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quinta-feira, março 28, 2024

Al-Assad avança com cobertura militar russa e apoio tático dos Estados Unidos

Após alguns meses nos quais a situação na Síria parecia estar “estancada”, a aparição da Rússia começa a mostrar mudanças tangíveis no tabuleiro militar da guerra civil síria.

Por: Daniel Sugasti

Nos últimos dias, os bombardeios incessantes da aviação e da marinha de Putin estão abrindo caminho para as tropas do ditador Al-Assad nas províncias de Idlib e Hama (oeste) e na Latakia (costa mediterrânea), feudo da família governante e região onde Moscou defende sua base naval de Tartus.

Protegido por caças russos, o exército oficial sírio avança junto a milhares de combatentes da milícia libanesa Hezbollah e centenas de “guardas revolucionários” iranianos.

Apesar das repetidas declarações dos comandantes russos, os ataques da força aérea e naval não são dirigidos contra o Estado Islâmico, mas contra as milícias antiditatoriais.

Sobre isso, Vladimir Putin expôs, sem meias palavras, o objetivo de sua participação na guerra síria: “estabilizar as autoridades legítimas e criar as condições para uma saída política ao conflito”.1 Em outras palavras, isso significa manter Al-Assad no poder.

Movida por esse interesse central, a Rússia entrou decididamente no conflito. Em sua mira, está a possibilidade de desnivelar a correlação de forças a favor de seu aliado sírio e ganhar a guerra.

Se a ajuda do Hezbollah e do Irã sempre foi importante para Assad, a intervenção russa é ainda mais qualitativa. Moscou, até agora, destinou ao menos trinta de seus melhores aviões de combate Sujói 34, 24-M e 25SM para a campanha síria. Ao mesmo tempo, sua marinha disparou mísseis do mar Cáspio, a mais de 1500 km de distância de seus objetivos em terra. Por outro lado, especialistas militares russos, que há muito tempo estão integrados nas fileiras do exército sírio, agora atuam abertamente para manejar novos mísseis terra-terra que seu país fornece a Damasco.

Presencia-militar-rusa
Deslocamento militar russo e norte-americano

Putin não parece economizar esforços e nem meios. Se sobre seu parceiro sírio existem denúncias sobre uso de gases químicos e bombas de barril, recentemente a organização Human Rights Watch acusou a Rússia de utilizar ou de fornecer bombas de fragmentação na Síria, que, ao disseminar milhares de pequenos projéteis, causam estragos na população civil.

Estimulado por essa gama de forças externas, Assad tem, nas últimas semanas, avançado muito mais do que nos últimos meses.

O Observatório Sírio de Direitos Humanos informou o progresso das tropas ditatoriais depois dos bombardeios russos, como na estratégica localidade de Kafer Nabuda, na fronteira entre as províncias de Hama e Idlib, onde é possível atacar rebeldes ao longo da rodovia M5, que atravessa o país a partir da fronteira com a Jordânia, no sul, até a disputada Alepo, ao norte. Além disso, as tropas de Assad, junto às do Hezbollah, retomaram outras quatro localidades da província de Hama e a cidade de Jub al Ahmar, na Latakia.

Se ainda restam dúvidas sobre o suposto “combate” ao Estado Islâmico, nessas semanas de bombardeios russos os seguidores do “califado” não só não retrocederam como avançaram em solo sírio. Ou seja, os “milicianos de preto” também aproveitaram os ataques russos sobre as milícias rebeldes e, menos frequentemente, sobre as posições da Frente Al Nusra, filial da Al Qaeda na Síria, para ganhar terreno nas imediações de Alepo, local onde os rebeldes devem enfrentar simultaneamente as tropas do eixo Al Assad-Rússia-Hezbollah-Irã e também o Estado Islâmico.

Se a tudo isso somarmos as declarações de vários políticos e líderes militares israelenses sobre a necessidade de armar o ditador Al-Assad para “salvá-lo”, pois uma possível queda do regime sírio provocaria uma maior “desestabilização da região”, especialmente na fronteira sírio-israelense das Colinas de Golã, podemos perceber que a sustentação da ditadura síria, ao menos como um “mal menor”, é uma política mais global.2

O imperialismo apoia o ditador Al-Assad

Relacionando os fatos, é possível notar a existência de um amplo acordo contrarrevolucionário entre Estados Unidos, Israel, Europa e Rússia, baseado na política de que para estabilizar a situação revolucionária seria necessária a permanência de Assad no poder.

Nesse sentido, o acordo “nuclear” que os Estados Unidos selaram com o Irã também começa a mostrar seus fins políticos na região.

Já faz mais de um ano que os Estados Unidos, apesar de criticarem a ditadura síria e responsabilizarem-na por “crimes humanitários”, não promovem a renúncia de Assad ou algo parecido. Pelo contrário, desde que começaram os bombardeios dos Estados Unidos, tanto Obama como os altos chefes militares desse país deixaram muito claro que o “objetivo imediato” é derrotar o Estado Islâmico, e não derrubar Assad. A questão da permanência ou não do ditador sírio passou, como mínimo, para segundo plano.

