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Estados Unidos

A independência dos Estados Unidos

julho 9, 2025

Por: Alejandro Iturbe

Hoje (04/07) marca um novo aniversário da independência dos Estados Unidos. Reproduzimos o texto de um artigo escrito em 2016 sobre este importante fato. Acreditamos que este texto mantém toda a sua validade tanto nas suas considerações históricas como na sua referência ao presente quando afirmamos que a burguesia imperialista dos EUA é a mais odiada pelos trabalhadores e pelas massas do mundo”. Deve-se acrescentar que a figura de Trump e suas políticas (como apoiar o genocídio sionista em Gaza, bombardear o Irã e atacar duramente os imigrantes que vivem nos EUA) aumentam ainda mais esse ódio.

Há 240 anos, em 4 de julho de 1776, os representantes das 13 colônias da Grã-Bretanha na América do Norte, reunidos na cidade de Filadélfia, votaram pela independência e pela formação de uma nova república com um presidente e parlamento próprios que seriam eleitos pelo sistema de voto popular. A nova república adotou o nome de Estados Unidos da América.

A declaração de independência foi um ponto de inflexão em um processo que já vinha acontecendo há mais de 10 anos. Para entender isso, é necessário considerar as características da colonização britânica nesses territórios.

A colonização britânica

A partir do início do século XVI, as principais potências da época iniciaram uma política de construção de impérios coloniais em territórios fora da Europa. Nesse caminho, a coroa britânica estabeleceu sua primeira colônia na América do Norte (até então habitada por povos nativos em estágio de desenvolvimento comunista primitivo) em 1607 (Jamestown, Virgínia). Essa colonização então se expandiu rapidamente pela região da costa atlântica.

Diferente de outras possessões coloniais, que se destinavam à extração de metais e minerais preciosos (ou seja, uma economia voltada para a pilhagem de recursos e, portanto, transitória), as colônias da América do Norte se desenvolveram centralmente em torno da produção agrícola destinada a ser exportada para a metrópole, de caráter muito mais estável e permanente.

Com base nisso, os dois setores centrais de colonos que se estabeleceram nos novos territórios (os puritanos protestantes ingleses e os católicos irlandeses) o fizeram com a perspectiva de transformá-los em sua “pátria” e neles poder prosperar livremente de acordo com suas idéias e convicções. Ambos os setores eram bons agricultores e produtores de artesanato.

As colônias prosperaram e se expandiram. As do Norte (região conhecida como Nova Inglaterra), a parti da base agrícola dos fazendeiros, também fabricavam material naval e processavam peles. As do Sul se especializaram no cultivo de plantações (tabaco, algodão e arroz). Nesse contexto, foram desenvolvidos centros urbanos, comerciais, administrativos e portuários, pequenos mas em permanente expansão, como Filadélfia, Nova York, Boston e Charleston.

E também uma burguesia arraigada com crescentes interesses próprios. Essa burguesia estava atravessada por uma divisão estrutural: a do Norte desenvolveu-se com base no trabalho assalariado, enquanto a do Sul o fez com o trabalho de escravos negros trazidos da África.

Aumentam as contradições

As contradições de ambos os setores com a coroa britânica crescem cada vez mais. Especialmente a partir de 1763, quando houve um aumento acentuado dos impostos. Entre eles, o destinado ao autofinanciamento das tropas britânicas instaladas nas colônias, o dos selos postais e o dos produtos importados monopolisticamente pela coroa, como o chá.

Assim começou uma rebelião civil na qual a cidade de Boston (Massachusetts) foi a vanguarda. Um exemplo disso foi a chamada Revolta do Chá (1774), na qual patriotas (disfarçados de índios de pele vermelha) jogaram uma carga de chá importado no mar. Além de seu caráter essencialmente simbólico, esse evento é considerado um marco nesse confronto [1]. Foi uma expressão de uma campanha generalizada de boicote aos produtos britânicos, que incluiu a formação de “comitês de patriotas” para promovê-la e garanti-la (na verdade, a estrutura básica de um partido de independência).

Começa a guerra

Nesse contexto, em 1775 começaram a haver confrontos entre tropas britânicas e milícias patriotas. Londres declara Massachusetts um “estado hostil” e envia tropas para reforçar a guarnição de Boston.

A “guerra revolucionária” (como é conhecida na história estadunidense) já estava aberta. As milícias independentistas crescem em número e são reforçadas por tropas de outras colônias. Também recebem apoio em armamentos das potências coloniais em confronto com a Grã-Bretanha (como França, Espanha e Holanda).

George Washington (natural da colônia da Virgínia e coronel aposentado do Exército Britânico) é nomeado comandante geral do exército rebelde de 16.000 homens. Depois de várias batalhas, derrotam os britânicos e passam a controlar Boston. Mais tarde, a guerra se move e se estende para as outras colônias.

A Declaração de Independência e o Triunfo Definitivo

Ao mesmo tempo, um congresso de representantes das colônias, que funcionava na Filadélfia (inicialmente convocado contra o imposto de selo e por outras demandas), havia sido transformado (desde 1774) em um “congresso continental”. Em 4 de julho de 1776, declara independência e o nascimento de um novo país.

A guerra contra a coroa britânica continua e segue incorporando territórios até 1781, quando alcança seu triunfo definitivo. A Grã-Bretanha aceita formalmente sua derrota em 1782 e, em 1784, reconhece o novo país.

