sáb set 07, 2024
sábado, setembro 7, 2024

Eleições europeias: por um programa de ruptura, em defesa das trabalhadoras!

Introdução

As próximas Eleições Europeias se realizam no marco da crise da ordem mundial e o aprofundamento da crise capitalista, enquanto o avanço da ofensiva imperialista russa contra a Ucrânia prossegue e assistimos ao genocídio israelense do qual a UE e seus governos são cúmplices e no qual 70% das vítimas são mulheres e crianças.

Por: Laura Sguazzabia (PdAC – Itália) e Laura Requena (Corriente Roja)

Apesar das leis e medidas aprovadas a favor das mulheres das quais se vangloriam alguns governos europeus, a situação das mulheres trabalhadoras e pobres na Europa não deixou de se agravar nos últimos anos; seja com as consequências de sua gestão capitalista da pandemia, como com a inflação e o aprofundamento da crise econômica, que arrastamos desde 2008.

Quando todas as pesquisas alertam para um ascenso da ultradireita com seu discurso de ódio, racista, homofóbico, transfóbico e machista, muitas trabalhadoras se perguntam o que fazer ou em quem votar, para enfrentar as medidas anunciadas por esta, que supõem uma ameaça para nós.

Mas a realidade é que os governos da social-democracia europeia e da mal chamada esquerda progressista, também têm sido cúmplices quando não diretamente artífices do ataque aos nossos salários e aposentadorias, do fechamento de empresas e redução de pessoal em muitas delas para garantir os benefícios do capital, das políticas racistas e xenófobas, da inação perante o genocídio israelense, do abandono do povo ucraniano que resiste heroicamente à invasão de Putin, das escassas medidas diante das mudanças climáticas, cujo verdadeiro objetivo é buscar novas fontes de lucro para o capital e algumas medidas sociais que não são suficientes enquanto planejam um aumento estratosférico do gasto militar.

Com tudo isso, não fizeram senão estender um tapete vermelho nas instituições, para uma direita e ultradireita que dizem combater e de cujo crescimento, agora se lamentam.

Por isso, mais além do voto, nos dirigimos a todas as trabalhadoras, às estudantes, às aposentadas, desempregadas ou às mal chamadas “donas de casa”, para explicar-lhes qual o caminho e a saída de classe e de ruptura que a LIT defende, para sair da situação de catástrofe social à qual todos os governos nos têm levado, no compasso da UE dos capitalistas. Qual é o programa que defendemos, para a mudança social real que a classe trabalhadora e as mulheres como parte dela, precisamos.

O ataque a todos nossos direitos como expressão de uma gestão capitalista da pandemia e a crise econômica

A pandemia da Covid-19 revelou, com toda nitidez, as distorções do sistema capitalista, como um sistema baseado na exploração, mas também na violência, na desigualdade e na opressão.

As trabalhadoras que somos maioria no setor da saúde e dos serviços sociais, nos mantivemos ativas durante a emergência porque estes âmbitos foram considerados inevitavelmente «atividades essenciais»: médicas, enfermeiras, faxineiras ou as que trabalhamos em casas de repouso, estivemos à frente, frequentemente sem as medidas de proteção necessárias, com o consequente risco para nós e nossas famílias. Muitas continuamos trabalhando ainda, nessas chamadas «atividades essenciais», cuja lista foi se ampliando para assegurar o benefício da patronal.

Outras, perdemos emprego ou aceitamos a redução da jornada com a consequente redução ou perda de salário. A tão vangloriada adoção do smart working, ou teletrabalho, converteu a conciliação do tempo de trabalho e de vida, em uma tarefa quase impossível. Com as escolas fechadas, a necessária limpeza a fundo da casa para evitar maiores riscos de contágio, a suspensão dos serviços de assistência a domicílio ou a falta de uma rede pública de cuidados; além de perder nossa independência econômica, sofremos uma sobrecarga adicional ao nosso trabalho doméstico e de cuidados porque é a ideia de que estas são tarefas próprias das mulheres é comumente aceita.

