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Economia

As raízes profundas da crise bancária internacional

abril 12, 2023

Para tentar entender os acontecimentos recentes que atingiram o setor bancário global, com a falência de dois bancos americanos de médio porte (SVB e Signature Bank), o resgate emergencial de um histórico banco suíço, o Credit Suisse, adquirido de seu rival Swiss Union Banque Suisse, as tensões que atingem o Deutch Bank, o banco mais importante daquela que é conhecida como a locomotiva econômica da Europa, a Alemanha (locomotiva com motor ligeiramente preso), devemos tentar analisar o estado da economia mundial e quais são suas perspectivas a médio e longo prazo. Isso porque, se nos limitássemos a avaliar apenas o colapso e o crescimento das bolsas de valores, o fracasso desta ou daquela empresa capitalista, correríamos o risco de cairmos presas de entusiasmos fáceis ou de visões catastróficas do fim do mundo.

Por: Alberto Madoglio

Mercados financeiros globais: uma estabilidade de fachada

Evidente que os movimentos do mercado acionário refletem a tendência mais geral da economia deste ou daquele país, tal como é verdade que as quedas das ações não provocam apenas prejuízos teóricos (basta pensar no caso em que as ações são dadas como garantia para obter empréstimos e as quedas bruscas de valor impõem ao devedor taxas de juro mais elevadas ou garantias adicionais a subscrever, ou o caso em que os fundos de pensões reduzem o valor a pagar aos trabalhadores com base nas tendências do mercado). Mas especialmente em um curto período, esses “altos e baixos” podem ser enganosos. Por exemplo, se olharmos hoje para o índice europeu de títulos bancários, o Euro Soxx Bank, veremos como ele está se recuperando dos mínimos pós-falência do SVB. O mesmo acontece com o índice da Bolsa de Valores de Nova York que quase atingiu o nível de 6 de março, uma semana antes dos fatos que todos conhecemos.

Se apenas olharmos para esses dados, poderíamos concluir falsamente que todos os problemas estão resolvidos ou a caminho de serem resolvidos, e o que vimos no último mês foi apenas uma das turbulências periódicas no mercado de ações e isso não indica que haja problemas na economia “real”.

Na verdade, como lembramos há muito tempo, a economia mundial está em uma situação extremamente difícil há muito tempo, e os eventos envolvendo o SVB, Credit Suisse e outros fazem soar alarmes para futuros e mais sérios problemas – esses são os clássicos canários usados ​​em minas para advertir vazamentos de gás que poderiam causar explosões devastadoras.

Não podemos entrar em muitos detalhes aqui, mas conforme relatado em uma postagem no blog de Michael Roberts (1), desde 1997, a taxa de mais-valia dos membros do G20 aumentou pouco em relação ao aumento da composição orgânica do capital. Isso significa que há cerca de 25 anos os fatores que podem contrapor a tendência de queda da taxa de lucro não atuam nesse sentido. Isso também explica a aparente irracionalidade de algumas decisões altamente impopulares, como a decisão do governo Macron de aumentar a idade de aposentadoria e a recusa de fazer a menor concessão, apesar das massivas manifestações de massa. É a situação objetiva em que se encontra o capitalismo em geral, e não tanto a insensibilidade de qualquer governante, inclusive presente no caso do primeiro-ministro francês, como também do seu homólogo britânico Sunak, que o empurra para uma atitude de absoluta intransigência.

Uma crise de uma década

Vamos começar com a situação na Europa. Segundo algumas estatísticas do Banco Mundial, os investimentos fixos brutos (isto é, em capital investido para repor o que se desvalorizou ao longo do tempo somado a novos investimentos, que Marx definia como a reprodução ampliada do capital) no Velho Continente entre 2008, quando a crise vinculada às hipotecas subprime estourou nos EUA, e 2021 manteve-se substancialmente estável (3,2 bilhões de dólares) em termos absolutos e em porcentagem do PIB no continente (14,26-14,56). Esses dados mostram que após o que hoje é conhecido como Longa Depressão, não houve um ciclo de recuperação de investimentos suficientemente grande para garantir um crescimento robusto da economia.

Outros dados corroboram nossa conclusão.

A força de trabalho empregada passou de 162 milhões para 164 milhões entre 2008 e 2021.

