ter mar 19, 2024
terça-feira, março 19, 2024

O grande negócio do genocídio e a luta de classes

Na semana em que comemoramos o 1º de Maio o Brasil alcançava a triste marca de mais de 400 mil mortos pela Covid19. Seguramente, já ultrapassa os 500 mil óbitos, pois não se pode acreditar nas cifras oferecidas por este governo assassino.[1]

Por: Geraldo Batata, metalúrgico de Minas Gerais

O ano de 2021 começou com o desespero das famílias em Manaus para conseguirem leitos de UTI´s e oxigênio, o colapso do sistema de Saúde obrigou a transferência de centenas de pessoas para outros estados, incluindo recém-nascidos.

Mas nada foi dito pela imprensa burguesa sobre o fato de que o “Distrito industrial” se mantinha em plena atividade. Este concentra cerca de 100 mil metalúrgicos em várias multinacionais, em uma cidade com cerca de dois milhões de habitantes. O grande impulsor dos contágios. Estamos diante de um assassínio premeditado e com requintes de crueldade.

O mesmo critério adotado pelo governo de Manaus, como veremos adiante, foi adotado em todo o país. Enquanto as grandes empresas seguem funcionando a chamada “nova onda” da pandemia, e suas novas cepas, ceifam a vida dos operários e espalha a pandemia.

O colapso em Manaus se repete nas grandes cidades do país. Cenas indignantes, uma chacina de milhares de seres humanos, verdadeira barbárie.

O número de mortos dos quatro meses de 2021 (até abril), já supera todo 2020, mesmo sem contabilizar a subnotificação. No Estado de Minas Gerais, foram contaminados 542.909 pessoas em 2020, e morreram 11.902. Em 2021 já ultrapassamos 1,5 milhão de casos e 20.595 mortes até abril desse ano, totalizando mais de 33 mil óbitos.

É preciso entender como chegamos a essa situação. Em meados do ano passado o discurso negacionista de Bolsonaro é assumido na prática pelos governadores e prefeitos e as tímidas medidas de isolamento, que nunca parou as fábricas, foram relaxadas.

Ao final do ano praticamente todas as empresas e o comércio estavam a pleno vapor. Pressionados pelo corte do insuficiente auxílio emergencial, a classe operária, os trabalhadores do comércio e os que ganham a vida na informalidade foram enviados sem piedade para o matadouro.

A imprensa burguesa se escandaliza hipocritamente com os 400 mil mortos. Ao mesmo tempo em que comemora o aumento dos lucros das grandes empresas, como se ambas as coisas não tivessem uma relação profunda.

Enquanto os governos estaduais fechavam os pequenos comércios e o comércio ambulante, as grandes empresas, sendo ou não parte dos setores essenciais eram “agraciadas” com o selo de “atividades essenciais”. Deslocando-se pelo transporte público superlotado, seus trabalhadores se infectaram, morreram e mantiveram o vírus circulando.

O vírus aumentava o seu contágio na mesma proporção que subia os lucros das empresas

Em uma pequena mostra do aumento dos lucros das principais empresas do Estado de Minas Gerais, que concentra a produção de minério-de-ferro e siderurgia, constatamos a profunda relação entre as mortes por Covid e o lucro.

Minerando a morte

Dominado por grandes multinacionais, parte delas com sede no Brasil, a exportação mineral em 2919 foi responsável por 51,56% do saldo da balança comercial brasileira. Os dólares que o país acumula em suas reservas, para que estas e outras empresas remetam ao exterior os lucros a seus acionistas[2], fator essencial para a submissão do país. A tabela abaixo demonstra o crescimento do lucro das mineradoras:

Faturamento trimestral do setor mineral

2020
1o. tri R$ 36 bi
2o. tri R$ 39,2 bi
3o. tri R$ 50,7 bi
4o. tri R$ 83 bi
2021
1o. tri R$ 70 bi

Fonte: IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração)

Mesmo antes da pandemia a Vale, principal empresa do setor, demonstrava a relação direta entre lucros, assassinato e destruição da natureza em Brumadinho (2019) e, em Mariana (2015).[3]

O lucro divulgado[4] em 2019 foi US$ 17,987 bi (R$102,345 bi), que contrasta brutalmente com o fato de que em plena pandemia, em 2020, chega a US$ 21,954 bi (R$ 124,918 bi). Cada vez maior, agora, no primeiro trimestre desse ano, a empresa anunciou aumento superior a 3.000% no lucro líquido : R$ 30 bi, frente a R$ 984 milhões, no mesmo período de 2020. Um lucro indecente e imoral para dizer o mínimo.