A pandemia passou, porém, a segregação no trabalho por gênero, a brecha salarial e nas aposentadorias ou a desigualdade social continuam

A situação de desvantagem das mulheres no mundo do trabalho e a visão de seu papel doméstico, não mudaram desde o fim da pandemia.

Nós mulheres somos 90% da mão de obra (remunerada e não remunerada) dedicada aos cuidados, o que, como a gravidez e a maternidade, supõe um obstáculo a nossa carreira profissional. Enquanto nossos salários continuam estagnados, espera-se que nos sobrecarreguemos com os maiores custos de criar e cuidar das nossas famílias, para contribuir para a reprodução da força de trabalho que a classe capitalista explora.

 Embora tenhamos 60% dos títulos universitários em toda a UE, recebemos em média 13% menos que os homens, o que se traduz em aposentadorias até 37% em média mais baixas e temos uma maior taxa de desemprego, assim como de empregos informais e precários, o que se traduz na chamada feminização da pobreza. Nós mulheres somos 80% das pessoas que, mesmo com um emprego, somos pobres e aproximadamente um terço das mulheres idosas da UE não recebem nenhum tipo de aposentadoria/pensão.

A outra pandemia: UE, território NÃO livre da violência machista

A pandemia da Covid-19 propiciou um forte aumento dos casos de violência doméstica em toda a UE: com as medidas de isolamento social, necessárias para conter o avanço do vírus, muitas se encontraram presas frente ao seu agressor e muitas vítimas viram aumentar sua dependência de parceiros violentos. Atualmente, vemos paralelamente aos discursos machistas da ultradireita, a deterioração das condições de vida pela crise ou pelo corte dos serviços públicos, aumentaram todas as formas de violência machista incluindo o assédio no local de trabalho e as agressões sexuais, o cyberbullying, a lesbofobia, ou o tráfico de pessoas.

Na Europa, sete mulheres são assassinadas por dia pelo seu parceiro ou um membro de sua família e uma em cada três mulheres foi agredida física e/ou sexualmente, pelo menos uma vez em sua vida[1].

Mulheres e meninas são também a imensa maioria das vítimas do tráfico na UE em particular, para fins de exploração sexual e quanto à mutilação genital, mais de 600.000 mulheres sofrem suas consequências na Europa e 190.000 meninas em 17 países europeus, correm o risco de serem submetidas a esta prática criminosa.

Os direitos reprodutivos continuam não garantidos

Durante a pandemia, as clínicas e hospitais europeus não garantiram o acesso aos serviços relacionados à saúde sexual e reprodutiva, como a IVE (interrupção voluntária da gravidez), os exames de HIV ou outras enfermidades de transmissão sexual, a detecção do câncer e o atendimento médico e hospitalar às mulheres grávidas[2].

Isto apenas destacou os obstáculos que as mulheres continuam driblando para a proteção da nossa saúde sexual e reprodutiva, em particular no que diz respeito ao acesso ao aborto e à contracepção. Embora atualmente o aborto só é ilegal em dois países da UE, muitos estados têm uma legislação muito restritiva, o que não diminui o número de abortos, mas obriga as mais vulneráveis, ao risco de abortos clandestinos, nos quais sua saúde e sua vida estão em jogo.

A Polônia é um dos países europeus que conta com uma legislação mais restritiva e só permite o aborto quando a vida da mulher grávida corre perigo ou quando a gravidez é consequência de um estupro. Na Hungria desde 2022 entrou em vigor a lei que obriga as mulheres a ouvir o batimento cardíaco fetal antes de abortar, o que é violência obstétrica. Na Itália, a lei 194/78 é inaplicável pela alta percentagem de objetores de consciência e, hoje em dia, pela presença nos hospitais de “Centros de Ajuda à Vida”.

