qui mar 28, 2024
quinta-feira, março 28, 2024

Paraguai | Balanço político 2019

Termina um ano difícil para o governo. No começo, parecia estar estabelecido com integrantes leais e acordos com a oposição que garantiriam certa governabilidade, sem depender da oposição cartista contra quem tinha tido  confronto altamente polarizado. 
Por: PT-Paraguai
O presente artigo, de maneira sintética, pretende estabelecer os eixos centrais que explicam a situação do governo, a dinâmica da política superestrutural e a situação do movimento, a correlação de forças e suas perspectivas.
Quatro momentos do ano para o governo
Podemos estabelecer quatro momentos do governo de Abdo Benítez no ano: uma primeira etapa de acomodação no aparato estatal e de fortes disputas com o cartismo que vinham da  feroz disputa eleitoral; um segundo momento em que, dada a combinação de uma situação de crise econômica e a virulência de confrontos intrapartidários, ele procurava acordo com o cartismo para uma saída conveniente para ambas as facções; um terceiro momento em que ele entrou em uma terrível crise política, com o escândalo do acordo bilateral de Itaipu, do qual foi salvo de um julgamento político pelo cartismo, a partir do qual esse setor tentou se relocalizar e condicionar o governo; e, um quarto momento em que, em resposta às chantagens do cartismo – em aliança com o governo Bolsonaro e com o apoio da embaixada americana – ele abaixou o dedo para o patrão com a prisão de Messer e o processo do próprio Cartes, oxigenando-se assim, por várias vezes, um governo débil.
Uma crise econômica que está se aprofundando
A todos esses momentos é preciso acrescentar como elemento transversal a crise econômica recessiva que se sentiu desde o início do ano e que continuou durante o ano com maior intensidade. Alguns economistas dizem que no próximo ano haverá uma recuperação de pelo menos 4%, os mais otimistas consideram que poderia ser mantido e até aumentar nos anos seguintes, a depender da orientação política do governo em relação à política externa. Os mais cautelosos falam que a recuperação é um produto do que eles chamam de efeito rebote da crise e que devemos ver como os mercados se comportam para ver sua sustentabilidade.
Embora o aspecto econômico mereça uma análise mais completa, a interpretação da situação da economia deve ser analisada a partir do contexto mais geral em que a configuração dos atritos interimperialistas e suas decantações se enquadram: conflitos geopolíticos e guerra comercial.
Essa nova crise do capitalismo mundial aberta desde 2008 não será encerrada sem continuar deteriorando a vida de milhões de pessoas e o meio ambiente. E de forma imediata, para o nosso país, a política de submissão completa à orientação do governo Trump implica a restrição dos mercados para as commodities. Além disso, é necessário levar em conta não apenas as perdas que os incêndios florestais representaram para o negócio agropecuário em comparação com os lucros obtidos em 2018, mas também as reivindicações desses setores burgueses em relação à política tributária do governo, cuja arrecadação é muito pequena em comparação com seus ganhos.
A recuperação nos termos macroeconômicos mencionados não é apenas relativa ao exposto, mas também que esses itens não têm um impacto significativo para a redistribuição dos lucros, começando pela natureza do modelo produtivo, pela baixa carga tributária e porque os lucros escapam para o exterior. Ou seja, os ricos deste setor praticamente não pagam impostos, não geram emprego e com seus enormes lucros especulam financeiramente, enquanto a maior parte da carga tributária é suportada pelos trabalhadores.
Como o governo se sustenta, apesar de sua fraqueza?
