Em dois anos, o livro do Lênin, Imperialismo, fase superior do capitalismo completará 100 anos.O que permaneceu atual? Quais tendências não se verificaram nos acontecimentos dos últimos 100 anos? Que partes do livro não aconteceram exatamente como Lênin previu?
Por Nazareno Godeiro
Este artigo busca responder a estas questões ao mesmo tempo em que busca explicar o presente: a situação do imperialismo no início do século XXI.
Quatro notícias corriqueiras mostram um mundo conturbado, às vésperas de grandes acontecimentos da luta de classes mundial:
- A Suprema Corte de Nova York decidiu que a Argentina deve pagar uma dívida com os ‘fundos abutres’ (especuladores norte-americanos). A Argentina ficou impossibilitada de pagar a famigerada “dívida e-terna” e renegociou as condições de pagamento. Os ‘abutres’ não aceitaram e recorreram à Justiça… norte-americana!
- Relatório da Agencia para Refugiados da ONU (ACNUR), de junho de 2014, informou que 51 milhões de pessoas estão desalojadas no mundo, devido a guerras, crises e desastres ‘naturais’. Já supera o número de desalojados da Segunda Guerra Mundial.
- Morreram 1.922 pessoas na guerra civil do Iraque no mês de junho de 2014. É um morto a cada 20 minutos, isto depois de 11 anos de ocupação norte-americana para ‘pacificar’ o país.
- A foto “Abraço Final”, de Taslima Akhter, mostra casal de operários têxteis de Bangladesh, em desastre onde morreram 1.138 operários soterrados, em 24 de abril de 2013, num desabamento de um prédio que abrigava fábricas que produziam em regime de terceirização para grandes multinacionais da moda mundial (Walmart, Levi’s, Benetton, etc). Estes operários ganhavam U$ 76 dólares por mês, para vestir granfinos da Europa e Estados Unidos. São terceirizados das terceirizadas. É o último elo da “Cadeia Global de Valor”.
No alvorecer do século XXI, o imperialismo mundial, chefiado pelos Estados Unidos, desataram uma guerra social simultânea com uma guerra colonial, para recuperar as taxas de lucros das grandes corporações multinacionais.
Assistimos também a uma recolonização do planeta, em graus distintos, para subordinar e oprimir 190 países para o enriquecimento de 4 ou 5 potências imperialistas.
Ficou para trás o parêntese histórico que compreendeu os 40 anos pós-Segunda Guerra Mundial, caracterizado por grandes conquistas da revolução mundial: melhores condições de vida na Europa e países imperialistas (conhecido como ‘estado de bem-estar social’) e a conquista da independência nacional de boa parte dos países colonizados, como produto de revoluções anticoloniais.
O imperialismo foi obrigado a fazer estas concessões com medo de que a revolução mundial, após a derrota do nazi-fascismo, vencesse em toda a Europa e se espalhasse para todo o mundo, combinando a revolução social com as revoluções de libertação nacional dos povos oprimidos da África, Ásia e América latina.
Segue atual a teoria do ‘Imperialismo’ de Lênin?
Marx e Engels elaboraram a teoria marxista a partir de uma contradição central do sistema capitalista: a contradição entre capital e trabalho. Para eles, a opressão dos povos coloniais e semicoloniais se acabaria com a derrubada da burguesia nos países mais desenvolvidos da Europa, especialmente na Inglaterra. Por isso, a revolução de independência nacional sequer fazia parte do programa marxista da época.
Coube a Lênin, ao formular a teoria do Imperialismo, incorporar a luta anti-imperialista como parte fundamental da revolução mundial. A partir daqui, a revolução anticolonial e a luta pela independência nacional tornaram-se um elo da revolução socialista internacional.
Para Lênin, a época imperialista é a época dos monopólios, associados indissoluvelmente à época da opressão colonial, da subordinação dos países pobres aos países imperialistas. Segundo esta teoria, a exploração capitalista anda junto com a opressão colonial, reforçando-se mutuamente.
Outra característica essencial e constitutiva da teoria do Imperialismo de Lênin é que essa exploração colonial, associada ao parlamentarismo, permitiu à burguesia dos países centrais corromper as lideranças da classe trabalhadora.
Nos momentos de crises econômicas e políticas, de grandes lutas revolucionárias, a burguesia apela para que estas direções dos trabalhadores governem, levando o povo a se desmobilizar, acreditando que é o “seu” governo que está decidindo.
Na atualidade, como produto de uma situação objetivamente revolucionária, disseminaram-se pelo mundo estes governos “progressistas” desde Mitterrand na França, Walessa na Polônia, Frente Sandinista na Nicarágua, Frente Farabundo Martí em El Salvador, o PT no Brasil, o peronismo na Argentina, Evo Morales na Bolívia, Chávez na Venezuela, e um largo etc. Na Europa inteira a socialdemocracia assumiu o governo no início do desmonte do “Estado de Bem-Estar”.
Nos últimos 100 anos, surgiram muitos questionamentos à teoria do Imperialismodo Lênin.
O mais completo foi a formulação de Kautsky que enxergava na formação das multinacionais uma harmonização da economia mundial e que poderia levar a uma paz democrática e melhorias nas condições de vida da classe trabalhadora, gerando um ‘superimperialismo’. O domínio do mundo pelo imperialismo norte-americano e o “Estado de Bem-Estar Social” na Europa, que permitiram os “30 anos gloriosos” de 1945 a 1975, pareceu dar razão a Kautsky e desmontar a teoria de Lênin, como uma época de guerras, revoluções e colonização.
Autores mais atuais, a partir da ‘globalização’, começaram a trabalhar com a hipótese do surgimento de governos supranacionais (por exemplo, um governo europeu), apoiando-se na tendência de mundialização das empresas e de perda da base nacional e do fim das fronteiras dos Estados Nacionais.
Outros autores acreditaram que o domínio colonial do planeta é coisa do passado e que todos os países se tornaram independentes.
Outra opinião bastante corrente nos meios intelectuais de esquerda é que o imperialismo norte-americano está em declínio e a China, junto com os ‘países emergentes’, será a nova superpotência que substituirá em poucos anos a supremacia americana.
Todas estas visões, partindo de tendências que existem na realidade, esquecem as contradições, absolutizam uma tendência como se fosse toda a realidade.
Caem no erro que alertava Lênin no início do Imperialismo…:
“Para mostrar essa situação objetiva há que tomar não exemplos e dados isolados (dada a infinita complexidade dos fenômenos da vida social, sempre se pode encontrar os exemplos e dados isolados que se queira para apoiar qualquer tese), mas é necessário levar em consideração o conjunto dos dados sobre os fundamentos da vida econômica de todas as potências beligerantes e do mundo inteiro.”[1]
Assim, queremos partir do resumo que fez Lênin da sua teoria, para ver o que foi verificado pelos acontecimento dos últimos 100 anos e o que se demonstrou equivocado ou que se afirmou de uma maneira diferente do que previu o autor:
“Se fosse necessário dar uma definição o mais breve possível do imperialismo, deber-se-ia dizer que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo. (…) Cinco traços fundamentais, a saber : 1) a concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado de desenvolvimento que criou os monopólios, os quais desempenhan um papel decisivo na vida econômica; 2) a fusão do capital bancário com o industrial e a criação, baseada nesse “capital financeiro”, da oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande; 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si, e 5) o termo da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes.”[1]
Acreditamos que estas características se mantiveram, com contratendências operando até o limite, sem alterar a qualidade que determina a época imperialista como a última fase do capitalismo, de crises, guerras e revoluções.
