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Chile| A posição do MIT frente ao plebiscito constitucional

julho 21, 2022

No dia 4 de setembro será realizado o plebiscito para aprovar ou não a proposta de nova constituição. Nas últimas semanas, redes sociais, canais de rádio e TV foram inundados de informações sobre os artigos da Nova Constituição.

Por: MIT Chile

Aqueles que defendem a Rejeição (não aprovar) espalharam muitas notícias falsas e mentirosas, uma verdadeira “campanha de terror” para que a classe trabalhadora e o povo rejeitem a Nova Constituição sem sequer conhecer seu verdadeiro conteúdo. Assim, espalharam que ninguém terá direito à casa própria; que os recursos economizados nas AFPs serão expropriados; que os povos indígenas terão privilégios e um longo etc. Campanhas de mentiras como essa são típicas dos donos do poder. A classe trabalhadora não pode cair nesse engano. É fundamental que os trabalhadores desconfiem dos meios de comunicação de massa e dos personagens espalhafatosos da direita. Devemos buscar compreender o verdadeiro conteúdo da Nova Constituição e analisar o processo social que estamos vivenciando.

Por outro lado, a campanha para a “Aprovação” também foi iniciada. Além de milhares de militantes honestos que são pelo sim, Aprovar, e querem muito mudar o país, neste campo estão também alguns dos responsáveis ​​por todos os problemas sociais que temos hoje, como o Partido Socialista, a Democracia Cristã e até a Frente Ampla (FA) e Partido Comunista (PC), que hoje são governos. Esses partidos e muitos ex-constituintes independentes também começam a fazer campanha de mentiras, porque dizem que com a Nova Constituição os problemas do povo serão resolvidos. Não falam de “letras miúdas”, nem dos aspectos centrais da Nova Constituição, que mantêm o domínio dos multibilionários sobre o país como um todo. Assim, devemos também desconfiar da campanha do “Aprovo” e questionar todas as informações que recebemos desse lado.

A Nova Constituição está a serviço do imperialismo e das 10 famílias mais ricas do Chile

Após 1 ano de Convenção Constitucional, podemos agora fazer um balanço desse processo. Desde o início fomos críticos do Acordo pela Paz que deu origem ao Processo Constituinte, pois esse acordo impôs enormes limites à Constituinte, que nasceu totalmente subordinada às atuais instituições do Estado, sem soberania, com presos políticos e com um quórum antidemocrático que deu enorme poder à minoria dos constituintes, representantes diretos do grande empresariado.

Assim, o resultado da Convenção não é surpreendente. A Nova Constituição mantém a essência do capitalismo neoliberal chileno. Mantém-se a propriedade privada dos grandes grupos econômicos sobre a economia do país como um todo. Os grandes monopólios de mineração, da pesca, do lítio, a concentração de terras nas mãos de empresas florestais não são tocados. A grande propriedade privada continua protegida e permanece quase inviolável na Nova Constituição, pois o Estado, se quiser nacionalizar minas de cobre ou expropriar terras para o povo mapuche, por exemplo, terá que pagar indenização multimilionária (e adiantada) aos donos do país. Nesse grande acordo em defesa da propriedade privada capitalista estavam a grande maioria dos constituintes, desde a direita, passando pela Frente Ampla, o Partido Comunista (que nada tem de comunista, além do nome) e até mesmo a “esquerda” independente como feministas ou povos indígenas .

No caso dos direitos sociais, tão almejados pela população e que deram origem às mobilizações das últimas três décadas, o setor privado continuará existindo e negociando com nossa saúde, nossa previdência e com a educação. A Nova Constituição não questiona o poder dos donos de clínicas e laboratórios particulares, nem dos donos de colégios e universidades particulares, nem das AFPs e Seguradoras, que sequestraram nossas aposentadorias/pensões. Todas as propostas que iam nesse sentido foram rejeitadas pela maioria dos constituintes. Várias Iniciativas Populares de Norma que propunham limitar o poder empresarial sobre esses direitos sociais foram rejeitadas, como parte das propostas das organizações de saúde, do Movimento NÃO + AFP, do movimento habitacional etc. Nossa companheira María Rivera defendeu as propostas dos movimentos sociais e também fez propostas para acabar com o controle empresarial dos direitos sociais, como proibir o financiamento público ao setor privado de educação ou permitir que todos os trabalhadores retirem todos os seus fundos das AFPs e Seguradoras, mas estas também foram rejeitadas.