O crescimento da produtividade oscilou de mais 1,2% na Itália para mais 8,6% na Alemanha e na França, com uma média continental de 7,8.

Em relação a este último item, o fato que melhor demonstra as dificuldades pelas quais passa o sistema capitalista mundial é que entre 2013 e 2018, 60% das economias mundiais estavam abaixo do nível histórico de crescimento da produtividade do trabalho do período 1981-2018. Para as economias avançadas, o percentual sobe para 75% e de O crescimento de 2010 quase parou (2). Os dados cessam há cinco anos, mas tudo aponta para supor que entre a pandemia de Covid 19 e a guerra na Ucrânia a tendência não se inverteu, mas seguramente agravou-se.

O que todo esse conjunto de dados nos mostra? Os capitalistas não investem, portanto, têm menos necessidade de proletários para valorizarem o capital, e se os investimentos enfraquecem, a produtividade estagna porque, em geral, há menos inovações que permitem produzir mais no mesmo tempo. Vale explicar, de forma bem simples, o que vem acontecendo há mais de uma década.

Se alargarmos o olhar para fora da Europa, e deixarmos por um momento de lado o que se passa nos Estados Unidos (3), notamos que outra potência imperialista de primeira linha, o Japão, se encontra numa situação que parece não ter saída.

Desde a década de 1990, o Sol Nascente atravessa uma fase de estagnação econômica para a qual não há fim à vista. Entre 1998 e 2013, o país, apesar de uma política monetária bastante expansiva, viveu um período de deflação, ou seja, queda dos preços em termos absolutos. Apesar de entre 1989 e 2019 os lucros das grandes empresas triplicarem (no mesmo período os salários diminuíram 11%), sua percentagem sobre o total do capital diminuiu continuamente, confirmando mais uma vez a tendência descendente da taxa de lucro que, segundo Marx, é a principal lei da economia capitalista.

Em tempos mais recentes, o PIB continua sendo cerca de 3% abaixo do pico de 2021 e 20% abaixo da média do G7 para o PIB per capita.

A taxa de desemprego é particularmente baixa, cerca de 2%, mas os contratos de trabalho a tempo parcial abundam no país e, além disso, uma diminuição da população em cerca de 500 mil por ano permite, por um lado, manter a percentagem de desempregados, mas, por outro lado, se esse fenômeno não for revertido, o futuro da ilha parece mais sombrio do que o de muitos de seus concorrentes (4).

Dessa forma, agora ficou mais simples, pelo menos assim pensamos, entender os acontecimentos das últimas semanas e tentar fazer previsões para o futuro.

Para tentar contrariar a tendência de queda dos lucros, o capitalismo ampliou o recurso da especulação, de qualquer tipo (5), e uma vez que surgem problemas no setor especulativo e eclodem crises, estas por sua vez têm um impacto violento sobre um setor produtivo em grandes dificuldades, que em consequência destas situações se agrava ainda mais, e que volta a ter um impacto negativo no ramo especulativo da economia, dando vida a um verdadeiro círculo vicioso que parece não ter fim.

As próprias decisões tomadas pelas autoridades financeiras nas últimas semanas conseguiram, em parte, evitar males maiores, mas na realidade apenas adiaram o acerto de contas ao longo do tempo, que quando aconteça terá sem dúvida uma expansão muito maior do que podemos imaginar.

A decisão das autoridades norte-americanas de também garantir também os depósitos bancários superiores a $250.000 de correntistas do SVB, com a desculpa de que o banco era grande demais para que seus clientes estivessem sujeitos às regras normais de liquidação bancária, evitou de imediato os piores problemas, mas, ao menos ao mesmo tempo, desencadeou uma saída de depósitos de pequenos e médios bancos regionais para os gigantes do crédito.

Porém, se um desses gigantes se encontrasse na situação do SVB, até mesmo os cofres da maior potência econômica do planeta teriam dificuldade em replicar o comportamento ocorrido em relação ao SVB.

Além disso, isso poderia levar os clientes dos bancos, cujos países não podem usufruir das mesmas garantias que os estadunidenses, a transferirem seu próprio capital para o exterior. Este poderia ser o caso da Itália, onde, diante de mais de 700 bilhões em depósitos formalmente garantidos, o fundo nacional de proteção tem apenas 3 bilhões, e o governo de Roma não conseguiria replicar as decisões tomadas em Washington.

