qua mar 27, 2024
quarta-feira, março 27, 2024

O assassinato do ativista bielorrusso Vitaly Shishov na Ucrânia e a luta das revoluções ucraniana e bielorrussa contra as ditaduras de Putin e Lukashenko

Em 2 de agosto, um ativista da Belarus, chefe da Casa Bielorrussa na Ucrânia[1], Vitaly Shishov, foi assassinado em Kiev, capital da Ucrânia. Vitaly deixou a Belarus em 2020 devido à repressão da ditadura. Na Ucrânia, ajudou a outros bielorrussos que também fugiam da perseguição do regime de Lukashenko, e facilitou as ações que os bielorrussos organizaram na Ucrânia em apoio à sua revolução. Vitaly era um dos que não acreditava na estratégia de negociação com a ditadura proposta pela oposição burguesa bielorrussa, e insistia na necessidade de derrubar a ditadura de Alexander Lukashenko, no poder desde 1994, com métodos de luta mais radicais. Ao mesmo tempo, sua organização tinha boas relações com os voluntários ucranianos que lutavam contra a ocupação em Donbass, região ao leste da Ucrânia, efetuada por Putin. Vitaly recebeu ameaças regulares e recentemente percebeu que estava sendo seguido.

Por: Ivan Razin

Atentado da ditadura de Lukashenko sob o patrocínio de Putin

Em primeiro lugar, expressamos nossas mais profundas condolências à família, amigos e companheiros de Vitaly. O assassinato ainda não foi resolvido. No entanto, sua circunstância deixa poucas dúvidas a todos.

Atualmente, há uma onda de repressão contra os ativistas mais notórios na Bielo-Rússia. Lukashenko busca atingir até mesmo ativistas que deixaram o país, como demonstrou o caso do sequestro e prisão de Roman Protasevich[2]. Matar opositores é um método tradicional para Lukashenko: foi com os assassinatos dos seus oponentes que começou a estabelecer sua ditadura. A própria tecnologia do assassinato (Vitaly foi sequestrado durante uma corrida matinal e no dia seguinte foi encontrado pendurado em uma árvore no parque) é extremamente característica da KGB [polícia política bielorrussa]. O FSB, a polícia política russa, apoia hoje totalmente a repressão realizada por Lukashenko, incluindo sequestros de ativistas bielorrussos na Rússia, transportados secretamente para a fronteira com a Bielo-Rússia para entregá-los à KGB de Lukashenko: as repressões contra a revolução bielorrussa chegaram a Moscou.

No dia em que foi descoberto o assassinato, os canais de propaganda de Putin como «Sputnik» (no cenário internacional) e «Rússia» e outros dentro da Federação Russa começaram a divulgar o assassinato com insinuações de que Vitaly poderia ter se enforcado enquanto praticava esporte; com histórias tradicionais sobre a «Ucrânia fascista» (no sentido de que se o mataram, não é algo tão ruim); ou mudar do tema concreto do assassinato para os métodos da polícia norte-americana (no sentido de que “os americanos também matam, então, qual é o problema com o que aconteceu em Kiev”?). Eles até apresentaram um grande filme «documentário» sobre este assassinato para o público russo com as ideias pré-concebidas. Em tudo isto, é extremamente difícil duvidar que o responsável por este assassinato político seja a KGB bielorrussa em estreita ligação com a FSB russo.

Dar uma resposta à agressão de Putin e Lukashenko

A Ucrânia precisa dar uma resposta dura a este assassinato político. Em primeiro lugar, deve ser investigado até que sejam reveladas todas as pessoas envolvidas, todo seu esquema, nos mínimos detalhes. Devem ser divulgados todos os fatores que impediram que a polícia ucraniana e o Serviço de Segurança da Ucrânia (SBU) não o tivessem previsto.

É necessário eliminar todas as estruturas do regime de Lukashenko – que está se tornando cada vez mais em uma continuação de Putin -, até a agressão direta no território da Ucrânia. A cessação do terror contra Ucrânia e, em primeiro lugar, da ocupação da Criméia e de Donbass, exige o fechamento não só dos canais de televisão pró-russos no país, como foi feito recentemente, mas de TODAS as estruturas de Putin e pró-Putin, a limpeza do país dos agentes da FSB e do regime de Putin em geral, que se sentem à vontade na Ucrânia, inclusive dentro da polícia e dos serviços especiais, que, apesar de certo expurgo após a revolução, mantiveram basicamente o mesmo pessoal.

