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Os 95 anos sem Lênin

“Revoluções são festas dos oprimidos e dos explorados. Em nenhum outro momento, as massas populares encontram-se em condições de avançarem tão ativamente enquanto criadores de uma nova ordem social como no tempo da Revolução” (Lênin)

Por: PSTU Brasil

A história da Revolução de 1917 consagrou de maneira plena o método consciente, e organizado, de intervenção do Partido Bolchevique. Lênin, principal dirigente desse partido, elevou o Outubro de 1917 à condição de maior referência dos projetos de vitória proletária na revolução mundial.

Imperialismo: a ordem dos grandes monopólios

Vladimir Ilich Ulianov nasceu em 22 de abril de 1870, em Simbirsk, Rússia. Lênin, nome pelo qual foi mais conhecido, foi o líder do partido bolchevique, organizador da Revolução de Outubro, na Rússia, e da Internacional Comunista.

Ingressando no movimento revolucionário russo em 1887, Lênin defendeu em seus escritos revolucionários que, já no início do século XX, o capitalismo mundial atingira o estágio imperialista. Trata-se do período em que os conglomerados capitalistas cartéis, trustes, consórcios internacionais assumiram decisiva importância ao substituírem o capitalismo competitivo pelo capitalismo monopolista.

O capital bancário fundira-se com o capital industrial, gerando o capital financeiro. Iniciou-se, então, a exportação de capital para países estrangeiros, dividindo o mundo entre os países mais ricos.

Assim, os novos obstáculos situados no caminho da luta econômica e política do proletariado, a ruína, os horrores e a brutalização da I Guerra Mundial, haviam transformado o estágio imperialista na era da revolução proletária socialista.

A luta contra a guerra

As novas guerras pela dominação do mundo e de mercados para o capital financeiro haviam adquirido a natureza de guerras imperialistas, ou seja, guerras de anexações, conquista e roubo, dinamizadas por diferentes grupos de potências.

Lênin desvendou corretamente os objetivos perseguidos pelos dois principais grupos inimigos de governos burgueses imperialistas na I Guerra. Defendeu que os partidos operários assumissem o derrotismo revolucionário perante todas essas guerras, contra o governo beligerante de seu próprio país. Tal posição implicava em não apoiar o governo e nem a sua guerra. Na Revolução Russa, os bolcheviques se apoiavam nas derrotas militares russas para forjar a oposição ao governo e à sua guerra reacionária. E no plano internacional, essa posição significava a transformação da guerra imperialista em guerra revolucionária, como a única forma de pôr fim à guerra imperialista em andamento.

Além disso, Lênin denunciou e combateu a traição da II Internacional e de seus partidos, que se colocaram a favor da guerra imperialista. Lênin defendeu a criação de uma nova Internacional Revolucionária, como a melhor forma de aproveitamento da crise econômica e política gerada pela guerra, para intensificar a luta pela revolução socialista.

É preciso uma nova revolução

Ao chegar à Rússia em 3 de abril de 1917, poucos dias após a conclusão vitoriosa da revolução democrático-burguesa de fevereiro, Lênin trazia consigo uma clara compreensão do novo estágio das contradições materiais e superestruturais do capitalismo imperialista.

Já nos primeiros dias após a derrubada do milenar absolutismo czarista pela Revolução de Fevereiro, Lênin, frente ao novo poder instituído pelo Governo Provisório, compreendeu, ainda em seu exílio na Suíça, a necessidade de ser elaborada em palavras simples e claras, uma nova tática revolucionária para a Revolução Russa.

Em suas Cartas de Longe, redigidas no exílio, Lênin desenvolveu essa nova tática, posicionando-se claramente contra o patriotismo burguês, exigindo a denúncia dos tratados de aliança com os imperialistas, a transformação da guerra imperialista em guerra revolucionária, como meio de assegurar pão, paz e liberdade. Por isso, ao desembarcar em Petrogrado, Lênin conclamou o proletariado a não depositar nenhuma confiança no governo provisório de coalizão de classes. Tal governo era formado pela burguesia (partido dos Cadetes) e os partidos operários (mencheviques e socialistas revolucionários, os SR’s). Num primeiro momento, o príncipe Lvov esteve à frente do governo, mas, depois, foi substituído por Kerenski, líder dos SR’s.

Lênin posicionou-se, então, a favor de uma segunda revolução na Rússia: uma revolução proletária, apoiada pela vasta maioria dos camponeses pobres, que, destruindo completamente a velha máquina de Estado, transferiria o poder político dos capitalistas e latifundiários para um governo dos operários e camponeses organizados em sovietes – Conselhos de operários, camponeses pobres e soldados instituídos nos seus locais de trabalho.

