search
Irã

Revolução iraniana: A luta pelo poder após a revolução

fevereiro 26, 2019

Reproduzimos este artigo, publicado originalmente em 2019, por ocasião da onda de protestos que abala o Irã. Reunimos este e outros textos de interesse em um especial sobre esse tema tão candente e importante para a luta de classes mundial

Após a derrubada do regime do Xá, o Ayatollah Khomeini e sua aliança com o Ulama (clero xiita), os bazaaris (tradicional burguesia e pequena burguesia comercial) e a burguesia liberal despontam como os favoritos para assumir o poder. Há dois obstáculos nesse caminho. O primeiro é que essa aliança abarca diferentes projetos. O segundo é que por fora dessa aliança as classes sociais subalternas, animadas pela esquerda, esperavam que as bandeiras da revolução, em particular liberdades democráticas amplas e igualdade social, fossem atendidas.

Por: Fábio Bosco

O Ayatollah Khomeini defendia uma teocracia baseada no conceito de Velayat-e Faqih (Guardião da Jurisprudência) na qual o poder final é do Supremo Líder, necessariamente um religioso com sólidos conhecimentos da jurisprudência islâmica.

A burguesia liberal liderada pelo primeiro-ministro do governo provisório Mehdi Bazargan defendia uma constituição ocidental inspirada na V República francesa de Charles DeGaulle, mas com um linguajar religioso. De conteúdo uma democracia burguesa, mas de forma uma democracia islâmica. Ela tinha o apoio de parte importante do Ulama como os populares Ayatollahs Talekani e Shariatmadari.

Correndo por fora da aliança estavam as forças de esquerda que defendiam de conteúdo uma república popular com formulações diversas. E também representantes das nacionalidades oprimidas (azerbaijanos, turcomenos, curdos, balochis e árabes) que defendiam autonomia para suas províncias.

A extensão e profundidade da revolução operária e popular era tamanha que qualquer alternativa, por mais forte que fosse, poderia ser derrubada em questão de dias. No entanto, o fator decisivo é que tanto as forças burguesas liberais como as organizações de esquerda capitularam à liderança de Khomeini.

A marcha ao poder

Nos últimos dias da revolução, Khomeini nomeou Mehdi Bazargan como primeiro-ministro provisório para evitar o desmantelamento ainda maior do Estado. Ao mesmo tempo foi constituindo um poder paralelo e eliminando dissidentes. À honrosa exceção da pequena organização trotskysta HKS, todas as forças políticas, sejam burguesas ou de esquerda, apoiaram a nomeação.

A década de comando de Khomeini foi marcada pelo crescente poder de seus seguidores e pela eliminação, frequentemente pela violência e apesar da resistência, e pela crescente aplicação de controle ideológico e de costumes sobre a população.”[i]

Khomeini implantou em Teerã um conselho revolucionário e um Komiteh central. O primeiro supervisionava o governo provisório. O último colocou sob suas asas os Komitehs locais e seus pasdars (guardas) que floresciam nas muitas mesquitas espalhadas em todo o país. Ele também expurgou dessas unidades os clérigos associados com outros líderes religiosos – especialmente Shariatmadari. Imediatamente após a queda do Xá, Khomeini estabeleceu em Teerã um Tribunal Revolucionário para cuidar de todas as cortes ad hoc que surgiram em todo o país. E em Qom um escritório central das mesquitas cuja tarefa era indicar os imãs jumehs para as capitais provinciais. Pela primeira vez, uma instituição religiosa central tomou o controle sobre os imãs jumehs provinciais.”[ii]

Entre os primeiros setores revolucionários a terem seus direitos desrespeitados foram as mulheres. A participação das mulheres na revolução, seja nas guerrilhas dos anos 1971-1976 seja nas mobilizações de rua e greves de 1978-1979, foi marcante. Em muitas marchas, as mulheres iam à frente para desmoralizar as forças de repressão do Xá. Isso não impediu o “poder” paralelo do Ayatollah Khomeini de tornar compulsório o uso do hijab (véu) nos primeiros dias pós- revolução. A reação veio através de uma manifestação de 8 de março em Teerã com a participação de cem mil mulheres. Mesmo assim, a ação cotidiana das forças, inclusive as milícias ligadas à Khomeini, acabou prevalecendo sobre o direito das mulheres. Neste caso houve mais um erro das forças de esquerda que não jogaram seu peso para defender o direito democrático das mulheres, facilitando a ofensiva de Khomeini. Posteriormente, novos ataques contra os direitos das mulheres serão consolidados com a nova Constituição.