Os monopólios hoje
Lênin escreveu:
“Em um belo dia despertaremos e diante de nossos olhos deslumbrados não haverá mais do que trustes e nos encontraremos com a necessidade de substituir os monopólios privados pelos monopólios do Estado.”[1]
A caracterização fundamental do imperialismo como a era dos monopólios continuou se verificando nos últimos 100 anos.
Um estudo recente, realizado por pesquisadores suíços[4], analisou 43 mil empresas multinacionais de uma base de dados que compreendeu 37 milhões de empresas de todo o mundo. Este estudo concluiu que 147 corporações controlam 40% da riqueza mundial, sendo que 75% destas empresas são instituições financeiras (J.P. Morgan, Citigroup, Bank of America, Merril Lynch, Goldman Sachs, Black Rock, Barclays, Deustche Bank, BNP, HSBC, Credit Suisse, etc.).
O peso destas multinacionais é avassalador. De acordo com a UNCTAD, em 2008, existiam 82 mil empresas transnacionais com um total de 820 mil filiais estrangeiras. O produto bruto das filiais estrangeiras em todo o mundo foi responsável por 10,5% do PIB global em 2009.
A revista Forbes, de 2013, relacionou as vendas das 1.000 maiores empresas do mundo, que atingiu um valor de U$ 31,7 trilhões, superando em duas vezes PIB dos Estados Unidos e alcançando 45% do PIB mundial. 60% destas vendas estão concentradas em empresas cujas sedes estão localizadas nos 5 principais países imperialistas e 40,3% de todo o lucro desta 1.000 empresas ficou com as empresas norte-americanas. Enquanto o lucro das empresas ianques representa 10% das vendas, as margens europeias e do Japão chegam a uma média de 5%.
Das 200 maiores empresas do mundo, segundo a revista citada acima, 122 delas tinham como sede/matriz os 5 países mais ricos do mundo, representando 61% do total. Os países pobres tinham apenas 36 firmas, representando 18% do total.
É interessante estudar as conexões das 10 grandes famílias tradicionais do capitalismo mundial com estes grandes bancos e multinacionais.
As famílias Rockfeller (EUA), Rothschild (Inglaterra e França), Goldman Sachs (EUA), Lehman (EUA), Warburg (Alemanha), Lazard (França), Moises Seifs (Roma), Kun Loeb (EUA), Iwasakie Dan (Japão), são as principais beneficiárias da espoliação do planeta.
A família Rockefeller tem parte do controle dos bancos J.P. Morgan, Citigroup, Bank of America, Goldman Sachs, Merrill Lynch, Lehman Brothers e Prudential. Estes bancos são grandes acionistas nas seguintes empresas: AT&T, GM, GE, Dupont, Exxon, British Petroleum, Chevron, Shell, Freeport McMoran, United, Delta, ITT, Xerox, Boeing, Westinghouse, HP, Honeywell, International Paper, Pfizer, Motorola, Monsanto, etc… A família Rothschild tem conexão com a família Rockfeller através do J.P. Morgan e do Bank of America.
De uma forma ou de outra, todas estas famílias controlam bancos e multinacionais que dirigem a economia mundial hoje.
Os monopólios hoje têm a mesma dinâmica do tempo do Lenin, porém com níveis muito mais avançados de domínio territorial do mundo, utilizando a abertura de filiais das multinacionais nos países pobres, ao invés de exércitos, que são usados apenas como último recurso.
Multinacionais, terceirização e precarização mundial
O desenvolvimento dos monopólios ocorrem em estreita relação com o domínio dos países pobres.
Segundo um estudo da OCDE sobre as multinacionais no mundo hoje[5], a produção intensiva e que requer menos habilidades são terceirizadas para países periféricos, que tem mão-de-obra em excesso e barata, enquanto reservam as atividades de alto valor para suas matrizes ou, na pior hipótese, para uma filial situada nos países pobres.
A característica nova, que no tempo do Lênin estava engatinhando, é a transferência de boa parte da produção das multinacionais para os países semicoloniais, abrindo filiais ou contratando fornecedores terceirizados nos mais diversos países do mundo, formando o que se chama de “Cadeias Globais de Valor”, que retêm o controle e a alta tecnologia nas mãos da empresa-mãe e terceiriza a produção de partes dos produtos de acordo com a “especialização” e as vantagens de produzir num ou noutro país.
Uma pesquisa de 2009[6], estudando 300 empresas multinacionais com vendas acima de US$ 1 bilhão, tiveram em média, 51% da fabricação, 47% da montagem final, 46% do armazenamento, 43% do atendimento ao cliente e 39% do desenvolvimento do produto fora das suas matrizes, do seu país de origem.
Baixos salários, tamanho do mercado interno e proximidade dos grandes centros imperialistas dão preferência para determinadas áreas e países.
Segundo a OIT, no ano de 2010, nas Filipinas, um trabalhador da indústria de transformação ganhou U$ 1,41 por hora de trabalho. Na Polônia ganhou U$ 4,86, No Brasil, ganhou U$ 5,41, nos Estados Unidos U$ 23,32 e na Alemanha U$ 25,80. Em comparação, na China existia uma média salarial de U$ 3,50 por hora.
Os gráficos abaixo, confeccionados pela OCDE, mostram que a produção de alta tecnologia se concentra nos países imperialistas enquanto a produção de baixa e média tecnologias são transferidas para os países pobres:
Os países conhecidos como BRICs passaram a fabricar boa parte dos produtos industriais do mundo, porém com desenho e tecnologia de fabricação desenvolvidos na matriz enquanto são fabricados e montados em países como China, com peças muitas vezes vindas da Ásia.
Assim, a China foi responsável por 19% da produção mundial em 2010 e tornou-se o maior fabricante do mundo.
Porém, este salto monumental da China se deve ao peso das empresas multinacionais que dominam a economia local. Em 2008, 85% das exportações chinesas foram de responsabilidade de multinacionais instaladas na China.
Ser ‘fabricante’ do mundo não é sinal que a China vai superar os Estados Unidos, que domina a alta tecnologia de fabricação dos produtos. O valor agregado pela produção doméstica da China é pequeno. O exemplo de um iPod, cujo produto final é exportado da China, tem apenas US$ 4 dólares acrescentado aí de um custo total de fabricação de U$ 144 dólares, que será vendido nos Estados Unidos por U$ 300 dólares.
Este exemplo demonstra que a economia chinesa está sendo usada pelas multinacionais para superexplorar o mundo ao mesmo tempo em que transforma a China em uma semicolônia do imperialismo mundial, condição subordinada que carrega imensas contradições, que vão explodir nos próximos anos.
A busca por uma terceirização geral da produção mundial de mercadorias pelas multinacionais combina com uma precarização das condições de trabalho e com uma localização geográfica em países coloniais ou semicoloniais.
Por exemplo, o aumento da produtividade das exportações da Alemanha, resultado da produção realizada no Leste europeu, na Rússia e na Ucrânia é a principal razão do sucesso da máquina de exportação alemã. O salário médio das multinacionais do setor automobilístico no Leste Europeu alcança apenas 17% do salário pago na Alemanha. A restauração capitalista permitiu um salto na exploração dos trabalhadores do Leste e a recolonização dos países que compõem esta região do mundo.
Este ataque aos trabalhadores de todo o mundo e às nações pobres é usado como chantagem para rebaixar o salario dos países ricos, deixando-o estagnado na última década.
O estoque de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) das empresas multinacionais atingiu US$ 22 trilhões em 2011 e ultrapassou o comércio global de bens, no valor de US$ 18 trilhões.
