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Especial Grécia-Syriza

O que pode oferecer o Governo Tsipras aos trabalhadores gregos?

março 10, 2015
O balanço de um mês de governo e a política dos revolucionáriosA cena mostra um menino brincando com um trenzinho elétrico. O menino está visivelmente contrariado porque a cada curva o seu trenzinho descarrilha e os vagões saem dos trilhos.

Ele então se dirige, pedindo ajuda, a um homem grande e gordo que, com um jeito afável e protetor, lhe mostra qual é a melhor maneira de fazer os comboios correrem sem que derrapem. Enquanto o trenzinho dispara, estável sobre os trilhos, tremula a bandeira da Grécia. O menino agora satisfeito faz um típico gesto estadunidense, o “give me five”, para o homem que o ajudou. Só nesse momento é que descobrimos que o menino se chama “Alexis”.

Os preparativos para o Governo: um olho nos militares…
 
A cena que acabamos de descrever é parte da propaganda eleitoral do partido Grego Anel (Anexartitoi Ellines, ou, Gregos independentes), a organização de direita que, nas últimas eleições obteve 4,75% dos votos e 13 cadeiras, e que graças a isso formou uma coalizão de governo com o partido da esquerda Syriza. O grandalhão da cena descrita é o próprio líder do Anel, Panos Kammenos, que interpreta a si mesmo enquanto ajuda o menino, que de maneira muito significativa se chama Alexis, a deixar o pequeno trem nos trilhos sem que ele derrape. Em apenas 35 segundos [1] contaram, antes ainda das eleições, aquilo que seria o governo Tsipras. A simbologia é bastante transparente: o jovem líder da esquerda grega não tem condições de sozinho manter o país sobre os trilhos; se pretende portanto, que, com pragmatismo paternalista e confiabilidade, se contrapor a inexperiência jovial, saiba segurar as pontas.

Anel é um partido da direita nacionalista Grega, nasceu de uma cisão da “Nova Democracia” do ex-premiê Samaras. As suas posições são contra a austeridade imposta pela Europa, mas principalmente contra a imigração e o multiculturalismo, em defesa dos valores patrióticos e religiosos da Igreja Grega Ortodoxa. Mas, o que é importante destacar, é que o seu líder Kammenos, é a garantia dos militares e representa, para o Tsipras, uma “apólice de seguro”[2].

É assim que se explica a rapidez (menos de uma hora de reunião) com a qual os dois firmaram a estranha aliança de governo: uma aliança que finca suas raízes na declaração de 6 de maio de 2012, quando em ocasião da eleições anteriores, Kammenos “não excluía uma aliança com Syriza a partir da rejeição mútua da dureza imposta por Bruxelas” [3].

… e outro na Igreja…
 
Mas não é só com os militares – lugar onde os neonazistas do Aurora Dourada nadam de braçadas – que o Tsipras quis garantir sua tranquilidade. Na Grécia, a igreja ortodoxa tem um peso social muito relevante, que não pode ser ignorado pelo poder político. No último mês de agosto, Tsipras foi ao Monte Athos para uma visita de dois dias à comunidade religiosa que conta com 20 mosteiros sediados nessa região, que a Constituição grega reconhece como uma forma de autogoverno. [4]

Recebido com todas as honras pelo conselho da comunidade que se reuniu especialmente para o evento, o líder do Syriza fez questão de assegurar aos representantes prometendo completo apoio aos pedidos pertinentes ao tema do regime fiscal das propriedades eclesiásticas.

Porém, esse foi só o último passo de um percurso de gradual aproximação com as hierarquias Ortodoxas, iniciada em Janeiro de 2013 na ocasião de um debate organizado pela Universidade de Tessalônica sobre o tema “Igreja e Esquerda”. Colocando de lado o anticlericalismo, Syriza iniciou uma estreita e crescente colaboração com a Igreja grega sobre os temas sociais e de luta comum contra o Aurora Dourada, resultando depois em uma inédita audiência concedida ao Tsipras, em Janeiro de 2014, com o patriarca de Constantinopla.