Nesse sentido, há poucos dias o governo de Obama anunciou o fim do programa de “treinamento” de uma força combatente para intervir na Síria, conforme anunciado em dezembro do ano passado. Esse programa contava com um fundo de 500 milhões de dólares. Washington, em pleno auge da intervenção russa, reconheceu que, dos 15 mil soldados que deveriam “formar-se” durante os três primeiros anos – 5400 no primeiro ano –, somente “quatro ou cinco estavam em combate” em setembro de 2015.3

Ao abandonar aquilo que havia sido apresentado como a “estratégia” dos Estados Unidos na Síria, o Pentágono reiterou que está focado em deter o avanço do Estado Islâmico e que, nesse sentido, se dedicaria a ajudar as forças “locais” e não a “criar” as suas. Nessa perspectiva muito mais limitada e comedida, no domingo 11 de outubro, a imprensa informou que aviões de carga C-17 norte-americanos lançaram, no norte da Síria, 50 toneladas de “armas leves e granadas”.4

Esses fatos demonstram que “a saída” de Assad deixou de ser uma prioridade para Obama, e cai por terra todo o estardalhaço que as organizações stalinistas e castro-chavistas, e inclusive partidos ditos “trotskistas”, fizeram ao dizer que as milícias rebeldes eram treinadas e “financiadas” pelo imperialismo.

Por sua vez, o imperialismo europeu, pressionado por milhares de refugiados sírios (580.000, aproximadamente) que batem às suas portas, também se mostra apressado para “estabilizar” a situação na Síria. Nas altas esferas, a discussão sobre esse assunto se mantém: o que fazer com Assad?

Na segunda-feira 12 de outubro, representantes europeus assinaram uma declaração que expressa: “o regime de Al-Assad não pode ser um parceiro na luta contra o Daesh [denominação árabe para o Estado Islâmico]”, mas admitem que tem um papel a desempenhar em uma eventual transição política na Síria.5

No entanto, os ministros de Relações Exteriores da União Europeia pediram à Rússia um “cessar fogo imediato” aos bombardeios feitos sobre os setores de oposição ao regime sírio, ao mesmo tempo em que tentam um “processo de diálogo” no qual não descartam incorporar o ditador.

Nesse sentido, Federica Mogherini, alto representante para a Política Externa Europeia, insistiu que era necessário serem “pragmáticos” e declarou: “A União Europeia apoia o processo da ONU para a paz na Síria e Staffan de Mistura [o enviado especial desse processo] já está conversando com o regime. Eu mesma não excluo manter conversas conjuntas com todas as partes envolvidas, junto a de Mistura”. O chefe da diplomacia espanhola também expressou essa posição: “temos que sentar para negociar com o regime de Assad, para levar a cabo um cessar fogo parcial que possa se generalizar até chegar a um cessar fogo total”.

A revolução síria atravessa um momento difícil. A frente contrarrevolucionária se amplia e começa a experimentar vitórias sobre o terreno.

A esquerda mundial, que majoritariamente segue apoiando o ditador sírio, deve analisar a realidade e modificar suas posições. Não é verdade que a política de Israel e dos Estados Unidos seja “derrotar” Bashar Al-Assad. Se o ditador puder garantir certa “estabilidade” ou, no mínimo, um cenário “menos caótico” que o atual, o imperialismo e o sionismo não terão dúvidas em apoiá-lo.

O próprio Assad não para de realizar “chamados” às potências imperialistas para “lutar juntos contra o terrorismo” – qualificativo que, em Damasco, inclui tanto o Estado Islâmico quanto as milícias rebeldes. Para todos aqueles que queiram ouvir, a mensagem de Assad para o imperialismo é clara: “Se eu caio, será pior para vocês; somente minha mão de ferro pode voltar a ordenar a casa e garantir seus negócios!”.

Perguntamos: onde está o suposto líder “anti-imperialista” e “antissionista” que o castro-chavismo defende? Não existe e nunca existiu.

No terreno, a unidade entre rebeldes árabes e destes com os curdos para derrotar a ditadura, o Estado  Islâmico e o imperialismo é decisiva, é uma condição para a vitória.

Fora da Síria, a grande tarefa é organizar a solidariedade ativa e exigir a cada um de nossos governos a ruptura de relações com a ditadura de Assad e o envio incondicional de armas pesadas, medicamentos e todo tipo de ajuda para as tropas rebeldes.

A solidariedade internacional com a revolução síria é urgente. Rodear a revolução de solidariedade, realizando ações concretas de apoio à sua causa, certamente pode inclinar a balança a favor do povo sírio. Essa é a nossa tarefa imediata.

Notas:

1. http://www.efe.com/efe/america/mundo/putin-la-tarea-de-rusia-en-siria-es-estabilizar-a-sus-autoridades-legitimas/20000012-2735297

2. http://litci.org/es/lit-ci-y-partidos/partidos/corriente-roja-estado-espanol/israel-pide-armas-para-el-regimen-de-assad/

3. http://internacional.elpais.com/internacional/2015/10/09/actualidad/1444395848_897355.html

4. http://www.clarin.com/mundo/EE-UU-arroja-paracaidas-armas-para-rebeldes-sirios_0_1447655455.html

5. http://internacional.elpais.com/internacional/2015/10/12/actualidad/1444641865_422912.htm

Tradução: Luma Féboli

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