A disputa nos shoras, conselhos operários

Outro setor revolucionário estratégico eram os trabalhadores organizados em shoras.

Os shoras, ou conselhos de fábrica, eram uma forma particular de organização dos trabalhadores que surgiu na indústria iraniana em seguida à queda da ditadura do Xá em 1979. Eles eram organizações de base cujo comitê executivo eleito representava todos os empregados de uma fábrica incluindo os administrativos independentemente de sua função, qualificação ou gênero.

Seu principal objetivo era conquistar o controle operário. Este objetivo ofensivo dos shoras por controle é o que os diferencia de delegados sindicais e também do sindicalismo que luta uma batalha política para mudar a estrutura social através de ações na produção. Os shoras não tinham um objetivo político claro. Diferente dos comitês de fábrica da revolução russa de 1917, os shoras não foram influenciados por tendências políticas de esquerda externas e não atuaram como um meio para mudança social. Eles se restringiam a exigir controle operário e a transformação das relações de poder na arena da produção.”[iii]

De fevereiro até agosto de 1979, os shoras proliferaram. Na maioria das fábricas, os patrões ou os gerentes fugiram deixando o caminho livre para os trabalhadores que desenvolveram um forte sentimento de posse da fábrica como parte da riqueza da população. Neste período o governo foi obrigado a nacionalizar 483 unidades de produção. As várias greves giravam em torno a salário e emprego mas havia também reivindicações políticas como punição para agentes da SAVAK e capitalistas, e exigências de demissão de gerentes. À exceção da rede de shoras da província de Gilan (junto ao mar Cáspio) e dos petroleiros, a luta se dava por fábrica.

Em março, a resistência dos petroleiros em manter a greve por suas reivindicações forçou Khomeini a recorrer a ameaças através da imprensa:

Qualquer desobediência ou sabotagem na implementação dos planos do governo provisório será vista como oposição contra a genuína revolução islâmica. Os provocadores e agentes serão apresentados ao povo como elementos contra-revolucionários de forma a que a nação decida sobre eles, da mesma forma que fez com a contra-revolução do Xá.” (jornal Ettelaat, 15/03/1979).

Após esta ameaça, o governo conseguiu que grevistas retomassem o trabalho em pelo menos 118 fábricas.

Durante este período (fevereiro a agosto de 1979), os trabalhadores controlavam as fábricas. O governo Bazargan expressou logo expressou oposição direta aos shoras, dizendo que o triunfo da revolução eliminou suas tarefas. Até o fim deste período, Bazargan reintroduziu o sistema de um gerente nomeando gerentes profissionais liberais. Este período termina com a primeira extensiva onda de repressão em agosto de 1979 vinda principalmente do clero dirigente. Organizações de esquerda foram atacadas e suas sedes saqueadas. O governo baniu jornais progressistas, monopolizou a mídia oficial e lançou extensivos ataques militares no Curdistão. Estes eventos foram seguidos de crescentes ataques contra o movimento sindical e pela exclusão de shoras e trabalhadores dissidentes.

A liquidação dos shoras independentes foi acelerada após a segunda onda de supressão simultânea ao fechamento de universidades. Entre os shoras fechados estão: Fábrica de Produção de Ferramentas, Left-Track, Pompiran e Kompidro em Tabriz; União dos Shoras de Trabalhadores de Gilan (representando 300 mil trabalhadores); União dos Shoras de Trabalhadores de Teerã Oeste; todos os shoras de petroleiros em Ahwaz e de Ferroviários. A Khane-i Kargar (Casa Sindical), anteriormente uma sede para assembléias operárias, se tornou um centro dos shoras ligadas ao Partido Republicano Islâmico e Associações Islâmicas.”[iv]

Em meados de 1982 os shoras foram formalmente proibidos.

