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sexta-feira, abril 19, 2024

O MST abandona o morenismo

À beira do abismo… Um passo à frente para o Secretariado Unificado (SU)
 
Entre os dias 8 e 11 de março realizou-se o 8º Congresso do MST[1]. A novidade mais importante foi a ratificação de um protocolo para a “unificação e confluência” com o “setor do trotskismo proveniente do mandelismo no campo da IV” (em seu jornal A.S. 15/3/12).
 
No mesmo artigo destaca-se a participação de João Machado, dirigente do PSOL do Brasil e da autoproclamada “IV Internacional” (Secretariado Unificado) nas deliberações. O MST dá assim um passo decisivo em sua ruptura com o “morenismo”, integrando-se ao agrupamento internacional que o próprio Nahuel Moreno definiu como o “centro do revisionismo” – do abandono dos princípios revolucionários no trotskismo – e cujas posições se dedicou a combater uma boa parte de sua vida.
 
Desde estas páginas queremos dirigir-nos àqueles camaradas que foram parte do MST e a muitos que ainda integram suas fileiras, que continuam reivindicando-se morenistas e defendendo os princípios de nossa corrente histórica, a todos os que diante deste novo salto no abandono dos princípios revolucionários se questionam quais são os motivos e o que fazer, para propor-lhes abrir um diálogo comum.
 
A unidade dos revolucionários? Com quem?
 
No ato de homenagem a Nahuel Moreno que organizaram, Alejandro Bodart, principal dirigente e legislador do MST, apelou a supostos ensinamentos do fundador de nossa corrente e de Leon Trotsky para justificar sua integração ao SU. Segundo Bodart, “o MST estaria elevando à prática uma política de unidade internacional dos revolucionários” ao integrar-se à corrente mandelista. O que há de verdadeiro nisso?
 
Ernest Mandel surge como um dos principais teóricos e dirigentes da IV Internacional depois da morte de Trotsky e o fim da 2º Guerra Mundial. Junto com Michel Pablo serão responsáveis por orientações desastrosas que levaram, por exemplo, à traição da Revolução Boliviana de 1952. Posteriormente Mandel, à frente já do SU da IV, vai impulsionar a capitulação a todas as direções nacionalistas e pequeno-burguesas surgidas no pós-guerra, desde a FLN argelina, à FSLN nicaraguense, passando pela direção castrista e Kadafi, considerando-as todas, direções “revolucionárias”. Em seus últimos anos apoiou o próprio Gorbachov na ex-URSS, o impulsionador da restauração capitalista nesse país, a quem considerava como parte da ala “progressiva” da burocracia soviética.
 
Os atuais dirigentes desta corrente são fiéis discípulos de seu mestre. A partir da queda da União Soviética, tiraram a conclusão de que a perspectiva revolucionária tinha desaparecido, e que a luta pelo socialismo, pela tomada do poder pela classe operária, se perdia em um futuro longínquo. A partir disso, começaram a atirar pela janela toda a bagagem programática e política do leninismo e do trotskismo.
 
A LCR francesa, sua seção mais importante eliminou de seu programa a “ditadura do proletariado” em 2005 e depois dissolveu sua organização no Novo Partido Anticapitalista (NPA), uma organização “ampla” com setores reformistas, abandonando a luta pela revolução socialista. Em Portugal, o Bloco de Esquerda dirigido pelo mandelismo, apoiou nas últimas eleições o candidato do PS, partido que, no governo, aplicou um brutal ajuste contra os trabalhadores, propõe a renegociação da dívida dos banqueiros, e seus deputados votaram as medidas de ajuste da UE à Grécia. No Brasil sua corrente DS[2], integrou o governo de frente popular de Lula em 2003, à frente do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Não menos vergonhoso é o apoio do SU às intervenções “humanitárias” do imperialismo, primeiro no Timor, depois no Iraque e recentemente na Líbia, onde Gilbert Achcar, um intelectual libanês ligado a essa corrente, encabeçou “a partir da esquerda” o apoio à intervenção da OTAN, chegando a afirmar que “era moral e politicamente um erro, por parte da esquerda, opor-se à zona de exclusão aérea”[3].
 
Finalmente no último Congresso do SU (2010), do qual participou como convidado o MST, se ratificou “a necessidade de impulsionar partidos anticapitalistas”[4] ao estilo do NPA em todo o mundo. O MST, por sua vez, deixou claro ali qual é sua proposta para a construção de uma nova internacional: “algum tipo de coordenação ou federação que concentre diferentes setores, seria um polo importante para atuar com mais força sobre a realidade mundial”.[5]  
 
As razões deste curso
 
O MST surgiu em 1992 como uma das correntes em que se cindiu o velho MAS e a própria LIT-QI, fortes organizações revolucionárias que Moreno tinha ajudado a fundar e construir e que se dividiu alguns anos após sua morte.
 
