qua jul 24, 2024
quarta-feira, julho 24, 2024

A pobreza no país e as esmolas de Costa

Sem política para erradicar a pobreza, o governo de António Costa limita-se a medidas pontuais e inócuas, quando não reduz à má fila o valor de salários e aposentadorias/pensões. Ao mesmo tempo, salvaguarda os superlucros dos bancos e de grandes empresas como Galp (Energia), EDP (Energia), Sonae (Varejista) e ou Jerónimo Martins (Alimentos), ou concede bônus milionários aos seus colaboradores, conforme demonstrado no recente escândalo TAP/Alexandra Reis.

Por: Em Luta – Portugal

O Natal de 2022 foi mais pobre em Portugal. Para os trabalhadores, é claro. Enquanto a inflação se mantém entre 9% e 10% desde junho passado, os salários nominais não crescem mais de 4%. Por conta disso, calcula-se que a perda do seu poder de compra foi de 5% em média no ano que passou. Não espanta, portanto, que aumente o número de trabalhadores pobres no país, mesmo que não estejam em situação de desemprego. O cenário para 2023 não se prevê muito diferente. Decreto-lei promulgado pelo governo estabeleceu para a Função Pública um aumento salarial com valor fixo de 52 euros em janeiro para quem ganha até 2.600 euros e de apenas 2% para quem ganha acima desse valor. No setor privado, o acordo de rendimentos assinado por sindicatos e patronal prevê um reajuste de somente 5,1%.

Quanto aos aposentados/pensionistas, perderam poder de compra em 2022 e serão ainda mais prejudicados a partir de 2023, por conta da verdadeira armadilha arquitetada pelo governo PS para emagrecer drasticamente as suas aposentadorias/ pensões. Em troca de um acréscimo equivalente ao valor de meia aposentadoria pago apenas uma vez, em outubro de 2022, o governo suspendeu a lei de atualização das aposentadorias/pensões de acordo com a inflação. Isso significa que em vez de serem aumentadas em 8,42% agora em janeiro de 2023, percentagem correspondente à estimativa da inflação feita pelo governo, as aposentadorias/pensões terão um reajuste bastante inferior, entre 3,89% a 4,83%.

Conforme cálculo do jornal Público: o aposentado/pensionista que ganha 600 euros mensais terá um acréscimo no valor de sua aposentadoria/pensão de apenas 28,98 euros, em vez dos 50,52 euros a que teria direito caso fosse aplicada a lei. O pior é que a base de cálculo para os aumentos dos anos seguintes será esse valor rebaixado. Criticado pelas associações de aposentados/pensionistas, o governo nega cinicamente o evidente corte nas aposentadorias/pensões.

Triste 8.º lugar

Conforme cálculo da Defesa do Consumidor (DECO), um cabaz[1] de bens alimentares essenciais, que custava em fevereiro do ano findo cerca de 185 euros, aumentou para 218 euros em dezembro. Isso significa que a inflação está a penalizar principalmente os mais pobres. Para eles a inflação significa não ter comida na mesa.

Por outro lado, as rendas altas e a subida da taxa de juros têm transformado a habitação num item cada vez mais proibitivo para uma grande parcela da população. Hoje há mais de 49 mil famílias na Grande Lisboa a viver em condições consideradas indignas, enquanto no país 9 mil pessoas estão em situação de sem-abrigo.

Não é por acaso que Portugal passou a ocupar o 8º lugar na lista dos países europeus com maior risco de pobreza e exclusão social. Nessa situação, segundo o Eurostat, o Gabinete de Estatísticas da União Europeia, encontram-se 2,3 milhões de portugueses, o equivalente a 22,4% da população. Considera-se estar em risco de pobreza os que vivem com menos de 554 euros líquidos por mês, o que torna praticamente impossível garantir uma refeição de carne ou peixe com regularidade ou manter a casa aquecida.