Sobre o papel das forças de esquerda quanto aos shoras, Asef Bayat escreve:

Havia uma tendência entre a maioria dos grupos de esquerda a desprezar os shoras como uma atividade espontânea da classe trabalhadora, ainda que seu surgimento tenha maravilhado a esquerda porque criava um terreno para justificar a relevância e retórica da esquerda. Para esses grupos, teoricamente, o conceito de shora dificilmente ia além de citações a-históricas de Lenin para quem o papel político de tais organizações, para enfrentar o Estado burguês, era da mais alta relevância. A esquerda tradicional via os shoras em termos de seu papel de oposição vis-a-vis os empregadores ou o governo, um papel que qualquer organização radical dos trabalhadores, incluindo sindicatos, poderia cumprir sob determinadas circunstâncias. Pouca atenção foi dada ao mais significativo e distinto caráter da shora como uma organização para controle operário que busca questionar a divisão de trabalho na produção (a divisão entre gerenciamento e execução). Os grupos de esquerda definiam o sucesso ou fracasso dos shoras pela sua militância e os classificavam em três tipos: shoras amarelos liderados por trabalhadores pro-Khomeini ou islâmicos fanáticos; shoras genuínos eleitos diretamente pelos trabalhadores que poderia ou não servir aos interesses dos trabalhadores de base (se não o fizessem eram vistos como ignorantes); e por final os shoras revolucionários cujos membros eram simpatizantes das organizações de esquerda. A tendência política dos integrantes de um shora se transformou então no critério para seu sucesso ou fracasso. Sua extensão e profundidade, áreas e em que condições exercia controle se tornaram irrelevantes. Além de tudo tal visão era incapaz de explicar o antagonismo entre os shoras amarelos e os gerentes liberais.”[v]

Mais uma vez, a maioria das organizações de esquerda fracassou em colocar seus melhores esforços para disputar os shoras.

O conflito sobre a nova Constituição e a tomada da Embaixada

O debate sobre a nova constituição foi antecedido por um plebiscito sobre monarquia ou República Islâmica. O primeiro-ministro Bazargan queria introduzir uma terceira opção: República Islâmica Democrática, mas o Ayatollah Khomeini não permitiu. Frente a isso, uma ala mais radical da burguesia liberal (Frente Democrática Nacional liderada pelo neto de Mossadeq – Hedayatollah Matin-Daftari), os fedayins e o Partido Democrático do Curdistão boicotaram o plebiscito. Mesmo assim no dia 1 de abril, 20 dos 21 milhões aptos a votar participaram e 99% votou pela república islâmica.

Em seguida foram convocadas eleições de um conselho de especialistas para agosto. Parte da burguesia liberal (a velha Frente Nacional e a Frente Democrática Nacional) e vários grupos de esquerda e das nacionalidades oprimidas boicotaram as eleições. O partido de Khomeini, o Partido Republicano Islâmico venceu as eleições e de quebra não permitiu que o líder do Partido Democrático do Curdistão Iraniano – Abdol Rahman Qasemlu fosse empossado.

O conselho de especialistas eleito escreveu uma constituição muito mais favorável ao clero e potencialmente autoritária que a primeira versão (elaborada pelo governo provisório). Ela incluiu o conceito de Velayat-e Faqih que outorga poderes inimagináveis para Khomeini. O artigo 4 diz que o faqih tem autoridade divina para governar e responde apenas a Deus. Outros artigos listam seus poderes que incluem o controle do exército e do Pasdaran (milícias criadas por Khomeini em março de 1979 a partir das milícias formadas pelo Komitehs regionais), o direito de vetar candidatos à presidência e a demitir o presidente se a alta corte ou o majles (parlamento)  o declararem incompetente. O poder do Majles (parlamento) é limitado pelo Conselho de Guardiães que pode vetar qualquer legislação se julgar esta incompatível com o Islã ou com a constituição. O Conselho de Guardiães tem 12 integrantes, seis ulama indicados pelo Faqih e outros seis selecionados pelo Majles a partir de uma lista preparada pelo consleho judicial supremo cuja maioria de membros eram indicados pelo Faqih. Baseado em sua interpretação da sharia (lei islâmica) o conselho judicial supremo prepara as leis sobre todos os temas judiciais e elege, demite, promove e descomissiona todos os juízes. Khomeini foi eleito Faqih perpétuo.”[vi]