… e outro nas finanças internacionais.
 
Todavia, as ações do Tsipras para se credenciar como futuro premier responsável e confiável, aconteceram com uma grande magnitude nos palcos das finanças internacionais.

Já em Janeiro de 2013, o jovem líder Grego começou um longo tour pelas capitais mais importantes, mostrando uma imagem de si mesmo tranquilizadora e nada radical. “Espero que tenha conseguido convencê-los que não sou perigoso como alguns pensavam (…). Quem quer assustá-los dirá que se o nosso partido chegar ao poder, rasgará os acordos com a União Europeia e o FMI, levará o país para fora da eurozona, [mas] o nosso objetivo é salvar o País e mantê-lo dentro da eurozona.” Essas foram as suas declarações para a plateia em um encontro na Brookings Institution em Washington, o mais influente organismo de análise política dos Estados Unidos [5].

Dois meses depois, Tsipras estava na London School of Economics tranquilizando o auditório, garantindo que não era a intenção do Syriza romper com o Euro ou repudiar a dívida[6].

Passados poucos meses, em setembro, participando do Kreisky Forum, de Viena, teve o cuidado de ilustrar para as burguesias europeias que o seu partido era contrário ao desmantelamento da União Europeia e que o projeto era apenas o de reprojetar a união monetária, estabilizando a eurozona e colocando em campo “um Plano Marshall europeu que compreenda uma verdadeira união bancária, uma gestão centralizada do débito por parte do BCE e (…) uma conferência extraordinária sobre a dívida europeia de toda a periferia. (…) o meu partido, Syriza, está comprometido em promover um plano europeu para a salvação da eurozona” [7].

Enfim, a peregrinação de Tsipras concluiu-se na Itália, onde, em setembro de 2014, registrou-se  a sua presença  – recebida calorosamente pela elite do capitalismo italiano – no Fórum Ambrosetti de Cernobbio (o cenáculo da grande burguesia italiana) [8], no qual flertou com Mario Monti, em uma enxurrada de elogios mútuos [9]. E então, alguns dias depois, a visita ao Papa [10].

O oportunismo e a tentativa da “mão de ferro” no partido
 
Como bem se vê, “estudando o futuro primeiro ministro”, Tsipras adotou uma astuta política com o objetivo de preparar o terreno para a ascensão do seu partido. Antes ainda da campanha eleitoral, Syriza já era protagonista de uma reviravolta, que na prática consistia no abandono progressivo de todos os pontos destacados do programa original do partido em favor do, muito mais moderado, “programa de Tessalônica”.

Para compreender o sentido do percurso político do Syriza, é preciso voltar às suas origens, ou seja, em 2002, quando se constituiu como coalisão eleitoral cujo principal componente era uma ruptura do Partido Comunista (KKE), Synapismos, favorável à adesão da Grécia à União Europeia. Confluíram nesse agrupamento alguns pequenos partidos da esquerda pseudo-trostskista, maoísta, anarquista e ecologista.

Foi só em 2012 que vem à luz o primeiro programa do Syriza, que previa, na época, – mas com uma linguagem ambígua e que podia servir para leituras tanto de esquerda como de direita – a nacionalização/socialização dos bancos e a sua integração em um sistema bancário público sob controle social e operário; a nacionalização de todos os serviços públicos de interesse estratégico; a suspensão do pagamento da dívida com uma auditoria para a verificação da sua parte ilegítima; e sobre a politica internacional, a saída da OTAN e a abolição da cooperação militar com o Estado de Israel.

Já em Julho de 2013, o congresso que transformou o Syriza de coalizão eleitoral em partido, cancelou e modificou profundamente os pontos mais ‘espinhosos’ do programa, não modificando completamente o manifesto de 2012, mas aprofundando os já amplos aspectos de ambiguidade. Por outro lado, o próprio Tsipras, encontrando, em ocasião da sua viagem para Washington, alguns representantes do Departamento de Estado Norte-Americano, já os tinha assegurado sobre a vontade do seu partido de garantir a permanência da Grécia na OTAN no caso de chegar ao Governo [11].

