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quinta-feira, setembro 12, 2024

Trotsky: A batalha contra a burocracia e a fundação da Quarta Internacional

Por ocasião de um novo aniversário do assassinato de Leon Trotsky, prestamos nossa homenagem lembrando sua luta contra a burocracia que culminou na fundação da Quarta Internacional.

Por: Alicia Sagra

A fundação da Quarta não estava no programa de Trotsky quando a batalha contra a burocracia começou.  Pelo contrário, seu objetivo estratégico era recuperar o partido soviético e a Internacional para a revolução. A necessidade da Quarta Internacional se manifestou como tal quando, depois de 10 anos, essa batalha foi derrotada.

A luta contra a burocracia.

Foi Lenin quem primeiro viu a necessidade de tal batalha. No final de 1922, quando voltou depois de ter estado ausente por sua doença, ficou impressionado com a expansão da burocracia no partido e no estado.

O partido bolchevique, quando assumiu o poder, herdou o atraso e a barbárie de séculos. A destruição da Primeira Guerra Mundial e depois a Guerra Civil rebaixaram ainda mais o nível cultural geral do país. A terrível situação econômica levou a uma luta desmoralizante pela sobrevivência. As massas que haviam feito enormes sacrifícios tendiam a se afastar da atividade política, os sovietes começaram a se esvaziar e as tarefas do Estado recaiam cada vez mais nas mãos do partido.

Lenin e Trotsky tentaram por todos os meios encontrar novos organismos que permitissem a participação das massas: os sindicatos independentes, a organização dos sem partido. Mas eles não podiam mudar essa tendência do movimento de massas que havia perdido seus melhores representantes na Guerra Civil. Nahuel Moreno era da opinião de que o processo do stalinismo era tão profundo, precisamente por causa dessa realidade do movimento de massas, que os esforços de Lenin e Trotsky não conseguiram reverter[1].

Tudo isso foi qualitativamente agravado pela derrota da revolução alemã. Os técnicos e especialistas que os bolcheviques esperavam da Alemanha não vieram. Foi preciso recorrer ao antigo serviço público czarista, bem como a seus técnicos e especialistas. O resultado foi o crescimento dentro do partido de uma corrente que refletia as aspirações dos carreiristas.

Essa corrente se aglutinou em torno de Stalin que, como chefe do Bureau Organizador, era responsável por atribuir cargos no partido e no estado.

Em dezembro de 1922, Lenin escreveu a Trotsky propondo formar “um bloco contra a burocracia em geral e contra o Bureau de Organização em particular”[2]

Lenin começa a batalha confrontando Stalin sobre a questão das nacionalidades. Em 30 de dezembro, ditou o seguinte às suas secretárias: “Diz-se que é necessário um aparato unificado, de onde vem essa afirmação? Não é do mesmo aparato grão-russo que tiramos do czarismo e que ligeiramente lubrificamos com petróleo soviético?” expressoua necessidade de “defender os não-russos do flagelo daquele autêntico homem russo, do chauvinista grão-russo, em essência, um patife, um tirano, como é o típico burocrata russo”, e insistiu “a responsabilidade política recai, é evidente, sobre Stalin e Dzerzhinsky”[3]

Em 4 de janeiro de 1923, escreveu um pós-escrito para seus escritos sobre a direção, que é conhecido como seu testamento “o camarada Stalin, ao se tornar secretário-geral, concentrou em suas mãos poder ilimitado, e não tenho certeza de que seja sempre capaz de usar essa autoridade com cautela” e propunha que o partido “procurasse uma maneira de remover Stalin” de seu cargo de secretário-geral.

Em 5 de março, ele escreveu a Trotsky pedindo-lhe que defendesse aqueles que discordavam de Stalin no Partido Comunista da Geórgia. No mesmo dia, escreveu a Stalin ameaçando romper todas as relações com ele.