Nós achamos que o longo curso que termina com esta integração do MST ao SU tem suas origens em desvios que foram se aprofundando ao longo dos anos e que é parte do debate que queremos fazer com aqueles companheiros que não estão dispostos a acompanhar este passo.
 
Este agudo giro teve sua última expressão em 2011 com a integração formal do MST ao Projeto Sul, uma frente patronal de conciliação de classes com um programa de centro-esquerda. Pela primeira vez em nosso país, um partido trotskista que se reivindica, além do mais, “morenista”, abandona a luta pela independência de classe em favor de construir uma “ferramenta ampla” para lutar por uma “franja de massas”. No entanto, a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) – do qual o PSTU/Argentina é parte – superou em suas votações o Projeto Sul, que por sua vez se esfacelou, arrastando na queda esse argumento.
 
Mas neste curso o MST não esteve sozinho. Os demais grupos de sua corrente internacional chegaram inclusive ir mais longe. Tal é o caso de Marea Socialista que integra o PSUV, o partido de Chávez na Venezuela, assim como La Lucha Continúa do Peru, integrante do Partido Nacionalista Peruano do atual presidente Ollanta Humala ou o MES que coletou fundos entre os empresários para a última campanha eleitoral do PSOL no Rio Grande do Sul.
 
Em defesa do morenismo, em defesa do trotskismo
 
{module Propaganda 30 anos}Nahuel Moreno dedicou seus maiores esforços à construção de uma internacional revolucionária e assim como Trotsky a considerava sua tarefa mais importante. Por isso nossa corrente foi parte desde o início dos diferentes processos de reagrupamento para a reconstrução da IV Internacional.
 
No entanto, nossa participação sempre foi crítica, lutando contra as posições revisionistas de Pablo e Mandel, majoritárias lamentavelmente na internacional. Em 1979 quando nossos companheiros da Brigada Simón Bolivar foram torturados e expulsos por ordem do governo sandinista, por tentar organizar sindicatos e um partido revolucionário na Nicarágua, a direção do SU se negou a defendê-los. Já não se tratava então de diferenças políticas, mas de um gravíssimo problema moral e de princípios. Isso precipitou a ruptura, e depois de uma frustrada tentativa de unificação com a corrente de Pierre Lambert, este processo culminou na fundação da LIT-QI em 1982, nossa organização internacional que comemora este ano seus 30 anos de existência.
 
Esta é a verdadeira história do morenismo, que nada tem a ver com o impulso a “alternativas amplas” nem “coordenações internacionais” com correntes oportunistas. Trata-se de décadas de luta consequente por construir partidos revolucionários fortemente enraizados na classe operária, flexíveis em suas táticas e formas organizativas, mas firmes na defesa dos princípios, da teoria, do programa e da moral revolucionária. E também de uma Internacional e partidos organizados em base ao centralismo democrático, tal como também propunha Trotsky. Exatamente o oposto da caricatura grotesca que fez Bodart no ato mencionado, tratando de “vender gato por lebre”.
 
Esta luta e trajetória do morenismo é a que hoje continuamos na LIT, que depois de superar sua gravíssima crise, rearmou-se teórica e programaticamente. E conquistou dinâmicos avanços com a incorporação nos últimos anos do PdAC (Partido de Alternativa Comunista) da Itália, proveniente da Refundação Comunista, a recente fundação de uma nova seção em Portugal, o MAS (Movimento Alternativa Socialista), com companheiros que romperam com o Bloco de Esquerda ou o desenvolvimento de Corriente Roja na Espanha. Mas a LIT também cresceu pela reincorporação de partidos e grupos morenistas que haviam se afastado nos últimos anos como o PST Colombiano ou mais recentemente o PST de Honduras, entre outros. A própria fundação do PSTU como seção argentina é parte desse processo, no qual temos reagrupado quadros e militantes morenistas de diferentes trajetórias.
 
Hoje a LIT e o PSTU/Argentina são organizações a serviço de construir a direção revolucionária que permita dar uma saída operária e socialista à crise capitalista. A partir destas páginas convocamos a todos os companheiros que querem continuar esta luta pela reconstrução de um grande partido e uma internacional revolucionária a que abramos um diálogo juntos e a dar a batalha comum por esta tarefa.
 
 
Tradução: Érika Andreassy



[1]MST – Movimento Socialista dos Trabalhadores – principal partido do que era a Tendência Morenista que rompeu com a LIT em 1992. No Brasil: MES

[2] Democracia Socialista, corrente interna do PT;

[3] Achcar Gilbert, Um debate legítimo e necessário desde uma óptica antiimperialista, 2011;

[4] Sergio García, XVI Congresso do Secretariado Unificado (IV Internacional)http://www.mst.org.ar/nova/?p=11310 (consultado 09/04/12);

[5] Idem

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