qui mar 28, 2024
quinta-feira, março 28, 2024

Pronunciamento da Articulação Revolucionária dos Trabalhadores (ART) frente à Consulta de Lasso

Em 5 de fevereiro diga NÃO à consulta ardilosa do governo de Lasso

O presidente Lasso convocou em novembro de 2022 uma consulta popular (referendo) que será realizada em 5 de fevereiro do presente ano, a mesma data em que as eleições das autoridades provinciais e municipais (prefeitos, governadores e juntas paroquiais rurais) serão efetuadas e também para eleger os sete novos integrantes do Conselho de Participação Cidadã e Controle Social (CPCCS), organismo que, segundo a Constituição, tem como funções a luta contra a corrupção e a organização de concursos para designar mais de 70 autoridades de controle.

A consulta contém 8 perguntas que se referem a três questões fundamentais: a insegurança, a institucionalidade democrática e o meio ambiente. É realizada em um ambiente político de evidente rejeição à gestão do governo da maioria da população (80% ou mais segundo as pesquisas).

Razões da rejeição da maioria dos equatorianos ao governo de Lasso

O descontentamento generalizado da população é uma resposta às políticas neoliberais de um governo que nestes 19 meses de gestão se colocou a serviço de uma reduzida elite de banqueiros e grandes empresários, mergulhando as grandes maiorias no desemprego, na carestia de vida, no temor pela crescente insegurança e incerteza no futuro. A rejeição ocorre pelo não cumprimento das demagógicas promessas de campanha do tiktokero Lasso, já que o governo deu prioridade ao pagamento da dívida externa e à redução do déficit fiscal, deixando de lado a obra pública que é a melhor forma de gerar empregos. Também por ter editado leis como a Lei Tributária, aprovada pela Assembleia Nacional (Congresso Nacional) que reduziu os salários da classe média e taxou as maiorias com novos impostos.

Há indignação frente à redução do orçamento destinado aos setores sociais, a falta de medicamentos e equipamentos nos hospitais públicos, a impossibilidade de centenas de milhares de jovens para ter acesso às universidades, como o banqueiro prometeu em sua campanha. Existe uma enorme incerteza pela situação que o IESS (Instituto Equatoriano de Seguridade Social) atravessa, a instituição social mais importante do país, de cujas cotas dependem milhões de equatorianos, frente à sua quebra premeditada a fim de justificar medidas como o aumento da idade e das contribuições para se aposentar, assim como sua parcial privatização.

Uma das questões que mais preocupa a população na atual conjuntura, é o desencadeamento da violência delinquente e em geral da insegurança em todos os aspectos, situação que está praticamente fora de controle do Estado. A Polícia, principal instituição encarregada da segurança, mostra-se impotente e também é questionada pela infiltração dos delinquentes e narcotraficantes em suas próprias fileiras. A este tétrico panorama se soma a corrupção nas mais altas esferas do governo como o caso denominado “El Gran Padrino” que envolve o banqueiro Danilo Carrera, cunhado e mentor de Guillermo Lasso desde sua tenra juventude, quem supostamente era o cabeça de um grupo dedicado a roubar nas empresas do setor público.

Os objetivos reais que o governo pretende com a consulta

Este é o contexto que nos permite entender quais são os objetivos do governo nesta consulta: o primeiro é buscar recompor sua instável imagem pública, gerando o falso discurso de que se o SIM ganhar na consulta, contribuirá para resolver os graves problemas de insegurança, caos institucional e destruição do meio ambiente que afligem o país. O segundo objetivo, o mais importante para Lasso e seu grupo, é controlar funções como o Conselho de Participação Social, para dessa forma garantir que as autoridades dos principais organismos de controle do Estado se alinhem com o governo e o protejam.

Por isso podemos classificar as perguntas do referendo em dois grandes tipos: 1) as perguntas atrativas, que respondem ao sentido comum da população, mas que não produzirão verdadeiras mudanças no país e, 2) as que permitirão uma maior concentração de poder no Presidente para controlar e ter ingerência em outras funções do Estado como a função judicial e a de controle social.

No primeiro caso, estão as seguintes perguntas: 1 (extradição dos equatorianos que tenham cometido delitos relacionados ao crime organizado transnacional), a 3 (redução no número de integrantes da Assembleia Nacional) a 4 (exigência aos movimentos políticos para contar com um número de filiados equivalentes a 1,5% do registro eleitoral de sua jurisdição), a 7 (incorporação de um subsistema de proteção hídrica ao Sistema Nacional de Áreas Protegidas) e a 8 (compensações para pessoas, comunidades e povos pelo seu apoio à geração de serviços ambientais).

No caso da pergunta 1, além de ser anticonstitucional, a extradição de equatorianos para o exterior não contribui em nada para o problema da insegurança e da violência. É uma demonstração de submissão ao imperialismo norte-americano e o reconhecimento de que a justiça equatoriana não tem capacidade para julgar o crime organizado. A extradição de equatorianos não soluciona a violência criminosa pois delitos como o narcotráfico não dependem de condições individuais, mas estruturais. E um exemplo é o México, que diante da prisão dos chefes da droga desencadeia uma violência incontrolável como represália.

