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Crise climática e ambiental

A melhor “vacina” contra a próxima pandemia? Proteger os espaços naturais e sua biodiversidade

maio 26, 2020

A irrupção do coronavírus teve um impacto na saúde inédito ao redor de todo o mundo. Até o momento, infectou milhões de pessoas, provocou a morte de centenas de milhares e confinou de maneira simultânea aproximadamente a metade da humanidade. Além disso, deflagrou o segundo capítulo da crise econômica, que parece que será muito pior que o primeiro de 2008. É difícil sequer imaginar a dimensão de morte e sofrimento que trouxe e trará, especialmente para a classe trabalhadora e a população mais pobre, mas a comparação com uma guerra parece ser a mais acertada.

Por: Juan P.
Muitos/as comentaristas declaram que esta situação era “imprevisível”, e que nada poderia ser feito para evitar a aparição e explosão da pandemia. Entretanto, o risco era bem conhecido. A edição de 2020 do Informe de Riscos Globais do Fórum Econômico Mundial apontava os problemas ecológicos como um dos mais ameaçadores, incluindo, com destaque, a mudança climática e a perda da biodiversidade. Por outro lado, inúmeros/as virologistas alertavam sobre a aceleração da aparição de surtos virais que passam de animais para pessoas (Nathan Wolfe escrevia em The New Yorker que “Se tivesse que ir a Las Vegas e apostar pelo próximo grande assassino, colocaria todo meu dinheiro em um vírus”); e inclusive existem vários projetos científicos, como o Global Viral Forecasting Iniciative, que se dedicam a “caçar” esses vírus antes de passarem para a população humana.
A destruição da natureza acelera a aparição de epidemias
Uma zoonose é qualquer doença infecciosa que passe de animais para humanos. Segundo a OMS, cerca de 70% das patologias que nos afetaram durante os últimos 40 anos, procediam de animais selvagens.  Algumas zoonoses recentes foram o SARS, a gripe suína ou o MERS. Há outras conhecidas, como a raiva, o ebola, a tuberculose ou a peste. Longe de teorias conspiratórias, ainda que não conheçamos todos os detalhes, é garantido que a COVID-19 é uma nova zoonose.
A aparição deste tipo de epidemias acompanhou a humanidade desde sua própria origem. No entanto, agora existe uma tendência evidente para sua aparição cada vez mais frequente e devastadora. A pré-condição para que uma doença de animais selvagens passe para as pessoas é que haja um contato estreito entre ele/as, coisa que fazemos ao invadir e destruir os ecossistemas. A atividade humana alterou 75% da superfície terrestre do planeta, provocando um nítido aumento das zoonoses à medida que os espaços naturais foram sendo arrasados. A globalização econômica e social fez o resto, espalhando a nova doença a uma velocidade inusitada para todo o planeta.
As principais causas dessa transformação são a expansão da atividade pecuária e agrícola (segundo o IPBES, entre os anos 1980 e 2000, uma superfície tropical equivalente à França e Alemanha foi transformada em cultivos), a caça para consumo local ou comércio (o pangolim, possível origem do COVID, é intensamente consumido), o tráfico de espécies (que é o 4º maior mercado ilegal) e outras atividades extrativas, como a exploração madeireira ou a mineração.
Tudo isto torna a aparição de zoonose bastante previsível.   Ocorrerá com maior frequência onde a mudança no uso do solo e a perda de biodiversidade for mais pronunciada.
A mudança climática e a contaminação atmosférica são potenciador
Outros fatores favorecem que os efeitos da pandemia sejam ainda mais letais. A Universidade de Harvard estabeleceu uma nítida correlação entre a mortalidade do COVID 19 e a contaminação atmosférica. Ainda que para sermos justos/as com o vírus, a contaminação atmosférica já matasse de maneira massiva antes dele aparecer. No Estado Espanhol estima-se 10.000 mortes prematuras anuais produzidas pela contaminação.
Por outro lado, a mudança climática favorece a aparição de zoonoses, ao aumentar a dimensão dos ambientes quentes, que são preferidos em geral por vírus e bactérias, assim como ao favorecer a expansão de “animais vetores” (como os mosquitos) de doenças até agora circunscritas às zonas tropicais. De novo, para sermos justos/as com o vírus, não podemos deixar de assinalar que, em palavras literais do próprio secretario geral da ONU, a mudança climática será “muito mais devastadora” que o COVID 19.
O vírus deu um descanso à natureza?
O impacto do vírus na economia produziu uma redução acentuada das emissões contaminantes em geral, e de gases de efeito estufa (GEE) em particular, especialmente os procedentes do transporte. De repente, numerosas cidades podiam contemplar um horizonte límpido, que normalmente estaria oculto pela contaminação. O confinamento geral também provocou que, durante algumas semanas, a pressão humana sobre espaços naturais diminuísse.
Entretanto, não há razões para comemorar. A redução de emissões está muito longe de ter um impacto positivo significativo na concentração atmosférica de GEEs. E o que deixou de ser emitido se recuperará rapidamente à medida que a economia for sendo reativada. Nenhum vírus solucionará a degradação ecológica. Para isso são necessárias medidas políticas, econômicas e sociais anticapitalistas.
Como “vacinar” contra a próxima pandemia?
A melhor “vacina” frente às pandemias é minimizar o risco de que apareçam. Nunca existirá o risco zero, mas o capitalismo é um sistema que maximiza todos os fatores que as favorecem.  O coronavírus é mais uma expressão das consequências da depredação selvagem da natureza. Outros efeitos já estão ocorrendo ou virão no futuro, de maneira gradual ou explosiva, produto da mudança climática, a perda da biodiversidade, a destruição de espaços naturais, etc…
Embora geralmente se pense que o capitalismo é a ordem social definitiva, “o fim da história”, é um sistema insustentável; isto é, está condenado ao colapso em seu formato atual, mais cedo que pensamos. Este pequeno vírus mostrou sua vulnerabilidade. O que ocorrerá quando os impactos globais da mudança climática, infinitamente mais graves e permanentes, cheguem ao extremo?
Seguramente, não parece boa ideia ficarmos sentados observando o desmoronamento, já que os destroços cairão sobre a classe trabalhadora e os povos. A burguesia demonstrou amplamente que lhe é indiferente arrasar o planeta em sua busca de acumular mais e mais lucros. Esse e não outro é o pilar fundamental do capitalismo. Ele confiam que sempre poderão comprar os lugares mais seguros.
Para garantir nossas vidas e a saúde do meio ambiente é necessário agir já. É necessário restringir a economia dentro dos limites da sustentabilidade, o que inclui reservar e ampliar os espaços naturais, proteger a biodiversidade e reduzir drasticamente as emissões poluentes (pela metade em 10 anos e a zero em 20 anos, segundo objetivos da ONU). Além disso, para que isto seja socialmente viável, deve ser feita com justiça social, o que implica uma redistribuição igual e radical da riqueza.
Às vezes nos dizem que somos “utópicos” por defender a necessidade de uma Revolução das/os trabalhadoras/es, mas o que é utópico é pensar que estes objetivos possam ser alcançados sob o capitalismo. Só o socialismo, com uma economia planificada democraticamente para as necessidades sociais e a sustentabilidade ecológica, pode conseguir a transformação que precisamos.
Tradução: Lilian Enck

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