É necessária a expropriação de todo o capital russo: é incrível que o invasor continue fazendo negócios no território do país! Putin e Lukashenko não toleram o “território da liberdade” que se transformou a Ucrânia com sua revolução, apesar do bastião contrarrevolucionário da ditadura de Putin. A defesa da revolução, das liberdades, da independência nacional exige respostas enérgicas ao assassinato cometido.

Na Belarus, embora a ditadura tenha conseguido aplacar a onda de protestos por meio da repressão, não conseguiu reverter à situação: após um quarto de século de uma «atemporalidade» da era Lukashenko, o povo da Belarus acordou e não voltará a dormir; hoje eles odeiam ainda mais à ditadura, este ódio paira no ar, se espalha por todas as partes e aponta cada vez mais para Putin, que por enquanto salvou a ditadura.

Hoje na Belarus há um processo inicial para a organização independente de lutadores operários. Mais conflitos começaram a surgir nas fábricas entre os operários e as administrações de Lukashenko devido à degradação das condições de vida e de trabalho. É importante que estes conflitos não se isolem em si mesmos, em suas próprias local de trabalho, mas que algumas delas se comuniquem com outras para que os conflitos sejam amplamente conhecidos fora da fábrica, se comuniquem entre si e contatem ativistas de organizações sindicais independentes. Tudo isto não só contribuirá à vitória em um conflito local, mas que pode se converter em uma base importante para reorganizar a luta para derrubar a ditadura burguesa de Lukashenko, em torno dos operários, cujas ações e greves são a chave para a vitória.

As limitações da política democrático-burguesa

O assassinato em Kiev e as últimas semanas, em geral, evidenciaram mais uma vez a incapacidade das forças burguesas de lutar de forma coerente e eficaz pelas liberdades democráticas e pela independência nacional.

Na Ucrânia, o governo burguês e seu SBU não conseguiram limpar o país dos agentes da FSB e da KGB, não conseguiram evitar um assassinato político na capital, e mostraram que não podem proteger os ativistas. Além disso, o SBU proibiu ao deputado de Vitaly na organização, Rodion Batulin, de entrar na Ucrânia. Batulin saiu da Ucrânia duas semanas antes desses acontecimentos; após o assassinato de Vitaly decidiu regressar urgentemente, mas os guardas da fronteira ucranianos não o permitiram entrar sob a alegação de que ele «representa uma ameaça à segurança nacional».

 

Duas semanas antes do assassinato, não apresentava nenhuma «ameaça». Essa proibição de entrar no país, é claro, está relacionada ao assassinato e com o fato de que Batulin (associado aos voluntários que lutam contra a ocupação em Donbass e, portanto, crítico das autoridades e sua linha de negociação) ser uma testemunha valiosa, que sabe muito, que é mais combativo que o governo contra a ocupação e, por isso, crítico. Uma investigação profunda sobre o assassinato – que se tornou em um fracasso da SBU -, pode abalar os Serviços, a corrupção e a presença de agentes da FSB, que constituem um problema quase oficial. A investigação tem o potencial de conseguir tanta ressonância como o assassinato em si.

Na vizinha Lituânia, onde as pessoas humildes apoiaram fervorosamente a luta dos bielorrussos, o governo também se pronunciou contra o regime de Lukashenko, e em apoio ao povo. O governo lituano chegou a exigir da União Europeia (UE) que suspendesse os empréstimos à ditadura, o que a UE estava fazendo (e por enquanto continua) depois de todos os seus crimes. Hoje, o povo da Lituânia segue apoiando aos bielorrussos na luta contra a ditadura. Mas o governo mudou sua retórica. Agora, basicamente condena o ditador não por reprimir o povo da Belarus, mas por facilitar a migração de refugiados que fogem da guerra e da pobreza dos países asiáticos, principalmente do Iraque, através da Belarus e Lituânia, para a Europa Ocidental, fato esse que Lukashenko começou a usar como ferramenta de chantagem. A proteção dos interesses dos governos das potências da Europa central tornou-se mais importante para o governo lituano que os interesses dos bielorrussos e a solidariedade lituana para com eles.