Resumindo, a recolonização dos países semicoloniais está se realizando na forma de implantação de filiais de multinacionais e pela contratação de fornecedores terceirizados locais, para subordiná-los dentro da Cadeia Global de produção das multinacionais.
Uma época de guerras e revoluções
Armado com a teoria do Imperialismo, os marxistas puderam prever a eclosão da Segunda Guerra Mundial, uma guerra entre países imperialistas para decidir quem dominava o mundo.
De quebra, o imperialismo utilizou a guerra para tentar derrotar a União Soviética e restaurar o capitalismo pela força das armas de Hitler.
Se ele tivesse sido vitorioso, abriria um tempo de barbárie demonstrando, pela negativa, a justeza da teoria do Lênin: que o imperialismo é a fase de decadência do capitalismo.
Porém, depois da vitória do imperialismo americano, que saiu da guerra como dono do mundo, se distanciou a possibilidade de uma III Guerra Mundial.
Lênin aventou essa possibilidade nos estudos preparatórios do livro “O Imperialismo, fase superior do capitalismo”:
“…no que se refere aos interesses financeiros e comerciais mais poderosos, é bastante possível que a próxima geração possa ser testemunha de uma internacional do capital tão poderosa que torne quase impossível as guerras entre as nações ocidentais.”.[1]
A não existência desta Terceira Guerra entre países imperialistas e a aparição dos Estados Unidos como imperialismo dominante, somado a três décadas de “paz social” na Europa e nos Estados Unidos parecem ter dado razão a Kautsky: o desenvolvimento dos monopólios levou a um superimperialismo, com uma diminuição das crises e harmonização social, sob um regime de democracia, associado com a melhora das condições de vida da classe trabalhadora.
Essa é a aparência da situação mundial neste período. Para entender a essência dos acontecimentos necessitamos analisar as circunstâncias que dificultam uma Guerra Mundial entre os países imperialistas e as razões que geraram o que se conheceu como “boom do pós-guerra”.
Em primeiro lugar, o pânico da burguesia em perder o controle do mundo. O imperialismo aprendeu que após cada carnificina, perdia o controle de parte do mundo.
A Primeira Guerra Mundial teve 19 milhões de mortos, sendo 10 milhões de civis, 7 milhões de incapacitados e 15 milhões de feridos graves.
Essa guerra temperou um exército de 500 milhões de proletários, com ódio ao imperialismo e a compreensão que ele não podia oferecer mais que a barbárie da exploração dos trabalhadores e dos povos coloniais para salvar um punhado de magnatas.
A guerra gerou a revolução russa e possibilitou a fundação da III Internacional, uma direção revolucionária de massas que só não derrotou o imperialismo mundial porque este contou com o apoio inestimável de todas as direções do movimento operário europeu para derrotar a revolução.
A Segunda guerra mundial matou cerca de 50 milhões de pessoas. A derrota do nazi-fascismo desatou o maior ascenso revolucionário que a humanidade conheceu. A revolução mundial chegou até a Alemanha e se espraiava pela França, Grécia, Iugoslávia, Itália, etc. Novamente, precisou que o stalinismo segurasse a revolução na metade da Alemanha, erguendo o infame Muro de Berlim.
Esse ascenso revolucionário obrigou o imperialismo a realizar uma concessão histórica: o “Estado de bem-estar social” nos países ricos, concessão feita à classe trabalhadora para garantir uma paz social nos centros imperialistas.
Simultaneamente, os países coloniais garantiam sua independência formal, como produto de revoluções anticoloniais.
No terreno econômico, o imperialismo utilizou a exportação de capitais em larga escala: as multinacionais americanas se espalharam pelo mundo, aumentando a exploração dos países pobres. Essa exploração da periferia (e dos imigrantes) permitiu a “paz social” nos países ricos por 30 anos. Durante o idílio europeu, se realizaram guerras contra países coloniais (Vietnã e Coreia), golpes de Estado no Irã em 1953, na Guatemala em 1954, no Congo em 1960, no Brasil em 1964, na Indonésia em 1964, na República Dominicana em 1965, Gana em 1966, Grécia em 1967, Camboja em 1970, Chile em 1973, Argentina em 1976, Bolívia… Tudo isto para adaptar os países para a dominação das multinacionais norte-americanas, alemãs e japonesas. A cooptação nos centros imperialistas tinha sua contrapartida na subjugação pela força nos países pobres.
A Terceira Guerra Mundial se tornou impossível e desnecessária para o imperialismo norte-americano. A reconstrução da Europa se deu sob a batuta do capital norte-americano. O poderio militar, expresso no bombardeio atômico de Hiroshima, deu a supremacia aos Estados Unidos. Alemanha, Japão, França e Inglaterra se renderam ao capital norte-americano e aceitaram o papel subordinado na exploração do mundo.
Portanto, circunstâncias únicas na história, a saber, crescimento econômico após destruição maciça, utilização da democracia burguesa e a colaboração do stalinismo e da socialdemocracia, permitiram os 30 anos gloriosos.
Porém, essa combinação de circunstâncias favoráveis ao imperialismo se desequilibrou a partir da crise econômica mundial de 1974. A partir daí, as multinacionais e o imperialismo se reorientam, aumentando a exploração e a espoliação dos países pobres a partir da cobrança da “dívida externa”. Começa a abrir relações com os “países socialistas”, através de vultosos empréstimos.
Inicia uma contrarreforma mundial, que dará um salto em 1990, com a aplicação do “neoliberalismo” em todo o mundo.
Se fechou o parêntese histórico de “harmonia” e o mundo se tornou convulsionado, predominando as guerras, crises e revoluções. Porém, as guerras já não são guerras entre países imperialistas, devido ao domínio avassalador do imperialismo norte-americano.
“Toda grande reforma é subproduto de revoluções”
Esse parêntese histórico demonstrou a correção desta máxima leninista.
A destruição do “Estado de bem-estar social” e das conquistas do movimento operário mundial pós-Segunda Guerra, realizadas pela burguesia mundial e institucionalizadas em todos os parlamentos do mundo, com as direções do movimento à frente, demonstroua falência da estratégia reformista do capitlaismo.
O livro de Thomas Piketty, O Capital no Século XXI, traz um panorama secular da exploração dos trabalhadores do mundo e mostra a curva da desigualdade, acompanhando as grandes lutas da classe trabalhadora.
Visto em perspectiva histórica, desde o início do surgimento da classe trabalhadora, a desigualdade social aumenta com o capitalismo, comprovando a teoria da “miséria crescente” de Marx (quanto mais rende riqueza ao capitalista mais pobre se torna o operário). Assim, historicamente, o capitalismo piorou as condições de vida da classe trabalhadora.
Essa teoria foi questionada pelo alemão Bernstein no século XIX e o desenvolvimento no pós-Segunda Guerra parecia ter dado razão a ele e não aos marxistas, já que houve uma melhora das condições de vida da classe trabalhadora nos países centrais.
Porém, agora, novos dados estatísticos, trazidos por David Piketty, demonstram que desde 1980 estamos voltando aos níveis de desigualdade social do século XIX.
Apenas grandes lutas revolucionárias da classe trabalhadora arrancam conquistas. Isso se verificou nos períodos que vão de 1871, logo após a Comuna de Paris e após 1914, com a revolução russa e em 1945 com a derrota do nazi-fascismo.
A burguesia “abre mão” de altos lucros para impedir um salto revolucionário. A vitóriada classe trabalhadora mundial sobre o nazi-fascismo obrigou o imperialismo a instaurar o “Estado de Bem-Estar Social” na Europa, nos EUA e no Japão.
