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sexta-feira, março 29, 2024

A profunda crise da República Centro-Africana

A região da atual República Centro-Africana é habitada há milênios. Mas foi o governo da França, com outros imperialismos, que construíram as fronteiras, criadas artificialmente, e escravizaram a população para trabalhos agrícolas, sobretudo no cultivo de café e algodão e a extração de marfim e diamante.

Por: Américo Gomes

Devido à exploração forçada os nativos da África Central começaram a se rebelar no início do século XX, como na Rebelião de Kongo-Wara (1928-1931), violentamente reprimida pelo imperialismo francês.

Depois de o país conquistar a independência, o governo da França apoiou uma série de ditadores que garantiram a manutenção da situação semicolonial. Entre eles o imperador Jean-Bédel Bokassa em 1976, que cometeu atrocidades contra seu povo. Foi deposto em 1979.

Um dos últimos desses ditadores foi François Bozize (que deu um golpe de Estado em 2003), deposto em 2013 pela coalizão Seleka, fugindo para Camarões. Ele foi responsável por desencadear uma guerra civil entre 2004 e 2012, com combates entre o governo, grupos armados muçulmanos e facções cristãs. Com limpeza étnica e religiosa, e deslocamentos populacionais massivos.

A tomada do poder pelos Seleka, colocou no poder um muçulmano, Michel Djotodia, que desencadeou uma onda de violência direcionada contra a comunidade cristã. Um conflito sangrento com os chamados anti-Balaka. Antes de deixarem o poder, em 2014, mataram milhares, pilharam e queimaram casas, fazendo com que o país virasse uma terra sem lei. O próprio Djotodia tentou desmantelar a Seleka, mas vários dos seus membros criaram novas milícias, conhecidas como ex-Seleka, que continuaram se enfrentando com os anti-Balaka e as tropas do governo.

Estas fações tomaram grandes partes do território, criando fronteiras, cobrando impostos e explorando os recursos naturais do país. Além disso, em 2008, o Lord’s Resistance Army, do senhor da guerra Joseph Kony, entrou no país, fugindo de Uganda, atacando a população, com mais: morte, violação, raptos, destruição e pilhagem de aldeias. Soma-se a isso os mercenários do vizinho Chade e os temidos Janjaweed da região de Darfur, no Sudão, que constantemente atravessam a fronteira.

François Hollande, em dezembro de 2013, aumentou a presença militar francesa nas ex-colônias, incluindo a Costa do Marfim e Mali. No ano seguinte, a pró-imperialista Catherine Samba-Panza, a Mãe Africana, assumiu a presidência, ficando até 2016. As tropas francesas, representando a ONU, foram denunciadas por estupros e abusos sexuais.[1] Em 2015, um painel independente criado para analisar os casos de violação e abuso sexual de crianças pelos militares acusou a ONU de negligência grosseira no trato destas acusações. Hoje existe a proposta que tropas brasileiras sejam enviadas à República Centro-Africana

As eleições em 2016 levaram Faustin-Archange Touadéra ao governo, sem diminuição da violência. Pelo menos 75% da população têm menos de 35 anos, com um desemprego juvenil oficial de 12,5%. O novo governo exerce seu poder praticamente só na capital, Bangui. As milícias e facções controlam 80% do campo com administrações paralelas. O centro e o leste do país são divididos pelos ex-Seleka e o anti-Balaka, e o sudeste pelo Lord’s Resistance Army, de Kony. No noroeste, um conflito étnico, cada vez mais violento coloca agricultores contra produtores de gado.

Nos últimos 12 meses cerca de 2.000 pessoas morreram em conflitos, um grau de violência somente visto durante a guerra civil.

Lucros imperialistas: exploração do sangue africano

Um dos exemplos contundentes dos danos feito pela exploração imperialista na Africa é o que ocorreu, e ocorre, na República Centro-Africana. A exploração imperialista, em beneficio das grandes empresas capitalistas multinacionais, levou a um processo de desintegração do Estado. Um conflito que fragmentou as comunidades que hoje continuam a ser armadas pelas empresas armamentistas dos países imperialistas.

O país tem reservas de urânio, petróleo, ouro, diamantes, madeira e energia hidrelétrica, bem como quantidades significativas de terras aráveis, mas está entre os dez países mais pobres do mundo, com o mais baixo nível de desenvolvimento humano, uma média de vida de 51 anos e com metade dos cinco milhões de habitantes necessitando de ajuda humanitária.

Mesmo com todos os esforços, muitas publicações sobre a relação Europa/África, não conseguem transmitir o dano que foi causado à economia africana, aos povos e ao desenvolvimento continental o tráfico de escravos e o colonialismo europeu, que destruíram cidades, estados pré-coloniais que dominavam sub-regiões, controlavam rotas comerciais e mantinham estruturas de governo.

A instabilidade na República Centro-Africana não é fruto de conflitos étnicos ou religiosos. Há sem duvida, alguns destes elementos. Mas a base é a miséria e a pobreza generalizada e por trás deles esta a presença de capital financeiro. Não é coincidência o fato de que grupos armados controlem áreas de mineração e rotas de comércio transfronteiriço.

Somente um processo revolucionário das nações africanas, que exproprie estas multinacionais e expulse a presença imperialista do continente e coloque os trabalhadores e a população pobre no poder, poderá trazer o verdadeiro desenvolvimento econômico a estes povos e exterminar a violência e os conflitos armados.

[1]    http://www.dw.com/en/samba-panza-i-have-accomplished-my-mission/a-19051938

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