Peru
Para quem governará Ollanta Humala?

agosto 22, 2011
Para os trabalhadores é de extrema importância ter uma definição do que será o governo de Ollanta Humala a partir do próximo dia 28 de julho, já que, pelos interesses contrapostos que terá na base das suas decisões, o governo não poderá vestir um santo sem desnudar o outro.
É importante, então, saber que santo vestirá o futuro governo nacionalista, ou saber qual será a sua prioridade: 0s trabalhadores ou a patronal? Nesta nota explicamos por que será importante manter a nossa independência política perante o próximo governo para defender ativamente nossas reivindicações. Uma coisa continuará sendo válida nos próximos anos: sem lutas não haverá vitórias.
Sinais a ter em conta
Vejamos alguns indicadores que marcarão o rumo do novo governo:
1. O "Roteiro" que Ollanta Humala utilizou para alcançar o acordo com o toledismo e Vargas Llosa não foi um estratagema para ganhar votos, mas sim um verdadeiro compromisso que efetivamente representa o abandono de pontos programáticos importantes como a revogação da Constituição fujimorista de 1993; se deixa de lado também uma reforma tributária integral para poder financiar verdadeiros programas sociais e a restituição dos serviços públicos de saúde e educação gratuitos e de qualidade. Tampouco se fala da revogação das leis que alentam os contratos precários de trabalho.
Existe, sim, um compromisso de aumentar o salário mínimo a S./750, a fiscalização do respeito pelos direitos trabalhistas e sindicais. Mas inclusive isto estará em função da atitude política do governo humalista perante a patronal, como veremos nos seguintes indicadores.
2. Ratificando o seu compromisso com o Roteiro, depois de 5 de junho Humala deu todos os sinais do seu compromisso com o modelo econômico, enfatizando que manterá as condições de crescimento da produção nacional. Humala foi tão convincente que motivou uma reação de confiança por parte das principais associações empresariais. "Vamos olhar em frente, ajudá-lo e trabalhar. Além disso, se dissiparam as dúvidas que a Confiep tinha", declarou o presidente da CONFIEP, Humberto Speziani, quatro dias depois das eleições do segundo turno, após uma reunião com o Presidente eleito.
A confiança vai inclusive mais além, se virmos como Southern tenta retomar o repudiado projeto mineiro Tía María com a mediação de Humala, tal como declarou Óscar González Rocha, presidente da empresa (Semanário regional El Búho, 15.06.11). Claro que a resposta do povo de Islay não se fez esperar: "o vicepresidente da Frente Ampla de Defesa do Vale de Tambo, Jaime de la Cruz, advertiu que se a empresa mineira volta a retomar o projeto e se o presidente eleito, Ollanta Humala, reconsidera a admissão da mina, a população de Islay pronunciar-se-á com greve indeterminada" (mesma fonte).
3. Como parte do compromisso assinado, a maioria dos nomes do processo de transferência e prováveis futuros ministros são conhecidos "tecnocratas" com trajetória na defesa do atual modelo econômico. Segundo Caretas (edição 16.06.11), o grupo de transição encabeçado pela vice-presidente eleita, Marisol Espinoza, é integrado por Luis Chuquihuara (embaixador da época toledista) na Presidência do Conselho de Ministros, Kurt Burneo (ex-chefe do plano econômico de Toledo e agora de Humala) na Economia, Afonso Velásquez (ex-ministro de Toledo) no Comércio Exterior, e Carlos Paredes (ex-vicepresidente da Câmara de Comércio de Arequipa) na Produção. Não se conhece ainda quem seria o ministro de Trabalho.
O sinal do governo
Todos estes fatores levam a pensar que o governo de Humala se iniciará com um vincado caráter de classe pró-patronal e que, por consequência, irá priorizar os interesses das empresas em detrimento dos trabalhadores e do povo. Isto é, esse caráter pesará nas suas decisões mais importantes.
Tomemos, por exemplo, o seu compromisso de manter as atuais condições que tornaram possível o crescimento econômico dos últimos anos: a defesa das linhas fundamentais da Constituição fujimorista de 1993, o liberalismo econômico, a mínima imposição tributária às empresas, preservar sobretudo a mão de obra barata, e as privatizações e concessões; este panorama aumentado e assegurado mediante os tratados de livre comércio, principalmente o TLC com os EUA, que tampouco se questionariam, além, como é claro, das saudações a outros projetos de integração regional.
As expetativas
Muitos trabalhadores e dirigentes de base celebram euforicamente, não sem justificação, a derrota eleitoral da candidata do fujimorismo, do atual governo de Alan García e da reação, e ainda que certamente alentem alguma expectativa no futuro governo de Humala, não estão tão esperançosos de que esse governo de repente e sem aviso resolva realmente suas exigências. Mas é importante saber o que esperar a partir de 28 de julho e com que orientação geral devemos conduzir a nossa classe na solução das nossas exigências.
A origem de Humala
Que o governo de Humala vai ter um caráter de classe burguês é algo que não deve surpreender ninguém. Ollanta Humala não surgiu do movimento operário e popular, muito menos vem de alentar uma alternativa socialista ou de esquerda. O seu discurso nacionalista, é verdade, recolheu uma série de reivindicações populares e democráticas, e até algumas exigências operárias, mas tudo isso ficou na etapa da camiseta vermelha. Hoje Humala é um Presidente eleito reconvertido e essa reconversão não foi um truque de campanha eleitoral.
Essa reconversão também ocasionou uma reacomodação dos dirigentes das organizações mais importantes da classe trabalhadora, a CGTP e a SUTEP, por exemplo. Eles defendiam até há pouco tempo que com Ollanta Humala os trabalhadores chegariam ao governo e ao poder; agora já só pedem que o Presidente eleito cumpra os seus compromissos, enquanto tanto chamam a apoiá-lo e defendê-lo.
O caminho é continuar a luta
Neste marco, não será propósito do futuro governo enfrentar-se à patronal, pelo menos nos temas que têm que ver com as condições de exploração capitalista. E por isso qualquer exigência importante da classe operária, como a derrogatória dos contratos temporários, o respeito pelas liberdades sindicais, a solução dos róis de requerimentos e, em geral, a derrogatória da carta constitucional fujimorista que continua bloqueando muitos direitos trabalhistas e liberdades democráticas, deverá ser conquistada por meio da luta.
Esta luta terá um ponto a favor nesta nova etapa que se iniciará a 28 de julho, que é a legitimidade das lutas para exigir o cumprimento dos compromissos de campanha. Organização e unidade para impulsionar as grandes lutas pela defesa de nossas reivindicações e uma verdadeira transformação do país em benefício das maiorias, e não a ilusão desmobilizadora, é a exigência que suscita a nova etapa.
Tradução: Renata Cambra