O gráfico abaixo, elaborado por Piketty, revela quantas vezes o capital privado acumulado no mundo superou a renda mundial entre 1870 e 2100 (projeção):
A riqueza privada representava quase 5 vezes a renda mundial no século XIX. Caiu a partir da Primeira Guerra, com as revoluções que ocorreram na Rússia e na Europa, continuou caindo após a Segunda Guerra, a tendência de queda vai de 1910 a 1970 e começa a retomar a partir de 1974, especialmente a partir de 1990, com a aplicação do neoliberalismo em todo o mundo e a restauração capitalista da URSS, China e Leste Europeu. Segundo as projeções de Piketty, em 2030, voltaremos aos níveis de desigualdade (e exploração dos trabalhadores) do século XIX.
Esta situação se reproduz nos Estados Unidos, como mostra o gráfico da desigualdade de renda nos Estados Unidos entre 1910 e 21o0.
A participação dos 10% mais ricos na renda nacional dos EUA saiu de 40% na década de 1910, subiu para cerca de 50% em 1930, caindo para 33% no pós-guerra, ficando nestes níveis até a década de 1990, com aplicação do neoliberalismo. De 1980 a 2010, a renda dos 10% mais ricos subiu de forma vertiginosa, retornando aos níveis de 1930.
Em 1940, a guerra mundial, as revoluções que emergiram dela, as lutas de libertação dos países coloniais, a abertura de filiais das multinacionais em todo o mundo, o “Estado debem-estar social” na Europa e EUA e uma situação revolucionária que ameaçou o poder burguês na Europa, levou a uma diminuição da desigualdade, que permaneceu até a década de 1980.
A partir daí, as multinacionais, pressionadas pela crise econômica e a pela queda das taxas de lucro, desatam uma guerra social e colonial em todo o planeta para retirar as conquistas que a classe trabalhadora mundial acumulou depois da Segunda Grande Guerra.
O grau de exploração dos trabalhadores dos EUA já retomou os níveis de 1930, como atesta o gráfico abaixo com as taxas de lucros das empresas norte-americanas entre 1959 e 2004.
Os níveis de desigualdade retornam a níveis ótimos para a burguesia mundial e o mundo volta a se convulsionar com crises e revoluções em todo o planeta.
A teoria leninista do imperialismo, depois de um período de forte questionamento, ressurge em toda sua plenitude.
O metralhamento dos mineiros grevistas de Marikana, África do Sul, a mando da patronal multinacional inglesa, mostra o retorno da superexploração do século XIX, assim como o retorno do domínio colonial dos países pobres. A repressão resultou em 34 operários mortos e 78 feridos.
O gráfico abaixo, também de Piketty, mostra que os Estados Unidos conseguiram ter um grau de exploração superior da sua classe operária e por isso têm lucros maiores que os europeus.
Salário mínimo na França e nos Estados Unidos, 1950-2013
Expressando o poder de compra relativo aos dois países, o salário mínimo por hora subiu de US$ 3,80 a $ 7,30 entre 1950 e 2013 nos Estados Unidos, e de 2,10 € para 9,40 € na França.
Enquanto nos EUA o salário caiu relativamente, na França aumenta persistentemente. O fenômeno tem a ver com a força da classe operaria francesa e a fraqueza da norte-americana. O salário mínimo vem caindo nos EUA desde 1970.
Esse gráfico demonstra porque os Estados Unidos se recuperou mais rápido da crise de 2008 frente à Europa. Se as empresas europeias não conseguem diminuir os salários e derrotar a classe trabalhadora, não terão nenhuma possibilidade de concorrer com as multinacionais norte-americanas.
Mostrando de outra forma essa contradição entre o capital norte-americano e europeu vamos analisar outro gráfico de Piketty: os ganhos dos 10% mais ricos dos EUA e da Europa entre 1900 e 2010. A parcela de renda dos 10% mais ricos da Europa foi maior na Europa do que nos Estados Unidos em 1900-1910, porém, agora entre 2000 e 2010, é muito maior nos Estados Unidos.
Este grande retorno financeiro dos ricos norte-americanos frente aos burgueses europeus tem a ver com o domínio da economia mundial por parte dos EUA (assim como de suas corporações multinacionais) e pelo maior grau de exploração da sua classe trabalhadora.
Os Estados Unidos tem uma superconcentração de riqueza, que hoje já é superior a 1810: Os 10% mais ricos dos Estados Unidos já detêm 70% da riqueza do país, enquanto os 1% mais ricos detêm 35% da riqueza total do país.
A diferença entre Europa e Estados Unidos reside no fato de que o epicentro da revolução no pós-guerra se concentrou na Europa, que tem uma classe trabalhadora mais organizada e formada historicamente. O grau de concessão foi muito maior na Europa e por isso, hoje, o grau de ataque e destruição do capital na Europa terá que ser superior ao realizado nos EUA.
O imperialismo alemão, segundo violino imperialista, utiliza a União Europeia para subjugar os países europeus, da Península Ibérica às Estepes russas, do Mar do Norte ao Mediterrâneo, produzindo uma nova localização dos países, aprofundando a colonização industrial, comercial, econômica, financeira e por fim, territorial.
O fim do “Estado de bem-estar” se deu de forma simultânea à restauração capitalista na URSS, China e Leste Europeu.
Vemos os acontecimentos dos últimos 100 anos corroborar a visão do Lênin, da fase imperialista como fase de crises, guerras e revoluções.
Uma volta à “normalidade”: o imperialismo se despoja das luvas de pelica para vestir a armadura da guerra social e colonial. Presenciaremos mais guerras de classes e coloniais, numa vastidão não vista antes.
A crise aberta em 2008, de grandes proporções, produzida após a reconversão capitalista de dezenas de países ex-‘socialistas’ e a recolonização de todo o planeta, abriu um novo período de redivisão do mundo entre áreas de influencia imperialista, um novo período traumático de divisão do domínio dos principais ramos econômicos do mundo entre grandes conglomerados mundiais. Nessa contenda de gigantes, cada Estado Nacional tratará de apoiar “suas” empresas na batalha global pelo domínio do mercado mundial.
Trotsky alertava, em 1940, para esta relação estreita entre o Estado Nacional e “seus” monopólios:
“O Estado não é uma abstração, mas o instrumento do capitalismo monopolista. Mesmo que não se exproprie os trustes e bancos em benefício do povo, a luta entre os estados é tão inevitável como a luta entre os mesmos trustes. A renuncia voluntária por parte do estado mais forte às vantagens que sua força lhe proporciona é uma utopia tão ridícula como a divisão voluntária do capital entre os trustes.”[1]
Na indústria automobilística mundial, apenas 3 ou 4 grupos vão sobreviver a esta crise e formarão um oligopólio mundial. Há uma superprodução e excesso de capacidade produtiva no setor. Muitos concorrentes disputando o mesmo espaço, tornando as margens de lucro pequenas (algo em torno de 3% do faturamento). Deve-se repetir neste setor, o que já ocorreu na mineração mundial: 3 empresas controlam mais de 90% da produção mundial do minério de ferro! Estas empresas têm condições de impor preços de monopólio mesmo sendo concorrentes.
Uma empresa para sobreviver no ramo automobilístico e ganhar muito dinheiro deve ter uma produção em escala na ordem de 6 milhões de veículos por ano. Assim, ela pode ganhar dinheiro no volume vendido, ainda que tenha uma margem de lucro pequena.