Mas a imprensa burguesa quando “chora” as mortes da Covid não explica o outro lado dessa moeda, dessa montanha de dinheiro. O aumento exponencial de casos e mortes nas cidades mineradoras é o resultado direto da manutenção das atividades, que afeta não somente os trabalhadores das minas, mas suas famílias, enfim a todos os habitantes das cidades. É o caso de Itabira, cujo contágio aumenta em 590%.

Leve-se em consideração que os dados estão subnotificados, pois nas cidades mineradoras, impera o domínio da Vale que está em plena sintonia com o negacionismo bolsonarista.

Aço, exploração e morte

Tomaremos o exemplo de algumas empresas. Mas o quadro não é distinto para todas multinacionais, que apresentam resultados “surpreendentes”, assim como nas regiões onde estão instaladas o número de mortes é igualmente assustador.

O lucro da USIMINAS no quarto trimestre de 2020 aumentou em 643% no comparativo com o mesmo período de 2019. Na comparação ano a ano, o lucro líquido de 2020 foi de R$ 1,29 bilhão, alta de 243% no comparativo com 2019.[5]

A Gerdau, outra gigante do aço, também comemora lucro de R$ 1,05 bi no quarto trimestre de 2020, uma elevação de 939%. No total lucrou R$ 2,38 bi, quase o dobro de 2019. [6] E agora, no primeiro trimestre R$ 1,8 bi.

Nas principais cidades do interior de Minas onde se localizam parte das grandes siderúrgicas os casos dispararam assim como o lucro dessas empresas, segundo a tabela abaixo:

CIDADE Nº CASOS 2020 Nº CASOS 2021 – 27/abr ÓBITOS 2020 ÓBITOS 2021 – 27/04 População % Contágio % tx letalidade
IPATINGA (Usimindas) 14.622 13.150 293 359 265.409 10,46 2,35
TIMOTEO (APERAM) 3.947 6.000 106 161 90.568 10,98 2,68
CEL FABRICIANO (APERAM) 6.049 5.545 118 133 110.290 10,51 2,16

Cidades do interior de Minas onde estão localizadas algumas das siderúrgicas citadas/ Fonte: ILAESE

 

Grande BH: fabricando mortes

 

CIDADE Nº CASOS 2020 Nº CASOS 2021 – 27/abr ÓBITOS 2020 ÓBITOS 2021 – 27/04 POPULAÇÃO (Estimada 2020) % Contágio % tx letalidade
BELO HORIZONTE 62.286 107.390 1.852 2.274 2.722.000 6,23 2,43
CONTAGEM 13.392 16.959 519 694 668.949 4,54 4,00
BETIM 10.912 13.403 311 487 444.784 5,47 3,28
NOVA LIMA 7.660 6.499 56 101 96.157 14,72 1,11
IBIRITÉ 3.926 3.765 82 149 182.153 4,22 3,00
TOTAL 98.176 148.016 2.820 3.705 4.114.043 5,98 2,65

Fonte: ILAESE

Se o aumento vertiginoso da infecção pelo Covid nas cidades do interior do Estado dedicadas a mineração ou siderurgia segue a circulação e aglomeração do operários nos locais de trabalho, uma grande cidade como Belo Horizonte (BH) não poderia ser diferente.

Na região metropolitana de BH funcionam a Vallourec, Fiat, Regap, Teksid, Nemak, e centenas de indústrias de autopeças, usinagem, químicas, plástico, embalagens, gigantescos armazéns atacadistas, telemarketing, etc… onde o vírus encontrou espaço “livre” para sua propagação.

Na Refinaria Gabriel Passos (Regap/Petrobrás), no mês de março a empresa contratou 2.000 trabalhadores terceirizados para realizar uma manutenção no maquinário. Em pouco mais de 20 dias, pelo menos 800 trabalhadores foram contaminados e 12 perderam a vida.

Este assassinato não foi maior porque os trabalhadores realizaram uma greve sanitária e a empresa retirou parte dos trabalhadores e mudou cronograma de manutenção.

A FIAT, com seus 15 mil operários funcionou todo o período e assumiu o primeiro posto entre as montadoras e aumentar suas vendas no período. Em todo 2020 a cidade de Betim onde está a FIAT foram mortos 311 trabalhadores, e esse ano, em apenas 4 meses, já são 487. Além da subnotificação porque parte importante dos trabalhadores da FIAT residem em toda Grande BH, onde todas as cidades divulgaram aumento exponencial de contaminações e mortes, nos quatro meses de 2021.

Nas autopeças a patronal usa de uma “criatividade macabra” para contornar afastamentos do trabalho por Covid. Contratam-se operários para substituir temporariamente os contaminados, enquanto estes se recuperam e, ao retornarem ao trabalho, substituem uma nova turma de contaminados. É uma forma de garantir a “imunização por rebanho”. Aumentam-se os relatos de operários que perderam familiares pela doença. “Uma dor que não passa” dizem alguns companheiros.

