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México inicia 2023 recebendo visita imperial

janeiro 11, 2023

A visita, no contexto da Cúpula de governos da América do Norte, anunciada para dezembro passado, foi adiada para 9 a 11 de janeiro de 2023. Os representantes imperialistas dos Estados Unidos e Canadá vão estar no México.  Com que objetivos chegam os ilustres abutres, Joe Biden e Justin Trudeau?

Por: Workers Voice (USA) e Corrente Socialista dos Trabalhadores (México)

A “agenda” oficial, como sempre acontece com o sigilo e a hipocrisia da diplomacia capitalista, sobrepõe-se à magnitude das questões e a profundidade das controvérsias. Serão reuniões entre administradores dos negócios das corporações multinacionais e os oligarcas locais. Serão como as anteriores, reuniões onde serão ajustadas as medidas de saque dos recursos naturais e energéticos e a exploração da mão de obra barata do México e da região centro-americana. Além disso, para que o mecanismo de dominação semicolonial continue funcionando com “segurança” serão ajustados, segundo a exigência dos impérios, o papel do México em questões políticas e militares “hemisféricas” críticas. 

A relação de dependência e dominação semicolonial do México pelos Estados Unidos (e em menor medida pelo Canadá), é um fator dominante. E embora em diversos momentos da história, segundo as conjunturas mundiais e as “aparências” mantidas por alguns governos mexicanos, as “formas” de dominação foram mudadas, esse domínio permanece desde a invasão dos Estados Unidos em 1846-48, que arrebatou do México mais da metade de seu território. E não é de se estranhar que, tanto o governo do México como os dos Estados Unidos e Canadá, também falsifiquem essa realidade evidente, definindo que as relações entre nossos países: “são de total relação com a nossa soberania e de cooperação para o desenvolvimento”.

De que se trata a soberania e cooperação?  Hoje temos um T-MEC (Acordo Estados Unidos, México e Canadá), assinado por Peña Nieto e Trump em 2018, com o apoio fervoroso do recém eleito AMLO (Andrés Manuel López Obrador). Um tratado que renovou e reforçou o saque, praticado durante 25 anos com o TLCAN (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio), assinado por George W. Bush, presidente dos Estados Unidos; por Brian Mulroney, o primeiro ministro canadense; e pelo presidente mexicano Carlos Salinas de Gortari, em dezembro de 1992. Atualmente está assinado por AMLO e Ebrard com Biden o “Entendimento Bicentenário”, que é uma simples mudança de nome do “Tratado de Mérida”, assinado em 2009 pelos presidentes Felipe Calderón e Barack Obama. E assim, mudando os nomes e os signatários, sob o governo da “Quarta Transformação” são mantidas as duras condições de domínio comercial e econômico do México, pelos Estados Unidos e Canadá. E também as condições de domínio político, militar e da chamada “segurança”.

A verdade nua e crua é que não há “transformação” possível, sem denunciar e combater esta dominação nacional que o México sofre. Dominação que é sobreposta e mantida pelo governo do país dominado, com um falso “discurso soberano”. E, com certeza esta dominação não é questionada, mas reivindicada pelos atuais opositores, os republicanos ianques de todos os matizes e por todos os “ministros”, súditos da coroa britânica que rege o Canadá. E não é surpreendente que também a reivindiquem os atuais opositores mexicanos do PRI (Partido Revolucionário Institucional), PAN (Partido da Ação Nacional), MC (Movimento Cidadão), PRD (Partido da Revolução Democrática), pois só aspiram voltar a ser os capatazes do saque, da colonização e da superexploração, como o foram durante longas décadas.  

O México na concorrência ianque com a China

Não se trata de uma visita de rotina do patrão aos seus empregados. Está no contexto da atual guerra comercial dos Estados Unidos contra a China. Através desta guerra, o capital estadunidense tenta reforçar sua hegemonia.  Também está tentando dar uma solução para o modo como a queda mundial das taxas de lucro capitalista o está afetando. Estes esforços podem ser resumidos em três políticas: a guerra comercial e de controle de matérias primas contra a China, a repatriação da produção, seja dos próprios Estados Unidos ou de suas dependências próximas para resolver problemas de taxas de rentabilidade e cadeias de suprimento e a busca de fontes de energias fósseis ou renováveis. O México desempenha um papel fundamental nestas três políticas, como lugar viável para as empresas estadunidenses poderem transferir a produção para os mercados estadunidenses ao invés de continuar produzindo na China. Também é um produtor de energia. Por isso, durante sua visita, Biden será um fiel representante das demandas das empresas estadunidenses de energias renováveis e fósseis que procuram obter estes recursos no México, liberando ainda mais a participação do capital estadunidense no setor e adiantando sua eventual apropriação.