Em 2003, o ex-presidente da GM, Rick Wagoner, fez uma caracterização: “Você não pode ter seis ou sete fabricantes, cada um com 8 a 10 por cento do mercado, e ganhar dinheiro“. Em dezembro de 2008, o Presidente mundial da Fiat previu que acabaria por serem apenas seis grandes fabricantes de automóveis, e que apenas um deles seria dos Estados Unidos. Depois, o Presidente da Volkswagen mundial disse: “após a recessão sobreviverão uma fabricante japonesa, uma chinesa, duas ou três na Europa e uma nos EUA.”
Os acontecimentos na Europa (guerras, estagnação econômica, quebras de empresas e nova relocalização de países) criaram as condições para dirimir as principais polêmicas instaladas na esquerda mundial, a saber:
1. Que o capitalismo poderia melhorar paulatinamente as condições de vida da classe trabalhadora mundial. Esse questionamento reformista da lei da miséria crescente de Marx caiu por terra. Os monopólios europeus necessitam impor condições de exploração da sua classe trabalhadora para os níveis anteriores à Segunda Guerra. Sem isso, não vai sobreviver na disputa com as multinacionais norte-americanas. A concorrência se acentua no tabuleiro da Europa e de todo o mundo. Os monopólios europeus devem buscar a expansão territorial para países pobres e terceirizar aí partes da sua produção. Para isso, usará a força e sua ampla rede de relações coloniais herdadas do passado.
2. A União Europeia se constitui não em enfrentamento e questionamento da supremacia norte-americana e sim subordinada, tendo a Alemanha como sócia menor, formando um novo eixo imperialista mundial, EUA-Alemanha.
3. Apesar de a unificação europeia representar o alto grau de unificação das forças produtivas continentais, a UE como instituição é o oposto da unificação livre entre países. No capitalismo, a unificação entre países só pode se dar pela subordinação e pela força, onde o mais fraco é obrigado a aceitar a associação em posição subordinada. O capital financeiro alemão, secundado pelo francês, impõe uma divisão de trabalho na Europa que superexplora a classe trabalhadora e aumenta o antagonismo entre os países ricos do norte e pobres do sudeste da Europa.
4. A União Europeia não acabou com as fronteiras nacionais. O capital, apesar de explorar todo o mundo, permanece com uma base nacional, associado a um Estado que o incentiva, expande e protege, quando necessário.
Assim, nos últimos 100 anos se verificou a visão de mundo do Lênin:
“…sob o capitalismo não se concebe outro fundamento para a divisão das esferas de influência, dos interesses, das colônias, etc., que a força daqueles que participam da divisão, a força econômica geral, financeira, militar, etc.” (…) Os capitalistas não dividem o mundo, levados por uma perversidade particular, mas porque o grau de concentração ao qual se chegou os obriga a seguir este caminho para obter benefícios; e o dividem “segundo o capital”, “segundo a força”; outro procedimento de divisão é impossível no sistema de produção mercantil e do capitalismo. A força varia por sua vez em consonância com o desenvolvimento econômico e político; para compreender o que está acontecendo há que saber quais são os problemas que se solucionam com as mudanças de força mas, saber se tais mudanças são “puramente” econômicas ou extraeconômicas (por exemplo, militares), é um assunto secundário que não pode fazer variar em nada a concepção fundamental sobre a época atual do capitalismo. Substituir o conteúdo da luta e das transações entre as alianças dos capitalistas com a forma desta luta e destas transações (hoje pacífica, amanhã não pacífica, depois de amanhã outra vez não pacífica) significa rebaixar-se até o papel de sofista. A época do capitalismo contemporâneo nos mostra que entre as alianças dos capitalistas se estabelecem determinadas relações baseadas na divisão econômica do mundo, e que, ao mesmo tempo, em relação com isso, vão se estabelecendo as alianças políticas entre os Estados, determinados vínculos baseados na divisão territorial do mundo, na luta pelas colônias, na “luta pelo território econômico”.[1]
[1] Lenin, Obras Completas, tomo XXVII, pagina 438.Uma recolonização percorre o mundo
Marx não formulou um programa para a revolução anticolonial dos países pobres porque via a libertação dos povos “atrasados” como subproduto das revoluções operárias nos centros capitalistas:
“À medida que for suprimida a exploração do homem pelo homem será suprimida a exploração de uma nação por outra.”[10]
Porém, a história percorreu outros caminhos. O surgimento do imperialismo aburguesou parte do movimento operário dos países imperialistas e gerou uma torrente revolucionária nos países coloniais e semicoloniais.
Lenin foi quem atualizou o programa marxista e colocou a revolução anticolonial e de independência nacional como parte indissolúvel da revolução mundial:
“…o programa da socialdemocracia deve apresentar como fundamental, como o mais essencial e inevitável sob o imperialismo, a divisão das nações em opressoras e oprimidas.”[1]
Lênin formulou uma teoria que o imperialismo necessita oprimir e explorar a maioria do planeta, para assegurar o domínio de um punhado de países ricos. Quanto menos países ricos no centro imperialista, mais países pobres na periferia do sistema: a lei de miséria crescente se ampliou com a lei do domínio colonial crescente.
“É absurdo opor a revolução socialista e a luta revolucionária contra o capitalismo a um dos problemas da democracia, no caso presente, ao problema nacional. Devemos combinar a luta revolucionária contra o capitalismo com um programa e uma tática revolucionários para o conjunto das reivindicações democráticas: república, milicia, eleição dos funcionarios pelo povo, igualdade jurídica para a mulher, direito das nações a autodeterminação, etc. Enquanto existir o capitalismo, todas essas reivindicações só podem se realizar como exceção e, além disso, de um modo incompleto e desvirtuado.” (…)
Algumas dessas transformações serão iniciadas antes da derrubada da burguesia, outras no curso de sua derrota e outras depois de sua derrota. A revolução social não é uma batalha única mas uma época que compreende toda uma série de batalhas por transformações econômicas e democráticas em todas ordens, batalhas que só podem culminar na expropriação da burguesia.” (…)
“O imperialismo é a opressão crescente das nações do mundo por um punhado de grandes potencias, é a época das guerras entre essas grandes potencias para ampliar e consolidar a subjugação das nação…” (…)
“Por esta razão, o ponto central no programa socialdemocrata deve ser a divisão das nações em opressoras e oprimidas, divisão que constitue a essência do imperialismo…”[1]
[1] Lenin, Obras Completas, tomo XXVII, 1916, páginas 65 e 66Esta lei também foi amplamente questionada devido ao processo de descolonização que ocorreu em todo o mundo, no pós-Segunda Guerra Mundial.
Hoje, depois de 25 anos de “neoliberalismo”, há um processo de recolonização do mundo, expresso em ocupações coloniais, como o caso do Iraque, Afeganistão e Mali e no domínio dos grandes bancos imperialistas e das corporações multinacionais, que submetem todo o planeta à sua vontade.
Essa recolonização (chamada de neocolonialismo por alguns) se realiza, hoje, mais pela dependência econômica do que pelo poder da ocupação militar colonial. Porém, quando o poder econômico não é suficiente para submeter um país, a força das armas do Estado demonstra que o Estado Nacional Imperialista é o último (e mais importante) guardião da propriedade privada capitalista.
Há um acordo geral com a importância da teoria do Imperialismo de Lênin, porém um ponto é ‘esquecido’ ou não é dada nenhuma importância ou diretamente é polêmico: a linha demarcatória da política mundial, produto específico da fase imperialista, é a divisão do mundo entre um punhado de países ricos, desenvolvidos, opressores, imperialistas e uma maioria de países pobres, coloniais e semicoloniais, nações oprimidas e exploradas.