Embora direitos sociais como moradia, saúde, educação e aposentadorias sejam agora reconhecidos como obrigações do Estado, a Convenção Constitucional rejeitou a proposta mais importante que permitiria o financiamento desses direitos sociais: a nacionalização das grandes mineradoras de cobre e lítio com controle dos trabalhadores e das comunidades. A nacionalização do cobre daria ao povo o direito de decidir o que fazer com a principal riqueza produzida pelo país, que hoje é entregue a transnacionais e algumas famílias chilenas, como a família Luksic. Assim, a Convenção fechou as portas para que os trabalhadores tivessem acesso à principal fonte de recursos que poderiam financiar a construção de milhares de moradias, garantir um Sistema de Saúde gratuito para toda a população, educação de qualidade e também investir em novas tecnologias para reduzir os impactos da grande mineração e outras indústrias na natureza e na vida humana. Todo o cobre chileno continuará sendo dado de presente ao imperialismo.

Para manter a defesa da propriedade privada e o controle dos grandes monopólios sobre o conjunto do país, a Convenção manteve o Estado chileno e seu aparato repressivo quase intactos. O odiado Senado é mantido, mas agora com um novo nome (Câmara de Regiões) e com menos atribuições. Toda a estrutura das Forças Armadas e sua cúpula corrupta e repressiva permanecem. Mantém-se a odiada instituição dos Carabineiros, que supostamente passará a ser uma polícia civil, mas que não tem nenhuma atribuição de polícia civil, pois não é reconhecido o direito de organização da tropa, de greve, liberdade de expressão ou mecanismos de controle da população sobre esta polícia. Também não foram punidos os altos funcionários dessas instituições, responsáveis ​​pela repressão e corrupção. Mantêm-se também os estados de exceção, que supostamente deveriam ser usados ​​”em caso de guerra”, mas sabemos que só são usados ​​contra o próprio povo chileno e mapuche quando se mobilizam.

Além disso, toda a Nova Constituição, se aprovada, terá que passar pelo atual Congresso, que poderá reformá-la e terá que legislar nos próximos anos para que os direitos se tornem realidade, um Congresso praticamente controlado pela direita e pela coligação que hoje governa o país e governa junto com os donos do país.

Portanto, a classe trabalhadora, os idosos, a juventude popular, os ativistas e militantes dos movimentos sociais devem ter nitidez de que a Nova Constituição não é a Constituição que o povo precisa e será usada como uma ferramenta contra o povo mapuche, contra a classe trabalhadora e a juventude que se mobiliza, a serviço da manutenção da pilhagem do país.

Votar pelo Aprovar contra a Constituição de Pinochet, Lagos e Bachelet. Defender o que foi conquistado e avançar com luta e organização

Ainda que toda a Nova Constituição mantenha a dominação do país, a luta dos trabalhadores, da população dos bairros pobres, do movimento de mulheres e da juventude arrancaram algumas conquistas. Todas essas conquistas são parciais e até agora estão apenas no papel. Entre elas estão a criação do Sistema Público de Previdência Social, o direito à saúde, o direito à moradia, a educação pública e gratuita em todos os níveis, a ampliação do direito à greve, o direito à negociação por ramo de atividade, o direito ao aborto, o fim dos Direitos de Aproveitamento da Água que permitem a especulação capitalista sobre a água, o reconhecimento dos povos originários e seu direito à restituição da terra, a proteção de geleiras e pântanos, etc. Todos esses direitos foram conquistados apesar dos partidos políticos tradicionais, que foram obrigados a abrir mão de algo para manter a essência do capitalismo neoliberal chileno. Todas essas conquistas estão ameaçadas no Plebiscito de 4 de setembro

No dia 4 de setembro não votaremos se gostamos ou não da Nova Constituição. No dia 4 de setembro votaremos se manteremos a atual Constituição ou a mudaremos para uma Constituição que reconheça algumas conquistas do movimento social, operário e popular.

O Movimento Internacional dos Trabalhadores, reunido em Conferência com delegados de diversas regiões do país e após um debate de mais de 2 meses, decidimos chamar a votar por Aprovar no dia 4 de setembro. Acreditamos que neste momento devemos votar pelo Aprovar para por fim à atual Constituição, defender os ganhos que conquistamos e fechar a porta aos ataques mais reacionários que, sem dúvida, virão do Congresso e das instituições atuais se a Rejeição vencer. Nosso voto não é um voto de confiança na Nova Constituição, é um voto crítico, para continuar o diálogo com os milhões de trabalhadores que têm expectativa que a Nova Constituição resolva seus problemas ou transforme o Chile em um país mais digno. Neste momento não podemos deixar as bandeiras de luta de milhões de pessoas nas mãos de partidos e organizações que só querem enganar e desmobilizar a luta dos trabalhadores e da juventude, como o Partido Socialista, a Frente Ampla, o Partido Comunista e até mesmo muitos ex-constituintes independentes.