Mas a direita, quando governa, não é a única que ameaça ou restringe o direito ao aborto. O falta de financiamento e privatização dos sistemas de saúde no Estado Espanhol, transformam em letra morta a última reforma da lei que regula o aborto, para que este seja garantido na saúde pública. Da mesma forma na França, onde o aborto foi consagrado recentemente na Constituição, os centros de planejamento familiar foram atacados, foram fechados 130 centros de abortos em 15 anos e os medicamentos abortivos escasseiam desesperadamente com Macron.

Um pacto europeu de imigração e asilo que aumenta a violência contra as mulheres

Se durante os conflitos e as guerras, as mulheres enfrentam formas específicas de violência, como muito bem sabem as mulheres ucranianas ou palestinas; as mulheres e as meninas experimentam também a migração ou a condição de refugiadas forçadas, de forma diferente dos homens e meninos. As mulheres e meninas migrantes no território da UE, representam um grupo especialmente vulnerável.

Estas condições serão agravadas pelo novo Pacto europeu de imigração e asilo aprovado em 10 de abril pelo parlamento europeu, com o voto da social-democracia. Um pacto que permite deter e registrar inclusive menores de seis anos e reforça a externalização de fronteiras dos últimos anos. Nunca a expressão “Europa Fortaleza” foi tão acertada como após a aprovação deste acordo da vergonha!

Um pacto que é complemento de seus estados-membros. 45% das pessoas migrantes estão sob risco de pobreza ou exclusão social na UE inclusive com emprego e 21% das migrantes sofrem exclusão social. As mulheres estão especialmente relegadas às profissões mais precárias, invisibilizadas e menos valorizadas socialmente, como o emprego doméstico, independentemente de sua formação. Isto aumenta o risco de serem vítimas de assédio, exploração sexual e trabalhista.

De quais medidas urgentes astrabalhadoras precisam?

As escassas ajudas sociais, enquanto se mantém o colapso e a privatização incontrolável das autorizações públicas pós-pandemia, não estão acabando com nossa pobreza e precariedade. Nem as leis de igualdade ou contra a violência machista nem a nova lei europeia contra a violência de gênero, (que não considerará estupro aquelas agressões sexuais nas quais não se possa provar violência física), vão acabar com as bases materiais nas quais se sustenta a violência, a discriminação e a superexploração cotidiana que sofremos. Exigimos!:

  • Licença maternidade e paternidade iguais e intransferíveis e com pagamento de 100%
  • Políticas ativas de emprego para as mulheres
  • Subsídio de desemprego para as trabalhadoras domésticas no Regime geral da Seguridade Social.
  • Salários e aposentadorias dignas e reavaliáveis, baseados no IPC
  • Recursos suficientes para mulheres agredidas. Garantia de emprego e/ou subsídio
  • Por uma cultura contra a violência contra as mulheres e setores oprimidos.
  • Luta eficaz contra o tráfico na Europa, com fins de exploração sexual.
  • Medidas de apoio a trabalhadoras durante a gravidez, lactação e primeiros anos da criança
  • Educação pública e gratuita desde 0 anos. Creches em empresas de forma transitória.
  • Centros de Dia e Residências públicas para atendimento a idosos e dependentes. Remunicipalização e ampliação de pessoal para Serviços de ajuda  a domicílio.  
  • Fora religião das aulas. Educação sexual e em valores de igualdade como disciplina curricular.
  • Aborto livre, seguro e gratuito para todas. Serviços de planejamento familiar .
  • Revogação das Leis dos Estrangeiros. Fechamento dos CIEs. Fora o Pacto de imigração e asilo
  • Todo nosso apoio às mulheres da resistência operária ucraniana na primeira linha do conflito como militares e combatentes, médicas e enfermeiras, cuidadoras de suas comunidades e famílias, deslocadas internas ou refugiadas!
  • Com as mulheres palestinas, cuja luta contra o genocídio israelense e pela libertação de seu povo, é exemplo de fortaleza e resiliência para todas. Por uma Palestina laica, democrática e não racista do rio ao mar! Não à armadilha hipócrita dos dois estados, que só serve para legitimar a ocupação colonial.