No Congresso, a ala à esquerda do partido recolheu cerca de 30% dos votos, com um consenso até os 40% em alguns adendos. Nesse contexto, a maioria do Syriza deslocou o epicentro da discussão sobre as questões estatutárias tentando uma manobra para proibir a existência de tendências internas. Mas a firme oposição a este ponto, não apenas dos setores que seriam afetados pela medida restritiva, como também dos setores de esquerda do próprio grupo de Tsipras, levou a uma solução de um compromisso com o encaminhamento da questão para posterior discussão. Segundo a principal figura pública da esquerda interna, Stathis Kouvelakis, o Tsipras foi induzido a tentar aquela manobra pelas pressões da imprensa, que tensionava com a finalidade de que o partido pudesse “controlar” a ala dissidente [12].
As tratativas com o Imperialismo

De qualquer maneira, o programa que saiu do congresso de 2013 foi ulteriormente “suavizado” para depois se transformar no “Programa de Tessalônica”, exposto pelo mesmo líder das eleições: um programa claramente keynesiano, cujas promessas (com as quais o Syriza conduziu a campanha eleitoral) partiam do pressuposto da resolução da questão da dívida com a Troika nas futuras negociações com Bruxelas. Mas antes de inicia-las, depois de vencer a competição, Tsipras e o seu ministro das finanças Yanis Varoufakis [13] iniciaram uma peregrinação em diferentes países europeus na tentativa de “desarticular” a aliança entre as nações credoras, buscando disseminar divisões entre aquelas mais fieis à austeridade (com a Alemanha à cabeça) e aquelas consideradas menos ortodoxas (França e Itália).


As esperanças se transformaram em desilusões. Como em uma partida de pôquer, enquanto os dois líderes helênicos tinham nas mãos um blefe, os adversários – mesmo que interpretando os papéis designados a cada um (Renzi e Hollande teciam elogios a Tsipras, enquanto Merkel e o seu Ministro Schauble bradavam contra ele) – desciam as cartas que realmente importavam em uma negociação com os ladrões imperialistas: a ameaça de suspender as ajudas. Por outro lado, a nova liderança grega não poderia não saber [14] que, quando era Comissário Europeu para Assuntos Econômicos e Monetários em 2013, Olli Rehn declarou em uma conferência de imprensa que o controle europeu sobre as finanças gregas não teria terminado com a expiração dos acordos sobre os empréstimos. A esse respeito, relatando a notícia, o jornal grego Kathimerini explicou bem o sentido dessa declaração: “se um eventual governo do Syriza quisesse colocar em prática políticas keynesianas, deveria antes de mais nada, convencer todos os seus parceiros da eurozona a aceitar uma mudança no atual quadro legislativo, ou então abandonar a moeda comum. Em outros termos, se o Syriza tentasse se distanciar da ortodoxia econômica, a Grécia seria arrastada em frente a Corte de Justiça Europeia, deveriam pagar algumas sanções e também subsídios para a União Europeia, segundo o acordo financeiro plurianual (2014 – 2020), seriam suspensos” [15].
 
O êxito das negociações

Em seguida, Tsipras e Varoufakis, se aventuraram, com uma arma de brinquedo nas mãos, sem considerar as consequências, em negociações com os advogados de Bruxelas, armados pelo contrário de um canhão [16]. Depois de uma negociação de alguns dias, as parte chegaram a um “compromisso”, que para a Grécia, no entanto, tem apenas o caráter semântico: o primeiro ministro grego, na verdade, está tirando vantagem com o seu eleitorado de que a Troika foi expulsa do país helênico; que obtiveram quatro meses de alívio graças à outros créditos; que as privatizações foram interrompidas, que os gregos reconquistaram a sua soberania, visto que poderão decidir por suas próprias mãos as medidas econômicas necessárias.

