qui mar 28, 2024
quinta-feira, março 28, 2024

México | Polarização Política e Social: Falam de golpes, fazem chantagens

A falida operação em Culiacán gerou um verdadeiro terremoto político nas altas esferas que continua ecoando. Iniciou-se uma crise de regime que está longe de se resolver.

Por: CST México

O discurso, lido cinco dias depois da operação pelo general da reserva Carlos Gaytán Ochoa diante de 500 outros generais da reserva em uma reunião periódica convocada pelo Secretário de Defesa, General Sandoval Rodríguez, continha profundas críticas ao chefe supremo do poder executivo e foi o motivo de uma série de declarações e interpretações de todo o espectro político. A primeira reação de López Obrador (AMLO) foi dizer que Gaytán Ochoa tinha “todo direito de opinar”.

Mas no fim de semana circularam amplamente mensagens de AMLO agitando o fantasma de um Golpe de Estado. Tomou como referência a derrota e assassinato de Francisco I. Madero em 1913, para igualar com a Quarta Transformação que ele encabeça e advertir que “Aqui não existe a mais mínima oportunidade para os Huertas, os Francos, os Hitlers ou os Pinochets. O México de hoje não é terra fértil para o genocídio e nem para canalhas que o reivindiquem (…)”

Não compartilhamos das analogias históricas que faz o presidente, mas de fato seu diagnóstico político nos parece realista: Aqui não existe hoje a mínima chance para os Pinochets, para o genocídio e nem para os canalhas que o reivindiquem. Por quê?

Justamente pelo que lamenta o reacionário General Gaytán Ochoa: “Atualmente vivemos em uma sociedade politicamente polarizada porque (…) acumularam durante anos um grande ressentimento (…)” “hoje temos um governo que representa aproximadamente trinta milhões de mexicanos, cuja esperança é a mudança. Uma mudança que permita corrigir o que eles consideram um déficit do Estado para o tal setor da população…”

De que polarização fala Gaytán Ochoa? Fala de uma exaustão social, do ódio operário e popular acumulado durante anos, que desde 2014 a 2017 caminhava para uma insurreição. A indignação pelos 43 de Ayotzinapa, pelo ataque aos professores, pelo massacre de Nochixtlan, pelo Gazolinazo – que anunciava centenas de levantes populares violentos como o de Ixmiquilpan – foi temporariamente canalizada para a via eleitoral… E provisoriamente “amarraram o tigre”.

Mas o general Gaytán Ochoa foi além e confessou seu medo e impotência atuais: “mais de um de nós gostaríamos de soluções mágicas, ou pior, drásticas, diante de um cenário histórico que o que se requer a gritos é pacificar, educar e manter são o MéxicoE conclui, depositando a confiança em seu comandante, o Secretário de Defesa, General Sandoval: “Por isso reconheço que o alto comando sustenta hoje sobre seus ombros a alta responsabilidade de manter o país coeso; de contribuir com sua pacificação o mais rapidamente possível, de fazer tudo com o menor custo social e a maior eficácia”.

Ou seja, amarraram o tigre na “esperança de mudanças”… Mas ainda não o “pacificaram” como costumam: matando, desaparecendo, ainda que tentem seguir fazendo, como quando            silenciaram Samir Flores, que resistia à Termoelétrica de Morelos… Por isso temem e alguns “imprudentes”, como Gaytán Ochoa, externam seu pânico.

E existem outras razões de muito peso para que as forças armadas não se lancem em uma aventura golpista. A primeira: no México, não há uma rebelião militar desde 1938 e nenhuma é triunfante desde 1921. A segunda: o contexto internacional. Os militares mexicanos entendem muito bem as consequências que houve a seus colegas de outros países latino-americanos pela participação direta em golpes de estado ou encabeçar governos. Na Argentina, a rebelião popular de 1982 derrotou a Junta Militar golpista de 1976 e seus generais foram condenados à prisão perpétua. No Chile a atual rebelião de massas aponta para um ajuste de contas com os seguidores de Pinochet…

E no México de hoje quem poderia estar por trás de projetos golpistas? Donald Trump que conseguiu de AMLO e Ebrard o que exigiu e ainda mais? Os oligarcas como Slim, Bailleres, Salinas Pliego, Larrea… que mantêm toda a política oficial a serviço de seus interesses? Quando agora junto a Romo Garza são “empresários respeitáveis e necessários”, os mesmos que ontem eram chamados de “máfia do poder”? Por acaso têm motivos para conspirar esses capitalistas e as transnacionais, que diferentemente de “El Chapo” e dos “chapitos”, que há décadas ingressaram no “seleto clube” dos que traficam e exploram “dentro de sua lei” e hoje contam com as Forças Armadas do Estado e da Guarda Nacional para cuidarem de seus negócios?

Mas é aí que se evidenciam grandes contradições no comportamento político do presidente. Se o golpismo não tem hoje nenhuma possibilidade de concretizar seus fins, para que agitar hoje o perigo de golpe? Quer desviar a atenção do “tigre amarrado”? Enviar uma mensagem de chantagem aos 30 milhões, que há quase um ano de governo estão decepcionados porque não enxergam concretizadas suas “esperanças de mudanças”?

Mas suponhamos que em algum momento futuro exista esse perigo. Como AMLO pretende defender a vontade de mudança e justiça de amplos setores do povo trabalhador? Hierarquizando e empoderando os militares, como fez ao reformar a Constituição para que possam reprimir nas ruas de todo o México? Mobilizando e armando “o respaldo de uma maioria livre e consciente, justa e amante da legalidade e da paz”, julgando todos os militares assassinos e corruptos ou cercando-se de generais “conservadores e seus falcões”? Por ora só vemos o presidente reunindo-se todos os dias com generais, almirantes e policiais.

Não esqueçamos que o general da reserva Gaytán Ochoa foi Subsecretário de Defesa Nacional, assim como o general da reserva Rodríguez Bucio, atual Chefe da Guarda Nacional, e tantos outros generais do Exército e almirantes da Marinha, foram parte da cúpula militar responsável por assassinatos, desaparecimentos, torturas e estupros durante os governos PRIAN.

E, apesar de dizerem defender a bandeira mexicana, todos eles são filhos ideológicos da Escola das Américas do Exército dos Estados Unidos. Como o general Homero Mendoza Ruiz, chefe do Estado-Maior de SEDENA, que em 3 de outubro “confessou” sua amargura diante de representantes da Embaixada dos Estados Unidos, da DEA e do Departamento de Estado norte-americano: “Estamos em um processo de desgaste muito forte, porém o soldado mexicano se desdobra, se esforça em satisfazer todas os requerimentos do Poder Executivo”.

Tradução: Túlio Rocha

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