A renúncia de Juan Carlos Monedero, cofundador e um dos ideólogos de Podemos, ocorre em um momento em que esta organização gira cada vez mais à direita e elimina todo vestígio de
democracia interna. Reproduzimos um artigo publicado recentemente por Corriente Roja da Espanha.
democracia interna. Reproduzimos um artigo publicado recentemente por Corriente Roja da Espanha.
Em seu empenho por apresentar-se como um ator político "confiável", capaz de formar um governo que não ataque os nervos dos poderes econômicos, a direção de Podemos não cessa de transformar suas propostas originais, ao mesmo tempo em que burocratiza o funcionamento do partido.
Enquanto se celebrava (com a presença de Miguel Urbán, de Podemos) um ato republicano no Parlamento Europeu com deputados que haviam se negado a receber ao rei, Pablo Iglesias acudia sorridente a cumprimentar o monarca e inclusive lhe dava um presente. A recepção real celebrou o dia 15 de abril, exatamente depois das manifestações e atos republicanos que percorreram cidades e municípios do Estado e das quais Podemos não participou.
Em Madrid, o candidato de Podemos à Comunidade declarou não contrapor-se à educação concertada[1]. Podemos apareceu na vida política como a força que levaria às instituições, as reivindicações que os movimentos sociais haviam levantado durante esses anos de mobilizações. Agora dá as costas aos milhares e milhares de estudantes, professores e pais que gritaram nas manifestações e greves: “Nada, nada, nada/para a privada!” (Para a educação privada).
Também nestas últimas semanas, os principais dirigentes econômicos de Podemos se reuniram com fundos de investimentos e banqueiros internacionais como o “Bank of America–Merryl Lynch”, um gigante financeiro estadunidense. Segundo alega a imprensa, a reunião foi para explicar-lhes diretamente as propostas econômicas de Podemos e para “escutar suas preocupações”. Umas semanas antes, em fins de janeiro, o secretário geral de Podemos – Madrid, Jesús Montero, declarava: "Há duas culturas empresariais. Uma é casta; a outra quer contribuir com o bem estar social como a família Botín, do Banco Santander”.
Esta inversão de Podemos é justo o que não pode fazer quem quer ser uma opção política de ruptura, que aspira representar os movimentos sociais e o “sentido comum” das lutas destes anos. Se Podemos se apresenta como uma opção de ruptura democrática com o “regime de 78”, não pode dar presentinhos ao rei e dar as costas à luta pela república. Nem negar-se à convocatória de um referendum de autodeterminação para que a Catalunha decida seu futuro nacional. Se Podemos quer ser a voz das massas, não pode defender a educação concertada. Se Podemos quer estar com as famílias despejadas, não pode congratular-se com os banqueiros da família Botín, nem "escutar as preocupações" dos fundos de investimentos.
Muita gente de Podemos não compartilha com este desvio e exige uma retificação do rumo. O melhor exemplo é “Andaluzia pela base”, a corrente que se levantou com um programa de ruptura e reivindica a volta ao programa fundacional do manifesto "Mover Ficha", e que as decisões e o controle de Podemos se exerçam democraticamente desde suas próprias bases.
Não revertendo este curso, a direção de Podemos levará ao desengano a todos aqueles que lhe viam como uma ferramenta para terminar com o bipartidarismo e abrir caminho às mudanças sociais; transformará Podemos em um PSOE-2 e ajudará a recomposição da direita. A grande tarefa é tirar o PP e ganhar a maioria para realizar, apoiados na mobilização social, um programa de mudanças profundas que dê solução aos principais problemas dos trabalhadores e do povo. Não valem as considerações e compromissos eleitorais.
[1] Uma ‘escola concertada’ é uma escola privada com cursos subsidiados por fundos públicos, ou seja, a sua titularidade e sua gestão são privadas, mas funciona graças à subvenção e financiamento do Estado.