Erro muito comum, inclusive no meio trotskista e revolucionário, que Lênin já havia identificado:
“Por outro lado, contrariamente aos proudhonistas que ‘negavam’ o problema nacional ‘em nome da revolução social’”.[1]
[1]Idem, página 271.Esse erro decorre de uma visão de que toda luta nacional é coisa do passado, da época das revoluções burguesas, a época da formação dos Estados Nacionais e dos nacionalismos. Agora, segundo esta visão antidialética, estaríamos na época das revoluções proletárias e internacionalistas, na época da economia e da revolução mundiais.
O desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo mundial mistura épocas e etapas, justamente porque a burguesia, depois de dominar o mercado mundial e subjugar o mundo inteiro tratou de impedir o crescimento normal capitalista dos países coloniais. Desta forma, o atraso da periferia foi perpetuado para o crescimento dos centros metropolitanos.
Porém, o que mudou foi a forma da dominação e da colonização: o novo imperialismo dominante, os EUA, expandiu a exportação de capitais na forma de abertura de filiais em boa parte dos países do mundo, garantindo com isso a subordinação das burguesias nacionais ao imperialismo.
A exportação de capitais predominou na forma de abertura de filiais das multinacionais nos países coloniais e semicoloniais. Tornou a dominação mais sutil, mas nem por isso menos eficiente. Formalmente, o governo local é ‘independente’, mas na essência, totalmente subordinado.
Nesta nova forma de subordinação, os países têm independência formal, jurídica e política, mas dependência econômica de fato. Assim predominaram as formas intermediárias de semicolonização do mundo, como Lênin dizia:
“Para falar da política colonial da época do imperialismo capitalista, é necessário perceber que o capital financeiro e a política internacional correspondente, a qual consiste na luta das grandes potencias pela divisão econômica e política do mundo, surgem abundantes formas transitórias de dependencia estatal. Para esta época são típicas não apenas os dois grupos fundamentais de países – os que possuem colônias e as colônias -, mas também os mais variados tipos de países dependentes que desde um ponto de vista formal, político, gozam de independência, mas que, na realidade, se encontram nas redes das dependência financeira e diplomática.”[1]
[1] Lenin, Obras Completas, tomo XXVII, página 402, ano 1916.Essa exploração colonial e semicolonial atingia, no tempo de Lênin, a 70% da população mundial, realizada por cerca de 10 potências econômicas.
Hoje atinge a mais de 97% dos povos do planeta. Apenas 4 ou 5 países imperialistas e duas centenas de grandes conglomerados dominam 190 países do mundo, em grau maior ou menor de subordinação.
A descolonização ocorrida nos pós-Segunda Guerra, levou a erro comum, pensar que todas as nações são independentes e vão trilhar um caminho de desenvolvimento econômico capitalista normal, de forma reformista, e vão chegar no “Primeiro Mundo”. Essa visão subestima o controle mundial do imperialismo e o domínio econômico, politico e militar do imperialismo americano (secundado pelo alemão, francês e japonês), subestima o domínio colonial e não percebe a recolonização em curso desde a década de 1970. Separa dois termos que sempre andaram juntos: dependência e colonização.
As revoluções anticoloniais do pós-guerra foram vitoriosas, porém garantiram a independência formal, pois de conteúdo se libertaram do domínio colonial britânico para cair na dependência econômica do imperialismo norte-americano.
Monopólio anda de mãos dadas com a recolonização
Monopólio e política colonial andam juntos na teoria do Imperialismo de Lênin:
“Os monopólios intensificaram a luta pela conquista das mais importantes fontes de matérias-primas (…) O monopólio nasceu da política colonial.”[1]
[1] Lenin, Obras Completas, tomo XXVII, pagina 442, ano 1916.É impossível entender o mundo hoje e as relações entre países no Sistema Mundial de Estados, sem ver as relações entre as multinacionais e “seus” Estados Nacionais, subordinando e recolonizando os povos da Ásia, África, Oriente Médio, América Latina, Leste e Sul europeu para garantir um máximo de exploração.
Isso fica patente quando a Siemens deslocou a produção para a Hungria, em 2004, pagando um salário médio de 3,8 euros, enquanto na Alemanha teria que pagar 26,5 euros.
Na disputa pelo mercado mundial só vão sobreviver aquelas corporações que reunirem muito capital e conseguirem dominar regiões geográficas que produzem partes da mercadoria com produtividade máxima e salário mínimo. Essas “Cadeias de Valor Global” precisam garantir condições de exploração ótimas, com péssimas condições de vida e salário para a população local. Por isso, vencerá aquela empresa que conseguir subordinar os países pobres para que aceitem estas condições de exploração e opressão. A teoria de Lênin vê o imperialismo não apenas como uma “política” e sim como um conjunto de relações econômicas, políticas, sociais, dentro de um sistema desigual e combinado de relações estatais. Cada Estado nacional busca acordos comerciais entre países que permitam essa localização excelente. Quando um país ou determinado setor da burguesia local não se subordinar a estas condições de exploração, será derrubado ou trocado. Portanto, visto deste ângulo, o mundo estará convulsionado nas próximas décadas.
Conflitos entre países, conflitos entre classes e setores de classes, conflitos entre grandes corporações multinacionais para ocupar territórios de exploração. Conflitos entre países imperialistas e países semicoloniais e coloniais.
A China é a nova superpotência que vai desbancar os Estados Unidos?
Desde o final da década de 1980 se instaurou uma “nova ordem” mundial, produto da orientação neoliberal, da recolonização dos países pobres e da restauração capitalista da URSS, do Leste Europeu e da China.
Os Estados Unidos emergiram como imperialismo dominante, arrastando seus sócios menores, a Alemanha, o Japão, a França e a Inglaterra.
Aqui surgiu um mito: a China será a nova superpotência mundial, acompanhada por novas potências regionais, Brasil, Russia, Índia, México, África do Sul, etc.
É verdade que estes países têm uma relação privilegiada com o imperialismo, porém sob domínio das transnacionais, todos eles estão em processo de recolonização.
A China se converteu na “fábrica do mundo”, 200 milhões de camponeses foram expropriados para permitir o surgimento de uma classe operária superexplorada, que comprimiu o salário mundial. Dominou de cima a baixo a fabricação de produtos industrializados e se transformou numa plataforma de exportação das grandes corporações transnacionais.
Porque a China não será a próxima superpotência?
Um relatório do Congressional Research Service, dos EUA, informa que o Investimento Estrangeiro Direto (IED) acumulado na China é de 1,3 trilhão de dólares, resultado da entrada de 445 mil filiais de empresas estrangeiras.
Pelo mesmo processo de recolonização passou a América do Sul, com o Brasil na cabeça, que se localizou como fornecedora de matérias-primas, alimentos e energia para o salto chinês.
Portanto, o neoliberalismo e a globalização que vimos acontecer no mundo representaram um salto na superexploração da classe trabalhadora mundial, associada a uma recolonização dos países pobres, devido ao domínio destes países pelas transnacionais.
Dito isto, é preciso considerar que a recolonização destes países será traumática, não pela resistência que as burguesias nacionais vão oferecer (coisa improvável, mas não descartada como mostrou Saddam Hussein e Chávez), mas pelo ataque ao conjunto dos países (econômico, político, militar, etc) e a resistência que os povos vão oferecer, gerando revoluções anticoloniais como parte específica da revolução mundial.
