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Crise climática e ambiental

Conferência do clima é balcão de negócios de petroleiras e mineradoras 

Sultão Al Jaber, presidente da COP28 e chefe da chefe da empresa petrolífera estatal dos EAU, a Abu Dhabi National Oil Company (Adnoc)
dezembro 8, 2023

Dois mil e vinte e três foi o ano em que os efeitos do aquecimento global ficaram escancarados. O mundo assistiu às terríveis ondas de calor no verão do Hemisfério Norte e, agora, no Hemisfério Sul, que produziram incêndios florestais. Na Amazônia a estiagem secou rios, e os fazendeiros se aproveitaram para tacar fogo na floresta. As secas também produziram quebras de safras agrícolas, além de fortes chuvas e grandes inundações, como as que devastaram o Rio Grande do Sul. 

Por: Jeferson Choma

O fracasso de todos os acordos climáticos mostra que o capitalismo não pode resolver a crise climática que o sistema provocou. 

Mas a pouca vergonha dos capitalistas é tamanha que a COP-28, Conferência Climática das Nações Unidas (ONU) realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, foi um balcão de negócios das grandes petroleiras, mineradoras e empresas que destroem o meio ambiente. 

Até a Braskem (responsável pelo maior desastre urbano em curso no mundo, em Maceió) e a Vale (responsável pelas tragédias de Mariana e Brumadinho) estiveram na COP-28, compartilhando o seu “sucesso” na gestão socioambiental e climática. 

Nas mãos das petroleiras

A COP-28 foi presidida por um dos principais homens do petróleo no mundo, o executivo Sultan al-Jaber, CEO da ADNOC, estatal petroleira dos Emirados. Antes da abertura da COP-28, a BBC e o Centre for Climate Reporting, do Reino Unido, apresentaram documentos mostrando que Al-Jaber se aproveitou das negociações climáticas para defender os interesses da petroleira ADNOC e celebrar possíveis acordos com outras empresas.

Na COP do petróleo, Al-Jaber também se revelou um negacionista. Disse que “não há nenhuma ciência, nenhum cenário que diga que a eliminação progressiva dos fósseis é o que vai atingir 1,5º C”. Para o presidente da COP, a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis levaria o mundo “de volta às cavernas”.

O petróleo, assim como o gás e o carvão, é um combustível fóssil. Eles são as principais causas das alterações climáticas porque liberam gases do efeito estufa que aquecem o planeta, como o dióxido de carbono (CO2), quando queimados para obter energia.

O fracasso das COPs

Colocar o presidente de uma petroleira (negacionista) para comandar uma conferência climática é a desmoralização completa dos acordos climáticos. A COP do petróleo mostra que os capitalistas estão se lixando para o aquecimento global. Desde que conferências ambientais são realizadas – a partir da realizada no Rio de Janeiro em 1992 – não houve nenhuma redução de emissões de CO2. Ao contrário, o aquecimento do clima só aumentou, assim como a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera. 

O que diz a ciência? 

O planeta à beira do precipício 

O aquecimento global é uma realidade e está tornando os eventos climáticos mais frequentes e cada vez mais intensos, como é o caso do El Niño, um fenômeno climático produzido pelo aquecimento das águas equatoriais do Oceano Pacífico. Vejamos: 

→ Segundo o observatório europeu Copernicus, 2023 deverá ser o ano mais quente em 125 mil anos. 

→ A concentração de CO2 na atmosfera chegou ao nível recorde de 424 ppm, a maior concentração em 800 mil anos, segundo a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês). Essa é a maior concentração de CO2 já vivenciada pela espécie humana desde que começamos a caminhar pela Terra há 200 mil anos. 

→ Em 2023, pela 1ª vez, o mundo registrou um dia com temperatura média global 2°C acima da era pré-industrial. Foi no dia 17 de novembro, quando a temperatura registrada foi de 2.07°C. 

→ A COP do petróleo em Dubai explodiu as metas do Acordo de Paris. Segundo o acordo, para manter o aquecimento entre 1.5°C e 2°C, o mundo precisaria reduzir em 40% as emissões até 2030 e zerar as emissões até 2050. Mas “A Carta de Descarbonização do Petróleo e do Gás”, celebrada pela COP-28 como “um grande primeiro passo”, apenas prevê acabar com a queima de gás (metano) até 2030.  Uma manobra que deixa de forma o CO2, o principal gás responsável pelo efeito estufa, produzido pelo petróleo e carvão. 

Quem são os responsáveis? 

O 1% mais rico teve a mesma emissão de carbono que os 66% mais pobres

→ Segundo a Oxfam, em 2019, o 1% mais rico foi responsável pela mesma emissão de carbono que os 66% mais pobres no mundo, ou seja, 5 bilhões de pessoas. 

→ As emissões de carbono do 1% mais rico cancelam o benefício gerado por 1 milhão de turbinas de vento. 

→  Super-ricos são responsáveis por 16% de todas as emissões de carbono do planeta desde 1990. 

Prêmio Fóssil 

Na COP do petróleo, Lula negocia entrada na Opep+

Lula foi à COP e fez muitos discursos responsabilizando os países ricos pela catástrofe ambiental. No entanto, logo ficou claro outro interesse do governo na conferência: ingressar na Opep+ (uma espécie de grupo expandido do bloco dos maiores produtores de petróleo). 

O movimento reforça o bloco de produtores de petróleo e vai na contramão da urgente e necessária transição energética que o Brasil e o mundo precisam para combater a crise climática. 