Tudo estava orientado para o XII Congresso do Partido Comunista Russo, que começaria em 30 de março. Segundo Trotsky: Lenin já não se contentava com preparar a demissão de Stalin do cargo de secretário-geral, mas se dispunha a fazer com que fosse desqualificado pelo partido. E todas as questões que se apresentavam: na questão do monopólio do comércio exterior[4], na questão das nacionalidades, na questão do regime do partido, na inspeção operária e camponesa e quanto à comissão de vigilância, toda a sua preocupação sistemática e tenazmente manifestada era canalizar as coisas de tal forma que, no XII Congresso do Partido,  que deveria ser celebrado, pudesse desferir um golpe mortal no burocratismo, no regime de gangues, no funcionalismo, no despotismo, na arbitrariedade e na grosseria, personificados em Stalin.[5]

Mas foi uma batalha que não pôde chegar ao seu fim, porque em 9 de março de 1923, Lenin teve um novo ataque que o manteve paralisado até sua morte, em 21 de janeiro de 1924.

O Congresso foi adiado para abril na esperança de que Lenin se recuperasse e pudesse participar. Stalin, preocupado com o clima criado pelas manifestações de Lenin, se comprometeu em modificar seu documento sobre nacionalidades e as teses de Trotsky sobre economia e indústria foram aprovadas no Politburo.

Mas depois que a doença de Lenin piorou, quando ficou evidente que não participaria do congresso, “a troika”[6] mudou de atitude. Não se animaram a tomar medidas contra Trotsky, que era muito popular no partido, mas começaram a agir para desacreditá-lo. No final de março, a “troika” com o apoio do Politburo emitiu uma carta a todos os membros e candidatos do CC na qual enumeravam todas as diferenças com Trotsky. Uma das principais acusações foi que com suas teses (do relatório sobre a indústria) onde propunha uma maior separação entre trabalho do partido, estatal e econômico “estendia uma mão àqueles que querem liquidar o papel de liderança do partido”[7]

Enquanto que Trotsky levantava suas diferenças apenas no nível do Politburo, pois elas eram desconhecidas dos delegados e não havia nenhuma coordenação, no Congresso, entre Trotsky e vários delegados que levantavam críticas semelhantes.

Trotsky explica a razão de sua atitude: A ideia de um “bloco” entre ele [Lenin] e eu para travar a batalha contra o aparato e a burocracia era conhecida apenas por Lenin e por mim. As cartas de Lênin sobre a questão nacional e o “testamento” permaneciam no maior segredo. Minha campanha teria sido interpretada, ou pelo menos poderia ter sido interpretada, como uma batalha pessoal para ganhar o posto de Lenin à frente do partido e do Estado. E eu não era capaz de pensar nisso sem sentir espanto. Pareceu-me que isso produziria uma desmoralização tal em nossas fileiras que, mesmo que eu triunfasse, pagaria muito caro pela vitória.[8]

Pode ser que este tenha sido, como afirmam alguns de seus biógrafos, o maior erro de Trotsky. O fato é que o XII Congresso, longe de dar o golpe final contra o burocratismo, como planejava Lênin, acabou fortalecendo a “troika”.

A Oposição de Esquerda

Em 8 de outubro de 1923, Trotsky enviou uma carta ao Comitê Central, na qual atribuía o surgimento de grupos no partido a dois fatores: “a) o regime partidário radicalmente incorreto e insalubre dentro do partido e b) a insatisfação dos operários e camponeses com a grave situação econômica causada, não apenas pelas dificuldades objetivas, mas também pelas dificuldades políticas”.  mas por causa dos erros flagrantes e radicais da política econômica”. Exigia que o “burocratismo do secretariado” fosse substituído pela democracia partidária na medida necessária para evitar que o partido fosse ameaçado pela “ossificação e degeneração”. E afirmava que há um ano e meio travava essa batalha dentro do CC, e que agora, diante da crise produzida pelas políticas aplicadas, se considerava livre para levá-las para fora do organismo.

Em 15 de outubro, 46 líderes do partido enviaram um Manifesto ao Comitê Central, criticando fortemente a política econômica e denunciando que o partido era dirigido por uma camarilha burocrática que estava separando o partido das massas.

A “troika” foi forçada a abrir a discussão e anunciou que em 7 de novembro as colunas do Pravda seriam abertas para publicar as várias posições.