O salvamento do Credit Suisse protegeu parcialmente os acionistas, mas penalizando uma particular classe de obrigações, congelou, para eles, o mercado, acima de 200 bilhões, e insinua a dúvida de que mesmo no futuro, não apenas na Suíça, se possa privilegiar antes aos acionistas do que a outros credores, violando os regulamentos bancários internacionais.

A possibilidade de que o banco central do Japão também siga seus homólogos dos EUA, Europa, e Grã Bretanha aumentando as taxas de juros, poderia empurrar aos bancos do país a se desfazer de obrigações estrangeiras que têm estado entre os maiores compradores no passado. Isso poderia gerar mais tensões no mercado internacional de títulos emitidos por empresas privadas (como empresas, bancos, seguradoras, etc.) (6).

Só uma vitória do proletariado pode representar esperança para o futuro

Um vazamento se fecha em um ponto do casco do sistema capitalista, e imediatamente outros se abrem em lugares diferentes e maiores. Que as nuvens estão se acumulando no futuro do planeta é confirmado por uma instituição que certamente não pode ser suspeita de abrigar simpatias revolucionárias.

Em seu relatório intitulado “Falling Long – Term Growth Prospects: trends, expectations and policy”, o Banco Mundial prevê que até 2030 o crescimento global estará em seu nível mais baixo das três décadas anteriores, com um aumento médio do PIB de 2,2 %. anual (a menos que apareçam acontecimentos que, como a pandemia e a guerra na Ucrânia, possam piorar ainda mais a situação). Afirma que, sem correções, o que estamos vivendo será uma década perdida.

Falta no relatório, como não poderia deixar de ser, um fato que pode fazer a diferença: a luta de classes entre capital e trabalho.

Isso é o que vem acontecendo há meses e ultimamente perturba o coração do imperialismo mundial: Grã-Bretanha, Alemanha e, acima de tudo, França.

Até o jornal La Repubblica, propriedade da família Elkann, grupo Stellantis, teve que admitir. “Paris, Berlim, Lisboa. A Europa redescobre a vontade de sair à rua”, é o título da página 17 desta segunda-feira, 3 de abril. Fala-se da “primavera europeia” ecoando as revoltas árabes de 2011. Admite-se que aqueles que queriam substituir a luta entre gerações pela luta de classes são desmentidos pelo que está acontecendo na França, onde jovens e adultos estão lado a lado para protestar não só pelas aposentadorias/pensões, mas contra um sistema que não dá esperança a jovens e menos jovens. Os protestos assumem reivindicações anticapitalistas e marcam o que o autor chama de fim do “confinamento do desencanto”.

Evidente que o jornal de uma das maiores famílias da burguesia italiana olha com alguma simpatia para os acontecimentos do outro lado dos Alpes porque a situação na Itália hoje, infelizmente, é menos efervescente.

Será o curso dos eventos em Londres, Paris, Berlim e, esperançosamente, em breve em Roma, que determinará se os anos 20 do século XXI serão uma década perdida.

De nossa parte, esperamos que assim seja para a burguesia de todos os países, e que o triunfo das lutas operárias, presentes e futuras, abra um tempo de nova esperança para os oprimidos e explorados do planeta.

(1) M. Roberts, ”More on a world rate of profit”,  https://thenextrecession.wordpress.com/2020/09/20/more-on-a-world-rate-of-profit/

(2) “Global Productivity: Trends, Drivers, and Policies”, disponível em  https://www.worldbank.org/en/research/publication/global-productivity-productivity

(3) Para aqueles que desejam refrescar a memória sobre o estado da economia Stars and Stripes, sugerimos a leitura do recente artigo https://www.partitodialternativacomunista.org/politica/internazionale/silicon-valley-bank-l-irrazionalita-di-un-sistema-basato-sul-profitto

(4) M. Roberts, “Japan: the ‘new capitalism’ updated”, https://thenextrecession.wordpress.com/2022/07/06/japan-the-new-capitalism-updated/

Tradução italiano/espanhol: Natália Estrada.

