qui abr 25, 2024
quinta-feira, abril 25, 2024

Uribe se vai…

A 20 de Julho, Álvaro Uribe leu o seu último discurso perante o Congresso da República. Nele apresentava um balanço dos seus oito anos de governo, reivindicando tudo o que fez e lamentando-se do que não chegou a fazer.



O seu objectivo era claro: unir ideologicamente a maioria dos parlamentares que lhe devem lealdade pessoal e representam os sinistros poderes regionais de narcotraficantes, paramilitares e saqueadores do tesouro, mas que agora devem apoiar os planos de Juan Manuel Santos. Para Uribe e sua fação é uma questão de vida ou morte consolidar a sua influência no Congresso e tratar de organizar o seu apoio partidário.
 
Fiel à sua decisão de governar até 7 de Agosto, Uribe seguiu adiante com seus planos: tratar de forçar a licitação do terceiro canal de televisão em benefício do reacionário Grupo Planeta de Espanha – o mesmo que lhe adjudicou o galardão de Estadista da Década –, bloqueada até agora pelo Conselho de Estado e pela Procuradoria; encerrar a negociação com a Alcadía de Bogotá [equivalente a prefeitura, ndt] para o financiamento do Metrô e Transmilénio; continuar com a multimilionária adjudicação dos contratos de infraestrutura de vias; enfrentar as acusações penais contra a sua própria família, além de apresentar uma lei de reforma para todo o aparato de justiça, a fim de se proteger. Preparar também a auto-defesa dos altos comandos militares implicados no macabro plano dos “falsos positivos” [1]; intensificar a ofensiva contra as Farc com a pretensão de capturar Alfonso Cano e bloquear-lhes a retaguarda, provocando a ruptura de relações com a Venezuela.
 
Santos, por seu lado, decidiu fazer-se desentendido. Continuou com a turnê internacional em que procurava estabelecer pontes com o imperialismo europeu, sarar as feridas com o Equador e Venezuela – procurando o apoio de outros governos latino-americanos –, e começar a propiciar um novo clima para os negócios.
A nomeação de cada ministro foi precedida de uma intensa negociação. Sabe que a Unidade Nacional que prometeu só se pode suportar repartindo quotas de poder e orçamento. E apesar da oposição manifesta de Uribe a algumas nomeações, pactuaram a renovação da cúpula militar e a designação do novo Chefe das Forças Militares. Como contrapeso impôs o trânsfuga Rodrigo Rivera no Ministério da Defesa e Germán Vargas como Ministro do Interior. Continua pendente o plano para controlar a nomeação do Fiscal e um acordo de paz com a Corte Suprema de Justiça.
 
Apesar desse cabo-de-guerra pelo controlo das rédeas do poder, quem se empenhou em encontrar diferenças de fundo entre Uribe e Santos se equivoca. Ainda que as duas alas representem a burguesia, e por tal motivo pudessem ter enfrentamentos, coincidem num propósito comum: dar continuidade ao regime autoritário e pró-imperialista consolidado durante a década passada, que lhes devolveu o controlo sobre o aparato do Estado e do território, e multiplicou astronomicamente os seus ganhos.
Uribe se vai, mas só disse um até logo.
 
…e a pobreza fica
 
Enquanto os de cima se dão ao luxo de resolver em público as suas diferenças, os de baixo vivem acossados pela miséria e desemprego: 28 milhões de pobres, 4 milhões de desalojados, 3 milhões de desempregados, são os números que provam a hecatombe social agravada durante o mandato de Uribe.
 
Ao tempo que tomava posse o novo Congresso, milhares de camponeses pobres chegaram à capital na chamada “Marcha Patriótica” “Agrupamento Aberto pela Independência”. Mas a sua presença em Bogotá foi ignorada pelos governantes e pelos grandes meios de comunicação. É a decisão unânime de ignorar quem vive marginalizado, na fronteira agrícola ou em pequenas veredas, sem possibilidades de acesso a habitação adequada, serviços públicos, saúde e educação, atormentados pelo enfrentamento armado entre guerrilha, exército e paramilitares, e muitas vezes vendo-se obrigados a viver dos cultivos ilegais ao serviço dos narcotraficantes.
 
Setores de trabalhadores, entretanto, resistem dispersos. Os professores precários do Distrito conseguiram um acordo parcial para os milhares de afetados pelas demissões em massa. Uma vintena de trabalhadores do setor floricultor de Sabana vê-se forçada à greve. Os empregados da Sodexo, multinacional de serviços, e os da Domesa, transportadora especializada, continuam em luta para que se respeite o seu direito à organização sindical e à negociação coletiva.
 
Mas a alta direção sindical e política das organizações dos trabalhadores e dos setores populares, ainda hegemonizada pelo Pólo Democrático Alternativo, continua a virar as costas às suas lutas. Enquanto os camponeses ocupavam a sede da Universidade Nacional, os parlamentares do Pólo acordavam com os partidos do governo a eleição das direções do Congresso, apesar de se autoproclamarem como o único partido de oposição. E a Alcadía de Bogotá, também nas mãos do Pólo, ria-se da luta dos precários.
 
É a realidade do momento atual. Os de cima conseguem a unidade nacional para impor seus planos antipopulares e pró-imperialistas, a direção do Pólo cede em troca de migalhas e prebendas burocráticas, enquanto faixas de trabalhadores lutam sem coordenação para enfrentar a miséria, o desemprego e a sobre-exploração. É hora da solidariedade para com os que resistem, pois será a seu lado que poderemos construir a alternativa revolucionária que requer a Colômbia para superar a sua crise. Nessa tarefa concentra as suas forças o Partido Socialista dos Trabalhadores.

[1] – Assassinato de civis inocentes para inflar o número de baixas e apresentá-los em "boletins positivos" como guerrilheiros tombados em combate e assim obter maiores premiações, ndt.
 
Tradução: Renata Cambra

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