qui abr 25, 2024
quinta-feira, abril 25, 2024

O governo do Syriza tira dinheiro dos hospitais para pagar a dívida

Após o acordo assinado em 20 de março entre o governo do Syriza e a agora chamada “comissão de Bruxelas” (nome “politicamente correto” com o qual foi rebatizada a antiga troika

formada pela União Europeia [UE], o Banco Central Europeu [BCE] e o FMI), está em curso uma nova rodada de negociações sobre a dívida externa grega. Mas, para que se concretize este novo “refinanciamento” (na verdade, apenas um movimento contábil), o governo grego deverá efetuar os pagamentos de juros que estão por vencer.

Para garantir esses pagamentos, o governo do Syriza aprovou no Parlamento uma duríssima lei de austeridade, que obriga todos os organismos estatais (de municípios até os hospitais) a colocar suas reservas de caixa à disposição do governo.

Esta lei já provocou uma rebelião dos municípios na reunião que tiveram com o vice-ministro das Finanças (1). E pode levar a uma greve dos trabalhadores dos hospitais, que seria a primeira contra o governo de Alexis Tsipras.

A esperança vai se transformando em pesadelo
 
Dessa forma, a esperança de mudança que o povo grego depositou no governo do Syriza vai rapidamente se transformando na continuação do pesadelo de empobrecimento e miséria crescente que o país vive já faz muitos anos.

O triunfo do Syriza foi um reflexo eleitoral distorcido da luta tenaz que os trabalhadores e o povo vêm travando todo esse período, marcada por 35 greves gerais e incontáveis mobilizações. Assim, desgastou os governos da Nova Democracia e do PASOK que, a serviço da troika, saquearam e quebraram o país. Ao levar o Syriza ao governo, mostraram que queriam uma profunda mudança dessa situação. Além disso, a vitória deste partido gerou muita simpatia e expectativas nos povos de todo o mundo.

Mas o Syriza foi rebaixando cada vez mais o seu programa. Em anos anteriores, falava da necessidade de “revogar o memorando” que atrela a Grécia ao imperialismo e de impulsionar uma “resistência europeia massiva.” Durante a recente campanha eleitoral já baixou o tom, mas manteve a promessa de “acabar com a austeridade”, aumentar os impostos sobre as empresas e os ricos e promover um Plano de Reconstrução Nacional. No mesmo dia de sua posse, o Syriza reduziu suas propostas de mudança a 11 medidas muito limitadas (que incluíam um aumento salarial de 586 a 751 euros, a paralisação das privatizações em curso e a revisão das privatizações anteriores), mas que, se tivessem sido aplicadas, significariam um pequeno alívio para o povo grego. Depois do acordo de 20 de março (em que capitulou à troika), até mesmo essas medidas foram deixadas de lado (já nem se fala do aumento de salários) e, em vez disso, tira dinheiro dos hospitais e outros serviços básicos para pagar a dívida externa.

Ao mesmo tempo, começaram a se manifestar os primeiros sintomas de uma crise no interior do Syriza, como a carta do eurodeputado Manolis Glezos (herói da resistência contra a ocupação nazista), que criticou duramente o acordo de março com a troika.

O governo do Syriza prepara outra capitulação na nova rodada de negociações em curso. É o que expressa a saída de Yanis Varufakis como chefe da equipe negociadora e sua substituição por Yorgos Juliarakis, que é visto como “mais moderado” e cuja nomeação foi considerada “muito positiva” pela Comissão Europeia.

Um governo burguês atípico
 
Para entender essa política, é necessário partir de algumas definições centrais. A primeira é o caráter de classe do atual governo grego. Um caráter que, de acordo com o marxismo, não pode ser definido pela ideologia ou pela origem de classe de seus membros, mas pelo caráter de classe do Estado que o governo administra e defende. De acordo com este critério, o do Syriza é, sem dúvida, um governo burguês sem nenhuma intenção de mudar o Estado capitalista da Grécia.

Por causa desse caráter, Alexis Tsipras não teve nenhum problema em fazer acordos e incorporar ao governo o partido burguês de direita ANEL (gregos independentes) ou em apoiar, no Parlamento, a eleição de Prokopis Pavlopoulos como presidente do país (representante da Nova Democracia, partido burguês de direita que o Syriza tinha acabado de derrotar nas eleições). Apesar de ser um cargo essencialmente protocolar, foi um sinal claro de que o seu governo não ia “virar a mesa.”

Este é um governo burguês “atípico” que denominamos de frente popular. Isto é, um governo em que o papel principal é assumido por organizações operárias ou pequeno-burguesas de esquerda, dirigentes do movimento de massas, que governam com setores minoritários da burguesia. Na verdade, o governo Syriza não é nenhuma novidade histórica: é a atualização de velhas fórmulas de governos de colaboração de classes, usadas muitas vezes no passado, especialmente em períodos de grande ascenso de massas, para tentar manobrar essa situação e derrotar o ascenso. Só que, agora, o lugar que antes os partidos socialdemocratas ou os velhos partidos comunistas ocupavam nos governos é ocupado por novas formações como o Syriza (ou aqueles que aspiram a esse papel, como o Podemos na Espanha).