Tradução espanhol/português: Lena Souza

As raízes profundas da crise bancária internacional

Para tentar entender os acontecimentos recentes que atingiram o setor bancário global, com a falência de dois bancos americanos de médio porte (SVB e Signature Bank), o resgate emergencial de um histórico banco suíço, o Credit Suisse, adquirido de seu rival Swiss Union Banque Suisse, as tensões que atingem o Deutch Bank, o banco mais importante daquela que é conhecida como a locomotiva econômica da Europa, a Alemanha (locomotiva com motor ligeiramente preso), devemos tentar analisar o estado da economia mundial e quais são suas perspectivas a médio e longo prazo. Isso porque, se nos limitássemos a avaliar apenas o colapso e o crescimento das bolsas de valores, o fracasso desta ou daquela empresa capitalista, correríamos o risco de cairmos presas de entusiasmos fáceis ou de visões catastróficas do fim do mundo.

Por: Alberto Madoglio

Mercados financeiros globais: uma estabilidade de fachada

Evidente que os movimentos do mercado acionário refletem a tendência mais geral da economia deste ou daquele país, tal como é verdade que as quedas das ações não provocam apenas prejuízos teóricos (basta pensar no caso em que as ações são dadas como garantia para obter empréstimos e as quedas bruscas de valor impõem ao devedor taxas de juro mais elevadas ou garantias adicionais a subscrever, ou o caso em que os fundos de pensões reduzem o valor a pagar aos trabalhadores com base nas tendências do mercado). Mas especialmente em um curto período, esses “altos e baixos” podem ser enganosos. Por exemplo, se olharmos hoje para o índice europeu de títulos bancários, o Euro Soxx Bank, veremos como ele está se recuperando dos mínimos pós-falência do SVB. O mesmo acontece com o índice da Bolsa de Valores de Nova York que quase atingiu o nível de 6 de março, uma semana antes dos fatos que todos conhecemos.

Se apenas olharmos para esses dados, poderíamos concluir falsamente que todos os problemas estão resolvidos ou a caminho de serem resolvidos, e o que vimos no último mês foi apenas uma das turbulências periódicas no mercado de ações e isso não indica que haja problemas na economia “real”.

Na verdade, como lembramos há muito tempo, a economia mundial está em uma situação extremamente difícil há muito tempo, e os eventos envolvendo o SVB, Credit Suisse e outros fazem soar alarmes para futuros e mais sérios problemas – esses são os clássicos canários usados ​​em minas para advertir vazamentos de gás que poderiam causar explosões devastadoras.

Não podemos entrar em muitos detalhes aqui, mas conforme relatado em uma postagem no blog de Michael Roberts (1), desde 1997, a taxa de mais-valia dos membros do G20 aumentou pouco em relação ao aumento da composição orgânica do capital. Isso significa que há cerca de 25 anos os fatores que podem contrapor a tendência de queda da taxa de lucro não atuam nesse sentido. Isso também explica a aparente irracionalidade de algumas decisões altamente impopulares, como a decisão do governo Macron de aumentar a idade de aposentadoria e a recusa de fazer a menor concessão, apesar das massivas manifestações de massa. É a situação objetiva em que se encontra o capitalismo em geral, e não tanto a insensibilidade de qualquer governante, inclusive presente no caso do primeiro-ministro francês, como também do seu homólogo britânico Sunak, que o empurra para uma atitude de absoluta intransigência.

Uma crise de uma década

Vamos começar com a situação na Europa. Segundo algumas estatísticas do Banco Mundial, os investimentos fixos brutos (isto é, em capital investido para repor o que se desvalorizou ao longo do tempo somado a novos investimentos, que Marx definia como a reprodução ampliada do capital) no Velho Continente entre 2008, quando a crise vinculada às hipotecas subprime estourou nos EUA, e 2021 manteve-se substancialmente estável (3,2 bilhões de dólares) em termos absolutos e em porcentagem do PIB no continente (14,26-14,56). Esses dados mostram que após o que hoje é conhecido como Longa Depressão, não houve um ciclo de recuperação de investimentos suficientemente grande para garantir um crescimento robusto da economia.

Outros dados corroboram nossa conclusão.

A força de trabalho empregada passou de 162 milhões para 164 milhões entre 2008 e 2021.