Foram mantidos os Majles e o presidente eleitos por voto popular e inseridos genericamente vários direitos sociais como o direito à educação primária e secundária gratuitas, saúde, moradia digna, aposentadoria, auxílio-desemprego, combate à pobreza, liberdade de expressão, imprensa, organização, manifestação, religião, direito de não ser vigiado, contra prisão arbitrária direito de ser levado ante um juiz em até 24h.

Sob pressão de manifestações convocadas pelos Mujahedins e Fedayins em frente ao local onde se reunia a Assembléia de Especialistas, foram incluídos na constituição conselhos regionais e locais para auxiliar governadores e prefeitos na administração denominados shoras.

A mudança completa da primeira versão feita por Bazargan trouxe consternação não apenas entre grupos laicos mas também com o governo provisório e Shariatmadari que sempre manteve fortes reservas sobre o conceito de Velayat –e Faqih feito por Khomeini. Bazargan e sete membros do governo provisório enviaram uma petição à Khomeini pedindo que ele dissolvesse a Assembléia de Especialistas pois a constituição proposta violava a soberania popular e colocava em risco a nação devido ao clericalismo, transformava o Ulama em uma ‘classe dominante’ e minava a religião pois as futuras gerações colocariam a culpa de todos os problemas no Islã. Reclamando que as ações da Assembléia dos Especialistas constituíam “uma revolução contra a revolução” eles ameaçavam ir a público com sua versão original de constituição. É totalmente possível que se o país pudesse escolher, a versão de Bazargan seria a escolhida.”[vii]

Reféns da embaixada norte-americana

Em meio a esta crise, o governo Carter aceita o ingresso do Xá Reza Pahlevi nos Estados Unidos para tratamento médico. No dia 4 de novembro, um grupo de 400 estudantes invade a embaixada americana. Eles alegam que, a exemplo de 1953, os Estados Unidos preparavam um golpe para tornar o Xá novamente o soberano do país. Na busca de retomar relações diplomáticas regulares com os Estados Unidos, o governo provisório exigiu a retirada imediata dos estudantes. Mas Khomeini apoiou os estudantes e aproveitou para desprestigiar Bazargan e o governo provisório publicando memorandos da embaixada que continham negociações entre o governo provisório e os americanos (é claro que os memorandos com negociações entre o Ulama e os americanos não foram divulgados).

A maioria da esquerda apoiou Khomeini nesta empreitada. Bazargan renunciou ao governo provisório e Khomeini, em meio a um sentimento generalizado de unidade nacional, convocou um referendo sobre a proposta de constituição para dias 2 e 3 de dezembro de 1979. A Frente Nacional, os mujahedins fedayins, e várias organizações curdas e azerbaijanas boicotaram o referendo. Somente 16 milhões votaram, uma redução de 17% em relação à votação anterior. A abstenção foi particularmente grande nas províncias das nacionalidades oprimidas.

A luta das nacionalidades oprimidas

A reação contra a nova constituição, antes e após o referendo, foi particularmente grande no Azerbaijão. O Ayatollah Shariatmadari emitiu uma fatwa contra a constituição e o Partido Republicano Popular Islâmico (MPRP) liderou um levante em Tabriz com a tomada do centro de rádio e TV. Khomeini prometeu mais autonomia para a província e enviou as milícias Pasdaran que ocuparam as sedes do MPRP, executaram alguns participantes dos protestos e dissolveram o partido.

