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sexta-feira, março 29, 2024

Verdade, justiça e punição

Semproni não é o único traidor

 “Que ninguém duvide que estamos lutando para revogar a Lei de Caducidade1”, disse Victor Semproni em sua intervenção e se retirou da Câmara dos Deputados para que o projeto que anularia os quatro primeiros artigos desta lei não fosse aprovado.

A atitude de Semproni, qualificada como traição por muitos de seus companheiros da Frente Ampla ontem na mobilização em frente ao Palácio, não é uma atitude isolada entre os dirigentes desta organização.

Semproni não fez mais do que seguir o que lhe aconselharam os máximos dirigentes da Frente Ampla: Mujica2, Astori e Vázquez, que chamaram a não votar no projeto, como haviam feito Jorge Saravia e Fernández Huidobro, todos com o mesmo argumento: “que faria mal ao país, que era inconstitucional ou que passava por cima de dois plebiscitos”.

Quem faz o jogo da direita?

Os mesmos argumentos que estes dirigentes da Frente Ampla usaram para não avançar contra a impunidade foram os usados por Bordaberry, Lacalle, Batlle, Sanguinetti e Larrañaga3. E esta postura em relação aos Direitos Humanos, como em tantas outras, deixou claro quem realmente “faz o jogo da direita”.

Por que a cúpula da Frente Ampla chamou a não votar contra a impunidade?

O que preocupa os máximos dirigentes da Frente Ampla não é a inconstitucionalidade da Lei nem os plebiscitos. O que querem, assim como os partidos Blanco e Colorado, é continuar cumprindo com pactos feitos com os militares no fim da ditadura, como o Pacto do Clube Naval e outros “acordos”, que hoje são reconhecidos publicamente por alguns dirigentes. Neles, foi acordado com as Forças Armadas golpistas que não seriam presos e essa é a verdadeira razão de fundo do que está passando com os Direitos Humanos.

Além disso, as Forças Armadas são o pilar fundamental do sistema capitalista, em que as multinacionais e os grandes proprietários fazem seus grandes negócios e os trabalhadores recebem as migalhas. Os militares são necessários para esses dirigentes que governam para os ricos, precisam deles para calar os protestos, para reprimir os trabalhadores, os jovens e os pobres. As ações policias nos bairros mais carentes devem ser vistas como um espelho; da mesma forma, usarão o aparato repressivo contra os trabalhadores e os jovens quando sairmos massivamente para protestar. Esta é a defesa extremada da “reconciliação” com as Forças Armadas feita pela Frente Ampla, o Partido Blanco e o Colorado e para não julgar e punir todos os assassinos, torturadores e violadores. Poderão mandar alguns para a prisão, mas tentarão manter livre a maioria dos que violaram os Direitos Humanos.

Estas são as mesmas Forças Armadas da ditadura

Um exemplo de que estas Forças Armadas são as mesmas da ditadura foi o ato de reivindicação do terrorismo de Estado realizado pelo Círculo Policial, o Centro Militar e do qual participou a cúpula dos militares em atividade, com o aval do ministro Rosadilla. São os discursos dos comandantes que continuam reivindicando suas ações impunemente. O problema é a instituição militar, e não alguns militares.

A luta contra a impunidade continua vigente

Sabemos que, para todos, a não aprovação do projeto que anularia parcialmente a Lei de Caducidade é um golpe, mas devemos tirar conclusões e voltar a nos organizar.

A PIT-CNT4 chamou, ontem, uma paralisação de três horas para nos concentrarmos em frente ao Palácio, mas isso não é o suficiente. Se a Central quer lutar de verdade contra a impunidade, deve organizar uma grande luta que seja encabeçada pelos organismos de Direitos Humanos e pelos familiares das vítimas do terrorismo de Estado. Não haverá solução, não haverá prisões para todos os militares e civis violadores dos Direitos Humanos se não dermos uma grande batalha que tenha continuidade e organização. Para levá-la adiante, é necessário que a PIT-CNT rompa com a conciliação que a mantém atrelada ao governo.

Mas nós podemos avançar. Temos que nos organizar nos locais de trabalho, nas escolas, nas faculdades, nos bairros, para fazermos um balanço do que aconteceu e tirarmos conclusões. A partir da base, pacientemente, devemos voltar a impulsionar um grande movimento que se enfrente com todas as injustiças e pelas necessidades dos trabalhadores, estudantes e dos setores populares.

Agora devemos encarar um problema político decisivo: a construção de uma força de esquerda conseqüente que não claudique. Precisamos construir um partido de esquerda socialista e dos trabalhadores para avançar nas mudanças de fundo e lutar por um Uruguai e um mundo socialista.

Chega de impunidade!
Por julgamentos sumários e públicos!
Formação de Tribunais Populares para os julgamentos!
Todos os crimes da ditadura são de lesa humanidade e não prescrevem!
 

 
Notas:
1. Lei 15.848 de Caducidade da Pretensão Punitiva do Estado, aprovada pelo Parlamento uruguaio em 1986 e que impede que haja investigações sobre as violações dos Direitos Humanos cometidas durante a ditadura militar.
2. José Alberto Mujica Cordano: presidente do Uruguai, membro da Frente Ampla.
3. Ex-presidentes e parlamentares do Partido Colorado e do Partido Nacional (Blanco), partidos burgueses do Uruguai.
4. Plenária Intersindical dos Trabalhadores (PIT) – Convenção Nacional dos Trabalhadores (CNT), única central sindical do Uruguai.

Tradução: Thaís Rossi

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