O crescimento da produtividade oscilou de mais 1,2% na Itália para mais 8,6% na Alemanha e na França, com uma média continental de 7,8.

Em relação a este último item, o fato que melhor demonstra as dificuldades pelas quais passa o sistema capitalista mundial é que entre 2013 e 2018, 60% das economias mundiais estavam abaixo do nível histórico de crescimento da produtividade do trabalho do período 1981-2018. Para as economias avançadas, o percentual sobe para 75% e de O crescimento de 2010 quase parou (2). Os dados cessam há cinco anos, mas tudo aponta para supor que entre a pandemia de Covid 19 e a guerra na Ucrânia a tendência não se inverteu, mas seguramente agravou-se.

O que todo esse conjunto de dados nos mostra? Os capitalistas não investem, portanto, têm menos necessidade de proletários para valorizarem o capital, e se os investimentos enfraquecem, a produtividade estagna porque, em geral, há menos inovações que permitem produzir mais no mesmo tempo. Vale explicar, de forma bem simples, o que vem acontecendo há mais de uma década.

Se alargarmos o olhar para fora da Europa, e deixarmos por um momento de lado o que se passa nos Estados Unidos (3), notamos que outra potência imperialista de primeira linha, o Japão, se encontra numa situação que parece não ter saída.

Desde a década de 1990, o Sol Nascente atravessa uma fase de estagnação econômica para a qual não há fim à vista. Entre 1998 e 2013, o país, apesar de uma política monetária bastante expansiva, viveu um período de deflação, ou seja, queda dos preços em termos absolutos. Apesar de entre 1989 e 2019 os lucros das grandes empresas triplicarem (no mesmo período os salários diminuíram 11%), sua percentagem sobre o total do capital diminuiu continuamente, confirmando mais uma vez a tendência descendente da taxa de lucro que, segundo Marx, é a principal lei da economia capitalista.

Em tempos mais recentes, o PIB continua sendo cerca de 3% abaixo do pico de 2021 e 20% abaixo da média do G7 para o PIB per capita.

A taxa de desemprego é particularmente baixa, cerca de 2%, mas os contratos de trabalho a tempo parcial abundam no país e, além disso, uma diminuição da população em cerca de 500 mil por ano permite, por um lado, manter a percentagem de desempregados, mas, por outro lado, se esse fenômeno não for revertido, o futuro da ilha parece mais sombrio do que o de muitos de seus concorrentes (4).

Dessa forma, agora ficou mais simples, pelo menos assim pensamos, entender os acontecimentos das últimas semanas e tentar fazer previsões para o futuro.

Para tentar contrariar a tendência de queda dos lucros, o capitalismo ampliou o recurso da especulação, de qualquer tipo (5), e uma vez que surgem problemas no setor especulativo e eclodem crises, estas por sua vez têm um impacto violento sobre um setor produtivo em grandes dificuldades, que em consequência destas situações se agrava ainda mais, e que volta a ter um impacto negativo no ramo especulativo da economia, dando vida a um verdadeiro círculo vicioso que parece não ter fim.

As próprias decisões tomadas pelas autoridades financeiras nas últimas semanas conseguiram, em parte, evitar males maiores, mas na realidade apenas adiaram o acerto de contas ao longo do tempo, que quando aconteça terá sem dúvida uma expansão muito maior do que podemos imaginar.

A decisão das autoridades norte-americanas de também garantir também os depósitos bancários superiores a $250.000 de correntistas do SVB, com a desculpa de que o banco era grande demais para que seus clientes estivessem sujeitos às regras normais de liquidação bancária, evitou de imediato os piores problemas, mas, ao menos ao mesmo tempo, desencadeou uma saída de depósitos de pequenos e médios bancos regionais para os gigantes do crédito.

Porém, se um desses gigantes se encontrasse na situação do SVB, até mesmo os cofres da maior potência econômica do planeta teriam dificuldade em replicar o comportamento ocorrido em relação ao SVB.

Além disso, isso poderia levar os clientes dos bancos, cujos países não podem usufruir das mesmas garantias que os estadunidenses, a transferirem seu próprio capital para o exterior. Este poderia ser o caso da Itália, onde, diante de mais de 700 bilhões em depósitos formalmente garantidos, o fundo nacional de proteção tem apenas 3 bilhões, e o governo de Roma não conseguiria replicar as decisões tomadas em Washington.

