Medidas de austeridade na Grécia: oito anos que não deixam outra saída além da luta operária
Finalizado o processo de “resgate” na Grécia, oito anos depois a suspensão da dívida e a nacionalização do sistema financeiro ainda estão pendentes. É necessário fazer uma análise para entender o que está acontecendo na Grécia e por que está acontecendo dessa forma; entender para onde o país helênico está indo e tirar conclusões a partir de um balanço. A verdade é que nossos vizinhos permanecem na sombra enquanto a maior parte da esquerda olha para o outro lado.
Por: Corriente Roja
O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, disse que o país sairá do regime de medidas de austeridade no segundo semestre de 2018, depois de oito anos de duros cortes e ajustes econômicos, que parecem se transformar em sua aclamada normalidade e estabilidade sob o nome de “recuperação econômica”.
O novo conjunto de medidas de austeridade (o terceiro, votado pelos parlamentares do Syriza e ANEL, após o acordo de agosto de 2015 e os pré-requisitos de maio de 2016) sacrifica no altar do superávit fiscal qualquer aumento que pudesse existir no PIB. A redução do PIB em 0,5% no primeiro trimestre de 2017 já atinha acabado com as projeções otimistas de redução do desemprego que foram incorporadas ao orçamento deste ano. Não é por acaso que o crescimento projetado para o PIB de 2017 no médio prazo esteja limitado a 1,8%, bem abaixo dos 2,7% previstos no orçamento estatal. Resta ainda um quarto pacote, que inclui medidas que foram qualificadas no objetivo orçamentário de médio prazo do Programa 2018-2021, sem dúvida destrutivo para os trabalhadores gregos.
Para explicar um presente ao qual não está se dando a devida atenção é importante mencionar que em 2016, o Syriza se reuniu com o Conselho de Ministros para preparar a cúpula extraordinária da UE prevista para uma reunião na qual apresentaria, previsivelmente, uma nova oferta de reformas para os credores internacionais.
Jogava-se um jogo muito importante: qual seria a relação da Grécia e o governo do Syriza com a União Europeia e a Troika; foi dito em tantas ocasiões naqueles últimos meses que estávamos diante do “encontro mais decisivo” que soava como exagero da mídia. Mas isso foi verdade. No âmbito institucional, era naquele momento ou nunca. Estava em jogo continuar servindo ou não aos interesses do imperialismo.
Nós sempre insistimos que se o governo de Tsipras estivesse realmente buscando mudar a situação do país teria que ter se apoiado na luta e na mobilização do povo grego para parar de pagar a dívida e deixar a União Europeia, dentro da qual não há saída para a classe trabalhadora nem margem político-econômico-social para defender e cumprir um programa de emergência social que realmente resolva as necessidades (que se convertem em reivindicações) da classe trabalhadora, como reverter a exploração, a injustiça, a miséria e a pobreza.
Dependia daquele dia que a Grécia permanecesse uma colônia econômica de bancos europeus e globais, já que se a Grécia rompesse (com a UE) poderia desencadear uma onda de manifestações em outros países ao verem que é possível, porque o povo grego depositou nas urnas o voto em Syriza para romper com o bipartidarismo, mas também contra o BCE, o FMI e a CEE, o que tem sido a Troika. Um voto de ilusão, mas também de exigência, pelo qual o governo Tsipras teria que responder às expectativas que criou no povo (porque sem o povo, o Syriza não teria vencido as últimas eleições gerais gregas) e cumprir seu programa, sem hesitar ou girar à direita como fez o Podemos.
Se não há exigência no momento, então não se pode ter a mesma legitimidade para denunciar as medidas e reformas de Tsipras, que cumpriu tudo o que foi exigido pela Europa sem reclamar. Varoufakis saiu na hora certa, mas sua proposta de “plano B” não deixa de ser uma proposta “light” de democratização das instituições da União Europeia, evidentemente sem renunciar a sua instituição.
Setores como os Anticapitalistas depositaram sua confiança no Syriza sem ressalvas: insinuavam fazer a experiência com esse jovem e novo governo, estimulando um “voto de confiança”.
Nós, ao contrário, queremos lutar e mobilizar sempre, e independentemente. Por mais “de esquerda” que pareça esse governo, queremos denunciar suas lamentáveis ações de repressão e cortes nas liberdades democráticas, bem como a supressão de direitos conquistados.
Assim, nos defrontamos com uma esquerda perdida, como na Nicarágua, incapaz de ver o óbvio e apoiando e justificando até o limite as violentas intervenções policiais da ditadura de Ortega contra os trabalhadores.
Por um tempo, a maior parte da esquerda europeia (Podemos, Izquierda Unida, Bloco de Esquerda, Front de Gauche ou Die Linke) apresentou Tsipras e o Syriza como os grandes heróis da esquerda e modelo a ser seguido diante de uma socialdemocracia entregue ao neoliberalismo e em queda livre. Atualmente, sabemos que Tsipras aprovou as novas demandas criminosas da Troika, entre as quais estão: um novo corte nas aposentadorias públicas, uma nova reforma tributária, novos cortes nos benefícios sociais, a deterioração dos direitos trabalhistas, a venda forçada do patrimônio público para o capital estrangeiro, transferência das dívidas dos bancos gregos (100 bilhões) para “fundos abutres” estrangeiros… Quem aprovou isso foi Tsipras, o assassino dos capitalistas europeus que Pablo Iglesias tentou nos convencer (sem nunca repudiar) que era a esperança para os povos.
