominação sobre os povos originários e comunidades tradicionais, cuja existência depende da preservação de seus territórios e ecossistemas.

A exploração de petróleo na margem equatorial, atrai as grandes petroleiras e capitais estrangeiros que apenas veem na Amazônia um reservatório de lucro fóssil e está se tornando o campo de uma nova corrida imperialista por energia, deixando para trás destruição ambiental, violência territorial e a erosão da soberania dos povos da região.

Rumo ao colapso

No Brasil, essa realidade é muito evidente e desnuda a grande contradição: o governo que vai sediar a COP30 expande o pré-sal e a exploração da Margem Equatorial. A corrida por petróleo, gás e carvão, travestida de desenvolvimento e soberania energética, é na verdade a reafirmação de um modelo colonial que empurra o planeta para o colapso em nome do lucro e revela cada vez mais a choque entre o sistema capitalista e a preservação do planeta e da maioria da população.

A devastação da Amazônia não afeta apenas os países que compartilham esse ecossistema — sobretudo o Brasil —, mas compromete a estabilidade climática mundial. Cada poço perfurado na floresta é um golpe contra os mecanismos naturais que regulam a temperatura e o ciclo das chuvas do planeta.

“Transação Energética”

Investimento em energias limpas têm como objetivo o lucro

Por outro lado, como para o capital o limite é o lucro, em 2025, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), os investimentos em energias limpas — solar, eólica, redes de transmissão e distribuição e baterias — devem ultrapassar 2,2 trilhões de dólares, quase o dobro do que se investe em petróleo, gás e carvão[5].
Para quem analisa os dados de forma ingênua, o aumento dos investimentos em energia limpa pode parecer um sinal de consciência ecológica das elites e dos grandes investidores do planeta. Mas isso é uma ilusão. Não há compromisso ambiental real, há apenas estratégia de lucro.

Fingindo responsabilidade ambiental

O capital vai onde há retorno rápido, e as energias chamadas “limpas” viraram um novo negócio bilionário. Com a queda dos custos da energia solar, a expansão da eólica e os generosos subsídios estatais, os bancos, fundos e petroleiras correram para abocanhar esse mercado. São os mesmos que encheram os bolsos com petróleo e carvão que agora se vestem de verde, fingindo responsabilidade ambiental.

O que realmente estão buscando não é a resolução da crise ambiental, mas o controle das novas cadeias globais de energia e mineração. Os poderosos competem por quem vai dominar o lítio, o cobre e o cobalto do futuro. A chamada “transição energética” , levada a cabo pelo sistema capitalista não passa de uma reorganização do saque, concentração de poder e exploração dos povos. Uma “transação” para obter mais lucros

Enquanto isso, as emissões continuam crescendo, o desmatamento avança e o aquecimento global se acelera. As empresas não estão abandonando o petróleo, estão lucrando dos dois lados: explorando combustíveis fósseis e, ao mesmo tempo, se apresentando como salvadoras do clima utilizando as mesmas práticas de pilhagem de terras, destruição ambiental e exclusão social.

Explosão da mineração

E, para sustentar essa corrida “verde”, cresce o extrativismo mineral sobre os países empobrecidos. Lítio, cobre, níquel, cobalto — todos indispensáveis para as baterias e turbinas — estão sendo arrancados da América Latina, da África e da Ásia à custa da destruição e da violência. No Chile, na Bolívia e no Peru, a mineração de lítio seca lagos e contamina comunidades indígenas. No Congo, a extração de cobalto envolve trabalho infantil e violência paramilitar. Em vários países africanos e latino-americanos, empresas estrangeiras tomam territórios, destroem ecossistemas e deixam atrás pobreza e poluição, apoiados por governos servis e aliados ao imperialismo.

Portanto, o aumento dos investimentos em energia limpa não é um sinal de esperança, mas sim, mostra que o capitalismo está se reorganizando para lucrar também com a crise climática. A catástrofe ambiental virou oportunidade de negócio e a própria salvação do planeta foi transformada em mercadoria.

Como se pode concluir a luta por uma transição energética verdadeira não virá dos mercados, nem dos governos submissos ao imperialismo.

Capitalismo insustentável

Atraso das metas  escancara a incompatibilidade do capitalismo coma redução de emissões

As NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) são os compromissos assumidos por cada país, dentro do Acordo de Paris (2015) para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa e se adaptar aos impactos da mudança climática. No âmbito da COP30, os países deveriam apresentar novas NDCs para 2035, pois o estabelecido pelo acordo exige que as metas sejam progressivamente mais rigorosas e alinhadas ao objetivo central de limitar o aquecimento global a 1,5 °C[6].   