Rússia: o estopim da revolução mundial

Para Lênin, o êxito definitivo da construção do socialismo na Rússia poderia apenas ser atingido se estimulado ativamente pela vitória da revolução proletária socialista nos principais países capitalistas da Europa ocidental e dos EUA, emergindo das contradições insolúveis decorrentes da guerra.

Em seu modo internacionalista de apreciar a luta de classes, Lênin entendeu que o proletariado russo não poderia, com suas próprias forças, conduzir a revolução socialista à vitória, porém poderia, em certo sentido, iniciá-la, devendo tomar o poder e criar as melhores condições para que seus aliados de classe na Europa e nos EUA aderissem à batalha decisiva pelo socialismo.

Caso isso não se desse, mesmo que fosse vitorioso na Rússia, o proletariado iria fracassar, a menos que fosse capaz de resistir até receber o poderoso apoio dos trabalhadores revolucionários vitoriosos nos principais países capitalistas.

A batalha interna no partido bolchevique

Em virtude de sua nova elaboração tática, Lênin se opôs abertamente à orientação defendida pela maioria da direção de seu próprio partido (na época dirigido por Kamenev e Stalin), que, em março de 1917, defendiam o “apoio crítico” ao governo provisório frente-populista.

Chegando em Petrogrado, na noite de 3 de abril, Lênin se encontrou com a dualidade de poderes (Sovietes vs. Governo Provisório) existente.

Apoiou-se então na vanguarda proletária e, sobretudo, nas forças proletárias de Vyborg, o principal bairro operário de Petrogrado, e de outros grandes centros da Rússia. Em suas Teses de Abril, defendeu que não houvesse nenhum apoio ao governo provisório burguês-latifundiário. Também que os Sovietes de Deputados Trabalhadores, Soldados e Camponeses são a única forma possível de governo revolucionário. O objetivo não deveria ser uma república parlamentar, mas sim uma república dos deputados trabalhadores, soldados e camponeses. Deveria ser feito o confisco e a nacionalização de todas as terras, que seriam tomadas e colocadas à disposição dos Sovietes de Deputados Trabalhadores Rurais e Camponeses. Pela fusão de todos os bancos em um único banco nacional, submetido ao controle dos Sovietes de Deputados Trabalhadores. Contra o defensismo na guerra, e pela criação de uma nova Internacional Revolucionária.

Lênin defendeu as Teses de Abril em aberta oposição às posições defendidas por Stalin e Kamenev. Depois de um duro debate interno, as Teses acabaram por prevalecer, nas Conferências bolcheviques em Petrogrado e na VII Conferência Bolchevique de Toda a Rússia, realizada em abril.

Um partido para tomar o poder

Uma das características fundamentais da estratégia revolucionária de Lênin foi a construção de um partido proletário marxista-revolucionário. Esse partido deve ser dirigido preponderantemente por revolucionários profissionais e trabalhadores conscientes, e apoiado no princípio organizativo do centralismo democrático. Deve ter um programa claro para a derrubada da burguesia, por meio da tomada do poder pelo proletariado.

Lênin demonstrou que o partido revolucionário não pode cumprir jamais o seu papel histórico embriagando-se em suas próprias vitórias, deixando de reconhecer as deficiências de seu trabalho de ligação com as mais amplas massas trabalhadoras.

No quadro da nova situação política russa e internacional, surgida com a Revolução de Fevereiro, os partidos dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques posicionaram-se publicamente, nos Sovietes e diante das massas, a favor do defensismo da Rússia na guerra imperialista. Dessa maneira, defenderam seu próprio ingresso no Governo Provisório, alegando ser, assim, possível mudar a política imperialista por este praticada.

Diante desse fato, Lênin defendeu a estratégia de promover relações mais estreitas, e até mesmo a fusão de suas forças apenas com grupos e tendências proletárias que se encontravam sustentando posições políticas realmente revolucionário-internacionalistas, como o grupo dirigido por Trotsky, a Interdistrital.

A incorporação de novos agrupamentos e tendências revolucionários fortaleceu o potencial de luta do antigo Partido Bolchevique, aglutinando todos os melhores lutadores do movimento proletário russo de então na luta comum em prol da revolução proletária.

O novo partido de Lênin e Trotsky demonstrou que, em um cenário de profunda crise revolucionária, seu impacto poderia aumentar qualitativamente, encabeçando ações muito superiores à sua dimensão puramente quantitativa.

Preparando a vitória

O partido dirigente de Lênin mostrou-se capaz de intervir, com arte e talento, rumo à tomada do poder. Com disciplina e ousadia, os bolcheviques conseguiram combinar distintas táticas, em meio à rapidez inacreditável do furacão revolucionário.