Respeitamos a posição dos companheiros e companheiras lutadores/as sociais que estão por votar pela rejeição ou nulo, criticando a Nova Constituição por seu caráter burguês, como muitos companheiros que se envolveram na luta pela nacionalização da mineração de cobre em grande escala. No entanto, acreditamos que neste momento votar nulo é subtrair votos da Aprovação, garantindo a possível vitória da Rejeição, o que significaria um importante retrocesso para a luta da classe trabalhadora e da juventude. Por isso, convidamos esses companheiros a refletir e mudar de posição.

Por outro lado, queremos ser enfáticos sobre uma questão. Embora devamos ir votar pelo Aprovo em 4 de setembro, não basta ir votar. Nenhum dos direitos conquistados sairá do papel sem luta e organização, já que tudo ficou nas mãos do Congresso. Também não podemos confiar no governo de Gabriel Boric, pois sua prioridade não é resolver os problemas dos/as trabalhadores/as, mas sim manter o capitalismo neoliberal chileno dando algumas migalhas aos trabalhadores. Gabriel Boric já mostrou que está disposto a negociar outro Processo Constituinte com a direita, caso vença a Rejeição. Essa postura é típica da pequena burguesia, que não pode levar até o fim as mais mínimas lutas pelos direitos democráticos do povo sem capitular à grande burguesia e seus representantes.

Quando falamos de luta e organização, queremos ser muito específicos. Os sindicatos devem tomar em suas mãos o direito à negociação por ramo de atividade, exigindo que o Congresso o reconheça e o torne efetivo, buscando a unidade do movimento sindical em sua luta pelos direitos da classe trabalhadora contra os patrões. O povo pobre deve continuar ocupando terrenos e fortalecer a luta para que o direito à moradia digna seja cumprido na realidade. As comunidades que sofrem com a falta de abastecimento de água devem tomar em suas próprias mãos a luta pelo fim do monopólio da água pelas grandes empresas agrícolas, florestais e mineradoras. O povo mapuche deve continuar recuperando o território roubado pelas empresas florestais. Não podemos sentar e esperar que este Congresso ou as futuras instituições resolvam nossos problemas.

É necessário reconstruir o caminho da luta pelo socialismo e pela libertação da classe trabalhadora

A classe trabalhadora, a juventude e os movimentos sociais só podem contar com suas próprias forças, sua própria organização e mobilização, independente dos empresários e governos de turno. Devemos buscar a unificação dos diferentes movimentos sob um programa de luta que combine as demandas imediatas do povo trabalhador, a luta pela efetivação dos direitos conquistados na Nova Constituição e a luta por nossas demandas estratégicas. Muitas de nossas demandas não foram reconhecidas na Nova Constituição, como a revisão dos Acordos de Livre Comércio que mantêm o país refém das transnacionais, a nacionalização da mineração em grande escala, o fim dos salários milionários dos políticos, o fim da subcontratação e o emprego precário e um longo etc.

O MIT e com nossa companheira ex-constituinte María Rivera, estamos convencidos de que o movimento social já tem muitos elementos de um programa de transformação radical da sociedade, que pode libertar nosso país das garras do imperialismo e da grande burguesia chilena. No entanto, não acreditamos que isso seja possível sem que a classe trabalhadora e o povo caminhem em direção a um governo dos trabalhadores, apoiado em organizações territoriais, de trabalhadores, jovens e povos originários.

As propostas mais importantes que defendemos na Convenção Constitucional apontavam nessa direção. A nacionalização da grande indústria de mineração de cobre e das principais empresas estratégicas do país, sob o controle dos trabalhadores e das comunidades, permitiria que as riquezas do país fossem utilizadas para solucionar problemas sociais e frear a destruição ambiental, apontando para outro caminho de desenvolvimento para o país. Para gerir esse novo modelo econômico, baseado na propriedade coletiva dos meios de produção, propusemos a criação de uma Assembleia Plurinacional de trabalhadores e povos, que possibilitaria a implantação de uma nova forma de governo, baseada na democracia de base, com cargos revogáveis ​​e sem salários milionários.

Embora essas propostas tenham sido rejeitadas pela Convenção Constitucional, acreditamos que deveriam fazer parte do programa estratégico da classe trabalhadora chilena em busca da libertação total da enorme maioria da população do jugo do capitalismo. Estamos convencidos de que nenhuma Constituinte, por mais democrática que seja, resolverá os problemas da classe trabalhadora, porque são organizações controladas pela grande burguesia e seus representantes, assim como o Parlamento e as demais instituições deste Estado. Vários países vizinhos como Equador, Venezuela ou Brasil têm Constituições repletas de direitos sociais, mas nunca saíram do papel. Portanto, é tarefa da classe trabalhadora construir seu caminho independente para a construção de um verdadeiro poder operário e popular que caminhe em direção a uma sociedade socialista.

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