As mulheres, na vanguarda das lutas

Pela nossa maior carga de opressão e exploração, nós trabalhadoras estamos hoje na liderança de muitas mobilizações. Não só pelos nossos direitos como o aborto, por igualdade salarial e nas aposentadorias ou contra a violência machista, mas também estamos à frente de muitas lutas trabalhistas, pelo direito à moradia digna ou em defesa dos serviços públicos.

Um exemplo: em 2023 no Estado Espanhol, 58% das greves foram lideradas por mulheres, apesar de sermos menos da metade da força de trabalho (46%). As atividades onde houve um maior crescimento das greves em 2023 foram educação, saúde e serviços sociais, que são justamente os setores mais feminizados.

Da mesma forma, e como ficou bem patente em 25N e 8M passados, no qual nossa luta se tingiu com as cores da Palestina, nós mulheres europeias estamos na primeira linha, nas mobilizações para exigir o fim do genocídio israelense contra o povo palestino.

Por um programa de ruptura com a UE, em defesa das mulheres trabalhadoras!

A exacerbação da violência e da opressão é, junto com o aumento da exploração dos trabalhadores, uma tendência do capitalismo. O ascenso de governos e correntes de ultradireita, não é mera casualidade, mas a expressão desta propensão. (…) “As respostas meramente democráticas, liberais, progressistas e reformistas não só são insuficientes, mas também são incapazes de acabar com as opressões e garantir a igualdade de forma definitiva, justamente porque não se propõem a acabar com o sistema capitalista[3]

As medidas acima expostas e outras que precisamos, como a redução do gasto militar, o não pagamento da dívida, a criação de um parque público de moradias sociais ou a expropriação com controle operário, dos setores estratégicos da economia e dos bancos para atender as necessidades sociais e a catástrofe ambiental, só podem ser realizadas apoiando-se em uma mobilização geral e sustentada das/os trabalhadoras/es e da juventude, porque inevitavelmente chocam-se com as pretensões e os privilégios das/os capitalistas e das instituições e governos a seu serviço, mesmo que estes governos estejam dirigidos por mulheres.

Há anos que a estratégia da esquerda reformista (que se autodenomina feminista), de democratizar a UE versus “refundá-la”, nos marcos da legalidade e das instituições atuais, isto é, sem rupturas de nenhuma classe, demonstrou seu fracasso. O Parlamento europeu influencia muito pouco em uma UE, onde as verdadeiras decisões são tomadas pelo Banco Central Europeu, a Comissão Europa ou o Fundo Monetário Internacional, que não são nem nunca serão, mecanismos democráticos. Então, a conclusão é nítida: é necessário desobedecer e romper essas regras do jogo, se quisermos avançar.

No próximo dia 9 de junho voltarão a nos vender a ilusão, de que é suficiente votar para deter a ultradireita e de que é possível transformar a UE em um instrumento “progressista” e a serviço da classe trabalhadora e dos povos, através da aritmética parlamentar.

Frente a esta utopia reacionária, defendemos que acabar com a UE fortaleza, antidemocrática e a serviço do capital e alcançar as medidas que precisamos, não há outra solução que a mobilização em massa contra os que nos afundam diariamente, na atual catástrofe econômica, social e ambiental. Por isso, independentemente de votar ou não neste 9 de junho, chamamos você para se organizar e vir lutar conosco. A tomar de uma vez por todas, as rédeas de nossas vidas para abrir o caminho para uma Europa solidária da classe trabalhadora e dos povos.  Precisamos avançar na construção de uma internacional revolucionária e seus partidos em toda a Europa! Este é o nosso compromisso e pelo qual lutamos!


[1] Instituto Mediterrâneo de Pesquisa Jornalística e a Rede Europeia de Jornalismo de Dados (2023)

[2] Dados do Fórum Parlamentar Europeu pelos Direitos Sexuais e Reprodutivos e a Federação Internacional de Planejamento da Família – Rede Europeia

[3] https://litci.org/es/una-decada-de-luchas-feministas-balance-y-perspectivas-del-movimiento-de-mujeres-trabajadoras/

Tradução: Lílian Enck

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