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terça-feira, março 19, 2024

Chile: o parlamento a serviço dos donos das AFP

Em 16 de maio de 2019 votou-se a favor de legislar a reforma da previdência de Piñera, a que traz mais resultados positivas para os donos dos fundos de pensões do que para os que se aposentam sob o sistema das Administradoras dos Fundos de Pensões – AFP. Os primeiros viram sua fortuna crescer, e os segundos continuaremos recebendo aposentadorias miseráveis.

Por: MIT-Chile

A votação deste projeto nunca deveria ter sido colocada no congresso, tendo em conta as massivas mobilizações que foram realizadas para acabar com as AFP e não para fortalecê-las, que é o que esta reforma de pensões propõe.  E mais, não somente as mobilizações multitudinárias que aconteceram em 2017 e 2018 expressam a indignação da população a respeito das AFP, como também as pesquisas – amplamente manipuladas como a CADEM – ainda mostram uma importante oposição contra as AFP, atingindo 67% de desaprovação na reforma de Piñera em 2019.

Por que devemos rechaçar a reforma e eliminar as AFP?

Entretanto, a informação a respeito de quem na verdade se beneficiaria com essa reforma é ocultada pelos grandes meios de comunicação, os quais só enfatizam os 4% a mais que “o empregador terá que desembolsar para a previdência de seus trabalhadores”. Mas, não menciona que esses 4%, na realidade sairá dos bolsos dos trabalhadores, nem que este projeto envolve um futuro e importante aumento no desemprego. O prognóstico é de que vão se perder 52.000 postos de trabalho em longo prazo e que por ano pode-se chegar a perder cerca de 9.000 postos de trabalho 1. Inclusive esses 4%, que serão administrados por uma entidade pública, não está garantido que não vai ser utilizado em investimentos para poder capitalizar a entidade, o que deixaria nosso “fundo individual” à mercê dos vaivéns da bolsa de valores e dos investimentos empresariais.

Por outro lado, em 28 de fevereiro de 2019 os fundos de pensão que as AFP administravam chegava ao montante de US$212.860 milhões de dólares. A Fundación SOL analisou o destino de US$124.336 milhões equivalentes a 58,4%, onde aparecem as 6 famílias mais ricas do Chile, Luksic, Matte, Saieh, Solari, Yarur e Said, como os principais beneficiados nos investimentos feitos graças a nossas pensões. Por exemplo, o grupo Luksic é o que recebe a maior quantidade de investimentos de fundos de pensões, chegando a $5.820.655.000.000 pesos chilenos. Estes investimentos vão para as empresas do grupo econômico Luksic, como os outros 5 grupos econômicos importantes, desde bancos até varejo2.

Por outro lado, o economista Marcos Kremerman, autor do estudo “AFP para quem?” afirma que se aposentam 10.000 trabalhadores por mês, e somente em setembro de 2018 a metade deles ganhou menos de 45.000 pesos. Inclusive quem contribuiu por 30 a 35 anos, toda uma vida, a metade deles tirou menos de $253.000 pesos3.

Também não diz que o pilar solidário só aumentará 10.000 pesos, questão que é uma fraude se observarmos o aumento no custo de vida que tem no Chile, e, sobretudo vendo o aumento das riquezas dos grandes empresários do país, onde 115 famílias tem 12% da fortuna total do país4. E a coisa fica pior quando comprovamos que as rentabilidades das AFP (mecanismo que deveria aumentar nossas aposentadorias) foram rebaixando desde a implementação do modelo. Vale dizer que um trabalhador que se aposente hoje com 10% vai ganhar mais que um trabalhador que se aposentar contribuindo 14% em mais 40 anos. Vale dizer que esta reforma não garante sequer, em seus pontos mínimos, uma possibilidade de ter uma aposentadoria digna, só afiança o fortalecimento das AFP e sua legitimação.

Não confiar no parlamento nem nos partidos tradicionais! Vamos organizar a greve geral!

Para frear este conluio do governo para fortalecer as AFP, a Frente Ampla buscou gerar uma “grande oposição” que se colocasse contra esta reforma buscando aliança com a ex-nova maioria, com a DC e o Partido Radical incluídos. Entretanto, ficou evidente dentro da votação para aprovar a reforma que esta estratégia não teve resultados, já que terminou com a reforma da previdência aprovada na câmara dos deputados. Da mesma forma também vemos a política de Luis Mesina de levar toda a discussão ao parlamento, de enfocar as forças nas próximas eleições, tendo como objetivo tirar os deputados que votaram a favor da reforma para mudar o modelo a partir de dentro.

Por um lado, observamos que esta tentativa de gerar oposições no congresso e concentrar as forças no debate parlamentar é estéril e não faz mais do que desviar o trabalho que se deve realizar nos locais de trabalho, nos sindicatos e territórios de trabalhadoras e trabalhadores, para impulsionar a mobilização. Da mesma forma pela qual a Frente Ampla defendeu uma política de debate no parlamento sobre a falsa gratuidade na educação e a perdeu – e que agora observamos as consequências -, o mesmo caminho parece abrir-se na luta contra as AFP.

Luís Mesina, por outro lado, também descartou como primeira instancia a mobilização de trabalhadoras e trabalhadores no Chile para poder dirigir a política contra as AFP para o mesmo parlamento corrupto que vota leis feitas sob medida para os grandes grupos econômicos, e que também são beneficiados com as AFP.

A única maneira de por em xeque as AFP, os políticos e os empresários e donos das AFP é através de uma greve geral que coloque em perigo os lucros dos grandes grupos econômicos no Chile. A pressão que a classe trabalhadora pode exercer nos lucros dos empresários só é possível através da organização de trabalhadoras e trabalhadores em sindicatos, territórios, associações de bairros, etc. A mobilização das vítimas do sistema de AFP e quem produz as riquezas do país é a forma de pressão mais eficiente e a única que pode colocar em perigo os empresários, obrigando-os a substituir as AFP por um sistema de repartição solidária, tripartido e administrado pelas e pelos trabalhadores.

Notas:

1 https://www.eldesconcierto.cl/2018/11/07/reforma-de-pensiones-hacienda-reconoce-que-se-perderan-52-mil-puestos-de-trabajo-al-largo-plazo/

2 https://www.elmostrador.cl/destacado/2019/05/16/luksic-said-yarur-saieh-matte-y-solari-las-millonarias-familias-chilenas-que-acaparan-la-inversion-de-las-afp/

3 Gálvez, R & Kremerman, M. ¿AFP para Quien? Dónde se invierten los Fondos de Pensiones en Chile. Mayo de 2019. Fundación Sol

4 https://www.elmostrador.cl/mercados/2017/06/14/mapa-de-la-extrema-riqueza-115-familias-chilenas-manejan-el-127-de-la-fortuna-del-pais/

Tradução: Lilian Enck

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