Quanto à própria Belarus, a figura central dos protestos de 2020 Svetlana Tikhanovskaya, que está no exílio, continua declarando uma estratégia ilusória de um diálogo com a ditadura, se reúne de maneira explícita e, sobretudo simbólica com os líderes ocidentais (que não se preocupam muito como os bielorrussos), colocando todas as suas esperanças neles. Ela exorta aos governos ocidentais que imponham sanções econômicas contra as empresas bielorrussas, ainda que os bielorrussos vejam as sanções contra as empresas de maneira extremamente contraditória (já que afetará aos trabalhadores), inclusive as sanções não são apoiadas pelos sindicatos independentes operários. Os canais liberal-democráticos populares na Belarus fazem eco desta atividade de Tikhanovskaya e das demandas do governo lituano para que Lukashenko “controle” os migrantes.

Neste sentido, na luta contra seus inimigos e pela independência nacional, os bielorrussos e ucranianos não podem confiar nem nos governos ocidentais nem nos políticos liberais burgueses. Devem confiar apenas em sua própria luta e organização, no apoio mútuo com os demais lutadores, e na solidariedade das pessoas comuns em outros países.

Unir as revoluções ucraniana e bielorrussa e pela solidariedade com elas

O assassinato do ativista bielorrusso na Ucrânia é significativo. Neste episódio, se opôs claramente as revoluções da Ucrânia e a da Belarus por um lado, e a contrarrevolução dos regimes de Putin e de Lukashenko sob seu patrocínio, por outro. É de vital importância para a revolução bielorrussa lutar não só contra o regime de Lukashenko, mas também contra o regime de Putin, que apoia a ditadura na Belarus, extradita os bielorrussos que fugiram para a Rússia e os entrega para a Belarus e Lukashenko, e agora, através do regime de Lukashenko aterroriza ainda mais os irmãos ucranianos do norte. A revolução ucraniana deve lutar não só contra o regime de Putin, que ocupa parte do país, mas também contra o regime de Lukashenko, que reprime os irmãos bielorrussos e se converte em um instrumento adicional da agressão de Putin contra a Ucrânia.

Nessa luta, os sucessos de uma revolução inevitavelmente ajudarão à outra. Ao contrário, o fracasso de um deles agravará as condições do outro. Daí a necessidade da unidade da luta das revoluções da Ucrânia e Belarus contra um inimigo comum.

As revoluções na Ucrânia e Belarus, que eclodiram nas fronteiras da Rússia e em sua zona de influência, já desferiram um duro golpe contra seu principal inimigo neste momento: o regime de Putin. Isso representa uma ameaça mortal para este bastião da contrarrevolução internacional. As revoluções da Ucrânia e Bielo-Rússia são irmãs. E ainda não chegaram ao fim. Putin e Lukashenko estão agindo juntos hoje contra elas. E essas revoluções também têm que empalmar uma conexão entre elas, para que seja mais fácil vencer.

Hoje, na Ucrânia, Lituânia, Polônia e muitos outros países, os bielorrussos estão organizando ações e manifestações em apoio à revolução bielorrussa contra a ditadura de Lukashenko. Fazemos um chamado às organizações sindicais, públicas, democráticas, a aderir a essas ações. É necessário demonstrar total solidariedade com as revoluções da Ucrânia e Bielo-Rússia contra os regimes de Putin e de Lukashenko e suas agressões.

Slava Ucraine! (Glória a Ucrânia!)

Zhive Bielarus! (Viva Belarus!)

[1] Organização não-governamental que ajuda opositores ao regime bielorrusso que fugiram para a Ucrânia, ndt;

[2] Jornalista crítico ao governo, sequestrado e preso em 23/05/21, torturado como mostra as imagens em vídeo, com feridas de algemas, acusado de “distúrbios civis”, que pode lhe custar até 15 anos de prisão, ndt;

Tradução: Rosangela Botelho

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