Uma grande revolução

A independência dos Estados Unidos deve ser caracterizada como uma das grandes revoluções burguesas da época, junto com a Revolução Francesa (1789). Nela, dois processos foram combinados. A primeira é a luta da burguesia ascendente para ter seu próprio Estado e suas próprias instituições autônomas (destruindo no processo as instituições da monarquia). A este respeito, antecipou o processo na França em mais de uma década e se tornou a primeira república moderna.

A segunda foi a luta anticolonial contra os impérios que as potências dominantes (Grã-Bretanha, França, Holanda, Portugal e Espanha) construíram nos séculos anteriores. Nesse sentido, estava 25 anos à frente do processo haitiano de 1801 (embora este último tivesse um elemento nitidamente distintivo: foi a única revolução anticolonial realizada por escravos e não pela burguesia nacional).

Esse caráter revolucionário burguês foi expresso tanto no texto da Declaração de Independência quanto na Constituição votada em 1787, com garantias democráticas muito amplas.

Nesse contexto, essa revolução deixou pendente um problema democrático gravíssimo: a questão da escravidão, que foi conscientemente evitada na declaração de independência e na constituição para evitar a divisão entre os dois setores burgueses que convergiam (o próprio George Washington era proprietário de escravos).

Essa diferença explodiria na Guerra de Secessão (1861), quando vários estados do sul se opuseram à política de abolição da escravidão promovida pelo presidente Abraham Lincoln e se separaram da União para formar os Estados Confederados. Depois de uma longa e sangrenta guerra, que terminou com o triunfo dos unionistas, a escravidão foi legalmente abolida. Mas a questão da opressão, discriminação e repressão dos negros permanece até hoje uma característica constitutiva do capitalismo dos EUA.

Uma expansão permanente

A dinâmica burguesia estadunidense tinha, desde sua própria conformação como burguesia independente, uma nítida política expansiva. Na própria guerra pela independência, ela foi expressa (a oeste dos Montes Apalaches) como uma “guerra contra os índios”, uma vez que os povos nativos se aliaram aos britânicos por medo (como realmente aconteceu depois) de que a nova nação avançasse para deslocá-los de seus territórios.

Em 1803, a Louisiana (originalmente uma colônia francesa) foi incorporada. Em 1819, a Flórida foi definitivamente comprada dos espanhóis. Junto com isso, os Estados Unidos cresceram e incorporaram novos territórios a oeste (na grande pradaria central da América do Norte) deslocando violentamente os índios americanos (um processo que foi eufemisticamente chamado de “conquista do Oeste”).

Uma das expressões mais brutais dessa expansão (como uma antecipação do monstro que seriam no futuro) foi o roubo de todo o Norte do México (cerca de 50% do território que pertencia a este país). Este roubo foi iniciado pela criação artificial da República do Texas e sua posterior incorporação aos Estados Unidos (1845) e continuou com a guerra entre os dois países (1846-1848). Como resultado, o México perdeu (além do Texas), o território que corresponde aos atuais estados da Califórnia, Novo México, Arizona, Colorado e Utah.

Em 1867, os Estados Unidos compraram o território do Alasca (separado do território central pelo Canadá) do império russo. Em 1898, eles invadiram e dominaram o arquipélago havaiano (no extremo leste do Pacífico). Ambos os territórios foram posteriormente incorporados como estados membros da União.

Tendo consolidado seu domínio do Atlântico à costa do Pacífico, e do Canadá, no norte, ao Rio Bravo, no sul, a burguesia estadunidense começou sua expansão na América Latina. Começou com o que chamou de “quintal”: América Central e Caribe. No final do século XIX, entrou em guerra com a Espanha para garantir a “independência” de Cuba. Na mesma guerra, transformou Porto Rico em um “estado associado”. Dividiu o Panamá da Colômbia para garantir a construção e o controle do primeiro canal interoceânico. Transformou outros países da América Central em “repúblicas bananeiras” dominadas pela empresa United Fruit.

A partir daí, continuou seu avanço em direção ao sul americano e, a partir da Segunda Guerra Mundial, em direção à sua transformação na potência imperialista econômica e militarmente hegemônica à qual estão subordinadas as outras potências e as burguesias nacionais das semicolônias (e das colônias que ainda existem).

Sustentou essa dominação com uma política agressiva de golpes de Estado, apoio a ditaduras sangrentas, repetidas invasões e guerras localizadas. Em seu país, apesar do impressionante desenvolvimento econômico e da imensa riqueza que possui e saqueia do mundo, construiu uma sociedade feroz e desigual (a mais injusta dos países desenvolvidos), onde muitos trabalhadores brancos e, especialmente, das minorias negras e latinas são superexplorados, discriminados e reprimidos.

É certamente a burguesia imperialista mais odiada pelos trabalhadores e massas do mundo. Não é coincidência: é o principal inimigo que devemos derrotar para construir o mundo socialista que almejamos.

Mas esse ódio mais do que justificado hoje não deve nos fazer esquecer que, em sua origem, foi uma burguesia revolucionária, que realizou uma das maiores revoluções burguesas da história.

[1] O nome Tea Party, adotado por uma corrente de extrema-direita do Partido Republicano, deve-se à reivindicação dessa revolta.

Tradução: Lílian Enck

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