Especial Grécia-Syriza
Parlamento grego aprova pacto entreguista entre Syriza e a Troika
julho 22, 2015
A traição se consumou. O parlamento grego, a pedido do primeiro ministro Alexis Tsipras, aprovou à noite o brutal pacote de medidas colonialistas que o governo do Syriza negociou dias
atrás com a Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu, FMI) em troca de um terceiro “resgate” dos bancos alemães, franceses e gregos, que poderia alcançar os 85.000 bilhões de euros em três anos.
atrás com a Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu, FMI) em troca de um terceiro “resgate” dos bancos alemães, franceses e gregos, que poderia alcançar os 85.000 bilhões de euros em três anos.
Dos 300 deputados, 229 aprovaram o acordo; 64 o refutaram, entre eles, 32 da ala dissidente do Syriza. Entre os que se opuseram, os mais notáveis foram os atuais ministros Lafazanis e Stratoulis e os ex-ministros Varoufakis e Nadia Valavani, além da presidenta do parlamento, Zoe Konstantopoulou. Outros seis parlamentares do Syriza se abstiveram e um esteve ausente[1].
Horas antes da votação, milhares de manifestantes marcharam em Atenas para protestar contra a aprovação do novo ajuste. A central sindical ADEDY, que aglutina os trabalhadores do setor público, convocou um dia de paralisação e uma marcha pela capital. Também houve uma manifestação de PAME, agrupamento sindical ligado ao Partido Comunista Grego (KKE), que juntou mais de 10 mil pessoas na Praça Omonia. Outros partidos, como ANTARSYA, também expressaram seu repúdio ao acordo. O governo do Syriza, empenhado em garantir o pacto com Merkel – da mesma forma que faziam os partidos da “velha política”–, enviou a polícia à Praça Syntagma, que reprimiu os protestos e deteve várias dezenas de ativistas anti austeridade.
Também pela tarde, 52% do Comitê Central do Syriza se pronunciou contra a aprovação do acordo com a Troika.
Em meio a esse clima quente, começou a sessão. Num sentido completamente oposto ao recente repúdio massivo à austeridade no referendo do passado 5 de julho, onde o “NÃO” foi vitorioso com mais de 61% dos votos, Tsipras conseguiu aprovar um acordo muito pior que o rechaçado nas urnas, e com o apoio direto dos partidos derrotados do “SIM”: Nova Democracia, PASOK e To Potami.
Da mesma forma, Gregos Independentes, partido nacionalista xenófobo com o qual Syriza se aliou para formar governo em janeiro, alinhou seus 13 deputados para aprovar o acordo com a Troika. “Se o governo cai, não haverá esperança para Grécia, não haverá esperança para a Europa”, expressou o líder deste partido e ministro de Defesa, Panos Kamenos.
A capitulação de Tsipras significa um salto qualitativo no processo de colonização da Grécia, que terá um duríssimo impacto nas condições de vida do povo trabalhador.
O governo grego deverá aplicar duríssimas medidas de austeridade: aumento do IVA (imposto sobre o consumo) – que implicará, como mínimo, um aumento de 720 euros por domicílio–; uma reforma no sistema de pensões que penalizará as aposentadorias antecipadas e elevará a idade mínima para ter este direito, apenas aos 67 anos em 2022; além de um inédito “fundo” de ativos públicos, controlado pela Troika, em que será depositada a arrecadação da privatização de portos, aeroportos e, possivelmente, até da empresa de eletricidade estatal. A economia grega continuará nas mãos do imperialismo.
“Em troca”, a Troika irá “soltando” o dinheiro do “resgate” a conta-gotas. Por enquanto, o BCE oferece um “crédito ponte” de 7 bilhões de euros para os próximos três meses –com o fim explícito de “recapitalizar” os bancos–, desde que aprovem as cruéis medidas de ajuste contra o povo grego.
Evidentemente, como ocorreu com os anteriores dois “resgates”, esse dinheiro será para pagar ao FMI (2 bilhões de euros) e ao próprio BCE (3,5 bilhões de euros). O resto dos vencimentos, se calcula, são de 3 bilhões ao BCE, em agosto; e outros 1,5 bilhões de euros ao FMI, em setembro.
