Sobre os Fundos de recuperação da União Europeia
Os fundos de recuperação estão a serviço do IBEX 35[1] e contra a classe trabalhadora e o meio ambiente.
Por: Corriente Roja
O governo de coalizão aprovou recentemente o Real Decreto-Lei que estabelece como serão distribuídos os 140 bilhões de euros de fundos europeus destinados ao Estado espanhol. Esses fundos tramitarão através dos PERTEs [Projetos Estratégicos de Recuperação e Transformação Econômica], acordos de colaboração público-privada. Mais uma vez, bilhões de fundos públicos vão parar nos cofres das aves de rapina do IBEX 35.
São inúmeras as questões sociais para as quais poderiam ser destinados esses fundos: reforçar a Saúde e Educação, fomentar emprego público de qualidade, prevenir despejos e cortes de luz, reforçar os programas de assistência social… No entanto, irão parar nas mãos de empresas como a Endesa (gás natural e energia elétrica), Iberdrola (energia renovável), Inditex (conglomerado têxtil, proprietária da marca da Zara), Repsol (petroleira), El Corte Inglês (lojas de departamento) ou as grandes construtoras. Aqueles que mais levantam a voz contra “as paguitas” [2]e “os subsidiados” para instigar contra as miseráveis ajudas sociais, sempre se esquecem de mencionar essas mamatas de bilhões para corporações que ano após anos têm lucros multimilionários.
O governo de coalizão PSOE – UP mostra mais uma vez sua submissão absoluta aos patrões, e deixa em suas mãos a “reconstrução” do país. Não por acaso, o plano finalmente aprovado é uma cópia do apresentado pela CEOE – Confederação Espanhola de Organizações Empresariais.
Em troca: contrarreformas trabalhistas e previdenciárias e desregulamentação ambiental
Tanto Pedro Sánchez como Pablo Iglesias apresentaram essa injeção de recursos como uma virada social da União Europeia (EU), em contraposição com suas políticas de ajuste anteriores. Ambos anunciaram que os fundos chegariam sem nenhuma imposição de condição. Uma vez mais, o discurso não condiz com os fatos.
O regulamento europeu de distribuição dos fundos estabelece nitidamente que não serão desembolsados até que os Estados realizem as reformas estruturais impostas pela UE. Para o Estado espanhol, em especial, outra reviravolta nas aposentadorias e a reforma trabalhista: rebaixamento das aposentadorias públicas e maior flexibilidade trabalhista.
Nadia Calviño, a ministra da Economia, compareceu à UE para explicar os planos do governo de coalizão, recebendo aplausos entusiásticos das instituições europeias. Com isso, já sabemos para onde caminham as reformas que o governo vai aplicar.
A propaganda governamental dá ênfase especial à publicidade de que esses fundos serviriam para a transição ecológica da economia espanhola. No entanto, o regulamento estabelece justo o contrário. Debilita a já escassa regulamentação ambiental. Concretamente, a Lei de Avaliação Ambiental é reformada, encurtando os prazos de avaliação ambiental e flexibilizando as normas de controle de contaminação e emissões.
Nossa resposta: unidade, luta e mobilização
A dramática situação sanitária e social atual, a crise econômica em curso e as políticas que o governo anunciou previamente com este acordo europeu, apontam para o pior. Se a crise de 2008 foi um duro golpe para a classe trabalhadora, estamos recebendo o segundo ataque, ainda pior que o primeiro.
No entanto, ao contrário daquele momento (em que vivemos grandes mobilizações como as Marchas da Dignidade, as greves gerais ou o Rodeia o Congresso) hoje impera uma resposta fraca e atomizada. Sem dúvida, a pandemia dificulta a mobilização, mas não é a única responsável pela desmobilização.
A esquerda institucional, hoje, faz parte ou está comprometida com o governo, e joga um papel apaziguador. O sindicalismo oficial, CCOO e UGT, também têm colaborado ativamente com o governo e, pela primeira vez, agora em fevereiro eles estão convocando tímidos protestos.
Confiar neles é lutar com as duas mãos amarradas nas costas, a garantia mais segura de derrota. É hora de organizar uma alternativa a essa “esquerda do mal menor” que se nega a lutar “para não fazer o jogo à direita”. O que faz o jogo da direita é uma esquerda que desmoraliza a classe trabalhadora. Essa é a melhor receita para a demagogia do Vox, partido de ultradireita, penetrar em nosso povo!
Nós de Corriente Roja apostamos em reforçar cada greve, mobilização de bairro e protesto estudantil. Mas, além disso, é necessário impingir a cada conflito uma visão ampla e geral. É preciso construir a unidade em uma frente social de luta que unifique sindicatos, associações e movimentos sociais em uma iniciativa que combata as políticas capitalistas do governo PSOE-UP e feche o caminho para a direita.
[1] principal índice de referencia da bolsa espanhola, ndt;
[2] La Paguita, expressão pejorativa para referir-se ao Rendimento Mínimo Vital (IMV, na sigla em espanhol), programa de ajuda social às famílias mais vulneráveis, aprovada pelo governo PSOE/Podemos em maio/2020, endossado pelo FMI, ndt;
Tradução: Rosangela Botelho