Durante a conferência, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, celebrou acordos com petroleiras e até sobrou um tempinho para tentar vender a Braskem ao presidente da COP, Al-Jaber. Ele também afirmou que a Petrobras será uma das últimas a parar de explorar petróleo no mundo. Lula foi na mesma direção e disse: “A Petrobras não vai deixar de prospectar petróleo, temos que lembrar isso, porque o combustível fóssil ainda vai funcionar por muito tempo na economia mundial.”

Petróleo na Amazônia

Lula não esconde seu “sonho” em explorar petróleo na Amazônia, que na verdade seria um pesadelo para os povos da região e para grande parte da humanidade. Um estudo da Agência Pública/Seeg concluiu que se for explorado todo o petróleo da Margem Equatorial, as emissões de gases de efeito estufa provenientes de sua queima anulariam, para o planeta, os ganhos obtidos com a redução do desmatamento da Amazônia. Segundo o estudo, “se todo esse petróleo for queimado, emitiria entre 4 bilhões e 13 bilhões de toneladas de gás carbônico (CO2), o principal gás de efeito estufa. É quase o que Estados Unidos (5,3 bilhões) e China (12,3 bilhões de toneladas) emitiram em 2020”. 

O estudo ainda mostra que as emissões referentes à queima do petróleo da Margem Equatorial seriam o triplo do quanto o Brasil se comprometeu a emitir em 2030, na meta apresentada junto ao Acordo de Paris.  

Enquanto isso, a Petrobras anunciou a redução dos investimentos destinados a fontes renováveis de energia. Dos US$ 102 bilhões em investimentos previstos pela Petrobras até 2028, apenas US$ 5,5 bilhões serão destinados a eólica/solar e US$ 5,5 bi a hidrogênio, uma merreca. Investe-se pouco para continuar engordando os bolsos dos acionistas privados da empresa, que receberam US$ 215 bilhões em dividendos no ano passado. 

Não foi por acaso que o Brasil acabou sendo o vencedor do Troféu Fóssil na COP-28, prêmio nada honroso para um país que deseja liderar as ações climáticas no mundo. 

Não existe capitalismo verde

Capitalismo fóssil e a farsa da transição energética 

A instalação de novas fontes de energia limpa é o único caminho para limitar a temperatura abaixo dos 2°C. Mas isso exige uma transformação urgente, revolucionária e inédita no fornecimento de energia em escala global. 

Sob uma sociedade socialista, baseada na economia planificada e controlada democraticamente pelos trabalhadores, o desenvolvimento dessas tecnologias daria um salto gigantesco. Mas, com as amarras do capitalismo, a transição energética não passa de uma farsa. Nos últimos anos existiram avanços concretos na tecnologia disponível que possa substituir a matriz fóssil, mas o capitalismo é um obstáculo ao seu desenvolvimento e, assim, ela serve apenas para que alguns bilionários possam obter alguma renda de monopólio. 

Enormes subsídios são concedidos pelos governos à produção fóssil. Estima-se que US$ 570 bilhões serão gastos na exploração de petróleo e gás a cada ano até 2030. Ao mesmo tempo, há uma corrida pela exploração das últimas grandes reservas de petróleo, como as reservas no Alasca, que Joe Biden quer explorar; a Margem Equatorial, sonhada por Lula; o petróleo do Ártico russo, cobiçado por Putin; e as reservas na costa da África oriental, exploradas pela China. 

A lógica capitalista impossibilita uma verdadeira transição da matriz energética. Na verdade, as soluções apresentadas (de carros elétricos ao hidrogênio verde) servem apenas para abrir novas fronteiras para os grandes capitalistas lucrarem, e não para impedir a destruição da biosfera. No máximo vai se criar um “mix” energético, uma combinação entre fontes renováveis de energia com as fontes fósseis, incapaz de combater o aquecimento global. 

 “Capitalismo verde” serve apenas à criação de novos nichos de mercado e para empresas incorporarem às suas marcas o rótulo de “sustentáveis” de marketing verde, o chamado greenwashing.

A transição energética vai exigir uma verdadeira revolução nas forças produtivas que só pode ser realizada numa sociedade socialista que liberte as ciências e os humanos da exploração e da opressão. Ou o capitalismo é superado por uma nova sociedade socialista que revolucione as relações de produção em escala global, ou a barbárie climática vai se abater sobre a humanidade.

Programa

Uma proposta socialista para combater a catástrofe climática

É preciso levantar um programa no Brasil para combater o aquecimento global, que deve passar pela redução das emissões de carbono e assegurar uma transição energética soberana. Para isso propomos: 

– Não à exploração da Margem Equatorial! A Petrobras precisa investir pesado em energias renováveis, usando a renda do petróleo para se transformar em uma empresa de energia sustentável. Isso só pode ocorrer com uma Petrobras 100% estatal, sob o controle dos trabalhadores.

– Nacionalização de todas as fontes energéticas, inclusive das reservas de petróleo e gás. Estatização das empresas poluidoras e causadoras de desastres.

– Defender a Amazônia e o Cerrado do agronegócio e a indústria minerária (os principais vetores da destruição ambiental do país), que precisam ser nacionalizadas e postas sob o controle dos trabalhadores.

– Pela interrupção dos projetos de termoelétricas e contra a expansão dos agrotóxicos.

– Exigimos de Lula o veto ao Projeto de Lei 11.247/2018, aprovado na Câmara no último dia 29, que libera a construção de mais termoelétricas (usinas a carvão) pela iniciativa privada. Também exigimos o veto ao PL do veneno (1.459/2022), aprovado no último dia 28 pelo Senado. O projeto vai ampliar numa escala jamais vista o uso de agrotóxicos que já são proibidos em outras partes do mundo.

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