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Especial Revolução Russa

106 anos da Revolução Russa

novembro 7, 2023

No meio do brutal ataque genocida de Israel contra Gaza e o povo palestino, o dia 7 de novembro (25 de outubro do antigo calendário russo) completa os 106 anos daquela revolução histórica que mudou o mundo.

Por: Alicia Sagra

Na Rússia, existia o regime despótico dos czares. Regime que não só explorou e oprimiu os trabalhadores e camponeses pobres, mas também restringiu os direitos democráticos, oprimiu uma série de nações sujeitas ao império czarista e também lançou ataques permanentes (pogroms) contra aldeias judaicas. Ataques semelhantes aos que o exército e os colonos israelitas realizam há mais de 75 anos nos territórios palestinos e que hoje atingiram a sua expressão máxima.

No dia 8 de março (23 de fevereiro do calendário antigo) de 1917, eclodiu uma revolução, conhecida como “Revolução de Fevereiro”, desencadeada por uma grande mobilização de trabalhadoras em Petrogrado, que abandonaram as fábricas e saíram para se manifestar contra a guerra e a fome [1]. Durante os 5 dias seguintes, o movimento cresce, incorporando um grande número de operários e soldados nas principais cidades, os bairros operários saem às ruas e os operários mais avançados, muitos deles formados pelos bolcheviques, dirigem-se para os quartéis. Trotsky, em sua História da Revolução Russa, conta como foram 5 dias e 5 noites com as ruas ocupadas, sob o grito de Paz, Pão e Terra, até que o primeiro grande triunfo foi alcançado: a queda do governo do czar.

Surge o governo provisório

Na Duma (uma espécie de parlamento) é eleito um governo provisório. Centralmente composto por líderes burgueses liberais que queriam o estabelecimento de uma República, e Kerensky, líder do SR (Socialismo Revolucionário), um partido com peso no campesinato.

Por sua vez, os operários, camponeses e soldados organizaram-se no Soviete (Conselhos), organização que teve origem na revolução de 1905 e ressurgiu com a irrupção revolucionária de 1917. No Soviete, os dois partidos com maior peso eram o Mencheviques [2] (com grande influência na classe trabalhadora) e os Socialistas Revolucionários (SR, com peso no campesinato). Os bolcheviques [3], com influência no movimento operário, eram naquela época uma força minoritária no Soviete.

Governo de aliança de classe e duplo poder

Nos dois meses seguintes, as mobilizações operárias e de soldados voltaram a crescer, porque o governo provisório não cumpriu as bandeiras da revolução: o problema da terra não foi resolvido, a fome continuou, mas centralmente a palavra de ordem mais importante não se materializou: a paz, e os operários e os camponeses continuaram morrendo na guerra Inter imperialista.

Para tentar desviar estas mobilizações que crescem dia a dia, a burguesia recorre a uma política que continua utilizando até hoje: a aliança de classes e integra ao governo representantes dos principais partidos do Soviete, Mencheviques e SR.

Surgiu assim um governo muito semelhante ao de Allende no Chile (1970-1973), que também tem semelhanças com os chamados “governos progressistas” da América Latina [4], que como era de se esperar despertaram grandes expectativas nos setores operários e populares.

Mas o governo continua a não responder às exigências e, com o aumento das lutas, fortaleceu-se o Soviete, que se tornou um órgão de duplo poder.

Como dissemos, este novo governo provisório que, com o crescimento das mobilizações operárias e populares, passou a ser chefiado por Kerensky, era muito semelhante ao do Chile com Allende, o Kerensky chileno.

Mas, ao contrário do Chile, na Rússia existia um partido operário, revolucionário e internacionalista, o Partido Bolchevique de Lênin e Trotsky, que não entrou no governo. Esse partido fez o oposto do que fez a maior parte da esquerda chilena.[5] Desde a chegada de Lênin à Rússia, em abril de 1917, esse partido repetiu incansavelmente: Nenhuma confiança no governo provisório. A única maneira de alcançar a Paz, o Pão e a Terra é com o Soviete tomando o poder e construindo o seu próprio governo.