Pouco depois da abertura do debate, o Comitê Central da Juventude Comunista apoiou a oposição. A maioria das células estudantis declarou seu apoio aos “Quarenta e Seis”

Diante disso, a “troika” deu a si mesma duas táticas. Por um lado, a perseguição aos líderes da oposição. Por exemplo, Antonov Ovseenko, um dos “Quarenta e Seis”, líder do assalto ao Palácio de Inverno em outubro de 1917, herói da guerra civil na Ucrânia e chefe dos comissários políticos do Exército Vermelho, foi destituído do cargo e seu voto foi suspenso. O Comitê Central da Juventude Comunista foi desintegrado e substituído por pessoas dispostas a apoiar a linha da “troika”.

Por outro lado, tentou neutralizar algumas das críticas, identificando-se com elas. Uma resolução aprovada pelo Politburo e publicada em 7 de dezembro condenava “a aguda diferenciação na situação material dos membros do partido”, “uma estreiteza de visão oficial”, “a burocratização que vinha sendo observada nos cargos do partido” e fazia um chamado “a aplicação real e sistemática da democracia operária”.

Em 11 de dezembro, aparece no Pravda uma carta aberta a todo o partido, assinada por Trotsky, pedindo a todos os seus membros a assumir as promessas contidas na resolução do Politburo. Dizia que era necessário remover de seus cargos de direção aqueles “que, à primeira palavra de crítica, objeção ou protesto, fazem brilhar os raios das penalidades…, o novo curso deve começar fazendo com que cada um sinta que, de agora em diante, ninguém se atreverá a aterrorizar o partido”

A aparição pública de Trotsky fortaleceu a oposição, ele era o dirigente mais popular depois de Lenin e muitos dos grandes dirigentes do partido estavam do seu lado: Preobrazhensky, Rakovsky, Muralov, Sosnovsky, Pyatakov.[9] Mas a batalha foi definida pelo peso do aparato.

A “troika” enviava seus seguidores de uma fábrica para outra em carros oficiais. Os oposicionistas eram ameaçados de perder seus empregos ou com a transferência para regiões distantes. O peso do aparato aumentava em regiões remotas.

Assim, apesar de que nas conferências do partido em Moscou a oposição tinha 36% dos delegados, no XIII Congresso Nacional, onde a discussão seria definida, que foi realizada em janeiro de 1924, a oposição tinha apenas 3 delegados entre 218.

O teste de força da “troika” foi esmagador e a oposição foi forçada a renunciar às suas atividades. O XIII Congresso deu status de princípio a uma suspensão temporária das tendências dentro do partido e ameaçou com expulsão quem não cumprisse essa regra. O novo regime partidário foi resumido por S.I. Gusiev, um novo membro da Comissão Central de Controle: “A autoridade é adquirida não apenas pelo trabalho, mas pelo medo. E agora a Comissão Central de Controle e a Inspeção Operária e Camponesa conseguiram impor o medo. Neste aspecto, sua autoridade está crescendo.[10]

A derrota da revolução alemã – o socialismo em um só país.

Essa derrota em 1923 foi um duro golpe para a Revolução Russa, que viu seu isolamento acentuado. No XIII Congresso, Bukharin afirmou que “a depressão psicológica teve uma influência extraordinária nas fileiras de nosso partido”.

A orientação equivocada de Stalin de não promover o levante, bem como a recusa de Trotsky em viajar para a Alemanha, contribuíram para a derrota, mas a resposta foi responsabilizar a direção alemã. Zinoviev, como presidente da Terceira Internacional, acusou Heinrich Brandler[11] de ser um oportunista e pediu que ele fosse removido de seu cargo de direção.  Trotsky foi duramente atacado por se opor a essa destituição. Zinoviev, com o apoio de Stalin, estendia à Internacional as práticas que haviam sido aplicadas no partido russo.

