qui jul 25, 2024
quinta-feira, julho 25, 2024

Chile| É possível mudar a realidade. Oito propostas para as organizações da classe trabalhadora e do povo

Governos entram e saem e todos dizem que realizarão grandes mudanças. Em suas campanhas prometem tudo. Mas depois rapidamente mudam e chamam as pessoas a serem responsáveis, a respeitar o Congresso, a não gerar inflação, a não desestabilizar a economia, etc. No final, passam-se os anos e nada muda. Aylwin, Frei, Lagos, Piñera, Bachelet, Boric. Fazem reformas superficiais, mas os problemas centrais do povo continuam os mesmos ou piores. Parece ser uma lei da natureza, que nada pode mudar. Mas não é assim. Nada muda porque todos os governos e o Estado estão a serviço do grande empresariado. E justamente é isso o que tem que mudar.

Por: MIT-Chile

Por isso, devemos recuperar a bela tradição de luta e organização da classe trabalhadora chilena. Em muitos momentos históricos as organizações da classe trabalhadora deram exemplos de luta e organização e puderam influenciar na mudança da história. No final deste artigo, recuperamos dois exemplos históricos muito importantes.

Acreditamos que as organizações da classe trabalhadora, os moradores de bairros pobres e a juventude têm um papel fundamental para mudar a situação atual. A começar pela CUT, que deve deixar de ser uma Central Sindical a serviço do governo e passar a organizar os trabalhadores, assim como muitas federações e sindicatos que hoje estão mais ao lado dos patrões que dos trabalhadores. Essas organizações devem colocar-se a serviço dos trabalhadores e convocar as organizações da juventude, como o Confech (Confederação de estudantes do Chile) e as organizações sociais, territoriais, feministas e de diversidade sexual a unificarem-se sob uma única lista de reivindicações urgentes da classe trabalhadora e do povo.

Essa lista de reivindicações deve servir para organizar e mobilizar a classe trabalhadora, para frear a ofensiva empresarial e buscar soluções reais para nossas necessidades. O MIT acredita que as medidas mais urgentes para mudar a situação do povo trabalhador são as seguintes:

1 –Aumento do salário mínimo para 700.000 pesos e reajuste automático dos salários de acordo com o IPC

O salário mínimo atual não cobre nem as necessidades básicas de uma pessoa. Com as imposições, o salário mínimo está em 333.000 pesos. Quem vive com esse dinheiro? Adoraríamos ver um político ou qualquer filho de Luksic ou Matte vivendo com 300 mil pesos. Certamente não teriam ideia do que fazer.

A primeira tarefa então é aumentar o salário mínimo. Com a inflação atual, não podemos falar de um salário mínimo abaixo de 700.000. Este é o montante mínimo calculado pela Fundação Sol para que uma família de 4 pessoas saia da linha da pobreza (esse montante é calculado a partir da linha da pobreza fixada pelo Banco Mundial e ainda é totalmente insuficiente para manter 4 pessoas).

Da mesma forma, é necessário reajustar automaticamente o salário dos trabalhadores de acordo com o IPC (Índice de Preços ao Consumidor).

2 – Congelamento de preços

Para conter a inflação, o governo deve congelar os preços dos bens e serviços mais básicos, como alimentos, aluguéis, transporte e contas de luz, gás e água. Sabemos que a resposta do empresariado ao congelamento de preços pode ser declarar a quebra de empresas, fomentar o desabastecimento ou o mercado clandestino. As empresas que ameacem com quebra devem ser desapropriadas e passadas para o controle da classe trabalhadora. O mercado clandestino deve ser combatido com a organização operária e popular, como nos anos 70 com as Juntas de Abastecimento e Preços (JAPs).

3 – 40 horas sem flexibilização trabalhista

Como afirmamos em outro artigo, a reforma das 40 h aprovada pelo Congresso está cheia de ataques aos trabalhadores. É necessário reduzir as horas de trabalho para que os trabalhadores tenham mais tempo livre e também para distribuir as horas de trabalho, gerando mais empregos. Por isso, defendemos a redução imediata para 40 h sem redução dos salários e sem flexibilização trabalhista a serviço do empresariado.

4 –Aprovação da 6ª retirada e fim imediato das AFPs, com direito à retirada de 100%

As AFPs (Administradoras de Fundos de Pensões/Aposentadorias) devem acabar. Isso é algo que vem sendo gritado nas ruas há quase uma década. Boric também prometeu acabar com o sistema de AFPs, mas até agora não fez nada. Sua proposta de Reforma da Previdência (se é que chegará a ser aprovada) mantém o negócio das AFPs e Seguradoras privadas.

Defendemos o direito de todos os afiliados a retirar seu dinheiro das AFPs e a criação de um sistema público tripartite de pensões/aposentadorias controlado pelos trabalhadores, e não pelos empresários.

