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segunda-feira, setembro 16, 2024

Peru: Os operários da Celima resistem às demissões nas ruas

Os operários de Celima (Cerâmicas de Lima), organizados no seu sindicato combativo, voltam a dar exemplo de luta e dignidade operária, enfrentando as demissões massivas por parte da empresa, com manifestações, passeatas e apelos à unidade de toda a classe operária para enfrentar a norma que legaliza as demissões coletivas.

Por: Víctor Montes

No dia 28 de agosto, o Ministério do Trabalho e Promoção do Emprego (MTPE) ratificou a inadmissibilidade do pedido de instauração do Procedimento Coletivo (demissões em massa) instaurado pela Cerâmica Lima S.A., contra 220 operários que atuam nas três fábricas que a empresa possui. em Lima. Mais da metade pertence ao Sindicato dos Trabalhadores da Celima S.A. e Afins, inclui todo o seu Conselho de Administração e os representantes dos trabalhadores perante o Comitê de Segurança e Saúde Ocupacional.

O anúncio foi recebido com alegria e ânimo de luta pelos operários da Celima que receberam a decisão com uma importante mobilização e manifestação diante da Autoridade do Trabalho, exigindo reposição imediata e pagamento dos seus salários, enquanto preparam uma nova Assembleia para implementar novas ações porque entendem que a luta apenas começou.

Não há dúvida de que a decisão do MTPE, em primeira e agora em segunda instância, é uma vitória política da luta que os operários organizados iniciaram no Sindicato, assim que a empresa anunciou as demissões, no dia 6 de agosto. Data desde a qual a empresa os impediu de entrar nas fábricas e aplicou a “suspensão perfeita do trabalho”, outro mecanismo legal pernicioso que permite aos empregadores mandarem operários para casa sem receberem salário e assistência médica.

De onde vem esse processo?

Como escreveu o ativista operário do Sindicato de Celima e ativista do Partido Socialista dos Trabalhadores, Manuel Fernández, desde o início do ano a empresa começou a dar sinais da sua intenção de despedir um grupo significativo de trabalhadores. Não podendo fazê-lo desde o início, promoveu uma política de “demissões voluntárias”, que se enraizou num setor do Sindicato:

“…começamos o ano com a notícia de que os armazéns de produtos acabados estavam superlotados, apesar das paradas de fábrica ocorridas no ano anterior. Não demorou muito para que os empregadores decidissem paralisar algumas linhas de produção na sede de San Martín de Porres (populoso bairro ao norte da cidade de Lima) e depois convocassem os trabalhadores dessas linhas para informá-los de que `já não há trabalho`, chantageando-os para que aceitassem um acordo de `aposentadoria voluntária` sob a ameaça de serem demitidos.” (Fernández, M. Bandeira Socialista 144)

A resposta foi organizada a partir da base com um grupo de vanguarda do Sindicato, que rapidamente realizou reuniões nas portas das fábricas para discutir o problema e propor ações de combate para deter as ameaças de demissões. Se não se avançou mais, foi porque a direção sindical optou pela negociação, subestimando o ataque patronal que acabaria por ser desencadeado de forma definitiva no início de agosto.

A demissão não é um “relâmpago num céu sereno”

A situação vivida pelos trabalhadores da Celima não é, no entanto, única. Desde 2023, a economia peruana está em recessão (fechou o ano com contração de 0,55% do PIB). E embora os números falem de uma recuperação da economia, as principais associações patronais, como a Sociedade Nacional das Indústrias, mostram que a indústria vive uma recuperação muito fraca de 1,5% no primeiro semestre do ano, os dados desagregados mostram que isso se explica pelo crescimento do setor fabril primário (8,3%) em contraste com o setor fabril não primário, que fechou o primeiro semestre com uma queda de 0,4%. Por seu turno, o investimento privado no país diminuiu 1,8% no primeiro trimestre do ano e 0,4% no segundo.