O debate dentro do partido russo havia sido oficialmente concluído. A Oposição de Esquerda passou a ser definida como um “desvio pequeno-burguês do leninismo”, enquanto Trotsky era rotulado como um semi-menchevique. Essa campanha de 1924 marcou o início da falsificação histórica. A princípio timidamente e depois abertamente, o papel de Trotsky na insurreição e na Guerra Civil foi diminuído, distorcido, até que finalmente foi removido da história.

Mas o ataque ao “trotskismo” se concentrou na Teoria da Revolução Permanente. A “troika” começou a acusar Trotsky de ser um aventureiro que estava tentando embarcar a Rússia em planos perigosos para expandir a revolução. Stalin foi muito mais além. Em setembro de 1924, enunciou uma nova teoria que revisava todas as concepções marxistas, a do “socialismo em um só país”. Em suma, essa teoria dizia que o socialismo poderia ser construído na URSS sem levar em conta o curso da revolução europeia. E argumentava que havia países que estavam maduros para o socialismo e outros que não estavam, a URSS era a única que estava madura. Essa teoria servia para justificar sua política de subordinar os interesses da revolução mundial aos interesses imediatos da burocracia soviética.

Em 1925, Trotsky foi dispensado do cargo de comissário de guerra e foi nomeado presidente do comitê de concessões, chefe das operações eletrônicas e presidente da direção técnico-científica da indústria.  Segundo disse em Minha Vida, o objetivo era separá-lo do Exército Vermelho e cobri-lo do trabalho para mantê-lo longe da atividade dentro do partido.

A Oposição Conjunta de 1926

A implementação da NEP[12] serviu para reanimar a economia destruída pela guerra civil, mas deu origem a um setor de novos exploradores, principalmente no campo, os kulaks, que eram fortes o suficiente para chantagear também as cidades.  Tudo isso aumentou a agitação social, apesar da política de capitulação aos kulaks continuar.

Kamenev e Zinoviev afastaram-se gradualmente desta política, ao mesmo tempo que não aceitavam a nova teoria do socialismo num só país. Por iniciativa da viúva de Lenin, Kruskaia, organizaram um bloco para enfrentar Stalin no 14º Congresso (1925), mas foram derrotados e removidos dos seus cargos de direção no partido e nos sovietes.

Essa nova realidade criou as condições para uma oposição unificada entre a liderada por Zinoviev e a liderada por Trotsky.

Em julho de 1926, a Oposição Conjunta apresentou seu programa ao Comitê Central. O CC rejeitou suas propostas e declarou suas reuniões ilegais. Lashevich, vice-comissário de guerra, foi destituído de seu cargo e expulso do Comitê Central por ter falado em um comício da Oposição Conjunta. Zinoviev foi separado do Politburo.

A oposição apelou para as bases com panfletos e falando em reuniões de células, nas fábricas. Nos comícios, tiveram que enfrentar bandidos organizados que assobiavam e vaiavam para eles. Apesar disso, chegaram a ter 8.000 membros. Provavelmente foi o mesmo número de membros ativos da fração Stalin-Bukharin, a grande massa do partido estava afastada da discussão.

Em outubro de 1926, o Comitê Central expulsou Trotsky do Politburo, Kamenev foi destituído de seu status de membro candidato e Bukharin substituiu Zinoviev como presidente da Terceira Internacional. Isso causou desmoralização em alguns membros da oposição. Trotsky escreve em Minha Vida: “No início de 1927, Zinoviev já estava disposto a capitular, se não de uma vez, pelo menos em várias etapas. Mas vieram os eventos catastróficos na China, nos quais o crime cometido pela política de Stalin era tão evidente que a capitulação de Zinoviev e daqueles que o seguiram teve que ser suspensa por algum tempo.

Expulsão e exílio

A política de Stalin levou à morte de milhares de comunistas chineses.[13] Trotsky exigiu que a política da China fosse discutida a nível de todo o PCUS. Quando Stalin negou, ele apelou para o Comitê Executivo da Internacional. Em setembro, ele e Zinoviev foram expulsos do Comitê Executivo Internacional.

