Recentemente, foi divulgada a possibilidade de os partidos de oposição apoiarem uma candidatura presidencial única, em princípio nascida da assim chamada “sociedade civil” (em particular do coletivo SUMAR POR EL SALVADOR[1]) para as eleições presidenciais de 2024. Essa notícia, que poderia ser atraente para aqueles que não concordam com o regime autoritário de Bukele, em nossa opinião não constitui uma opção real ou uma chance de vitória para a classe trabalhadora, mas sim falsas ilusões.
Por: PCT – El Salvador.
Nada de novo sob o sol
Devemos lembrar que esse tipo de candidatura ou construção não é novo em El Salvador, que já experimentou em sua história o fracasso de iniciativas como a que se pretende construir. O antecedente mais recente é a candidatura de Mauricio Funes, que reuniu setores de “progressistas” da sociedade civil, do setor empresarial (Amigos de Mauricio) e do antigo partido de esquerda FMLN. No entanto, a referência à qual os promotores desse esforço aludem é a União Nacional de Oposição (UNO), que surgiu em 1972, quando o Partido Democrata Cristão, o Movimento Nacional Revolucionário e a União Democrática Nacionalista se articularam com o objetivo de acabar com os regimes militares.
A UNO concorreu às eleições presidenciais de 20 de fevereiro de 1972, com José Napoleón Duarte como candidato à presidência. Após as eleições, a UNO denunciou fraude eleitoral em favor do candidato pró-governo Arturo Armando Molina. Algumas semanas depois, em 25 de março de 1972, um grupo de militares tentou um golpe de Estado fracassado em apoio à UNO. Esta continuou participando como aliança política e eleitoral nas eleições presidenciais de 1977, onde também houve sérias denúncias de fraude e derramamento de sangue em 28 de fevereiro para impor o candidato do PCN, General Carlos Humberto Romero, oficialmente declarado vencedor. E que foi derrubado no final de 1979, dando lugar à conhecida Junta Revolucionaria de Gobierno (JRG), nome dado aos três governos de fato de El Salvador que governaram o país entre 15 de outubro de 1979 e 2 de maio de 1982, nos quais o Partido Comunista salvadorenho desempenhou um papel penoso e traiçoeiro.
Depois foi eleita uma Assembleia Constituinte, que nomeou Álvaro Magaña como presidente por dois anos, para realizar eleições em 1984, que finalmente foram vencidas por José Napoleón Duarte (o primeiro candidato da UNO). Não devemos nos esquecer do papel condenável que Duarte desempenhou durante os anos de guerra em El Salvador e de seu servilismo ao imperialismo norte-americano, bem como do grave retrocesso nos direitos e na qualidade de vida do povo salvadorenho.
Os mesmos de sempre são os responsáveis pelo atual governo, é proibido esquecer
Outra razão para não confiar no atual cenário de oposição eleitoral é que o candidato que está sendo considerado não vem da classe trabalhadora e dos setores populares, mas do partido ARENA (embora se venda como sociedade civil) que governou o país por 20 anos, mergulhando-o na pobreza, na corrupção e permitindo que o fenômeno das gangues crescesse em todo o país, uma situação que nunca devemos esquecer, embora a situação seja delicada.
Outro elemento que devemos ter em conta é que, se hoje Bukele governa e controla o aparato estatal salvadorenho, isso se deve à decepção causada pelos dois governos da FMLN, que, além de desmantelar as organizações sociais e de trabalhadores, traíram o desejo de mudança do povo, mergulhando-o ainda mais na pobreza, na corrupção e na morte. Tudo isso se tornou um terreno fértil para que a população, farta da ARENA e da FMLN, entregasse o poder a Bukele que, com grande astúcia e autoritarismo, acabou impondo sua vontade ao país. Essa discussão não é nova, basta lembrar como e a que custo o programa da Revolução Salvadorenha do Governo Democrático Revolucionário (GDR) foi substituído pelo do Governo de Ampla Participação (GAP). A discussão atual é apenas uma reedição desse antigo debate e a intenção de nos levar de volta a uma aliança de classes que só beneficia a burguesia, seja ela qual for.
O problema é a imposição e o autoritarismo.
É importante esclarecer que, em nossa abordagem, o problema não é a reeleição presidencial em si. De uma perspectiva revolucionária, a classe trabalhadora e o povo podem manter um governo se quiserem. Entretanto, não é o caso da situação atual, mas sim é o caso do autoritarismo e do quase fascismo de Bukele, que impôs sua continuidade no poder, não porque esteja interessado no povo, mas porque quer continuar fazendo negócios e protegendo a si mesmo e a sua família diante da corrupção desenfreada de seu governo. O caso seria diferente se, por meio de uma Assembleia Constituinte, um plebiscito, um referendo ou um processo revolucionário, o povo salvadorenho decidisse permitir a reeleição presidencial em El Salvador. Nesse caso, seria a vontade do povo, e não a de um ditador, que seria imposta.
Por todas essas razões, embora acreditemos que seja urgente construir uma alternativa ao regime de Bukele, não apoiamos a proposta de uma candidatura única de oposição nascida da ARENA e da FMLN (não devemos nos esquecer de que outros partidos também surgiram ou tiveram relação ou vínculo com eles, como o PAIS, o NUESTRO TIEMPO e até mesmo o VAMOS).
É hora de confiar em nossas próprias forças e construir nosso próprio futuro.
É por essa razão que chamamos o povo trabalhador salvadorenho a não confiar nessas falsas ilusões que não representam uma saída autêntica para a crise do país. Consideramos que a proposta de candidatura única é apenas uma distração, pois não resolve a situação em que nos encontramos. Os partidos políticos de oposição só nos levam a um beco eleitoral “sem saída”, constroem uma derrota e desmoralizam o espírito de luta que está começando a despertar no povo salvadorenho, assim como a ONU fez na década de 70. Nosso chamado é à construção de uma FRENTE UNITÁRIA DE LUTA que reúna aqueles de nós que não confiam nem nos “velhos” nem nos “novos” políticos e que também estão convencidos de que Bukele e tudo o que ele representa não podem ser derrotados nas urnas, que construa democraticamente um Programa para Lutar baseado nas bandeiras dos setores em Resistência, em um Encontro da Resistência. Essa é a única maneira de derrotar Bukele e seu regime, fortalecendo a luta organizada, a tomada das ruas, as greves, os piquetes, as mobilizações encabeçadas por todos aqueles que estão fartos da miséria, da fome e do autoritarismo de uns poucos sobre as grandes maiorias.
Os partidos políticos burgueses (ARENA, FMLN, PAIS, VAMOS, Nuestro Tiempo) devem ser deixados de lado e superados pela classe trabalhadora salvadorenha e pelo povo pobre, que devem voltar a confiar apenas em suas próprias organizações e forças que os levarão à vitória e à reivindicação de suas legítimas aspirações.
NÃO à farsa eleitoral!
A saída não está nas urnas, mas nas ruas!
Pela construção de uma Frente Unitária de Luta!
Pela construção do Programa de Luta da Resistência para derrotar o regime!
Pelo Encontro da Resistência!
San Salvador, 6 de junho de 2023
[1] A plataforma Sumar é composta, em caráter pessoal, por membros de várias associações, fundações, intelectuais e organizações não governamentais que se opõem ao regime de Bukele.
Tradução: Tae Amaru