A sujeição às imposições da Troika gera, em países como a Grécia, o mesmo círculo vicioso das dívidas latino americanas. Quanto mais se paga, mais se deve. Se o terceiro “resgate” for concretizado totalmente, a “ajuda da Europa à Grécia” alcançará 260 bilhões de euros desde 2010.Como sabemos, tal “ajuda”, sempre acompanhada de tremendos planos de ajuste e colonização, não só não foi pedida pelo povo (mais do que isso, foi rotundamente repudiada tanto no último referendo como nas mais de 30 greves gerais desde 2010), como nunca foi usada para melhorar a vida do povo trabalhador grego. Apenas 11% deste dinheiro foi utilizado para gastos correntes do Estado grego. O restante, 89%, se destinou ao pagamento de juros e, em menor medida, amortizações da mesma dívida gerada pelos mesmos “resgates”.
Quando começou a crise econômica mundial, a dívida “pública” representava 120% do PIB grego. Hoje representa 177%. Este mecanismo de espoliação é tão perverso que o próprio FMI admite que, inclusive aplicando radicalmente todas as terríveis medidas de austeridade que comporta este terceiro “resgate”, a dívida grega estará “próxima de 200% do PIB” em menos de dois anos. Tsipras e Syriza fizeram um “bom negócio”!
Unidade para enfrentar o plano colonizador
A traição de Tsipras e do Syriza não deve provocar desmoralização. Ao contrário: deve servir para que o movimento operário e a juventude desempregada e precarizada extraiam lições.
Uma delas é que não é possível confiar nos mecanismos próprios da democracia dos ricos. O caso grego, neste sentido, é ilustrativo. O povo votou no Syriza expressando, fundamentalmente, um rechaço à austeridade que vinha sendo aplicada pelos partidos tradicionais, Nova Democracia e PASOK. Mais recentemente votou expressivamente pelo NÃO contra a intenção colonizadora da Troika. No entanto, no fórum parlamentar, o governo do Syriza, aliado aos partidos derrotados do SIM, transformou escandalosamente o NÃO em um SIM às doutrinas do capital financeiro.
A segunda lição importante é sobre o papel que cumprem os partidos neo reformistas (reformismo sem reformas) como Syriza na Grécia, ou PODEMOS no Estado Espanhol, ou o Bloco de Esquerda português. Exatamente por seu programa reformista, são incapazes de romper com a lógica capitalista, e apesar de uma ou outra retórica “anti austeridade”, terminam capitulando –ou governando, no caso da Grécia– a serviço do imperialismo e da colonização de seus países.
Íñigo Errejón, considerado o “número dois” de PODEMOS, afirmou: “Apoiaríamos o que apoia o Parlamento grego”. Da mesma forma que Syriza, o partido PODEMOS não tem um horizonte além do euro: “Era ou o acordo ou a saída do euro”. A questão fundamental, é que o reformismo é incapaz de aceitar que não existe forma de acabar com a austeridade e evitar a colonização da Grécia e da Espanha e, ao mesmo tempo, manter-se nos marcos do euro.
A ruína completa destes partidos se faz mais evidente com as palavras do próprio Varoufakis: “Se celebrou o referendum, que nos deu novo impulso e nos haveria permitido tomar essas medidas, mas nessa mesma noite o governo decidiu que o NÃO do povo não ia dinamizar nossa resposta, mas sim ia servir para fazer concessões importantes: nosso primeiro ministro se reuniria com os líderes políticos e ia aceitar que, ocorresse o que ocorresse, nunca nos mostraríamos agressivos. Em definitivo, havíamos nos rendido. Deixamos de negociar”. Inclusive no terreno da “negociação”, o ex ministro “radical” do governo de Tsipras somente pode admitir a capitulação do Syriza.
Os ativistas honestos devem refletir sobre os acontecimentos na Grécia. A desilusão com Tsipras, altamente progressiva, deve transformar-se em bronca e em disposição de luta.
A tarefa neste momento é unificar as lutas de todos os setores para enfrentar as medidas do plano de ajuste que serão aplicadas por Tsipras. É necessário golpear juntos. Unir a classe trabalhadora com a juventude. Manter a mobilização de forma constante, porém de maneira completamente independente, tanto do governo como de qualquer outro partido patronal.
É necessário exigir da chamada “esquerda do Syriza”, conhecida como a Plataforma de Esquerda, que rompa de uma vez por todas com este governo e com esse partido. Faz muito tempo que o papel da ala esquerda do Syriza se reduz, na prática, a legitimar as decisões de Tsipras. Continuaram com ele após o vergonhoso acordo de fevereiro. Que farão agora? É necessário uma ruptura categórica e lançar-se sem meias tintas à oposição frontal contra o governo do Syriza, o principal executor dos planos da Troika na Grécia.
[1] Syriza conta com 149 deputados eleitos.