Tiveram a lucidez para conter o processo insurrecional espontâneo dos trabalhadores de 3 e 4 de julho, quando não existia ainda condições para a luta pelo poder, quando os Sovietes ainda tinham uma maioria de mencheviques e socialistas-revolucionários. Apenas desse modo, foi possível, já em 31 de agosto, a conquista da maioria nos Sovietes pelos bolcheviques nas principais cidades sob a palavra de ordem “Todo o Poder aos Sovietes!”.

Uma vez obtida a maioria nos Sovietes, Lênin passou a defender que os bolcheviques deviam e podiam tomar imediatamente o poder, marcando antecipadamente a data para a deflagração da insurreição.

Presente clandestinamente em Petrogrado em 10 de outubro, Lênin contribuiu decisivamente para que sua proposta de preparação e desencadeamento imediato da insurreição fosse aprovada por 10 votos a 2, na reunião do Comitê Central do Partido Bolchevique.

Assim, o partido dirigente de Lênin foi capaz de desempenhar, em 25 de outubro de 1917, a arte da insurreição.

Varrendo os órgãos de poder da burguesia e do latifúndio russos, a insurreição consagrou a passagem de todo o poder de Estado ao II Congresso dos Sovietes de Toda a Rússia, aprovou os novos decretos sobre pão, paz e terra e elegeu o novo governo de Comissários do Povo (encabeçado por Lênin).

A Revolução de Outubro desencadeou a energia revolucionária de explorados e oprimidos de todo o mundo. Com uma dimensão jamais vista ao longo de todo o século XX, espalhou-se rapidamente pelas principais capitais e rincões do planeta, inspirando novos movimentos revolucionários proletários, populares e nacionais-libertadores.

A luta contra a burocratização

Mas as experiências mais difíceis estavam por vir. A contrarrevolução avançou e a Rússia foi invadida por exércitos estrangeiros. Foi o início da guerra civil. Em 1918, o país estava cercado por contrarrevolucionários das principais potências mundiais.

A Revolução Russa sempre foi pensada pelos bolcheviques como parte da uma revolução internacional, em particular com a perspectiva da extensão da revolução para os outros países da Europa. A dupla derrota da Revolução Alemã (1918-1919 e 1923), pela traição da socialdemocracia, deixou o jovem Estado Operário isolado.

A Guerra Civil foi vitoriosa contra os exércitos invasores, mas destruiu a economia do país e dizimou parte da classe operária, sobretudo os quadros que haviam participado da insurreição.

Os técnicos, funcionários e militares de carreira adquiriram cada vez mais peso social e acabaram tomando para si as funções dos sovietes e, mais tarde, do próprio partido. O isolamento da Revolução Russa começou a cobrar seu preço. Sem apoio de revoluções em outros países, a burocratização começa a crescer na União Soviética.

Lênin, já doente e preocupado com as dimensões da burocratização, propôs reformas na administração do Estado e do aparato partidário. Sua luta esbarrou na resistência da cúpula partidária, expressão da burocratização do Estado. Stalin, o secretário geral, utilizou o cargo para troca de favores e consolidação da sua condição de dirigente da nova camarilha burocrática.

As tensões entre Lênin e Stalin se tornavam cada vez maiores. Em seu testamento, Lênin propõe a saída de Stalin do cargo de secretário-geral e sua substituição por alguém “mais gentil e leal, menos vaidoso e truculento”. Formou, então, um bloco com Trotsky que se tornou praticamente seu porta-voz em questões políticas e econômicas. Mas era tarde demais. A fração burocrática do partido havia adquirido vida, força, independência e interesses próprios. O “testamento” de Lênin sequer foi publicado. Stalin permaneceu no cargo e nenhuma reforma foi realizada.

O esgotamento, provocado pela enorme tensão durante anos, minou a saúde de Lenin. A esclerose atingira as artérias do cérebro. No início de 1922, os médicos o proibiram de trabalhar diariamente. No início de outubro, sua saúde melhorou e ele retorna ao trabalho, mas a doença progrediu e Lênin faleceu em 21 de janeiro de 1924.

Lênin morreu quando a contrarrevolução burocrática estava triunfando. Caso não morresse, poderia terminar seus dias preso. A Revolução foi usurpada por uma burocracia que se apresentaria como a “continuadora de Lênin”. O imperialismo e seus defensores se apressaram em igualar a burocracia stalinista ao “socialismo”. Mas seu legado demonstra a todas as novas gerações de revolucionários marxistas que a luta de classes moderna, travada entre burguesia e proletariado, há de ser necessariamente conduzida por um partido revolucionário, profundamente enraizado na classe operária e disposto a realizar uma aliança com outros setores pobre e explorados pelo capital. Também mostra que a vitória do socialismo só pode ser plenamente realizada em âmbito internacional.

 

 

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