Stalin, incapaz de suportar o debate sobre a China, redobrou seus ataques à oposição, destituindo ou transferindo seus líderes. O ponto culminante foi no dia 7 de novembro, na celebração do 10º aniversário da revolução. A oposição participou com cartazes com suas próprias palavras de ordem: “Luta contra o kulak e o burocratismo”, “Acelerar a industrialização”, “Que o testamento de Lenin seja cumprido”, “Contra a divisão do partido, vamos preservar a unidade bolchevique”.

A coluna da oposição foi atacada por grupos armados e, em 14 de novembro, Trotsky e Zinoviev, juntamente com centenas de membros da oposição, foram expulsos do partido. A Oposição Conjunta está dividida. Zinoviev, Kamenev e seus seguidores capitulam[14]. Não apenas aceitam as decisões, mas denunciam suas próprias posições como “erradas e antileninistas”. Trotsky é exilado no Curdistão.

Após a expulsão de Trotsky, a Oposição de Esquerda se organizou como uma fração do partido oficial e continuou a luta para reformar o PCUS e a Internacional. Sustentavam que ainda não havia motivos para afirmar que o processo de burocratização era irreversível, que a vanguarda do proletariado mundial estava concentrada nas fileiras da Internacional Comunista e que a tarefa da Oposição era alcançá-los.

A Oposição de Esquerda Internacional

Em abril de 1930, a Oposição de Esquerda Internacional foi formada. Era composta por pequenos grupos. Os da Espanha e da Grécia eram cerca de 2.000 membros, nos outros países eram grupos de centenas ou mesmo dezenas de militantes. Em sua luta pela regeneração da Terceira Internacional, eles interviram nos processos desenvolvendo uma forte batalha pela Frente Única dos Trabalhadores para enfrentar o fascismo e contra a Frente Popular.

Essa luta para recuperar o partido mundial para a revolução durou até 1933.

A vitória de Hitler e a morte da Terceira Internacional

Analisando a vitória de Hitler, Trotsky escreveu: “A socialdemocracia é inconcebível sem governo parlamentar e sem organizações de massas dos operários, como os sindicatos. Pelo contrário, a missão do fascismo é destruir tanto o parlamento quanto as organizações operárias.

A unidade defensiva dos comunistas e social-democratas deveria ter sido baseada nesse antagonismo. Mas os líderes cegos rejeitaram esse caminho. Os trabalhadores ficaram divididos, indefesos, sem planos ou projetos diante de um inimigo que atacava.”[15]

Embora o perigo do fascismo não tivesse despertado o partido alemão, Trotsky ainda esperava que o Comintern pudesse reagir. Mas em 7 de abril de 1933, a Internacional Comunista anunciou: “A linha política do Comitê Central do PCA, com Thaelmann à frente, estava completamente correta, antes e depois do golpe de Estado de Hitler”.

Isso foi decisivo. Em julho de 1933, Trotsky pediu a construção de uma nova Internacional Marxista, independente da burocracia stalinista e completamente oposta a ela, dizendo que só assim o grande triunfo de 1917 poderia ser salvo.

Em outubro do mesmo ano, Trotsky chegou à conclusão de que a burocracia stalinista só poderia ser eliminada com uma nova revolução, a revolução política. As reformas do PCUS e do Comintern eram impossíveis. Uma longa e difícil batalha foi travada e perdida.

A polêmica sobre a fundação da Quarta.

Em meio ao avanço do terror stalinista, dos julgamentos de Moscou, dos assassinatos de militantes, Trotsky desenvolveu um grande combate pela construção da Quarta.  Entre os membros da antiga Oposição de Esquerda Internacional, houve resistência à sua fundação.