Outra questão a abordar neste contexto é a regulamentação a respeito da produção de peças para veículos elétricos e quais “privilégios” de exportação para os EUA terão acesso livre de impostos. Os EUA buscam incentivar a autorização da produção mexicana de peças nas condições mais vantajosas para suas próprias empresas automotivas, aprofundando mais a dependência deste setor no México. Quando falam em criar uma só área produtiva com o México e o Canadá, Biden e seus representados não têm em mente uma igualdade entre os produtores.

O atual governo do México continua representando – agora no contexto da “Quarta Transformação” – os interesses dos maiores oligarcas (como Telmex-Carso de Carlos Slim), que aspira desempenhar um papel maior em outros mercados do continente, inclusive Cuba, Venezuela e Peru. Com essa incumbência AMLO interpreta o papel de uma figura latino-americana “independente”, um líder político regional, mas a serviço da potência imperialista hegemônica em crise. Parte desta artimanha é sua declarada ambição “geopolítica” de superar a China com a mão de obra barata do México a serviço do capital dos Estados Unidos: “O encontro com o presidente Biden será muito importante por isso, porque vamos propor um plano para ‘o desenvolvimento de toda a América Latina e o Caribe’, alcançar ‘a autossuficiência da América’”. Proporá “um plano para substituir importações e produzir na América, primeiro na América do Norte, mas a médio prazo em toda a América, o que consumimos”, disse AMLO. Mais dependência colonial disfarçada com frases como a “Aliança para o Progresso”, promovida por Kennedy.

A “agenda” são as incumbências dos patrões

Notícia de 28/12/22 informa: “Embora ainda esteja sendo trabalhadas questões da agenda para a Cúpula de 2023, espera-se que a questão migratória e o tráfico de fentanil sejam colocados na mesa, pois é preciso lembrar que o México aceitou acolher os migrantes venezuelanos que entrem ilegalmente nos EUA”.

E essas incumbências para seus capatazes, os governos mexicanos – e AMLO não é exceção – não só consistem em administrar o saque do país e a exploração dos operários mexicanos com o T-MEC, dentro dos 3 países. Não. Também exigem que sejam os gendarmes que cuidam de sua fronteira Sul para frear a avalanche de migrantes, que chegam empurrados pela miséria extrema, pela decomposição social e pela violência dos governos centro-americanos, caribenhos e do resto da América Latina. Para isso é que foi criada a Guarda Nacional e para mais “eficiência” agora quem está comandando é o Exército.

Os EUA também colocaram na agenda a questão do milho através de uma queixa contra o México no marco do T-MEC pelas barreiras (débeis por si) contra a importação no México de milho transgênico para consumo humano. Não satisfeitos com o desastroso impacto do TLC sobre a área agrícola mexicana, os ianques buscam reinventar algum impedimento restante para a apropriação da terra e da água na agricultura, e dos recursos naturais em geral.

Limpar a fazenda na véspera da visita do patrão

Como parte da cenografia, por “mera coincidência”, três dias antes da visita, ocorreu a espetacular e violenta operação para a captura e extradição, ordenada pelos Estados Unidos, do narcotraficante Ovidio “Ratón” Guzmán, filho do “Chapo”, em Culiacán, Sinaloa. López Obrador, passou 4 anos proclamando que seu lema para erradicar o narcotráfico era “Abraços, não tiros”. Entretanto, em um dia seu governo desencadeou um tiroteio e massacre, com ataques a aviões de passageiros, com dezenas de mortos entre militares e delinquentes, que mergulharam Sinaloa em um tormento e comoveu o México e o mundo. Assim, AMLO cumpre com outra exigência fundamental dos Estados Unidos: que os governos mexicanos garantam à DEA (Administração de Fiscalização de Drogas) o controle da política mexicana referente ao narcotráfico. Especialmente agora, a produção e tráfico do fentanil. Há décadas os Estados Unidos fazem campanha, oficialmente, contra o narcotráfico. Mas isto é só uma retórica vazia, já que têm feito acordos com proeminentes colaboradores dos cartéis de drogas, como o General «Padrinho» Cienfuegos, o ex Chefe da Secretaria da Defesa Nacional acusado de narcotráfico nos Estados Unidos, mas que foi permitido que voltasse ao México com impunidade depois de um acordo entre Trump e AMLO.