Neste contexto, é preciso contrapor a soberania da Grécia frente à submissão à Troika e às políticas de austeridade, que na verdade resultam do fato de que todo o dinheiro do país é usado para pagar a dívida, o que implica em cortes, privatizações, demissões, achatamento dos salários etc. Só assim se pode explicar a conjuntura atual, a situação político-econômica da Grécia depois de ceder aos interesses de Merkel e companhia, depois de não se manter firme.
Ou seja, que não há absolutamente nada para as reivindicações realmente importantes, como as questões de habitação, emprego, mulheres, saúde, educação, aposentadoria…
Em geral, são necessárias medidas profundas que realmente atendam às necessidades do povo e, na atual situação político-econômica da Grécia, isso é impossível.
Quando você tem uma dívida, o normal é que a quantia a pagar diminua com a passagem dos meses. Neste caso, é exatamente o contrário: os meses passam e as colônias econômicas da UE (Estado espanhol, Grécia, Portugal, Chipre, Itália) devem cada vez mais à Troika, devido às altas taxas de juros, e isso é pago com cortes em educação, saúde, habitação, reforma trabalhista… No final, há uma dívida eterna, impagável, a tal ponto que “os gregos têm uma dívida que é quase o triplo do valor do seu PIB e que os obrigará a operar um ‘milagre econômico’ para pagá-la antes de 2060”, como um artigo no jornal digital Infolibre comenta.
Isto obviamente trouxe consequências devastadoras e uma crise político-econômica e social muito preocupante. Para piorar a situação, há meio milhão de jovens gregos emigrando para o exterior, o que implica em um grave impacto sobre a economia grega. Assim, em 4 de fevereiro de 2016, a Grécia passou pela terceira greve geral durante o governo de Tsipras, apenas um ano após sua posse. Tiveram grande repercussão os protestos dos incansáveis aposentados.
E isso está acontecendo no Estado espanhol, em Chipre, em Portugal, na Itália e esperemos que nunca mais na Grécia. É como Begoña Ramírez diz na Infolibre: “a política de austeridade para a Grécia deixa um país empobrecido que continuará preso a uma dívida ciclópica por décadas“. De fato, muitos dos planos discutidos começam a ser aplicados a partir de 2019.
Partindo do fato de a UE ser uma prisão de povos e uma máquina de exploração de trabalhadores, o governo grego não pode ser um mero gestor social dos cortes e da miséria. O Syriza não pretendia ser a mudança, mas o substituto do governo anterior, pois já estamos vendo tudo o que supõe o neo-reformismo, que se declara “nem de esquerda nem de direita” e que pensa que a situação pode ser revertida a partir das instituições.
É por isso que sempre insistimos tanto na questão do não pagamento da dívida e do rompimento com a UE, e para isso não basta apenas se posicionar publicamente e levantar a bandeira da insubordinação. Queremos ações, não palavras; queremos algo que se apoie na luta para avançar.
Tsipras disse em todos os momentos que seu mandato é para negociar e não para romper, e que a renegociação da dívida é necessária para sair da crise. Ao Sr. Tsipras é preciso dizer que a dívida não se negocia nem se reestrutura: a dívida é ilegítima e NÃO SE PAGA. O povo (com grandes greves gerais nas costas) passou por cima desse governo, assim como das direções dos velhos aparatos, porque as mobilizações na Grécia têm um ritmo acelerado e agora o governo está muito mais à direita que o povo.
As coisas não se resolvem em escritórios, se resolvem nas ruas, que é o nosso terreno, o terreno dos revolucionários. O que é necessário agora mais do que nunca é levantar um plano alternativo a partir da mobilização, forjado nas lutas, com um programa internacionalista e de classe, de desenvolvimento social que inclua a ruptura com a União Europeia e o euro e a suspensão pagamento da dívida.
Agora, mais do que nunca, é necessária a ruptura, não a “democratização” de suas instituições com a UE do capital, que é uma prisão de povos e uma máquina para explorar os trabalhadores. A única maneira de parar o retrocesso social é romper com a UE dos banqueiros e lutar por uma Europa dos trabalhadores e dos povos.
Diante do terceiro plano de austeridade e da submissão do governo de Tsipras à Troika e à UE, diante do aumento de impostos e redução nas aposentadorias, diante do ajuste na forma de privatização e cortes, diante da traição ao OXI…
LUTA OPERÁRIA! O POVO NÃO DEVE NADA À EUROPA NEM AO GOVERNO!
DIANTE DOS INTERESSES DA TROIKA E DO CAPITAL, NÃO CEDER NUNCA!
Tradução: Tae Amaru