A pergunta 3 se aproveita da baixa popularidade da Assembleia Nacional, gerando a falsa imagem de que reduzindo o número de membros da assembleia pode se melhorar o funcionamento desta instituição, desconhecendo que o problema fundamental não é o quantitativo, mas qualitativo. Além disso, reduz o número de representantes das províncias pequenas e médias, mas aumenta o dos membros da assembleia nacionais, de forma que o resultado final será a sub-representação das primeiras em benefício das províncias mais populosas. O mais grave nesta proposta é que os migrantes poderiam ficar sem representantes porque se exige que exista meio milhão de pessoas em cada jurisdição para poder eleger um representante, tendo conhecimento de que esse número é muito difícil de alcançar, pois existem muitos compatriotas ilegais que não se registram por medo da deportação.

No caso da pergunta 4, acaba sendo irrelevante devido ao fato de que o requisito de 1,5% de adesões para a criação de movimentos políticos já consta no Código da Democracia e sua proliferação se deve a que estes podem constituir-se a nível paroquial, cantonal ou provincial, realidade que não mudará com as modificações propostas. Situação semelhante ocorre com as perguntas 7 e 8 sobre meio ambiente, considerando que já existe uma legislação como as consultas prévias à população que permite proteger as áreas hídricas e os habitats naturais, e que o governo não respeita, além de que compensar pelos serviços ambientais nos leva à lógica capitalista de “pagar para contaminar”: pagamento por cuidar de uma floresta, por exemplo, mas isso me dá direito de contaminar outra zona. O problema da acelerada destruição do meio ambiente se deve à falta de vontade política dos organismos do Estado encarregados de cumprir as normas existentes, devido à interferência de poderosos interesses econômicos e políticos como é o caso da mineração, tanto em grande escala como a ilegal.

São as perguntas do segundo tipo, que têm a ver com uma acumulação de poder do executivo, as que têm um interesse maior para o governo.  É o caso das perguntas 2, 5 e 6. A segunda pergunta procura deslocar o Conselho Judiciário em suas competências constitucionais de selecionar, avaliar, promover, capacitar e sancionar os funcionários do judiciário e também do Ministério Público. Tais tarefas passariam para um novo organismo chamado Conselho Fiscal, cujos integrantes seriam designados por ela ou pelo Procurador Geral. Em suma, o governo aposta que a atual Procuradoria, a mesma que atua sob os interesses do governo de Lasso, seja a que assuma as funções que pelo mandato constitucional correspondem ao Conselho Judiciário, anulando dessa forma a autonomia deste organismo fundamental para o exercício da justiça.

A quinta pergunta busca eliminar a faculdade que o CPCCS tem atualmente de designar autoridades de controle através de concursos públicos, para que a Assembleia Nacional nomeie tais autoridades. Entretanto, se lermos o conteúdo dos anexos desta pergunta, o organismo que terá a capacidade para selecionar tais autoridades é uma comissão técnica que será formada por delegados das diferentes funções do Estado onde o executivo terá possibilidades de pressão para impor pessoas afins. A armadilha desta pergunta crucial é que nas disposições transitórias se estabelece um prazo de um ano e meio para que este processo seja executado e enquanto isso as autoridades atuais serão prorrogadas em suas funções. O governo é quem conseguiu controlar os integrantes do atual Conselho de Participação e o que pretende continuar com o controle deste organismo crucial para proteger-se frente às denúncias de corrupção.

A sexta pergunta pretende que os integrantes do CPCCS já não sejam eleitos por votação popular, mas pela Assembleia Nacional baseada nos 20 candidatos selecionados por uma comissão técnica de seleção. Ou seja, para os organismos mais representativos do Estado como Controladoria, Procuradoria, Superintendências, Conselho Judiciário, etc., será a Assembleia Nacional a que novamente nomeará seus integrantes segundo suas forças políticas, a quem melhor se oriente aos seus interesses, ou seja, aos seus incondicionais.

Em conclusão, esta mal denominada consulta popular é ardilosa e enganosa porque não resolverá os graves problemas do país em matéria de insegurança, funcionamento da democracia e meio ambiente, e sim responde a uma estratégia do atual governo para recuperar sua impopular imagem e principalmente para obter maior poder e controle de outras funções do Estado, como a judicial e o CPCCS. Consideramos que Lasso busca unicamente tomar um fôlego e recuperar algo em sua legitimidade, para desfalcar o que falta e roubar descaradamente os recursos do Estado. Por isso nos unimos às vozes das organizações sociais e políticas da classe trabalhadora e dos setores populares com a finalidade de proclamar nossa rejeição a este referendo, às políticas neoliberais e da fome do governo inepto e dizer que votaremos 8 vezes NÃO.

Tradução: Lilian Enck

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