AMLO vai propor a Joe Biden uma “fórmula para reduzir a migração”

“Vamos tratar da questão de forma estrutural. Estamos propondo que exista um programa de apoio aos países com mais pobreza, com mais necessidade, para que as pessoas não sejam obrigadas a migrar e já temos alguns exemplos de como funciona, oferecendo opções aos que se veem obrigados a optar pela migração”, disse o presidente do México.

Enquanto milhares de migrantes estão retidos e amontoados na cidade fronteiriça de Tijuana, López Obrador “revelou” que a migração será um dos pontos que abordará com Joe Biden, a quem apresentará um “plano de ajuda econômica aos países centro-americanos para assim evitar que milhares de pessoas sejam obrigadas a sair de seus países em busca de melhores oportunidades de vida”. Insistiu que seus programas como “Semeando vida” e “Jovens construindo o futuro” funcionaram não só no México, mas que sua exportação para alguns pontos da América Central obteve resultados positivos. E em um novo e temerário exercício de demagogia, proporá a Biden a possibilidade de financiar esse plano “para ajudar a reduzir a migração na região”.

Porém, atualmente, ainda mais nesta etapa de crise global e recessão da economia, as leis da superexploração – ou seja, da extração de maior mais valia – e o saque, funcionam segundo a equação que até agora e há décadas as economias do México e países da América Central mantêm: as remessas de dezenas de bilhões de dólares, enviadas por migrantes explorados nos Estados Unidos e Canadá. Por isso negociarão a “mobilidade do trabalho”, concedendo vistos de trabalho, para cobrir as necessidades do grande capital dos EUA e Canadá, da mão de obra barata. Enquanto as corporações de mineração canadenses e estadunidenses, continuam saqueando e contaminando como nas últimas três décadas, nas quais foram levados mais ouro e prata que o roubado nos 300 anos de domínio colonial espanhol. E agora saqueiam o lítio, sob a camuflagem das energias limpas.

A verdadeira saída para combater a pobreza de toda a América Latina

Não será suplantando a produção da China à custa da superexploração das massas mexicanas e latino-americanas dentro e fora dos Estados Unidos. Não será cumprindo com os pagamentos da usurária e fraudulenta dívida externa. Não será alimentando governos e parlamentos corruptos que administram os lucros das corporações estrangeiras e seus sócios oligárquicos. Não será com o saque dos megaprojetos de mineração e dos recursos energéticos, hídricos e naturais que degradam o meio ambiente.

E a classe operária mexicana e os povos originários lutaram e continuam lutando, apesar de todos estes anos de confusão, produzida pela simulação “transformadora” que López Obrador encarna. As operárias e operários das montadoras da fronteira em Matamoros, Tamaulipas protagonizaram greves massivas superando as burocracias sindicais, os bairros pobres de Chiapas, Oaxaca, Coahuila e Durango enfrentaram os megaprojetos de morte e em fábricas como General Motors, Silao e em outras automotivas e de autopeças, ocorreram importantes processos de reorganização sindical. E, como porta-estandarte destas lutas está a heroica greve de mais de mil dias  das e dos trabalhadores da Agência de Estado Notimex, que lidera o SutNotimex, enfrentando os perversos ataques do governo de AMLO.  

Por isso estamos convencidos de que o caminho para superar a pobreza e submissão será com a unidade sem fronteiras de toda a classe operária e o povo pobre e setores oprimidos do México, Estados Unidos, Canadá e de toda a América desde o Alaska até a Terra do Fogo, para mobilizar com um programa de independência nacional e libertação social. Ou seja, estabelecendo governos dos trabalhadores, que deixem de pagar as fraudulentas dívidas externas ao BM e ao FMI, que expropriem todas as grandes empresas e bancos estrangeiros e locais. E colocar esses imensos recursos a serviço das necessidades dos trabalhadores e povos americanos. Por outro lado, que anulem o T-MEC, o Entendimento Bicentenário e todos os pactos de submissão colonial. Só assim, mudando a superestrutura capitalista semicolonial que o imperialismo domina, se poderá conseguir “de forma estrutural” que não exista uma avalancha de necessitados que lutam para sobreviver e encontram a morte e humilhações, quando tentam cruzar os muros e fronteiras para realizar o “sonho americano”.

Tradução: Lilian Enck

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