Pobreza tem rosto

A maioria dos pobres ou em risco de pobreza em Portugal são mulheres, velhos e imigrantes, mais especificamente aqueles denominados pelo jargão dos burocratas europeus como estrangeiros extracomunitários. São marroquinos, timorenses, nepaleses, indianos, paquistaneses, senegaleses, guineenses e de vários outros países da África subsariana. Muitos dos que vêm para Portugal com a esperança de melhorar de vida, só encontram exploração e fome.

É o caso dos imigrantes que trabalham na campanha da azeitona no Alentejo. Quando não há mais trabalho, ficam sem qualquer proteção, a dormir no relento e sem dinheiro sequer para comer, a depender totalmente da caridade de instituições não-governamentais, como a Cáritas e outras. Enquanto os partidos de extrema-direita, racistas e xenófobos, como o Chega, os acusam de serem uns malandros que se aproveitam dos subsídios do Estado, a realidade é bem diferente. O Observatório das Migrações apurou que os imigrantes em Portugal contribuem muito mais do que recebem dos cofres do Estado. Em 2021, o saldo entre contribuições efetuadas e prestações sociais recebidas atingiu os 968 milhões de euros.

As esmolas de Costa

Em vez de aumentar salários e aposentadorias/pensões de acordo com a inflação, acabar com a precariedade e a exploração dos imigrantes, tornando legais todos os que vivem e trabalham no país; em vez de congelar o valor dos aluguéis e aumentar a oferta de imóveis a preços adequados à realidade portuguesa, o governo entretém-se a dar esmolas que só perpetuam a situação de penúria.

Exemplo disso são os 70 euros, em complemento ao abono de família, dados a cada criança em situação de pobreza extrema, num total de 150 mil, ou o apoio extraordinário de 125 euros concedido, apenas uma vez, aos trabalhadores e beneficiários de prestações sociais, e o mais recente cheque de 240€ aos mais pobres, para supostamente minimizar o impacto da subida dos preços.

A inflação em 2022 totalizou 8,1%, mas o salário mínimo foi reajustado em apenas 7,8%. O seu valor subiu de 705 para 760 euros. É com esse dinheiro que 25% dos assalariados em Portugal terão de sobreviver e pagar as suas despesas com alimentação, moradia, transporte e vestuário. É com esse magro rendimento que terão de enfrentar um ano em que, segundo as previsões do próprio Banco de Portugal, o crescimento econômico baixará de 6,8% para 1,5%, em que a recessão é uma perspectiva realista e a inflação vai continuar.

Ao mesmo tempo em que se recusa a aumentar os salários da função pública e o salário mínimo de acordo com a inflação, ou a congelar os preços dos aluguéis e dos bens de primeira necessidade, o governo do PS (partido Socialista) recusa-se ainda a tributar os lucros extraordinários das empresas. Até agora, aceitou taxar apenas a parcela dos lucros das empresas petrolíferas e de distribuição alimentar que ultrapasse os 20%. Deixa de fora, desta forma, a maior parte desses lucros e as empresas do setor elétrico, os bancos e as seguradoras.

Para quem governa o PS?

A verdade é que o governo de Costa atende aos interesses do grande capital e dos seus auxiliares, no governo e fora dele. A sua obsessão em reduzir a dívida pública, na mesma linha do tempo da troika, e manter as contas certas, isto é, obedecer ao receituário da Comissão Europeia, não inclui as benesses concedidas aos seus colaboradores, como os 500 mil euros dados a Alexandra Reis, ou os lucros das grandes empresas.

Quem está a pagar a conta da crise são os de sempre, os trabalhadores. Alterar isso só pode ser uma tarefa dos próprios trabalhadores – na luta, e não em negociações e geringonças nas quais sempre saem a perder.


[1] O cabaz alimentar português indica o orçamento mensal necessário para uma ingestão adequada de alimentos por três agregados familiares de referência (compostos por crianças e pessoas em idade ativa, de boa saúde, sem deficiências e a viver na capital do país).

Tradução: Lilian Enck

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