Em maio de 1938, Trotsky escreveu uma carta a um camarada belga, respondendo aos questionamentos que haviam: (…) “Você aponta para o fato de que ainda não fizemos uma análise da última fase do imperialismo, etc. (…) A relação entre teoria e prática não tem um aspecto, mas dois aspectos, ou seja, um caráter dialético. Teoricamente, estamos suficientemente equipados para a ação, melhor do que qualquer outra organização. Nossa ação dará impulso ao nosso trabalho teórico, originará e atrairá novos teóricos, etc. O processo histórico não espera pela pesquisa marxista, “definitiva”, “completa” e “exaustiva”. Temos que tomar uma posição sobre a Revolução Espanhola sem esperar por estudos marxistas sobre a Espanha. A guerra nos exige uma resposta, independentemente de nossos teóricos terem ou não produzido um, dois ou três volumes de trabalho de pesquisa (…) A teoria é muito importante; mas o fetichismo pedante da teoria é inútil. (…) “É preciso dedicar a maior atenção aos grupos vacilantes e imaturos da classe operária que estão se movendo em nossa direção. Mas não podemos fazer concessões de princípio aos líderes centristas sectários, que não querem reconhecer nossa organização internacional, nem nossa disciplina.”

“Isso significa que você quer uma internacional monolítica? Diria alguém com santo medo. Não, nada disso, eu responderia. Toda a história da Quarta Internacional e de cada uma de suas seções mostra uma constante, ininterrupta e livre luta de tendências e pontos de vista. Mas, como testemunha a nossa experiência, esta luta só mantém um carácter saudável quando os seus participantes se consideram membros da mesma organização nacional e internacional, que tem o seu programa e os seus estatutos (…)” Por todas essas considerações, mantenho minha posição de que nos chamemos, como somos chamados pelos trabalhadores e pelas classes inimigas, isto é, A Quarta Internacional!”[16]

No Programa de Transição, os diferentes setores que questionam a fundação da Quarta são respondidos mais uma vez: “Os céticos perguntam: mas chegou a hora de criar uma nova Internacional? É impossível, dizem eles, criar uma Internacional ‘artificialmente’, ‘somente grandes eventos podem fazê-la surgir, etc. (…) A Quarta Internacional já surgiu de grandes eventos: as maiores derrotas do proletariado na história.”

“A causa dessas derrotas está na degeneração e traição da antiga direção. A luta de classes não admite interrupção. Para a revolução, a Terceira Internacional, depois da Segunda, está morta. Viva a Quarta Internacional!”

“Que é fraca? Sim, suas fileiras não são numerosas porque ainda é jovem. Por enquanto, existem principalmente quadros. Mas esses quadros são uma garantia do futuro”

“Se nossa Internacional é numericamente fraca, ela é forte por causa de sua doutrina, seu programa, sua tradição, a energia incomparável de seus quadros”

O Congresso da Fundação.

Em 3 de setembro de 1938, em uma conferência realizada em Paris, a Quarta Internacional é fundada. Participaram dez seções (URSS, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Polônia, Itália, Grécia, Holanda, Bélgica e Estados Unidos) mais um delegado representando a América Latina (o brasileiro Mario Pedrosa). Por razões de segurança, Trotsky não participou da Conferência. Dias antes, Rudolf Klement havia sido assassinado pela GPU.[17] O Congresso dura apenas um dia, no qual o Programa de Transição é aprovado.

As pressões provocadas pelo avanço do nazismo e do stalinismo levaram à capitulação de diferentes setores que inicialmente se juntaram à tarefa de construir uma nova Internacional. Por esta razão, a Quarta é fundada pelo que foi a Oposição de Esquerda Internacional. Foi fundada como uma continuidade programática, metodológica e moral da Terceira Internacional, expressa em seus quatro primeiros congressos. Trotsky insistiu na necessidade de sua fundação, para preservar as bases do leninismo e ser capaz de responder ao ascenso revolucionário que ocorreria após a Segunda Guerra Mundial. O ascenso ocorreu, mas a Quarta não cumpriu esse papel.

Nahuel Moreno dizia que a Quarta Internacional nasceu com cabeça de gigante e corpo de anão. O assassinato de Trotsky, dois anos depois, deixou apenas o corpo do anão. Uma direção inexperiente que teve que enfrentar não apenas a guerra e o terror nazistas, mas também o terror, as perseguições e os assassinatos do stalinismo. Após a guerra, essa direção foi submetida às pressões do stalinismo, da socialdemocracia, dos movimentos nacionalistas burgueses e não soube como responder, o que levou à dispersão.

Hoje nos encontramos com a contradição de que, quando a realidade confirma seu programa, a Quarta não existe como organização.