O que se conhece como BRICs, em grau maior ou menor de subordinação e dependência, são plataformas do imperialismo para dominar o mercado mundial. São submetrópoles em processo de recolonização ou “colônias privilegiadas”, como dizia Lênin.
“A luta contra o imperialismo sem luta contra o oportunismo e a ruptura com este é um engano.”[16]
A frase acima é parte indissolúvel da teoria do Imperialismo de Lênin. A guerra demonstrou que havia uma parte podre no movimento socialista internacional. Justamente as lideranças operárias dos países imperialistas, que foram corrompidos por ‘sua’ burguesia. Lenin concluiu que não podia permanecer no mesmo partido com este tipo de gente, corrompidos por 30 anos de ‘paz’, parlamentarismo e desenvolvimento capitalista nos países centrais:
“na Europa o socialismo já superou a etapa relativamente pacífica e enquadrada em estreitos limites nacionais. A guerra de 1914-1915 a fez entrar na etapa das ações revolucionárias na qual a ruptura completa com o oportunismo e sua expulsão dos partidos operários estão indubitavelmente na orden do dia.”[1]
Essa etapa de ações revolucionárias necessita de um novo tipo de partido, preparado para combates revolucionários em vez da rotina sindical/parlamentar. Pressupunha também uma ruptura taxativa com a direção reformista e centrista da II Internacional.
As Teses da III Internacional “As tarefas fundamentais da Internacional Comunista” do Segundo Congresso (1920) resume toda a experiência do movimento comunista internacional com relação às direções oportunistas:
“Um dos obstáculos mais importantes para o movimiento operário revolucionário nos países capitalistas desenvolvidos deriva do fato de que graças às possessões coloniais e a mais-valia do capital financeiro, etc., o capital conseguiu criar uma pequena aristocracia operária relativamente importante e estável. Este grupo se beneficiou com as melhores retribuições e, além disso, está permeada por um espírito de corporativismo estreito, pequeno burguês e de preconceitos capitalistas. Constitui a verdadeira “base” social da II Internacional dos reformistas e dos “centristas” e na atualidade está muito próxima de converter-se em um ponto de apoio da burguesia. Nenhuma preparação, nem sequer prévia, do proletariado para a derrota da burguesia é possível sem uma luta direta, sistemática, ampla, declarada, com esta pequena minoria…”
[1] Lenin, Obras Completas, tomo XXIV, página 268, ano 1915Dados empíricos de Thomas Piketty demonstram o surgimento desta ‘aristocracia operária’ dos países ricos. Como ele analisa a renda das pessoas e não as classes sociais identifica esta aristocracia como parte da classe média:
“As migalhas que a classe média recolhe são importantes. Seria um erro subestimar o significado histórico desta mudança. Uma pessoa que tem uma fortuna de 200.000 a 300.000 €uros pode não ser rica, mas está longe de ser pobre. Dezenas de milhões de pessoas que compõem 40% da população representam um grupo intermediário entre ricos e pobres, com propriedade individual no valor de centenas de milhares de euros e que possuem 25 a 30% da riqueza nacional nos países imperialistas. Em termos históricos, isso representou uma grande transformação, que alterou profundamente a paisagem social e a estrutura política da sociedade.”
Ter a clareza da existência desta aristocracia operária, que é produto da exploração colonial e de uma grande conquista, deve nos alertar para os conflitos poderosos que essa camada social vai desenvolver em defesa dos seus interesses, atacados duramente pelo imperialismo.
Depois da Segunda Guerra Mundial e a expansão das multinacionais por todo o planeta, o imperialismo tratou de criar em cada país semicolonial, uma aristocracia operária nos moldes da sua congênere dos países ricos, porém com menos peso numérico e social. Os empregados diretos das grandes empresas multinacionais (e das empresas estatais) em cada país constituem a base principal das direções reformistas.
Na Europa está se produzindo uma diferenciação social no interior da classe operária:
“….a criação dos contratos precários conhecidos como minijobs de 400 euros mensais (7,5 milhões de trabalhadores). O que teve como resultado que 1 a cada 4 trabalhadores ganhe menos de 5 euros por hora e os salarios reais do conjunto do proletariado, entre 2000-2010, tenha caído 7%. A ampliação da precarização produziu uma diferença salarial abismal, que gira em torno de 40%. Ainda que a velha aristocracia operária mantenha o essencial de suas conquistas, uma camada cada vez maior do proletariado não tem acesso às mesmas condições de vida que suas camadas mais privilegiadas.”[1]
[1]La Unión Europea y nuestra política, documento da LIT sobre a situação europeia, 5 de fevereiro de 2014.
Essa camada social foi a base de sustentação da socialdemocracia europeia por décadas. O papel desta direção foi determinante para evitar a expansão da revolução russa para toda a Europa, logo após a Primeira Guerra Mundial.
Esta Guerra rendeu a perda do Império Russo para o imperialismo, onde despontou a União Soviética. Primeira Grande Guerra, primeira grande ameaça de perder o controle sobre a Europa.
A traição da Socialdemocracia internacional, que ganhou volume e extensão com a destruição da III Internacional sob a bota do stalinismo, permitiu que as burguesias imperialistas se aventurassem na Segunda Grande Guerra.
Novamente, o imperialismo perdeu territórios, agora na ordem de 1/3 do Mapa Mundi que deixou de ser capitalista.
O imperialismo aprendeu com as Guerras Mundiais e as revoluções. Aprendeu que não sobreviveria a uma Terceira Guerra Mundial. Isto obrigou a subordinação das diversas burguesias dos países imperialistas ao chefe maior: o imperialismo norte-americano.
A frase do Lênin citada no subtítulo acima significa que o imperialismo, por si só, com toda sua maquinaria de exploração e de guerras não é capaz de ganhar uma guerra, como mostra o Iraque e o Afeganistão, nos anos 2000, ou como já tinha mostrado no Vietnã, na década de 1960.
Ele só sobrevive porque se apoia em determinados setores da classe burguesa local, nos países coloniais e semicoloniais, e corrompendo uma minoria da classe trabalhadora, através de altos salários ou, diretamente, pela corrupção dos líderes, através dos postos sindicais e parlamentares.
Desta forma, conseguiu cooptar a direção marxista de massas do início do Século XX, a socialdemocracia europeia e o stalinismo, que durante 60 anos traiu dezenas de revoluções em todo o mundo e realizou a grande traição no Pós-Segunda Guerra, evitando a revolução socialista em toda a Europa.
A história deu razão a Trotsky, infelizmente, pela negativa: o stalinismo levou 1/3 da humanidade de volta ao capitalismo e, pior, na condição de semicolônias.
A trajetória do PT no Brasil, de Evo Morales na Bolívia, da Frente Sandinista na Nicarágua, de Chávez na Venezuela entre tantos outros, demonstra que não é possível mudar o capitalismo pela via morta do parlamentarismo e de gerenciamento do capitalismo desde os governos ‘reformistas’ ou ‘nacionalistas’.
Agora, na atualidade, com um início de ruptura das massas com estes governos “populares” e a esquerdização paulatina da classe trabalhadora, novas correntes começam a crescer eleitoralmente como o Syriza na Europa. Infelizmente, essas novas direções anticapitalistas já nascem com todos os defeitos da socialdemocracia (cuja estratégia é reformar o capitalismo pela via da democracia burguesa) sem ter, contudo, suas virtudes (partidos combativos de alta composição operária).
O imperialismo é a fase ‘decadente’ do capitalismo?
A maioria dos estudiosos da economia mundial recusa essa parte da teoria do Imperialismo.