O salvamento do Credit Suisse protegeu parcialmente os acionistas, mas penalizando uma particular classe de obrigações, congelou, para eles, o mercado, acima de 200 bilhões, e insinua a dúvida de que mesmo no futuro, não apenas na Suíça, se possa privilegiar antes aos acionistas do que a outros credores, violando os regulamentos bancários internacionais.

A possibilidade de que o banco central do Japão também siga seus homólogos dos EUA, Europa, e Reino Unido aumentando as taxas de juros, poderia empurrar aos bancos do país a se desfazer de obrigações estrangeiras que têm estado entre os maiores compradores no passado. Isso poderia gerar mais tensões no mercado internacional de títulos emitidos por empresas privadas (como empresas, bancos, seguradoras, etc.) (6).

Só uma vitória do proletariado pode representar esperança para o futuro

Um vazamento se fecha em um ponto do casco do sistema capitalista, e imediatamente outros se abrem em lugares diferentes e maiores. Que as nuvens estão se acumulando no futuro do planeta é confirmado por uma instituição que certamente não pode ser suspeita de abrigar simpatias revolucionárias.

Em seu relatório intitulado “Falling Long – Term Growth Prospects: trends, expectations and policy”, o Banco Mundial prevê que até 2030 o crescimento global estará em seu nível mais baixo das três décadas anteriores, com um aumento médio do PIB de 2,2 %. anual (a menos que apareçam acontecimentos que, como a pandemia e a guerra na Ucrânia, possam piorar ainda mais a situação). Afirma que, sem correções, o que estamos vivendo será uma década perdida.

Falta no relatório, como não poderia deixar de ser, um fato que pode fazer a diferença: a luta de classes entre capital e trabalho.

Isso é o que vem acontecendo há meses e ultimamente perturba o coração do imperialismo mundial: Grã-Bretanha, Alemanha e, acima de tudo, França.

Até o jornal La Repubblica, propriedade da família Elkann, grupo Stellantis, teve que admitir. “Paris, Berlim, Lisboa. A Europa redescobre a vontade de sair à rua”, é o título da página 17 desta segunda-feira, 3 de abril. Fala-se da “primavera europeia” ecoando as revoltas árabes de 2011. Admite-se que aqueles que queriam substituir a luta entre gerações pela luta de classes são desmentidos pelo que está acontecendo na França, onde jovens e adultos estão lado a lado para protestar não só pelas aposentadorias/pensões, mas contra um sistema que não dá esperança a jovens e menos jovens. Os protestos assumem reivindicações anticapitalistas e marcam o que o autor chama de fim do “confinamento do desencanto”.

Evidente que o jornal de uma das maiores famílias da burguesia italiana olha com alguma simpatia para os acontecimentos do outro lado dos Alpes porque a situação na Itália hoje, infelizmente, é menos efervescente.

Será o curso dos eventos em Londres, Paris, Berlim e, esperançosamente, em breve em Roma, que determinará se os anos 20 do século XXI serão uma década perdida.

De nossa parte, esperamos que assim seja para a burguesia de todos os países, e que o triunfo das lutas operárias, presentes e futuras, abra um tempo de nova esperança para os oprimidos e explorados do planeta.

(1) M. Roberts, ”More on a world rate of profit”,  https://thenextrecession.wordpress.com/2020/09/20/more-on-a-world-rate-of-profit/

(2) “Global Productivity: Trends, Drivers, and Policies”, disponível em  https://www.worldbank.org/en/research/publication/global-productivity-productivity

(3) Para aqueles que desejam refrescar a memória sobre o estado da economia Stars and Stripes, sugerimos a leitura do recente artigo https://www.partitodialternativacomunista.org/politica/internazionale/silicon-valley-bank-l-irrazionalita-di-un-sistema-basato-sul-profitto

(4) M. Roberts, “Japan: the ‘new capitalism’ updated”, https://thenextrecession.wordpress.com/2022/07/06/japan-the-new-capitalism-updated/

Tradução italiano/espanhol: Natália Estrada.

Tradução espanhol/português: Lena Souza

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