5 – Renda mínima universal aos desempregados e informais

O desemprego e o trabalho informal são uma das características mais brutais do capitalismo. Com a quantidade de riqueza produzida no Chile e no mundo, é inconcebível que muitas famílias não tenham dinheiro para suas necessidades básicas. Por isso, defendemos uma renda mínima universal para todos os trabalhadores desempregados e informais enquanto não houver pleno emprego.

6 –Por um plano urgente de construção de moradias sociais dignas para acabar com o déficit habitacional

Hoje no Chile mais de 600 mil famílias não têm direito à moradia. Ao mesmo tempo, para que se tenha uma ideia, só em Santiago, 5 grandes bancos e companhias de Seguro (Consórcio Nacional de Seguros, Penta Vida, Banco de Chile, Banco Santander e Confuturo) possuem quase 7 milhões de m² de solo! Toda essa propriedade deve ser expropriada sem indenizações e colocada a serviço da construção de moradias sociais e dignas. O Estado deve criar uma empresa pública de construção, sob controle dos trabalhadores, para gerar milhares de empregos e acabar com o déficit habitacional.

7 – Basta de agiotagem dos Bancos

Os Bancos lucraram mais de 5,5 bilhões de dólares em 2022 sem produzir um só milímetro de riqueza. São os grandes parasitas que sugam o sangue e o suor de cada trabalhador. Por isso é necessário que os reajustes de créditos hipotecários sejam congelados e todos os leilões de bens de trabalhadores sejam suspensos. Também propomos a criação de um plano nacional de crédito brando para pequenos empresários e a suspensão de toda dívida CAE (Crédito com Garantia do Estado).

8) Para financiar todas essas medidas, confiscar os lucros das grandes empresas e nacionalizar o cobre

Para financiar todo esse plano, é necessário confiscar os lucros dos grandes empresários. Somente as famílias Luksic, Matte e Angelini ganharam mais de 8 bilhões de dólares em 2022. Com esse dinheiro poderiam ser construídas 140.000 moradias sociais de 50 milhões de pesos. Esses enormes lucros empresariais devem estar a serviço do povo.

O mesmo em relação ao cobre, a maior riqueza produzida pelo país. Como propusemos na Convenção Constitucional, é necessário nacionalizar a mineração do cobre em grande escala e colocá-la sob controle dos trabalhadores com participação das comunidades afetadas pela grande mineração. Só assim será possível determinar quanto se produz e de que forma, protegendo os ecossistemas e comunidades vizinhas às grandes minas. O lítio também deve ser nacionalizado e deve ser aberta uma ampla discussão nacional sobre sua exploração ou não em ecossistemas tão frágeis como o Salar do Atacama.

Dois exemplos históricos de luta e organização

No início do século XX, a classe trabalhadora chilena estabeleceu um marco na luta de classes ao enfrentar com organização, uma saída independente à crise nacional provocada pelo fechamento das minas de salitre que deixou 50% dos mineiros no desemprego, uma crise de abastecimento alimentar e os efeitos da primeira guerra mundial que encareceu o custo de produção e frete. Tratou-se da união, em uma assembleia nacional de pequenos e grandes sindicatos, clubes operários e clubes sociais, que diante da grande crise de fome para enfrentar a carestia dos produtos de primeira necessidade e que deu vida à Assembleia Operária de Alimentação Nacional (AOAN). A AOAN mobilizou milhares de trabalhadores nas chamadas marchas da fome entre 1918 e 1920, organizando uma petição para enfrentar a crise alimentar e o poder burguês.

Outra breve e pequena experiência similar nos relata Humberto Valenzuela en Cahiers Leon Trotsky. Esta ocorre em 1932, devido aos resquícios da Grande Depressão e por conseguinte a queda das exportações de salitre e cobre (um informe da Liga das Nações estimava que o Chile era um dos países mais devastados com este marco histórico). Diminuíram as receitas fiscais, a dívida pública e privada aumentou desproporcionalmente, a inflação disparou e pela primeira vez teve-se que suspender o pagamento da dívida externa. Nesse contexto, milhares de desempregados emigraram para Santiago e muitas famílias acabaram vivendo nas ruas e as panelas comunitárias se multiplicaram. O Seguro Operário administrado por Santiago Labarca necessitava construir o Consultório Nº1 (Declarado Monumento Histórico).  Então se constituiu o Comitê Único de Obras da Construção que levantou uma proposta para construí-lo.  O Seguro Operário aceitou, forneceu os materiais e a ajuda técnica e o comitê organizou as contratações de pessoal, normas de trabalho, turnos, assistência e salários. Foram estabelecidas três jornadas, de seis horas cada uma, para dar trabalho à maior quantidade de operários possível, com um salário mínimo de oito pesos por dia, numa época em que os professores ganhavam quatro.  Lamentavelmente, veio o boicote da patronal, mas foram capazes com muita organização de levantar a obra e embora depois fosse terminada pelo Estado, o Consultório nº1 foi construído com o dinheiro do Seguro Social dos trabalhadores e não dos empresários.

Tradução: Lílian Enck

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