sex mar 29, 2024
sexta-feira, março 29, 2024

Paz, equidade, educação: o grande embuste

Há quatro anos Santos prometeu cuidar dos “três ovitos” de Uribe: segurança democrática, coesão social e confiança dos investidores. Contudo estes ovitos acabaram por ser reinventados pelas cinco locomotivas do desenvolvimento que prometeu Santos no seu governo de “Prosperidade para todos”:

 infraestrutura, agricultura, habitação, mineração e inovação. A verdade é que estas locomotivas nunca arrancaram e a prosperidade só chegou para os grandes capitalistas. No seu discurso de tomada de posse para um segundo mandato, Juan Manuel Santos mudou a sua metáfora. Apoiando-se no enfado da população com o conflito armado, que habilmente soube aproveitar para garantir a sua reeleição, agora promete três pilares no seu plano de governo sobre os quais se construirá a Colômbia do pós-conflito: paz, equidade e educação. Nós, os trabalhadores e os pobres da Colômbia, não temos razões para confiar nas promessas deste jogador de póquer: é um trapaceiro que está acostumado a jogar com as cartas marcadas. Ao invés de lhe dar trégua, os operários, estudantes, trabalhadores do campo e setores populares devem voltar à mobilização para conquistar nas ruas o que nos negam o Governo e as leis.

 
Paz: a hora das vítimas

As negociações de paz em Havana continuam a prolongar-se e anunciam-se compromissos de costas voltadas para as maiorias trabalhadoras. O tema mais recente e dramático foi o das vítimas. Na verdade, a justiça e a reparação que exigem os afetados estão subordinadas à mal apelidada “reconciliação” entre vítimas e seus algozes. O Governo de Santos pretende agora que todos sejam “vítimas do conflito” caso tenham sido afetados pela ação das forças estatais, da guerrilha ou dos paramilitares. A origem social do confronto militar é esquecido, e o seu processo de degradação pela ação consciente do Estado – financiado pelo Governo norte-americano –, da burguesia, dos latifundiários e das transnacionais – promotoras do paramilitarismo – e a perda de legitimidade da insurgência armada – pelas suas práticas bárbaras e a sua relação com o narcotráfico – é a justificação para o “perdido e esquecido” com que se quer virar a página sangrenta do último meio século, consagrando a mais absoluta impunidade para os responsáveis. O regime político genocida, autoritário e corrupto por meio do qual um punhado de privilegiados tem governado o país sairia assim legitimado com a cumplicidade dos comandantes guerrilheiros e a maioria da Esquerda que apelou a votar em Santos dizendo que se votava pela paz.
 
Equidade: nem trabalho, nem pão

A Colômbia é um dos países mais desiguais do Mundo. Os seus recursos naturais colossais e a capacidade produtiva das suas gentes somente servem para tornar os ricos mais ricos e os pobres mais pobres. Santos promete agora a criação de dois milhões e meio de empregos. Já sabemos o que isso significa: benefícios e subsídios para os empresários, mais flexibilização laboral e trabalho em condições de precariedade sem limite. Como as condições a que foram submetidos os operários petroleiros a serviço da transnacional canadense Pacific Rubiales que explora a jazida mais importante do país. Ou a população de Guajira, assentada sobre a maior mina de carvão a céu aberto do mundo, enquanto as suas crianças morrem de subnutrição, a água se evapora e a contaminação ambiental torna o horizonte tenebroso. É o futuro que ameaça as populações que estão a ser afetadas pelos megaprojetos mineiros, as hidroelétricas e os monocultivos agroindustriais. A Lei das Terras em processo de execução não é uma reforma agrária, é somente a legalização da desapropriação. A legislação trabalhista continua a negar a estabilidade e o trabalho extra. A negociação coletiva no sector público é uma farsa para preservar os Tratados de Livre Comércio com os quais se saqueia o país.
 
Educação: nem qualidade, nem mercado de trabalho.

Santos promete fazer da Colômbia o país mais educado da América Latina e anunciou um orçamento para o setor, que é superior ao das forças armadas. O que não disse é que a maior parte desse orçamento apenas pretende reforçar o grande negócio da educação privada no qual as transnacionais da educação se inseriram como piratas, endividando as famílias com os créditos educativos.

A gratuidade até o décimo primeiro ano de escolaridade é uma falsidade enquanto as crianças e jovens dos bairros pobres estiverem obrigados a trabalhos temporários para garantir a sobrevivência familiar. A extensão da jornada escolar única apenas procura aumentar a sobre-exploração dos docentes e o tempo de controle sobre uma juventude vítima dos flagelos do capitalismo. Os professores todavia reivindicam salários dignos, proteção adequada na saúde e respeito pela carreira docente.

As universidades públicas assinalam um déficit estrutural de onze bilhões de pesos, ao mesmo tempo que 80% dos professores universitários apenas têm contrato de oito meses por ano. Nessas condições de trabalho e de bem-estar não haverá Educação de qualidade. E se existisse, o único horizonte para esses profissionais seria a emigração ou o subemprego. É a razão pela qual se vai dar prioridade à formação técnica e se reduz a metade o orçamento da Colciencias.[1] O mercado laboral na Colômbia está funcionalizado de acordo com a desindustrialização do país e a quebra do setor agrícola.

Este é o verdadeiro plano de Santos. Um país em paz para que o capital financeiro continue o seu trabalho parasitário aumentando a dívida pública, para que as transnacionais possam aproveitar a mão-de-obra qualificada e barata, sem proteção ambiental perante o saque dos recursos naturais e uma educação limitada aos planos miseráveis de “desenvolvimento” do grande capital. Perante este plano os trabalhadores devem apressar-se para a luta. Nenhuma confiança nas promessas do Governo e da sua Unidade Nacional! Nenhum apoio à oposição da ultradireita uribista! Nenhuma ilusão nos acordos de Havana! Hoje mais do que nunca é necessário construir uma verdadeira frente de luta dos explorados e dos oprimidos do país. O VI Congresso da CUT[2] será uma primeira oportunidade para que os trabalhadores se apresentem como a verdadeira alternativa para a solução definitiva aos grandes problemas da nossa sociedade.



[1] Departamento Administrativo da Ciência, Tecnologia e Inovação (N. do T.).

[2] Central Unitária de Trabalhadores, congregação dos sindicatos colombianos (N. do T.).

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