Essa ausência é fortemente sentida em um momento em que estamos vivendo a heróica resistência palestina contra o genocídio sionista, as mobilizações internacionais em apoio à Palestina, a guerra na Ucrânia contra a invasão russa, as grandes mobilizações em Bangladesh, a da juventude britânica contra o fascismo.

Esta realidade confirma a definição estratégica que a LIT-QI assumiu desde a sua fundação: colocar-se ao serviço da reconstrução da Quarta Internacional, da continuidade revolucionária da Terceira Internacional Leninista, como única forma de avançar para o triunfo da revolução socialista mundial.

Tradução: Lílian Enck


[1] Escuela de Cuadros- Argentina 1984, Crux Ediciones

[2] Diário das Secretárias de Lenin

[3] Lenin, Obras Completas, Volume XXXVI

[4] Stalin fez votar no CC (na ausência de Lenin e Trotsky) uma redução desse monopólio. Tanto Lenin (apesar de já estar doente) quanto Trotsky expressaram sua oposição e Lenin notificou Stalin de que Trotsky defenderia sua posição na próxima reunião. Diante disso, Stalin recuou e o CC anulou sua resolução anterior.

[5] Minha Vida, A Doença de Lênin, p. 383. Editorial Pluma

[6] No final de 1922, Stalin formou um bloco com Kamenev e Zinoviev dentro do Politburo do partido bolchevique. Zinoviev chefiava a organização do partido em Petrogrado e Kamenev em Moscou, as principais cidades da Rússia. E Zinoviev era presidente da Internacional Comunista. Esse bloco conhecido como “troika” que tinha a maioria do Comitê Central não se baseava em um acordo programático, mas no apoio mútuo para manterem-se como os principais líderes do partido

[7] Informe do XII Congresso do Partido Comunista Russo, citado por Vadim Rogovin em “Havia Alternativa ao Stalinismo?”, p. 146, Editora Sundermann

[8] Mi Vida, p. 384, Editorial Pluma.

[9] Preobrazzhensky: Principal economista bolchevique. Ingressou em 1903, dirigiu a luta clandestina nos Urais, onde liderou a luta pela revolução e na Guerra Civil. Racovsky: chefiou o primeiro governo soviético na Ucrânia. Foi embaixador soviético na França e na Inglaterra. Muralov. Bolchevique desde 1903, liderou os Guardas Vermelhos no ataque ao Kremlin em outubro de 1917. Comandante do distrito militar de Moscou durante a guerra civil, membro da Comissão de Controle do partido. Sosnovki, proeminente jornalista bolchevique, chefe do departamento de agitação e propaganda. Piatakov: Lenin diz no “testamento” que ele foi um dos líderes mais destacados da geração jovem.

[10] Citado por Dave Frankel em História da Oposição de Esquerda.

[11] Principal dirigente do partido alemão.

[12] Em 1921, o partido bolchevique aprovou a implementação da Nova Política Econômica (NEP). Lenin a propôs como um mecanismo para levantar a economia soviética após a destruição dos anos da Guerra Civil, por meio de uma restauração limitada do livre mercado. A ideia básica era que o Estado soviético manteria o controle dos “centros decisivos” da economia, enquanto usava o mercado para estabelecer um vínculo entre as cidades e a economia camponesa. Os camponeses venderiam o grão voluntariamente em troca de produtos industriais que poderiam comprar no mercado.

[13] Stalin impôs a dissolução do PCC no Kuomintang, nomeando seu líder, Chiang Kai Shek, membro honorário da liderança da Internacional. Após a repressão de Chiang Kai Shek que levou à morte de milhares de membros do partido, Stalin indicou a mesma política em relação ao Kuomintang de esquerda

[14] Apesar de sua capitulação, Zinoviev e Kamenev acabaram sendo condenados e fuzilados nos julgamentos de Moscou.

[15] Escritos da Vitória de Hitler, 1933.

[16] Leon Trotsky, Escritos, Volume IX, Vol. 2. Editorial Pluma

[17] Secretário de Trotsky, foi um dos responsáveis pela organização do congresso.

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