Assim ganharam a maioria nos sovietes e no dia 7 de novembro (25 de outubro) lideraram a Revolução de Outubro, que mudou o mundo. Pela primeira vez, os operários tomaram e mantiveram o poder, provocando mudanças econômicas, democráticas e políticas nunca antes vistas: ao nível da vida dos trabalhadores, das nações oprimidas, das mulheres, das pessoas LGBT. E deram um grande passo organizativo revolucionário com a construção da Terceira Internacional, como ferramenta central na luta pela revolução socialista mundial.

Essa revolução é apenas parte de um passado glorioso ou é um guia para o futuro?

Há muitos que dizem que esta revolução foi muito boa no passado, mas que hoje já não está colocada. A prova é que hoje não existe nada que tenha sido alcançado naquela época; que o capitalismo foi restaurado em todo o mundo; que a classe operária não é mais o centro e já não luta mais como antes; que agora as coisas são diferentes; que agora temos de lutar pela paz, contra a violência e assim por diante. E aqueles que propõem isso recorrem cada vez mais às eleições, procurando uma solução através de meios parlamentares.

Não compartilhamos nada disso. A classe operária continua sendo o centro na medida em que dela depende a produção de tudo. E ninguém que olha para a França, a Grã-Bretanha, a Alemanha, a Ucrânia, a China, a Coreia, os EUA, os portos belgas que paralisam o envio de armas para Israel, pode dizer que a classe operária não está disposta a lutar. As impressionantes mobilizações das massas árabes em apoio à Palestina falam dessa mesma disposição.

O que é certo é que hoje as conquistas da grande revolução de outubro foram perdidas e que o capitalismo foi restaurado em todo o mundo. O que aconteceu é que na Rússia (e na URSS) não houve apenas uma grande revolução. Anos mais tarde, a contrarrevolução stalinista triunfou, impondo 70 anos de liderança de uma burocracia sinistra, com um regime de repressão semelhante ao regime nazista.

Por um lado, isso culminou na restauração do capitalismo e, por outro, essa burocracia foi um grande obstáculo à construção de partidos revolucionários em todo o mundo.

Uma grande consequência disto é que hoje não existe um partido bolchevique que tenha feito a diferença e tornado possível o triunfo da Revolução de Outubro.

Mas a resposta a isso não pode ser abandonar a luta pela revolução socialista. A conclusão a que devemos chegar é que não há tarefa mais importante e urgente do que avançar na construção desse partido, dessa direção revolucionária internacional.

Isto é assim porque a necessidade da revolução socialista é mais urgente do que nunca. As massas palestinas e árabes que lutam contra o genocídio dizem isso em voz alta. Assim como todos aqueles que lutam no mundo contra a exploração e a opressão. Essa mesma necessidade é nitidamente expressa pela destruição do meio ambiente e pelas catástrofes ambientais. A alternativa “socialismo ou barbárie” está cada vez mais presente.

É verdade que o mundo anseia pela paz. Mas a paz nunca será alcançada no Oriente Médio até que não se derrote e não se acabe com o Estado fascista nazi de Israel. A paz nunca será alcançada para a Ucrânia se a invasão russa não for derrotada. E, de um modo mais geral, a paz no mundo nunca será alcançada se o imperialismo não for derrotado com o triunfo da revolução socialista mundial.

Portanto, a Revolução de Outubro não é apenas uma glória do passado, mas continua a ser um guia para o futuro. E hoje, a grande forma de aplicar as suas lições é redobrar os esforços no apoio à Palestina contra o genocídio de Israel e, nesse processo, avançar na construção da liderança revolucionária mundial, baseada no desenvolvimento e fortalecimento da LIT-QI e seus partidos nacionais.

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[1] A Rússia estava participando da Primeira Guerra Mundial. E na frente de batalha morria um grande número de soldados, não só pelas ações do inimigo, mas também pelo frio e pela má alimentação. Ao mesmo tempo, devido aos gastos da guerra, a miséria e a fome cresceram nas cidades.

[2] Uma das duas facções do Partido Social Democrata Russo.

[3] A outra facção do Partido Social Democrata Russo, cujo principal líder era Lênin

[4] Lula e Dilma no Brasil, Correa no Equador, Petro na Colômbia, Evo na Bolívia, etc. A semelhança é que nestes governos participam ou são apoiados por organizações operárias. A outra semelhança é que a maior parte da esquerda chama à confiança nestes governos.

[5] E do que faz a maior parte da esquerda perante os diferentes governos deste tipo.

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