As coisas, obviamente, não ocorreram bem assim. O jornal a Repubblica [17] esclarece de imediato que “os mais fortes, Jeroen Dijsselbloem e a Alemanha, venceram ganhando muito mais coisas do que concedendo”, reconhecendo em Atenas apenas o suficiente para reivindicar o magro resultado de “ter aberto por baixo e desrespeitando as leis dos números um debate sobre a Europa destinado a durar mais do que as próprias decisões desses dias.” A verdade é que, para dar um “agradinho” para Tsipras e em homenagem ao compromisso linguístico por ele pretendido para limpar a sua barra frente ao seu povo, a Troika não se chamará mais assim, mas de hoje em diante, mesmo continuando as mesmas políticas em relação a Grécia, se chamará “as Instituições”; que os empréstimos para os próximos quatro meses não são exatamente ‘novos’, mas são a extensão, não só do acordo sobre o empréstimo, mas do originário Memorando (que porém, sempre por uma gentil concessão de Bruxelas, não se chamará mais assim); que permanecem paradas as privatizações já decididas, enquanto o governo grego se dedica a respeitar o processo em conformidade com a lei para aquelas já iniciadas e para examinar com os parceiros aquelas privatizações ainda no papel, com a finalidade de melhorar os termos [18]; que os gregos poderão ‘livremente’ escolher a própria política econômica não mais do que livremente possam “escolher” quem ver apontando a arma para a sua cabeça. E de fato, o governo helênico ‘livremente’ deu um passo atrás na promessa eleitoral de recompor o salário mínimo para 751 Euros, postergando indefinidamentea sua discussão, “previa consulta com as instituições europeias e internacionais”; se dedicou a dar inicio a uma manobra sobre oIVA [tipo de imposto sobre o consumo] [19](adotando “uma linguagem digna dos funcionários do Ocse” [Organização pela cooperação e desenvolvimento econômico na Europa],ironiza o Jornal da Confederação das Indústrias Italianas, Il Sole 24 Ore[20]); se dedicou a “expandir e desenvolver os atuais projetos de trabalho temporário” [21], garantindo o “alinhamento com as melhores práticas europeias através de um processo de consulta com os parceiros”, e a aprovar uma reforma da previdência, estabelecendo “uma correspondência mais estreita entre as contribuições arrecadas e o montante da pensão”; e por fim, se empenhou a “adotar uma revisão dos gastos em cada área de despesa (por exemplo: educação, defesa, transportes, governo local, assistência social)’ e a “remover os obstáculos à concorrência” [22].

Esse programa de “reformas” – sobre o qual, em um envergonhadíssimo artigo, o patrocinador italiano do governo Tsipras (Refundação Comunista) afirma com uma ironia involuntária: “não nos parece que se trate mesmo da “entrega” da qual falam todos aqueles que não confiam que seja colocada em discussão a disciplina neoliberal na União Europeia” [23] – representa, como conclusão, a demonstração incontestável do quanto a amortização da dívida tenha agora definitivamente se tornado uma condição criada pelo próprio poder executivo grego.
 
Um Governo de Frente Popular
 
Como já escrevemos acima, Tsipras impôs a eleição de Prokopis Pavloupoulos à Presidente da República. Pavlopoulos é um importante expoente do partido de Centro-Direita Nova Democracia e ocupou o cargo de Ministro do Interior durante o governo Karamanlis de 2004 a 2009, exatamente no período em que a violenta polícia grega matou um jovem estudante, Alexandros Grigoropoulos, dando início a grandes manifestações de protesto. O Corriere dela Sera, que o descreve como um maçom e europeísta convicto, evidencia como a sua eleição serviu ao primeiro ministro grego para “controlar os ânimos mais extremos de seu partido”[24]. Mas na realidade teve também o objetivo de mandar um sinal de distensão ao eurogrupo com o fim de favorecer a conclusão das negociações, que não por acaso aconteceram dois dias depois [25].  Mas deve-se também notar que o cenário de “coabitação”, ou seja, aquele no qual um governo baseado no Syriza pode coabitar com um presidente de centro-direita, foi proposto pelo próprio Panos Kammenos, o aliado do Governo Tsipras, como demonstração seja do peso político que um representante direto dos setores da burguesia grega no governo anti-austeridade tem no interior do executivo, seja a falácia da analise que a propósito faz a esquerda centrista interna do Syriza [26]. Parece evidente, portanto, como a partir do acordo com o ANEL, com a eleição de Pavlopoulos tenha se determinado uma recomposição da direita no coração do regime grego.