O governo ainda está de pé devido a uma combinação de fatores como: 1) Não houve um “acordo” entre as forças que queriam derrubá-lo, especialmente o cartismo, sobre a localização que cada um ocuparia no caso de uma situação de substituição de Abdo , descartada essa possibilidade seu principal inimigo jogou com a tática de desgastá-lo de várias maneiras; 2) Porque os trabalhadores ainda não conseguiram tomar as ruas com toda a raiva contida para derrubar o governo; 3) Por não haver alternativa que canalize o descontentamento e, os espaços de articulação existentes caracterizam-se por ainda serem muito fracos, portadores de um sectarismo doentio ou por terem um descrédito que apenas gera desconfiança; 4) A grande burguesia hesita sem saber qual caminho seguir, porque as alternativas podem trazer mais caos, como exemplo do que acontece no Chile e em outros lugares; além disso, há atritos entre suas frações que não nos permitem propor uma saída acordada e, finalmente; 5) Porque o imperialismo com seus governos fantoches na região continua dando-lhe algum crédito político por sua servidão e serviços.
A reação ainda lenta da classe trabalhadora
Apesar da raiva acumulada, o movimento ainda continua lento e sem um ponto de referência para a organização. Embora tenha acontecido uma série de ações ao longo do ano contra medidas governamentais, elas continuam reduzidas a lutas setoriais caracterizadas pela debilidade e por sua descontinuidade. Não há espaço de canalização do descontentamento, mas sim expressões isoladas de raiva que não conseguem encontrar uma plataforma que impulsione grandes mobilizações.
Os setores que se mobilizaram tinham reivindicações específicas, reduzidas ao local de trabalho, alguns ampliam para o setorial e poucos apontam para questões mais gerais. No entanto, o investimento no slogan da campanha presidencial – Marito contra o povo – começou a penetrar, mas sem conseguir estimular ações e mobilizações conjuntas.
Houve mobilizações de vários setores: de enfermeiras com ampliação significativa à médicos, segurados e afetados pela negociação do IPS, de camponeses do setor de erva mate ou do multissetorial, greve no Hospital das Clínicas, mobilizações de seguranças, entre outros. Também houve manifestações de baixa intensidade a favor das “lutas de Payo” que expressam, em vez de simpatia pelo personagem em questão, a raiva do povo contra o Congresso Nacional.
Um elemento comum a todas as ações, com maior ou menor ênfase, é o combate à corrupção, tirar os corruptos do caminho, como aconteceu em um primeiro estágio. Para o povo, a varredura pode continuar e isso foi demonstrado pela demissão de vários corruptos ou pela derrota dos colorados no CdE, entre vários outros acontecimentos.
As mobilizações mais importantes devido à sua natureza política foram realizadas após o escândalo da política de entreguista do governo com a assinatura do ato bilateral com o governo subimperialista de Bolsonaro. O recuo dessas mobilizações veio do fato de que o cartismo salvou Abdo do julgamento político e, consequentemente, não havia mais a possibilidade de sua destituição.
Uma nova traição sem grandes repercussões
Infelizmente, não foi necessário outro Joselo para fechar o ano com a assinatura de um acordo bastante semelhante em relação às desvantagens na contratação de energia de Itipú. Foi estabelecido um cronograma até 2022, descartando a possibilidade de acordos anuais como estavam sendo feitos (o que é mais vantajoso para o nosso país). Foi feito um cálculo bem acima do crescimento vegetativo de nossa demanda de eletricidade e foi concedida uma margem maior se precisarmos contratar mais.
Ou seja, não poderemos contratar menos da energia comprometida a ser utilizada (energia garantida) e, se não usarmos toda essa quantidade de energia contratada, não poderemos acessar a energia não contratada ou também denominada não segura ou excedente – que é mais barata – e como consequência a taxa aumentará. A política entreguista continuará sendo a orientação deste governo no caminho à 2023 para a negociação do Anexo C.
 Em busca de uma saída
Os setores de trabalhadores urbanos organizados continuam tentando encontrar o caminho que fortaleça suas demandas, sem que haja progresso até o momento para atacar as políticas governamentais. No setor privado, as coisas permanecem muito mais lentas. Isso se deve em grande parte à ditadura dominante da patronal, expressa na violação arbitrária dos direitos trabalhistas e à impunidade que eles desfrutam de tornar regra a falta de liberdade sindical.