Esse caráter atípico faz com que, por um lado, as massas vejam esse governo como “seu” e, portanto, é necessário que façam sua experiência com ele. Por outro lado, não é o governo que o imperialismo e a burguesia nacional preferem e vão buscar voltar a um governo burguês “normal” de seus partidos tradicionais. Mas, enquanto não conseguem, eles toleram e aproveitam esse governo para que faça o “trabalho sujo”.

Um país semicolonial
 
A segunda definição é que a Grécia é um país semicolonial. Ou seja, é um país com pactos políticos e econômicos que o subordinam ao imperialismo, como se expressa no caráter do seu pertencimento à UE e à zona do euro (que significou, por exemplo, a destruição de sua principal indústria: estaleiros navais) ou por meio da dívida externa e suas consequências (os sacrifícios para pagá-la e a supervisão permanente de sua política econômica). Em sua subordinação ao imperialismo, a situação grega é semelhante a dos países latino-americanos. As políticas impostas à Grécia afundaram o país e vão continuar a afundá-la ainda mais, como fizeram com todos os países que se submetem aos ditames do FMI e dos grandes credores internacionais.

Por isso, a resposta da troika, especialmente da liderança da UE (o imperialismo alemão), longe de mostrar “clemência”, é tão dura e sem nenhuma concessão. Por causa da crise na UE, precisam mostrar a Grécia e o governo do Syriza derrotados e de joelhos, para que não haja um “mau exemplo” de novos experimentos eleitorais, um pouco “rebeldes”, que possam se estender para outros países como Portugal, Espanha e inclusive Itália.

O governo do Syriza, diante da disjuntiva de responder às aspirações do povo grego ou capitular à troika, optou por este último caminho da capitulação. Assim, fica comprovado que todo governo que não rompe com a burguesia e o imperialismo acaba sendo (mais cedo do que tarde) instrumento do capital financeiro.

Qual deve ser a política dos revolucionários em relação ao governo do Syriza?
 
A LIT-QI apoiou a luta do povo grego contra os governos do PASOK e da Nova Democracia. Chamamos a votar criticamente no Syriza para acompanhar e acelerar a experiência dos trabalhadores e das massas.

Agora, diante do caráter burguês do governo do Syriza, estamos em uma oposição de esquerda e de classe em relação a ele. O nosso apoio e solidariedade com a luta e as aspirações de libertação dos trabalhadores e do povo grego continuam sendo incondicionais. Isso significa não dar qualquer apoio ao governo que as está traindo. Fazemos um chamado a  não depositar nenhuma confiança neste governo e denunciamos cada uma de suas capitulações.

Ao mesmo tempo, exigimos que o governo aumente imediatamente os salários e revogue as privatizações, como prometeu durante a campanha eleitoral. Centralmente, exigimos que rompa com o imperialismo e a burguesia grega como única maneira de salvar a Grécia do desastre. Por isso, alentamos a mobilização independente dos trabalhadores e das massas, no caminho que pode começar a ser apontado pela greve dos trabalhadores dos hospitais.

Acreditamos que a tarefa imediata na Grécia é organizar a oposição operária e popular para enfrentar o governo. Esta é a única possibilidade de construir uma alternativa rumo a um verdadeiro governo dos trabalhadores e do povo, baseado em suas organizações democráticas, que rompa com o capitalismo.

Na Europa, afirmamos que a solidariedade com os trabalhadores e o povo grego deve ser expressa essencialmente em mobilizações para exigir dos governos europeus a anulação da dívida externa da Grécia.

Também exigimos do governo alemão que pague os 278 bilhões de euros relativos aos empréstimos compulsórios que os nazistas impuseram à Grécia durante a ocupação do país, na Segunda Guerra Mundial, e as reparações por danos causados pela ocupação.

A situação da Grécia e de outros países revela o verdadeiro caráter da UE, a serviço das potências imperialistas europeias, principalmente a Alemanha. Isso mostra que, sem deixar de pagar a dívida externa e romper com o euro, esses países vão afundar cada vez mais na pobreza e decadência. Finalmente, mostra que a UE deve ser destruída pela luta dos trabalhadores e das massas, e substituída por uma união dos trabalhadores e dos povos, uma União Europeia de Países Socialistas.

Nota:
1. http://www.elconfidencial.com/mundo/2015-04-24/syriza-exprime-a-grecia-en-busca-de-liquidez_765488/

Confira nossos outros conteúdos

Artigos mais populares