Nesse ponto, é necessário proceder, com base nos elementos que estão sobre a mesa, a uma caracterização do Governo Tsipras para compreender qual deve ser o comportamento dos revolucionários.

Iniciemos, antes de mais nada, reafirmando que o Syriza, levando em consideração o seu programa reformista, já descrito sinteticamente por nós, pode já ser considerado como parte dos partidos sociais-democratas. Com um programa repleto de keynesianismo e que não se coloca o objetivo de romper com o regime de dominação burguesa, mas ao contrário, procura obter “melhorias administrativas realizadas no terreno das relações de produção [burguesas], que não mudam para nada a relação entre capital e trabalho, mas no melhor dos casos, diminuam para a burguesia os gastos do sua dominação e simplificam a estrutura de suas finanças públicas” [27]. Enquanto partido Social Democrata, e como representante do Movimento Operário e popular, na onda da vitória eleitoral que as massas lhe entregaram, formou-se um governo de colaboração de classes com setores da burguesia (integrando outros posteriormente, como visto com a eleição de Pavlopoulos): um governo que nasce nas urnas – com a desconfiança dos partidos diretamente representantes da burguesia – como subproduto deformado das lutas das massas populares gregas dos últimos anos, contra a colonização imposta pela Troika e pelo imperialismo europeu, mas que pelo seu programa e compromissos que assumiu com o capitalismo, não representa e não pode representar os interesses da classe trabalhadora e das massas populares.

Um governo, além de tudo, que, depois ter anunciado em alto e bom som, a adoção de medidas frente à “emergência humanitária” (salário mínimo a 751 Euros, eletricidade gratuita para 300.000 famílias) foi rápido em esquecê-las: Não porque se diferencia do Imperialismo (como sustentou a esquerda reformista e centrista do mundo inteiro), mas porque foram sacrificadas no altar das negociações continuas e ininterruptas com as burguesias europeias, visto que na situação da Grécia, até medidas mínimas e insuficientes como essas se chocam diretamente com o sistema de dominação imperialista que subjuga o país e, portanto, não são praticáveis sem romper unilateralmente os acordos com a Troika e repudiar a dívida recusando a realizar o pagamento. Exatamente por isso se tratava, desse modo, apenas de promessas eleitorais, não diferentes daquelas mirabolantes que fazem todos os partidos burgueses durante as campanhas eleitorais.

A Política dos Revolucionários frente ao Governo Tsipras

Mas a esquerda reformista e centrista mundial, mesmo se tratando de medidas que estavam apenas no papel, as defendeu, afirmando que, a correlação de forças, não permitia que se avançasse nesse terreno. No Programa de Transição, Trotsky sustentava que é verdade que na realização das reivindicações mínimas dos trabalhadores se coloca um problema de correlação de forças, mas é também verdade que é um problema “que só pode ser decido com a luta”, através da “mobilização permanente das massas para os fins da revolução proletária”[28].

Ou seja, diferentemente dos reformistas (que defendem incondicionalmente aquele governo e as suas medidas) e dos centristas (que defendem “criticamente” aquele governo e suas políticas). Os marxistas revolucionários devem explicar pacientemente à classe trabalhadora o real caráter capitalista do governo que ela reconhece como seu, denunciando incansavelmente e implacavelmente como um governo burguês contra revolucionário, alertando as massas –em que pese as ilusões que elas nutrem- a não depositar nenhuma confiança nesse governo e fazendo um apelo a contínua mobilização para poder mudar com a independência de classe o seu destino.