O mesmo tipo de tratamento será dado para as demais nacionalidades oprimidas como os árabes, os balochis, os turcomenos e, particularmente, os curdos que estavam em rebelião desde abril de 1979 e cuja província é invadida pelo Pasdaran em 1982. Todas as áreas são retomadas e o partido democrático curdo tem que se refugiar no Iraque em 1984.

A ascensão e queda de Bani-Sadr

Em janeiro são realizadas as eleições presidenciais que são vencidas por Bani Sadr com 10,7 milhões de votos. Em segundo lugar ficou o Almirante Madani da Frente Nacional. Em terceiro o candidato do Partido Republicano Islâmico do Ayatollah Khomeini que fora apoiado também pelo Tudeh (partido comunista).

Em abril de 1980, o Conselho Revolucionário Islâmico, a pedido de Khomeini, dá um ultimato para todas as organizações de esquerda deixarem as universidades. Suas milícias invadem as universidades e expulsam ou executam os estudantes de esquerda. Bani Sadr anunciou o início de uma revolução cultural fortalecendo a repressão sobre os estudantes.

No mesmo mês, o governo americano faz uma tentativa fracassada de resgatar os reféns mantidos dentro da embaixada americana, o que fortalece mais uma vez Khomeini e seus aliados.

Em junho e julho ocorrem expurgos e execuções de oficiais das forças armadas e funcionários públicos. A milícia Hezbollah, também aliada de Khomeini, ataca a sede do partido Frente Nacional e fecha seu jornal.

Em 22 de setembro de 1980, o governo iraquiano liderado por Sadam Hussein invade o Irã sob alegação de intervenção iraniana em seus assuntos internos. Na verdade, Sadam Hussein nunca aceitou as fronteiras estabelecidas no estratégico Rio Shatt El-Arab em 1975 e ainda apostava que a população do Cuzistão, rica em petróleo e em sua maioria árabes, iria apoiá-lo, o que não aconteceu. Ao contrário, Khomeini aproveitou a guerra para explorar o sentimento de unidade nacional e eliminar todas as dissidências restantes.

Neste momento o mais importante era se livrar do popular presidente eleito Bani-Sadr. Bani-Sadr era crítico de uma série de políticas de Khomeini e seus aliados, tais como:

  1. O acordo com os Estados Unidos sobre os reféns na embaixada americana, que foi muito favorável aos americanos (mas que abriu as portas para a venda clandestina de armas americanas para o Irã durante a guerra contra o Iraque);
  2. O apoio ao Hezbollah quando este invadiu um ato na qual Bani-Sadr era orador.
  3. O apoio ao primeiro-ministro Rajai acusado por Bani-Sadr de violações de direitos humanos, tortura e censura.

Finalmente, em 21 de julho o parlamento vota seu impeachment que é confirmado por Khomeini no dia seguinte. No dia 28 de julho Bani-Sadr foge para a França em um vôo clandestino da própria força aérea iraniana, ajudado pelos Mojahedins.

A eliminação das forças de esquerda

Os Mujahedins se lançaram à luta armada contra o regime. Desde 1979 os Mujahedins são alvos de ataques de apoiadores de Khomeini que os chamavam de hipócritas. O Hezbollah já havia atacado e fechado sua sede ainda em 1979. Em um ato contra o impeachment de Bani-Sadr em junho de 1981, o Hezbollah assassinou militantes mujahedins presentes.

Sua ação militar mais importante foi a explosão de uma bomba no local de uma conferência do Partido Republicano Islâmico que matou mais de 70 pessoas entre as quais o Ayatollah Behesti, quatro ministros e 25 deputados. Em outras operações morreram o presidente Rajai, o primeiro-ministro Bahonar e o chefe da polícia. Mas o levante popular esperado pelos Mujahedins não ocorreu e milhares de seus militantes foram executados.

Nos 28 meses entre fevereiro de 1979 e junho de 1980, as cortes revolucionárias executaram 497 oponentes políticos como ‘contra-revolucionários’ e ‘cultivadores da corrupção sobre a Terra’.”[viii] A maioria destes eram apoiadores do velho regime.