Apoiam-se no grande desenvolvimento da técnica, especialmente na revolução provocada pelo surgimento dos computadores, que abriu um novo ramo produtivo mundial.
Estes estudiosos cometem um erro importante: entendem o desenvolvimento das forças produtivas como o desenvolvimento da técnica. Não entendem que as forças produtivas são compostas pelo homem, pela natureza e pela técnica.
Vistas no seu conjunto, as forças produtivas da humanidade estão sendo constrangidas, sufocadas e destruídas. Essa afirmativa ficará mais clara dentro de uma década.
Até aí, veremos esta grave crise econômica, que se iniciou em 2008, desenvolver-se como ela, de fato, é: a terceira grande depressão que a economia capitalista já conheceu.
Como esta crise, só existiram duas anteriores: a que ocorreu entre 1873 e 1895, que durou 22 anos ea que ocorreu entre 1914 e 1939, durante 25 anos.
A primeira deu origem ao imperialismo, a segunda quase levou o mundo à destruição e/ou revolução mundial e a terceira, iniciada em 2008, desatou uma depressão econômica que ainda está ganhando contornos precisos.
A primeira crise depressiva foi analisada por Engels que a denominou de “crise crônica”, “estado crônico de estagnação em todos os ramos dominantes da indústria”.
Essa longa estagnação que teremos nas próximas décadas trará consigo guerras, recolonização dos países pobres, crises e revoluções que preparam as condições da destruição do imperialismo.
Na aparência, esta crise depressiva não se assemelha às duas anteriores, que foram devastadoras, com quebra de 25% da produção de riquezas nos países ricos, desemprego massivo e falências generalizadas.
Porém, a diferença não reside na natureza destas três crises, mas na ‘solução’ que a burguesia deu. Em 1930 a burguesia permitiu a quebra de bancos e empresas de forma generalizada. Hoje não poderia fazer isto, já que os bancos, fundidos com suas multinacionais através do capital financeiro, são “grandes demais para falir” e quebraria o sistema capitalista mundial.
A solução foi injetar dinheiro público na economia, empurrando com a barriga o problema. Os governos injetaram US$ 25 trilhões para “irrigar” as veias do capitalismo mundial, evitando o colapso, porém, transformou a crise numa longa estagnação, que terá picos de queda forte e algumas recuperações fracas.
Ademais, o imperialismo desenvolve cada vez mais seu caráter especulativo: segundo o BIS, existem operações em derivativos (apostas futuras) no valor de mais US$ 600 trilhões, mais de 7 vezes toda a produção de riqueza anual do planeta.
Toda a montanha de papel fictício, montanhas de dívidas e supervalorização de ações, apostas especulativas, tudo isto vai desinflar nas próximas décadas, se ajustando à produção de riqueza real da economia mundial.
O imperialismo está desatando um furioso ataque às condições de vida da humanidade para recuperar suas taxas de lucro e começar um novo período de crescimento econômico. Essa guerra social e colonial vai dar a tônica nas próximas décadas.
Serão 20 anos de destruição das forças produtivas para poder retomar uma nova fase de crescimento capitalista. Aqui se demonstra a cara decadente do imperialismo: cresce, destruindo.
O melhor exemplo dessa afirmação é o caso da GM. O governo Obama, ao invés de estatizar a empresa falida, fechou 18 complexos industriais nos Estados Unidos, demitiu 37 mil trabalhadores e rebaixou os salários. Além disso, o governo Obama assumiu (junto com o Sindicato), a dívida de US$ 160 bilhões da GM. Portanto, socializou o prejuízo e privatizou o lucro.
Nunca a célebre frase de Karl Marx, no Manifesto Comunista, se mostrou tão correta: “O governo moderno não é senão um comitê para gerir o conjunto dos negócios da classe burguesa”.[19]
O imperialismo, na sua decadência, apresenta uma tendência de gerar ilhas de riqueza e alta produtividade incrustradas em um mar de miséria, degradação do ser humano e do meio ambiente.
Segundo a OIT, existem 246 milhões de crianças que trabalham, sendo dezenas de milhões em condições de escravidão.
Conclusão:
A partir da elaboração da teoria do Imperialismo, Lênin deixou de fazer uma separação tajante entre a revolução democrática (burguesa) e a revolução socialista (operária) e terminou ligando-as no processo histórico, onde as revoluções anticoloniais se tornaram um prólogo da revolução mundial.
“A diferença econômica entre as colônias e os povos europeus consistia antes no fato de que as colônias eran arrastadas ao intercâmbio de mercadorias, mas à produção capitalista. O imperialismo mudou essa situação. O imperialismo é, entre outras coisas, a exportação de capital. A produção capitalista se transplanta com crescente rapidez para as colônias. É impossível arrancá-las da dependência do capital financeiro europeu… a separação das colônias é realizável, como regra geral, apenas com o socialismo; com o capitalismo, essa separação é realizável a título de exceção ou mediante uma série de revoluções e inssurreições tanto nas colônias como nas metrópoles.”[1]
[1] Lenin, Obras Completas, tomoXXX, 1916, página 37, sublinhados no original por Lênin.Lênin sempre acreditou que as guerras abriam situações revolucionárias que provocam revoluções e que o imperialismo é a antessala da revolução socialista mundial:
“Sobre la ruina mundial creada por la guerra, se agranda así la crisis revolucionaria mundial, que, por largas y duras que sean las peripecias que atraviese, no podrá terminar sino con la revolución proletaria y su victoria.” [21]
Trotsky, a quem coube formular a teoria da Revolução Permanente, complementou esta visão:
“La lucha por la independencia nacional de las colonias es, desde el punto de vista del proletariado, sólo una etapa transicional en el camino que llevará a los países atrasados a la revolución socialista internacional. La Cuarta Internacional no establece compartimientos estancos entre los países atrasados y los avanzados, entre las revoluciones democráticas y las socialistas. Las combina y las subordina a la lucha mundial de los oprimidos contra los opresores. Así como la única fuerza genuinamente revolucionaria de nuestra época es el proletariado internacional, el único programa con el que realmente se liquidará toda opresión, social y nacional, es el programa de la revolución permanente.”[22]
O imperialismo, navegando as contradições gigantescas do planeta, busca salvar-se utilizando a seu favor as desigualdades da economia mundial e ir respirando, entre uma crise e outra.
Na China está sua salvação (no boom que já dura 15 anos) e sua desgraça (quando estourar a crise, dentro de alguns anos). Provavelmente, quando a China entrar em recessão, a estagnação mundial vai se tornar uma longa depressão, se antes o imperialismo não conseguir derrotar o proletariado mundial.
Os Estados Unidos empurram com a barriga para evitar a debacle. Queimar capital, fechar fábricas, gerar desemprego massivo e quebrar países inteiros, que vão perder peso no sistema mundial de Estados, como está ocorrendo agora com Portugal e Grécia. Os países imperialistas diminuem em número (ficando praticamente EUA, Alemanha, França, Japão e Inglaterra), mesmo assim, com grandes extensões territoriais e populacionais pobres no seu interior: manchas de pobreza – ou de imigração – em ilhas de prosperidade.
Do ponto de vista dos monopólios, está se configurando uma economia mundial onde duas ou três grandes empresas dominam cada ramo e subordina uma parte da média e pequena propriedade (quebrando o restante como supérfluos), terceirizando e precarizando a produção.
Assim, teremos uma ‘aristocracia operária’ reduzida na empresa-mãe e um mar de terceirizados, sem papéis e sem direitos, produzindo em todo o mundo para dois ou três oligopólios, que dominam cada ramo produtivo mundial.