A classe operária, os estudantes, as massas populares deverão portanto – permanentemente mobilizadas –, exigir do governo do Syriza a ruptura com a burguesia, a cassação dos ministros burgueses, a denuncia do pacto que levou à eleição do Presidente da República e a sua destituição; o bloqueio imediato de todas as privatizações e a anulação daquelas já acordadas; a denúncia e a anulação de cada acordo e tratado com os credores internacionais, repudiando o pagamento e não reconhecendo a dívida, a saída do Euro; a ruptura com a UE e a OTAN; a expropriação sem indenização e sob controle operário dos bancos e das empresas estratégicas;  a abertura dos livros de contas e a abolição do segredo comercial; a reconversão da produção no cenário de um plano econômico centralizado à serviço das necessidades mais imediatas do povo grego, relativos à alimentação, saúde, transporte, energia, habitação; o monopólio do comércio exterior e o controle dos fluxos de capital com a criação de um único banco nacional sob controle dos trabalhadores; a dissolução das forças armadas e de todos os destacamentos especiais que durante esses anos foram responsáveis pela feroz repressão da luta justa dos trabalhadores, com armamento do povo para a defesa do país dos possíveis ataques externos e internos, considerando que os nazistas da Aurora Dourada, além de serem a terceira força grega eleitoral, estão armados e organizados.

Ao mesmo tempo, alertamos a classe trabalhadora e as massas populares do fato de que o governo Tsipras, justamente por ser um governo burguês, não estará disposto a defender os nossos interesses, mas salvando o regime existente, está disposto a tutelar os interesses da burguesia nacional e do capitalismo internacional, cuja ação conjunta em todos esses anos levou o proletariado grego à fome e à miséria.

Justamente por isso, no seio de sua permanente mobilização e solicitando a solidariedade internacional concreta dos outros povos da Europa, os trabalhadores deverão colocar-se o objetivo da construção urgente dos seus instrumentos independentes de luta, ou seja, um Partido Operário, revolucionário e socialista, e com isso, se colocar o objetivo de tomar o poder para construir o seu próprio governo, colocando as bases para realizar em todo o continente, a partir da própria Grécia, uma revolução socialista que aponte a edificação de uma verdadeira Europa dos Trabalhadores e do Povo, ou seja, Os Estados Unidos Socialistas da Europa [29].