Revolução socialista ou marcha ao abismo!

No dias que correm, a imagem do capitalismo é semelhante a um corpo em sua putrefação, com odor fétido, inchaço, gerando colônias de bactérias e vermes em sua decomposição. Somente pode sobrevier nutrindo-se da MORTE.

As forças destrutivas geradas pela decomposição se manifestam em forma de crises violentas, guerras, genocídios, agressões ambientais, superexploração do trabalho. Esta é a única forma de sua ressurreição permanente.

Deste navio fantasma nascem vermes como Bolsonaro. Muitos veem suas atitudes como descalabro de um psicopata, mas não, ele é somente a expressão da decomposição e degeneração social do capitalismo-imperialista. Expressão de uma classe dominante subordinada aos interesses do capital internacional que não treme o pulso quando se trata de mandar para morte centenas de milhares de pessoas, se isso se converte em lucro!

Quando este verme já não atender aos interesses do Capital, será jogado fora. Todos os que foram parte deste genocídio, farão cara hipócritas e a imprensa terá o seu “bode expiatório”, mas os acionistas da Usiminas, Vale, etc., serão “canonizados” como filantropos, doaram cestas básicas para os famintos e respiradores para os moribundos.

Hoje, estamos, a maioria da classe trabalhadora, inseguros, de luto, premidos pelo desemprego e pela morte de amigos, parentes, vizinhos, vivemos em estado de “choque”. Neste momento de reflexão aparecem os “cantos de seria”.

Se equivoca o ex-presidente “reabilitado” quando disse que se a classe dominante deste país tivesse um mínimo de racionalidade o apoiaria nas próximas eleições. A razão é função do tempo presente, e se encarna nos bilhões de reais de lucros. Essa mesma razão é a que o reabilita para desempenhar o seu papel neste circo de horrores, sobre uma montanha de cadáveres.

Agora o papel de Lula será de impedir que os trabalhadores tomem o seu destino em suas próprias mãos. Está aberta uma grande disputa política pela consciência de nossa classe. A frente amplíssima que se expressou neste primeiro de maio contra Bolsonaro não é exclusivamente uma frente eleitoral.

O alerta dado pelas massas no Paraguai, a recente explosão na Colômbia, e a continuidade das mobilizações chilenas, antecipa os movimentos da classe dominante brasileira. Seu objetivo supremo é impedir que a classe trabalhadora, arrastando consigo a pequena burguesia arruinada e os famintos que se espalham pelo país,   rompam as correntes deste inferno. O seu objetivo mais profundo é impedir a organização e mobilização dos trabalhadores independente da burguesia, e que nossa classe veja a razão da catástrofe, o capitalismo-imperialista.

[1]De acordo com a Fundação Osvaldo Cruz (FIOCRUZ) existe pelo menos 30% de subnotificação.

[2]Segundo o balanço anual do IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração): Em 2020, o setor mineral foi decisivo para manter positivo o saldo da balança comercial brasileira. O saldo do setor foi de US$ 32,5 bilhões, o equivalente a 63,8% do saldo da balança comercial brasileira. Em 2019, essa equivalência foi de 51,6%. https://ibram.org.br/conteudos-tecnicos/

[3] Agrega-se nestes macabros episódios o fato de que o governo do Estado abriu mão de uma parte da indenização pela ruptura da barragem de Brumadino, no valor de R$ 17 bi, de um total exigido de R$ 55 bi. Além disso, a Vale expropriou milhares de pequenos proprietários rurais, casas, cujas áreas ficavam na rota da lama de outras barragens ameaçadas de rompimento iminente, aumentando suas áreas de mineração futura. O governo do Estado abriu mão de uma parte da indenização pelo crime de Brumadino, no valor de R$ 17 bi, de um total exigido de R$ 55 bi. Além disso, a Vale expropriou milhares de pequenos proprietários rurais, casas, cujas áreas ficavam na rota da lama de outras barragens ameaçadas de rompimento iminente, aumentando suas áreas de mineração futura.

[4]RELATÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO DA VALE 2020. http://www.vale.com/PT/investors/information-market/quarterly-results/ResultadosTrimestrais/RELATORIO%20DA%20ADMINISTRACAO%202020_p_vf.pdf

[5]https://valorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2021/02/12/lucro-da-usiminas-em-2020-e-o-maior-em-11-anos-e-receita-tambem-e-recorde.ghtml

[6]https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/02/24/lucro-da-gerdau-sobe-939percent-no-quarto-trimestre.ghtml

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