Este é o quadro econômico das demissões coletivas, uma norma adaptada aos interesses da patronal que coloca os lucros acima do direito humano ao trabalho. A verdade é que a patronal, encorajada, têm aproveitado o enquadramento econômico para atingir as camadas de operários que, nos últimos 20 anos, reconstruíram os seus sindicatos e conquistaram, através da luta, aumentos dos seus salários e respeito pelos seus direitos trabalhistas.

É por isso que no início do ano a fábrica Bosch, que se dedicava ao fabrico de fogões e freezers, encerrou operações no país e despediu todos os seus operários (mais de 400), 80 deles sindicalizados. Já antes, em novembro de 2023, a Embotelladora Graco S.A.C. – Subsidiária do Grupo Econômico AJE, tinha também despedido, através de demissão coletiva, 208 trabalhadores, incluindo vários sindicalizados. Outras empresas com processos de rescisão coletiva são Cifarma e Ollas Record, entre outras.

Endosso do governo

Além dos elementos que compõem a situação econômica, e do seu impacto no país, a patronal sente-se fortalecida pelo aval que lhe foi dado pelo governo de Dina Boluarte e pelo Congresso dominado pelo fujimorismo e pelos seus acólitos.

A imposição pelo governo, sobre o assassinato direto, pelas mãos da polícia e do Exército, de 49 lutadores, deu aos patrões a confiança de que a sua ofensiva será protegida com sangue e fogo por um governo arrivista que depende inteiramente do seu apoio, revelado na cumplicidade de um Congresso pouco apresentável, repleto de corruptos, de pessoas ligadas a crimes contra os direitos humanos na ditadura de Fujimori, e tantos outros ligados à mineração ilegal, entre outros.

A política das direções conciliadoras

Contudo, não foi apenas a repressão que criou um momento que os empregadores consideram apropriado para a sua ofensiva. Ao mesmo tempo que o governo assassinava no Sul, os dirigentes das organizações do movimento operário, especialmente a direção da CGTP, dividiram a luta que vinha do sul e impuseram uma dinâmica de conciliação com o governo assassino, semeando a desmoralização no conjunto de lutadores/as.

Assim, a classe operária e o povo encontram-se, de fato, desarmados face aos diversos ataques que os patrões realizam, tanto nas fábricas e nas minas do país, como a partir do Congresso, aprovando leis draconianas.

Operários da Celima enfrentam as demissões nas ruas

Os operários do Sindicato Celima saíram às ruas desde o dia em que foi anunciada a demissão coletiva, dando o exemplo de como defender os seus direitos mais básicos.

Já no dia 7 de agosto, foram realizadas manifestações combativas em frente às portas das fábricas localizadas em San Martín de Porres e San Juan de Lurigancho (distrito leste de Lima). Desde então, ocorreram diversas Assembleias Gerais e 3 mobilizações ao MTPE, bem como o chamado aos dirigentes da Federação dos Trabalhadores Industriais Peruanos (FETRIMAP) e da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), para realizarem uma greve que unifique a luta operária contra as demissões coletivas e as demissões em geral.

Neste mesmo quadro, o sindicato recebeu a solidariedade internacional de organizações sindicais e ativistas da Colômbia, Argentina, Equador e Costa Rica, que responderam rapidamente ao apelo do Comité de Luta criado a partir da base do sindicato para se manifestar contra a demissões.

Atualmente, a necessidade de criar um plano unitário de luta que mobilize os mais amplos setores da classe operária contra as demissões é fundamental para derrotá-las. Dizemos em alto e bom som: Não há solução para as demissões coletivas pela via judicial! O único caminho certo para os trabalhadores/as que enfrentam demissões é o da mobilização combativa e unitária em todo o país!

Esse é o caminho declarado dos operários da Celima, que de fato se colocam na vanguarda de toda a classe operária peruana nesta luta contra o abuso e a exploração patronal. Por isso é também urgente cercar de uma solidariedade ativa a eles, e às suas famílias, que somam um total não inferior a 1.000 pessoas, cuja subsistência está no ar, devido à ação da Celima S.A.

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