Nos próximos quatro anos de junho de 1981 a junho de 1985 as cortes revolucionárias executaram mais de oito mil oponentes. Embora seu alvo fosse principalmente os Mujahedins, eles também perseguiram outros e até mesmo quem se opunha aos Mujahedin. As vítimas incluem os Fedayins e curdos bem como o Tudeh, a Frente Nacional, e apoiadores de Shariatmadari. Muitos, incluindo Shariatmadari, apoiadores de Bazargan e líderes do Tudeh, foram obrigados a aparecer na televisão e revisar suas opiniões. Então os números de execuções daqueles que participaram na revolução são muito maiores que entre os apoiadores do Xá.”[ix]

“Finalmente um último derramamento de sangue em 1988, imediatamente após Khomeini aceitar o cessar-fogo mediado pela ONU e terminar com a guerra. (…) Em quatro semanas, cortes especiais instaladas nas principais prisões enforcaram mais de 2.800 prisioneiros. A Anistia Internacional os descreveu como ‘prisioneiros de consciência. Ex-Mujahedins foram executados por suspeita de nutrir simpatias secretas pela organização. Esquerdistas foram executados por ‘apostasia’, por virar as costas a Deus, ao Profeta, ao Alcorão e à república islâmica.”[x]

Os ventos de uma nova revolução

As principais condições que levaram à poderosa revolução operária e popular de 1979 não foram resolvidas.

A repressão e a falta de liberdades democráticas continuaram, e a desigualdade social aumentou particularmente após uma série de privatizações.

Vários protestos ocorreram desde então.

Em julho de 1979 houve seis dias de protestos estudantis por liberdades democráticas violentamente reprimidos.

Em junho de 2009, ocorreram os maiores protestos dentro do Irã desde a revolução de 1979. Os manifestantes protestavam contra a fraude eleitoral. As manifestações continuaram até 2010. Este movimento foi denominado de “revolução verde”.

Em fevereiro 2011 começaram novos protestos nas cidades de Teerã, Shiraz, Isfahan, Mashhad e Kermanshah (Curdistão). Em abril houve protestos em Ahwas, uma região de maioria árabe com uma grande produção de petróleo.

Em dezembro de 2017 protestos começaram em Mashhad por questões econômicas. Nos dias seguintes houve protestos em várias cidades e o movimento passou a combinar reivindicações por liberdades democráticas e por melhores condições de vida.

A relação com o imperialismo norte-americano tem seus momentos de colaboração como a devolução dos reféns na embaixada, a compra de armas durante a guerra contra o Iraque, o apoio ao governo títere no Afeganistão e no Iraque e o acordo nuclear. Mas tem seus momentos de tensão como as sanções econômicas em 1979, 1987, 2006 e agora em 2018 sob o governo Trump.

O fato é que somente a classe trabalhadora e os setores oprimidos têm o interesse em arrancar liberdades democráticas, um nível de vida digno e de ter uma posição anti-imperialista coerente.

A grande debilidade é a ausência de uma organização revolucionária que terá de ser forjada no calor das lutas que virão.

Leia o primeiro artigo da série: https://litci.org/pt/mundo/oriente-medio-mundo/ira/aqui-e-a-voz-de-teera-a-voz-do-verdadeiro-ira-a-voz-da-revolucao/

[i] Keddie, Nikki, “Modern Iran – Roots and Results of Revolution”, Yale University, 2003

[ii] Abrahamian, Ervand, “History of Modern Iran”, Cambridge University Press, 2008

[iii] Bayat, Asef, “Workers and Revolution in Iran: A Third World Experience of Workers’ Control”, Zed Books, 1987

[iv] dem

[v] Idem

[vi] Keddie, Nikki, “Modern Iran – Roots and Results of Revolution”, Yale University, 2003

[vii] Abrahamian, Ervand, “History of Modern Iran”, Cambridge University Press, 2008

[viii] idem

[ix] idem

[x] idem

Leia também