No setor público, a primeira mobilização importante do ano aconteceu como reação à proposta de modificação da Lei 1626, que buscava ampliar a estabilidade do emprego para 10 anos. Esse projeto impulsionado pelo PPQ teve uma boa resposta nas ruas. As centrais mais combativas alcançaram um destaque importante e aproveitaram a presença da Coordenação Intersetorial Nacional nas ruas para realizar uma unidade de ação, além da expressão de solidariedade para com ambas as lutas.
Outra importante reação de setores da classe se deu frente ao PGN 2020. Nesse sentido, foram significativas as lutas realizadas pelos professores, a greve organizada pelo SITRANDE e a greve dos funcionários do Ministério da Fazenda que obtiveram conquistas muito importantes.
 A desorganização ainda prevalece
A correlação de forças, embora ainda desfavorável à classe trabalhadora como um todo, não se deve a uma continuidade do contexto reacionária em que o governo de Cartes se estabeleceu. Ou seja, ainda que o caráter do regime do novo governo seja menos repressivo – devido à sua fraqueza – não foi possível reorganizar o movimento e ultrapassar o caráter defensivo das lutas, que teve no período anterior.
No período atual, houve avanços em termos de uma relativa maior disposição de mobilização em certos setores, sem alcançar unidades de ação em questões mais estruturais da classe trabalhadora. Não foi possível reverter a desorganização, atomização, cooptação e a burocratização como características da maioria das organizações e, como resultado, isso não permite uma agenda de mobilizações significativas e relevantes em torno dos interesses da classe como um todo.
A maioria das ações tiveram caráter setorial ou são aquelas de datas fixas que não passam de reivindicações simbólicas sem conseguir unidade de ação para fazer avançar o movimento de massas em direção à verdadeira independência política.
Durante o ano, a marca das mobilizações em geral continuou sendo dada pela “cidadania” em favor da transparência, em favor da institucionalidade, contra a desonestidade e o tráfico de influência judicial, contra a corrupção generalizada. Em geral, a agenda esteve abalizada pelos meios de comunicação de massas.
Apesar de suas limitações, essas ações podem servir no sentido de incentivar as ações do movimento em outras questões mais estruturais e de classe. No movimento operário e camponês continua a raiva contra a arbitrariedade por parte dos patrões, pelos despejos, a falta de mercado para pequenos produtores e a negligência do governo com a vida miserável dos trabalhadores. No entanto, as ações permanecem de baixa intensidade e sem o apoio dos setores médios, que olham com grande desconfiança por causa da influência dos ataques da imprensa burguesa, e às vezes justificados por ações da burocracia sindical.
Como está o governo hoje?
O governo de Abdo mantém sua característica de ser um governo débil, embora hoje esse caráter seja mais relativo se comparado a outros momentos. Esse caráter de maior fragilidade em relação ao governo de Cartes implica que ele tenha um caráter menos repressivo, vivenciado nos primeiros momentos em que procurou avidamente se diferenciar de seu principal inimigo.
No entanto, a agenda do governo em questões econômicas segue a mesma linha do que era o cartismo. Isso significa que políticas de austeridade e reformas (previdenciária e trabalhista) que não puderam ser aplicadas neste período estarão na agenda do ano que se inicia.
Perspectivas e desafios para a vanguarda
Ainda não se vislumbra nenhum levante significativo e imediato dos setores da classe trabalhadora organizada. Romper com a debilidade organizativa e de mobilização é o desafio. Isso exigirá um grande esforço dos setores de vanguarda, os mais avançados da classe trabalhadora, o que significa a discussão de uma agenda comum para ir à luta contra as políticas de ajuste deste governo.
O conjunto das organizações classistas e combativas de nossa classe como a esquerda revolucionária, devem se colocar à frente de maneira responsável para discutir o impulso à mobilização no âmbito de um programa de luta que coordene a mais ampla unidade de ação.
Tradução: Luana bonfante
 

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