Notas

[1] Spot Eleitoral Anel http://tinyurl.com/k2uwmwc.
[3] Il Sole 24 Ore, 28/1/2015: http://tinyurl.com/lq8ycsm. A esquerda interna do Syriza parece subestimar o dado dessa aliança: com uma postura típicamente centrista, Antonis Ntavanellos, representante desse setor e membro da Coordenação executiva do partido, sustenta que é infundada a preocupação – expressa sobretudo fora da Grécia – cerca a coalizão sem precedentes e tenta minimizar o significado político do acordo, colocando ao contrario a ênfase sobre a postura de contrariedade ao Memorando por parte do ANEL e declarando que a intensão com o partido de Kammenos somou-se um problema “fácil” de resolver se comparado com os problemas mais importantes que se colocaram ao recém nascido governo Tsipras: http://tinyurl.com/mfho25y. Assim, para os centristas internos do Syriza a aliança de governo entre quem deveria representar os trabalhadores e o povo grego e um partido que ao contrario encarna os interesses da burguesia (ou pelo menos de um setor dela), seria uma questão enfim “secundária” com relação a ação do governo? Veremos no texto que não é assim. Mas podemos aqui antecipar que a resposta à pergunta tão logo se apresenta, vem seguida da eleição do presidente da república: em obséquio a esse problema “secundário”, Tsipras quis com afinco como chefe de Estado, e fez eleger, Prokopis Pavlopoulos, membro da Nova Democracia, caracterizando o seu executivo quase como um governo de unidade nacional. Nós continuaremos a discutir o assunto no decorrer do artigo.
[6] “Alexis Tsipras entre radicalismo e «realismo»”: http://tinyurl.com/cgx8e32.
[8] La Stampa, 7/9/2014.
[10] Http://tinyurl.com/l754ldj. O site grego Enikos definiu o encontro “histórico”: http://tinyurl.com/m35ynw4.
[11] V. nota 6.
[12] Aldo Cordeiro Sauda: “Syriza: partido e programa”, in http://tinyurl.com/ntq62am.
[13] Varoufakis, não é militante do Syriza, mas um acadêmico escolhido por Tsipras para um cargo de ministro. Dá voz ao setor mais a direita do partido. Nos encontros de negociação com os homens da finança europeia quis apresentar-se como um personagem bizarro no seu modo de se vestir (…). Descrito por parte da imprensa quase como um “demônio marxista”, é, na verdade, “um velho social democrata” (assim o descreve Antonis Ntavanello nas declarações contidas na video conferência citada na nota 3. Ele mesmo se define como “um marxista excêntrico” (http://tinyurl.com/oebty8v) e acredita que está investido da tarefa de “salvar o capitalismo de si mesmo” (http://tinyurl.com/njcxgb5): o que, de fato, como será demonstrado pelo êxito nas negociações das últimas semanas, e de acordo com o que apresentaremos no texto.
 [14] Até porque a questão da conferência à imprensa, que será discutido agora no texto, havia colocado Nadia Valavani, figura do primeiro escalão do Syriza e hoje vice ministro das finanças.
[15] “Greece can choose its government, but not its economic policy” (A Grécia pode escolher o seu próprio governo, não a própria política econômica.): http://tinyurl.com/omobw4y.
[16] Mas Tsipras e Varoufakis não estão limitados apenas nisso: foi muito além! Para a tratativa sobre a renegociação da dívida grega está contando com um dos principais “tubarões” da finança internacional, isto é, o banco de investimentos estadunidense Lazard (http://tinyurl.com/m5vwnra), responsável pelo endividamento de muitos países africanos e já nomeado em 2012 pelo governo grego então encarregado de prestar uma consulta  pelo módico preço de 25 milhões de euros!
[17] “Acordo sobre a Grécia: vencedores e derrotados”, 20/2/2015.
[18] Em outras palabras, salvaguardar no interesse do capitalismo internacional o inteiro quadro das privatizações impostas pela Troika.
[19] Que em campanha eleitoral excluiu resolutamente.
[20] “O livro dos sonhos de Tsipras que  arquiva o programa de Tessalonica”, 24/2/2015.

[21] Os trabalhadores precários lhes são gratos!
[22] O texto integral do documento de compromisso da Grécia pode-se ler aqui: http://tinyurl.com/kw8quw2.
[24] “Pavlopoulos, assim Syriza compõe a frente grega”, 20/2/2015 (http://tinyurl.com/ok6zadr).
[25] Está claro, desse modo, que a escolha para presidente de uma figura de destaque da direita ligada ao Memorando representa um compromisso com o sistema, em nível nacional e internacional.
[26] Discutimos na nota 3.
[27] Trata-se do que Marx definia como “socialismo burgués” (Manifesto do Partido Comunista, 1996, Editoras Reunidas, p. 46).
[28] L. Trotsky, Programa de transição, 2008, Massari editore, p. 76, 78).
[29] “A vanguarda proletária da Europa dirá aos patrões de hoje: ‘Para unificar a Europa é necessário primeiramente tomar o poder deles. O faremos. Unificaremos a Europa. A unificaremos contra o inimigo e esse inimigo é o mundo capitalista. Faremos um grandioso campo de batalha  do socialismo combatente. Seremos a pedra angular da Federação Socialista Mundial’” (L. Trotsky, “Il disarmo e gli Stati Uniti d’Europa” in http://tinyurl.com/o9pz9an).

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