No entanto, no prazo oficial, estabelecido para 10 de fevereiro de 2025, apenas 13 países apresentaram suas NDCs e até meados de setembro, chegou a apenas 34 países que representam cerca de 24 % das emissões globais[7]. As NDCs foram estabelecidas para cumprir as metas de  chegar até 2030 com uma redução de 42% (comparado a 2019), e até 2035, uma redução de 57%. O objetivo é chegar à “Net Zero”[8] até 2050, mas os países precisam mostrar como vão chegar lá.

A  China, responsável por quase um terço das emissões globais, mantém sua meta de atingir o pico de emissões ainda em 2030, o que significa seguir ampliando o consumo de carvão e petróleo nesta década, em plena escalada da crise climática. Os Estados Unidos, segundo maior emissor, sob o comando de Trump, retiraram-se do Acordo de Paris e portanto não tem nenhum compromisso de NDCs estabelecido. Além de ser um defensor radical da exploração de petróleo.

A Índia, por sua vez, se esconde atrás do discurso de “direito ao desenvolvimento” para seguir apostando na expansão do carvão, enquanto apresenta metas vagas e distantes, ainda que seja o terceiro maior emissor do planeta. Da mesma forma, o governo brasileiro — cujo país figura entre os dez maiores emissores de gases do planeta —, apesar de ter apresentado sua NDC em novembro de 2024, com a promessa de reduzir entre 59% e 67% das emissões até 2035, segue ampliando a exploração de petróleo e permitindo a expansão desenfreada das fronteiras agrícolas e pecuárias que avançam sobre florestas. Ao mesmo tempo, assiste passivamente — e muitas vezes apoia — a ofensiva parlamentar que desmonta a legislação ambiental em nome do agronegócio e da mineração.

O atraso e ao mesmo tempo a insuficiência dessas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) não são fruto do acaso, mas resultado direto de um sistema capitalista que prioriza o crescimento econômico e a competitividade acima da sobrevivência do planeta. Enquanto as potências defendem seus mercados e lucros, os países em desenvolvimento se sustentam no discurso da necessidade de desenvolver-se, e assim vão mantendo intactas as margens de manobra para o capitalismo fóssil sobreviver e a transição energética ficar nas mãos daqueles que não estão interessados em nada mais que seus lucros.

O que esperar da COP30?

Mais uma vitrine de discursos vazios

Sendo assim, a COP30 se anuncia como mais uma vitrine de discursos vazios, onde os ricos que dominam e seus governos títeres, tentarão disfarçar a continuidade da destruição planetária com promessas verdes e metas mentirosas ou ineficazes. Não há saída ecológica dentro da lógica do lucro. A crise climática é expressão direta de um sistema que vive da exploração e da desigualdade e que tem nome: sistema capitalista.

Somente a mobilização dos povos, a organização dos/as trabalhadores/as, da juventude, das mulheres, negros/as, movimentos indígenas, ambientais e populares poderá impor uma verdadeira transição energética justa, solidária e que seguramente se chocará com o sistema capitalista. A luta pelo clima é, mais do que nunca, uma luta contra o capital, pela sobrevivência da humanidade e por uma sociedade socialista.


[1] COP 29: Ponto para os combustíveis fósseis – Liga Internacional dos TrabalhadoresLiga Internacional dos Trabalhadores

[2] La OPEP+ se prepara para extraer 500.000 barriles de petróleo adicionales cada día | Mercados Financieros | Cinco Días e Oil Market Report – September 2025 – Analysis – IEA

[3] Países correm na direção contrária ao clima e planejam exploração recorde de fósseis, alerta estudo de 2025 – CPG Click Petróleo e Gás

[4] Amazônia desponta como nova fronteira global do petróleo – InfoAmazonia

[5] Discurso especial do secretário-geral da ONU: “Um Momento de Oportunidade – Impulsionando a Nova Era da Energia” | As Nações Unidas no Brasil e Sumário executivo – World Energy Outlook 2024 – Analysis – IEA

[6] Entenda o que significa o limite de 1,5°C, crucial para o aquecimento global | WRI Brasil

[7] Nações apresentam novas metas climáticas antes da COP30 – DW – 24/09/2025

[8] Net zero (ou zero líquido) é o ponto em que a quantidade de gases de efeito estufa (GEE) liberada na atmosfera é igual à quantidade removida dela, criando um equilíbrio. 

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